Raifurori Brasileira

Autor(a): NekoYasha


Volume 2

Capítulo 78: Apenas Um Louco

O primeiro passo para se tornar um assassino era cometer um assassinato.

Era simples, afinal quando se oferece comida a um gato, ele fica hesitante em se aproximar, no entanto, basta a primeira mordida para que baixe sua guarda e aproveite a refeição, ignorando totalmente o seu entorno.

Para cair no abismo bastava um passo em falso. A primeira vez era sempre a mais assustadora, como uma visita a um lugar novo, mas bastava poucas horas para que o pavor desaparecesse e desse lugar a um sentimento inexplicável…

Kurone teve medo quando sentiu aquela emoção ainda na pré-adolescência. Sua mente era sempre barulhenta, ele ouvia vozes, distraia-se facilmente e tinha impulsos estranhos. Às vezes, no meio de uma aula entediante, se pegava pensando em fazer um massacre na escola, outras vezes ele era o vilão que destruiria o mundo. Pensamentos assassinos assim não eram normais, mas ele sabia quem era o culpado por aquilo.

Ao passar dos anos, percebeu que seu caso apenas se agravava cada vez mais, então o que poderia fazer além de aceitar aquelas vozes incessantes reverberando em sua mente? Por que não transformar insanidade em um escudo?

“... Você só é um louco…” As palavras de Rory foram um golpe duro, mas não ligou e continuou a andar. Ele andava constantemente no inferno, não beirava mais a insanidade, tornou-se a própria insanidade. 

Nada mais importava.

Um sorriso enorme surgiu no rosto do jovem. Era algo ainda mais macabro que aquele da garotinha. O garoto continuou andando calmamente, jogando o corpo de um lado para o outro, como se estivesse drogado. A verdade era que se sentia leve como uma pluma, porém todo o corpo tinha espasmos a cada minuto.

Ao chegar na praça, percebeu a sombra aproximando-se. Nem precisava ativar o Olho Sagrado para saber que era um ser anormal. Ele estava indo direto para Kurone e provavelmente o mataria assim que encostasse.

— Vamos, mostre a todos o meu poder! — Um grito se sobrepôs às vozes barulhentas na cabeça do jovem. Ele simplesmente repetiu as palavras vindas do fundo da sua mente.

Não teve medo diante da presença do ser negro, ele pensava em um milhão de coisas ao mesmo tempo, quase todos os pensamentos envolviam Rory, era como a evolução da SPA, abraçou a própria insanidade e mostraria a garotinha que a salvaria com ela, provando que não era apenas um louco.

Que a fúria da divindade se volte contra os seres pecaminosos que infestam este mundo — ele começou em um murmúrio e aumentou o tom insano gradualmente —, queime o sangue blasfemo, empreste vossas chamas para teu servo e permita que ele traga o julgamento aos pecadores… [Bæwylm Eftwyrd]!

Chamas tomaram o ar. A afinidade mínima com as chamas foi aumentada exponencialmente pela deusa. A muralha de fogo erguida balançou de um lado para o outro e tomou a forma de um enorme tornado flamejante. O calor aumentou e o jovem sentiu a pele aquecendo cada vez mais, no entanto sua única reação era…

— Hahaha! Sim! Queime, queime tudo! 

O ser que se aproximava parou rapidamente ao perceber as chamas se aproximando. Do interior do capuz negro, uma esfera de matéria escura arroxeada foi arremessada em direção ao tornado de fogo. 

Vosh! Em um choque violento, chama divina e matéria escura entraram em contato, porém quanto mais a esfera arroxeada diminuía, o fogo expandia-se, aumentando ainda mais o calor da cidade e destruindo tudo ao seu redor. 

— … [Bæwylm Eftwyrd]! Hahaha! Queime!

Um segundo tornado juntou-se ao primeiro e dobrou sua área de dano. O espírito não pôde fazer nada e simplesmente foi engolido pelas chamas, fazendo o jovem aumentar ainda mais sua risada macabra que reverberava por toda a Cidade-Estado. O fogo não se dissipou e, após queimar completamente o corpo do espírito negro, continuou a se espalhar pelas construções.

O jovem não se importou e continuou andando, o corpo tremia, o sorriso assustador estava estampado em seu rosto e o Olho Sagrado brilhava como nunca. Ele pôde ver tudo, o fluxo de mana de Bishop e Amélia fugindo, a demônia e a loli arrogante e… 

— Te encontrei, não ache que poderá escapar também, vou queimar todos!

O fluxo inconfundível do demônio que assassinou Flugel, o supervisor e a garotinha. Ele ainda estava na cidade e provavelmente era o Duque que iniciou o ataque. Após salvar Rory, mataria o desgraçado, Kurone assim decidiu ao sair da catedral.

Ele apressou o passo, mas não precisava correr, afinal a demônia veio ao seu encontro. Lá estava a garota fofa e estranha que conheceu na mansão Soul Za, a empregada que seguia Rory como um cachorro atrás do seu dono. Como aquela Elsie e a Elsie de agora eram a mesma pessoa?

A empregada continuava com seu uniforme preto e branco, combinando com a máscara. A roupa dificultava a locomoção, pois era um vestido longo que quase tocava o chão. Porém, não havia tempo para sentimentalismo, a única coisa que Kurone podia sentir olhando para aquela garota era ódio.

— É a primeira vez que nós vemos depois que saí da mansão — ela começou —, mas pela sua expressão, a manipulação de memórias não funcionou em você, não é, Kuronejinho…

Pow! O garoto não permitiu que ela continuasse e disparou. Claro, Elsie só precisou mover a foice em alguns centímetros para bloquear o disparo da Boito.

— O que foi isso? Você ficou diferente, nem parece o idiota que conheci na mansão… Assim é melhor, gosto de homens selvagens.

Pow! Pow! A cada tiro Kurone, aproximava-se mais da demônia. Ele sabia que ela era perigosa, mas enquanto tivesse o Olho Sagrado, não teria problemas. Só precisava usar a magia cedida por Annie até que ela se tornasse nada mais que cinzas.

— Que rude, não quer nem flertar antes de irmos ao ato… Seja como quiser — a demônia falou enquanto avançava brandindo a foice.

Graças ao Aprimoramento Físico e o Olho, ele pôde acompanhar os movimentos da oponente e, quando estava próxima o suficiente…

— Convocação de Orcs!

Um raio caiu entre o jovem e a demônia, explodindo o chão e abrindo uma cratera. Dessa vez foram 20 monstros esverdeados. 

— O que foi isso… — Elsie olhou confusa para o pequeno orc indo em sua direção com uma clava de madeira.

Azazel deu alguns passos para trás e cortou o monstrinho ao meio em um único corte rápido. 

Pow! A pólvora atravessou o vão entre as duas bandas do corpo da criatura e seguiu em direção a Elsie. A garota saltou usando a foice como apoiou e ficou de ponta cabeça. Estranhamente, mesmo estando equilibrada de ponta cabeça na ponta da foice, o vestido de Elsie não desceu. Mais uma vez a gravidade daquele mundo surpreendeu o garoto, não que ele esperasse ver a calcinha da oponente…

— Matem ela — ordenou aos outros monstros parados. — … [Bæwylm Eftwyrd]!

Pow! Pow! Uma horda de 19 orcs, um tornado de fogo e os tiros da Boito foram de uma vez na direção da oponente.

Vosh! Elsie deu dois mortais e cortou os três orcs na dianteira, esquivou dos tiros e usou a foice como escudo para evitar as chamas, no entanto, a Magia Sagrada de Kurone começou a queimar sua pele intocada até o momento.

— Hã?! — Pelo tom, a demônia fez uma expressão surpresa por baixo da máscara. — Parece que subestimei você. Ai, ai, e eu querendo te deixar vivo após matar a menina.

— A Rory… — Kurone disse quase rugindo —, cadê a Rory!? O que você fez com ela, desgraçada?! 

— Que agressivo. É hora de te acalmar um pouco… liberando 75% do meu poder, espero que consiga aguentar.

Elsie estalou os dedos e, em instantes, a atmosfera mudou para uma pressão esmagadora, literalmente! Os insetos dourados foram ao chão, qualquer ser vivo próximo caiu violentamente e provavelmente quebrou algumas costelas. No entanto, Kurone permaneceu firme. O ar havia mudado, mas o jovem não foi afetado, assim como a manipulação de memórias não teve efeito nele.

— Incrível, incrível, você não para de me surpreender, enfim temos aqui um oponente capaz de me derrotar…?

— Argh! — gritou ao sentir um aperto no peito.

— … Brincadeirinha — Elsie disse enquanto olhava fixamente para o objeto que apareceu em sua mão de repetente. — Por favor, eu sou um demônio que viveu milhares de anos, enfrentei diversos oponentes com triplo de seu poder e você acha que vai me vencer apenas porque quer salvar alguém? Haha! Patético, quando foi a última vez que lutou sério? Acha mesmo que consegue vencer apenas com seu “Ah! Eu quero salvar a Rory”, e aí… haha… o universo vai te dar o poder que precisa? Que tipo de fantasia é essa? — A demônia olhou mais uma vez para o objeto em mãos: o coração de Kurone ainda pulsante.

— Quê?

Ele ignorou a dor, não olhou para o buraco que provavelmente tinha no peito, tudo aconteceu muito rápido, nem mesmo o Olho Sagrado foi capaz de acompanhar a sombra da oponente. — Não é possível…

— Tsc, isso aconteceu porque confiou em sua insanidade. Você é apenas um louco, Kurone Nakano. — Assim dizendo, a garota esmagou o coração em sua mão.



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