Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 2

Capítulo 97: Quimera

O jovem apertou o corpo da garota com força e apontou a escopeta para a fera esquelética em chamas. O corpo dele ficou repleto de ferimentos após enfrentar as centenas de esqueletos convocados pela criatura.

Por sorte, as chamas não podiam atravessar o enorme portão, livrou-se pelo menos de um dos problemas, agora… “Eu preciso matar essa coisa”, pensou encarando seu inimigo ficando de pé. Ambos estavam destruídos, mas nenhum dos dois queria desistir da luta.

— Tudo bem com você? — Kurone perguntou sem encarar a garota, toda a sua atenção estava voltada ao morcego esquelético. — Consegue ficar de pé?

A menina nada respondeu, apenas encarou seu “salvador” com seus enormes olhos ametistas.

Aquele garoto estava longe da figura de um herói chegando para resgatar sua princesa. Seu palavreado era vulgar, o corpo nu até a cintura estava coberto de queimaduras e feridas profundas e o rosto era oculto por uma máscara demoníaca.

Vendo que a garota permaneceu calada, Kurone a jogou no chão frio e forçou seu corpo a ficar de pé. Ele olhou para ela por alguns segundos e começou:

— Não precisa ter medo, eu vou matar essa coisa. — Sua voz continuava como antes e o corpo tremia, mas não de dor, e sim excitação. Por mais que estivesse à beira da morte, gostava daquela sensação de lutar sem depender do poder dos outros. 

A máscara estava apenas contendo sua insanidade e a Boito .20 era controlada por ele, eram apenas objetos de apoio, usava seu próprio poder contra aquele monstro.

— Rooooaaaaar!!! — a fera rugiu fazendo todo o salão tremer. Kurone cumpriu seu objetivo: destruir o repositório da criatura, na verdade, afastou-a de lá e ainda precisava fechar o portão para ela não conseguir reconstruir o corpo, mas havia equilibrado a luta.

Ele estendeu a mão, queimou mais da sua ínfima mana para gerar chamas e investiu.

O monstro não perdeu tempo e também avançou. Ambos os corpos encontraram-se no centro do enorme salão frio.

A criatura atacou com a cauda repleta de ossos pontiagudos, mas ao invés de explodir com a escopeta, Kurone estendeu a mão em chamas para receber o impacto doloroso. Todo o seu corpo tremeu, mas ele permaneceu na mesma postura até sentir os ossos afiados tocando seus dedos. Sem hesitação, segurou com força, sentindo o sangue escorrer pelo braço, e alastrou o fogo por toda a região.

Porém, não saiu ileso. A criatura rodopiou o corpo e o jovem foi arremessado contra o trono dourado confortável, mas grunhiu ao bater as costelas no braço de ouro do assento.

Levantou-se rapidamente e percebeu que a fera tentava retornar para o corredor, provavelmente queria recuperar as partes perdidas na luta. Pow! O garoto explodiu a perna do morcego com um único tiro. 

A criatura tentou continuar arrastando o corpo, mas Kurone não permitiria tal ato. Ele saltou, sentindo a dor dos ossos quebrados, em direção ao oponente para dar o golpe decisivo, porém o monstro tomou uma atitude desesperada e arremessou espigões ósseos na direção do jovem.

Ele rolou pelo chão para esquivar do primeiro e transformou o segundo em pó com o chumbo… — Argh! — Porém, não acompanhou a velocidade do terceiro projétil que acabou atravessando sua perna direita. Rolou pelo chão praguejando, mas não desistiu de perseguir seu alvo. Também começou a se arrastar como uma minhoca.

Seria uma perseguição cômica dos dois inimigos arrastando-se pelo chão se não fosse todo aquele sangue espalhado pelo salão.

A garota pálida apenas observava de longe aquela batalha inacabável, talvez tivesse poder suficiente para matar o monstro e curar o garoto, mas não ousava interferir na luta. Ela podia sentir a sede de batalha vinda do corpo do jovem.

Kurone tomou coragem, removeu o osso atravessado em sua perna e usou-o como uma estaca para aumentar a velocidade. Ele colocou a espingarda na frente dos olhos e…

Pow! Atingiu a cabeça do inimigo, porém o monstro continuou a se debater, desistindo de chegar no portão e indo em direção ao garoto. Estava desnorteado, mesmo sendo um esqueleto, não conseguia enxergar sem o seu crânio.

O garoto percebeu que precisava agir logo ou seria esmagado pelo corpo desgovernado da fera em chamas. “Drogaaaaa!!”, praguejou internamente enquanto tentava rolar para salvar sua vida, usando o osso ensanguentado e a Boito .20 como apoios. 

Percebendo que seria inútil fugir, ele virou o corpo em direção ao monstro e estendeu a mão. Concentrou todo o fluxo de mana nas pontas dos dedos e convocou suas chamas frágeis, porém não arremessou. Concentrou mais fogo nas mãos, formando uma imensa esfera flamejante. Ainda não era o suficiente!

Ignorou a aproximação do monstro e continuou juntando o fogo, ainda não era o suficiente. Cerrou os dentes para suportar o calor. Aumentou a concentração, passando toda aquela sua mana infinita para ambas as mãos em chamas.

Fechou os olhos, rangeu os dentro, forçou os músculos, franziu o cenho, apertou os dedos dos pés e contorceu todas as partes do corpo. Veias surgiram na região do pescoço e dos ombros, mas ignorou tudo, precisava de mais concentração!

Quando viu a sombra criada pelo enorme corpo do morcego esquelético, percebeu que era o suficiente. Mirou com precisão e disparou a esfera flamejante em direção ao seu oponente.

Como estava de olhos fechados antes, não prestou atenção na quantidade inacreditável de chamas que tinha em mãos.  

A sala anteriormente fria foi aquecida pelo fogo criado por Kurone. A criatura com quem lutara bravamente tornou-se cinzas no ar e desapareceu, foi vaporizada! 

Kurone encarou as mãos vermelhas, certamente causou a si queimaduras de terceiro grau, mas não importava, ele ganhou a luta. Lutou com toda a sua força, usou sua mana abundante e vaporizou o inimigo com aquilo de Cecily chamara de “mínima afinidade com o fogo”.

Venceu sua primeira batalha sem a ajuda de uma loli arrogante, um cavaleiro negro ou um Duque do Inferno. Seu sorriso aumentou, se pudesse mover o corpo, estaria pulando de felicidade por aquela grande conquista.

A máscara no seu rosto desapareceu sem que ordenasse, revelando a face ensanguentada do bravo guerreiro. Mesmo tão próximo da morte, sentia-se vivo. Na verdade, aquela fora a mais perigosa das suas batalhas, pois morrera pelas mãos de Azazel van Elsie, morrer ali significava ter a alma apagada como a de Ryuu e dos outros.

— Eu venci… Hahahaha! Eu venci, caralho! Porra! Se fudeu, desgraçado! Haha!

Mesmo assim ele não temeu e lutou com coragem, em nenhum momento lamentou sua falta de habilidade ou hesitou quando percebeu que não havia como esquivar das investidas mortais. Kurone Nakano podia dizer que era digno de lutar ao lado daquelas pessoas poderosas de Andeavor e Eragon.

Ele sentiu algo macio tocar a cabeça e forçou o movimento do pescoço rígido para ver a origem da sombra que tapava todo o seu rosto. Teve uma surpresa ao se deparar com os olhos ametistas marejados daquela garota que salvou.

Se a via daquele ângulo, então o “algo” macio que sentiu antes deveria ser as coxas da garota. “É o meu prêmio por vencer?”, pensou encarando aquele rosto bonito.

— O que… — começou a garota em uma voz tímida e quase inaudível — o que é você?

Ele abriu a boca surpreso com a pergunta. Como assim? Ele era um humano… na verdade, naquela altura duvidava da própria humanidade. De fato, fazia coisas que nem mesmo alguém com o título de “Suserano da Morte” conseguia fazer.

— Você possui — continuou a menina de voz doce e calma — os olhos negros como os de Érebos, porém porta no fundo do ser as chamas de Agni. Sua presença é divina como a de um Santo, mas possui o coração de um demônio. Seu corpo é de humano, mas sua alma tem uma quantidade absurda de poder mágico… então, o que é você exatamente?

Ficou ainda mais em dúvida com aquelas palavras. Bastava olhar para o seu corpo, no peito havia o Sigilo de Azrael e no braço esquerdo, a Marca da Besta. Um humano comum não devia portar tatuagens como aquelas.

Nem mesmo a distorção de memórias criada pela poderosa Azazel van Elsie o afetou. Podia ver aquilo que nem o próprio Avios Bishop conseguia… Ele relaxou o rosto ao lembrar da maldita Annie. Aquela deusa era a única que tinha a resposta desde o início, como ela mesma dissera, Kurone Nakano, na verdade, era…

— Acho que a única que consegue me resumir é a palavra “quimera” — respondeu encarando a garota.

Optou por um sinônimo, pois ainda odiava ser chamado de “aberração” por outra aberração como Annie, mas era fato que aquilo era o que lhe resumia.

O antigo Kurone Nakano morreu naquele dia, no momento em que matou o tio, espancou o médico e deixou sua irmã tirar a própria vida. O que estava ali era uma criação do seu pai, um louco, alguém obcecado por salvar as suas irmãs.

Ele ia contra todas as leis do mundo. Tinha tanto a presença de um demônio quanto de um Santo, nada mais justo que resumi-lo como uma quimera, porém não culparia apenas seu pai por ser uma aberração. Se deuses existiam, então culparia o deus que lhe deu a capacidade de se transformar naquilo.

— E quem seria você? — perguntou ainda encarando o rosto bonito da menina.

— Eu sou Annie, a deusa.

— Heh? — Kurone sentiu um arrepio ao escutar aquelas palavras. Nem os rugidos do morcego esquelético foram tão aterrorizantes, afinal só conhecia uma mulher com o nome de “Annie” e o título de deusa



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