Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 2

Capítulo 89: Incidente No Hospital

— Kurone… — Teruhashi disse lentamente.

A garota estava com algumas bandagens no rosto e a perna engessada para fora do lençol branco, porém tinha uma expressão feliz no rosto. Segundo a mãe, Teruhashi sofreu o acidente porque Raika correu para a rua sem que ninguém percebesse, se não tivesse saltado para empurrado a irmãzinha, algo pior teria acontecido.

— Ela vai ficar bem, não foi muito grave. A fratura na perna vai melhorar em dois meses — explicou o médico entrando no quarto repentinamente. Era um homem baixo, gordo e de longos cabelos negros amarrados em um rabo de cavalo.

— O importante é que a Raikazinha está bem — comentou a garota.

Kurone não sabia se sentia alívio ou não. Seu relacionamento com as irmãs havia mudado no último ano, apesar de ele ter se tornado um delinquente. O motivo disso foram os conselhos de Teruhashi, pedindo para ele tentar se dar bem com as meninas.

O garoto também havia se identificado com Rin, que às vezes chorava e esperneava no meio da noite sem motivos, na verdade, apenas ele sabia o porquê daqueles gritos de sofrimento, ambos foram vítimas do experimento doentio do pai.

Raika, por algum motivo, gostava muito dele. No início ela era a que Kurone mais ignorava, porém, acabou se apegando a ela como se fosse sua irmã de sangue.

Quanto a Eriko, ele quase não interagia com ela na semana, pois a menina dormia cedo, porém gostava de levá-la no colo quando saíam para um passeio em família.

— É melhor ir para casa, amanhã você tem aula — disse Teruhashi olhando para o irmão pensativo. — Você também, mãe. As meninas vão chorar se você não voltar logo.

— Eu…

— Tudo bem, tudo bem — o médico cortou a fala do garoto —, as enfermeiras ficarão de olho na sua irmã. Em uns três ou quatro dias ela poderá voltar para casa.

— Tudo bem…

— E Kurone — ela o chamou quando já estava virando em direção à porta —, vá para a escola mesmo, viu? E calce um sapato também, senão vai ficar resfriado — ela completou em um sorriso bonito.

— Tá bom! — ele respondeu energeticamente.


“A Luna não apareceu hoje de novo”, pensou ao atravessar o corredor da escola. Havia prometido a irmã que iria até à escola, mas não disse quantas aulas assistiria. 

Fazia quatro dias desde o acidente de Teruhashi, ele não aguentava mais esperar, pois a irmã voltaria para casa naquele mesmo dia, bastava terminar alguns exames, porém também estava preocupado, pois a prima não apareceu mais na escola.

Toc Toc! Ele bateu com força na porta. Toc Toc! Insistiu mais uma vez. Já estava cansado de bater naquela porta e não obter uma resposta.

— O que você quer? — Finalmente alguém abriu a porta e o recebeu com uma voz indiferente.

Era uma mulher alta e bonita em seus quarenta e poucos anos, seios fartos e longos cabelos loiros. Por algum motivo, o rosto tinha olheiras pesadas.

— Onde está a Luna? Ela não apareceu na escola esses dias, então achei que…

— Ela voltou para a Itália. Era só isso? Estou ocupada aqui.

— C-como assim voltou para a Itália?! — gritou de olhos arregalados. — Ela nem me avisou nada, nem se despediu…

— Adivinha qual foi o motivo para ela ir? Eu avisei que os homens da família Nakano eram todos uma escória, mas ela não me escutava. Ainda bem que conseguiu perceber que você era uma má influência. 

— Hã…?

— Pronto, agora para de encher meu saco, eu tenho mais o que fazer — ela disse fechando a porta com violência.

“Ela foi embora… Por quê? Eu fiz algo”, pensou enquanto encarava a porta que sabia que nunca mais se abriria. As pessoas ao redor o encaravam, além da voz alta da mulher, o uniforme do fundamental também chamava a atenção, um estudante devia estar na escola àquela hora.

“Por que você foi embora sem me dizer nada, droga!”, praguejou internamente enquanto atravessava a rua. A cena da última conversa se repetia em sua mente.

Ele seguiu em direção ao hospital com a fachada com kanjis brilhantes. Realmente não conseguia aguentar, precisava ver a irmã, por mais que soubesse o tamanho do sermão que levaria por faltar a aula.

A recepcionista não estava no balcão, então ele entrou rapidamente. Já sabia onde era o quarto, se não fosse barrado por ninguém, chegaria em segurança. “Droga, eu devia ter trazido outra roupa na mochila, esse uniforme tá chamando a atenção”, pensou encarando o rosto das pessoas no corredor.

A porta do quarto estava fechada, mas sabia que bastava um empurrão com força para abrir, pois a maçaneta estava quebrada. 

A sala estava fria e escura, porém havia duas pessoas lá, o pequeno médico gordo e…

— Teru… — o garoto balbuciou arregalando os olhos.

Naquele momento, o mundo de Kurone Nakano virou de ponto cabeça. 

O médico estava apenas de calção, com os cabelos soltos e uma expressão bizarra no rosto, bem em frente à cama de Teruhashi. A garota, por sua vez, estava imóvel, com o rosto manchado de lágrimas. A camisa estava aberta, mostrando o sutiã branco. Em segundos Kurone entendeu o que estava acontecendo.

— E-eu não fiz nada!! — O médico tentou se defender. — Eu vim aqui e… Ela…

O médico cambaleou um pouco e quase caiu no chão frio. Nesse momento o menino percebeu o motivo pelo qual a garota estava imóvel. Sangue! Havia sangue vazando pelo pescoço dela, o líquido vermelho também escorria do braço do médico, aparentemente ele fora cortado por uma lâmina.

— Ei… — Kurone começou em tom seco — o que você fez com a minha irmã, seu desgraçado. — Ele cerrou os punhos e fechou os olhos com força.

Estava claro o que acontecera. A bolsa bagunçada — ao lado da cama — de Teruhashi indicava que ela havia tirado algo de lá, provavelmente um estilete ou tesoura, e cortou o braço do médico. “Ela se matou para não ser abusada…”, concluiu encarando a cena terrível, ainda estático.

— Ga-garoto, eu posso explicar tudo direitinho. Não vamos nos precipitar, ok? — o médico disse apavorado.

“Existe algo em nosso cérebro que separa os pensamentos das ações, nos faz refletirmos antes de falarmos qualquer coisa ou tomarmos qualquer ação baseada em emoções, eu costumo compará-lo com um filtro. A função é exatamente o que o nome significa, ele filtra os pensamentos. Imagine que você está sofrendo bullying e um pensamento assassino vem à sua cabeça, porém você é alguém que deseja ter uma vida tranquila, o filtro vai separar os pensamentos da ação, ou seja, você vai desejar muito matar aquela pessoa, porém o filtro o impedirá. Minha droga, filho, consegue destruir em filtro.” Essas foram as palavras ditas pelo pai enquanto estava no carro, voltando para casa.

— DESGRAÇADO!

Tudo aconteceu em um flash. Quando Kurone percebeu, já estava em cima do homem, dando uma sequência de socos no rosto imundo. Sentiu a mão sendo perfurada pelos dentes do médico e o sangue de ambos escorrendo por seu braço.

— Filho da puta! Desgraçado! 

O médico tentava gritar, mas tudo que fazia era cuspir sangue no rosto do garoto. Mesmo se quisesse, Kurone não conseguia mais parar, suas mãos estavam em um tipo de modo automático, um soco chamava o outro. As vozes macabras no interior da cabeça gritavam incansavelmente para ele matar o homem.

— Maldito! Monstro — berrou enquanto pisava sem misericórdia na virilha do médico. Os olhos da vítima estavam quase revirados, mas Kurone ainda não estava satisfeito. 

A sequência de socos e chutes continuou por mais uns cinco minutos, o garoto não sabia de onde havia tirado tanta força, porém ainda não queria parar. Sabia que a irmã não voltaria mesmo se matasse aquele homem, porém o corpo desejava continuar a afundar aquele rosto desprezível em socos até se sentir satisfeito.

— Haha! Desgraçado! Haha! Eu vou te matar, bastardo!

Naquele momento, Kurone sentiu vontade de dar um soco em si mesmo. Por que estava rindo? Sua irmã morreu e ele estava prestes a matar um homem, qual era a graça daquilo? Por que tinha um longo sorriso macabro no rosto? 

Repentinamente, a porta abriu-se violentamente e os dois seguranças do hospital pularam no interior. Ambos tentaram segurar o garoto louco, porém ele saltou sobre a cama e agarrou o estilete nas mãos de Teruhashi.

— Eu vou matar todos! — gritou apontando a lâmina para os homens na porta. — Vocês são todos desgraçados! Malditos! Monstros! Vou matar, matar, matar…

Avançou para cima do primeiro segurança, mas sentiu uma corrente elétrica ao se aproximar. O corpo ficou trêmulo e a visão, turva. Ele caiu no chão frio. Claro, aqueles dois não eram seguranças à toa, carregavam armas de choque e não se intimidariam com um simples garoto do fundamental segurando um estilete.

Kurone escutou a comoção ao seu redor, sentiu o corpo ser levantado e levado para outro local, mas nem tentou abrir os olhos, apenas queria afastar aquelas vozes incômodas da sua cabeça e dormir eternamente. Ele sentiu o rosto umedecer com as lágrimas quentes caindo dos seus olhos.



Comentários