Volume 2
Capítulo 58: Encontros Inesperados
Ele estava certo sobre a influência de fora no festival, mas não imaginou que fosse alguém ainda vivo, ou tão forte como o reitor. Aquele velho era uma monstruosidade.
— Ugh! Você não olha para onde anda?
— Qual é? Tá querendo apanhar também? Eu ainda tô com a cabeça quente e os punhos…
— É você, homenzinho desagradável. — Avios Bishop fez uma expressão de desgosto ao reconhecer o jovem que esbarrou em seu corpo.
— Você é a última pessoa que eu queria ver hoje.
— O que… — Avios franziu o cenho. Havia algo de diferente naquele garoto herege. Era como se a aura insana e a intenção assassina tivessem aumentado desde o último encontro em Andeavor. O rosto e punhos feridos demonstravam que estivera brigando recentemente.
Após o desentendimento no instituto, Kurone foi orientado a não voltar até que esfriasse a cabeça — foram ordens da própria Rory. Por algum motivo, a garotinha manteve uma postura hostil em relação ao reitor, mas não apontou um fuzil para a testa dele como de costume, isso já era uma grande vitória!
Kurone andou, furioso, pelas ruas de Eragon até esbarrar no seu velho conhecido, Avios Bishop, o Santo da igreja da deusa Annie.
— Tá fazendo o quê aqui? Se tava vindo pra Eragon de qualquer maneira, por que não veio com a gente? Nós não teríamos nos perdido se viéssemos com você.
— Escute aqui, eu não devo satisfação a ninguém, mas se usar três dos seus neurônios de macaco vai perceber que o Santo da deusa Annie e o Festival da Deusa Lunar têm alguma relação.
— Ah, entendi! Você veio aqui pra balançar a bunda no palco.
— Ugh, você ficou mais irritante desde a última vez. O que é esse sorriso nojento?
A atitude de Kurone não era para menos, já que se passou um tempo considerável desde a última vez que tomou o remédio para controlar a agressividade, mas não tinha como Avios Bishop saber disso, ele apenas via que o jovem estava diferente.
— Por que está me seguindo?
— Ei, eu queria saber de uma coisa, como você chegou aqui? Eu já vi que não tem elevador pra transportar pessoas e muito menos um busão voador pra turistas.
— Como assim "como chegou aqui", você não está aqui também?
— É que eu tava desacordado na hora…
— Eu tenho mais o que fazer, então vou te responder logo e você vai embora. Nós usamos o portal, satisfeito? Agora se me dá licença…
— Portal…?
— Eu tenho cara de professor? Quer tudo mastigado? Vá descobrir por si mesmo. Anda, anda, saia da minha frente, homenzinho desagradável, tenho que ir até à igreja me apresentar para o líder local.
— Obrigado por nada, idiota. Olha só, você me fez falar igual a Rory.
Após o encontro inesperado com Avios Bishop, Kurone continuou caminhando sem propósito pelas ruas de Eragon. O objetivo dele era esfriar a cabeça, mas não estava tendo êxito, apenas ficou mais irritado ao ser tratado como um ser insignificante por Bishop.
Por sorte, as pessoas estavam ocupadas com os preparativos para o festival e o ignoraram, era algo bem melhor que ficar sendo encarado por eles, como se fosse amostra de uma espécie rara.
O garoto martelava a palavra "portal" na cabeça. Seria muito conveniente ter um daqueles mentores que normalmente aparecem em filmes e explicam o mundo para o protagonista?
— Senhor Kurone Nakano? É um prazer revê-lo.
— Hã? — O jovem virou o rosto, à procura da voz feminina. — Ah! É você… É…
— Pode me chamar de Flugel.
A garota estava com roupas diferentes, mas os fios dourados adornando a cabeça eram inconfundíveis, aquela era a líder das Amazonas Aladas. Flugel convidou Kurone para sentar ao seu lado, em uma barraca de comida quase pronta.
— Desculpe a intromissão, mas o que aconteceu com você, senhor Kurone Nakano? — disse a garota, analisando o jovem com hematomas e sangue alheio na roupa.
— Pode deixar a formalidade de lado, me chame apenas de Kurone.
— T-tudo bem… senhor Kurone…?
— Quase lá.
— Desculpe, não costumo me referir às pessoas de maneira tão informal.
— Tudo bem, mas eu também não tô acostumado a ser tratado de maneira tão formal, fico até com vergonha.
— Falando desse jeito parece que é alguém sem nenhum valor… Ah! Me desculpe! Eu falei demais!
— Tudo bem, tudo bem, você não tá totalmente errada. Mas respondendo à sua primeira pergunta, eu tava só passeando pra esfriar a cabeça… Ah! Talvez você saiba me responder isso… Flugel, não é?
— Sim, isso mesmo. Pode me perguntar o que desejar.
— Então lá vai: pode me explicar o que é esse tal "portal" que traz as pessoas pra cá?
— É só isso? É algo bem simples. O portal é alimentado pela mesma fonte de energia que faz a cidade flutuar. Quando ligado daqui de cima, ele se conecta com o portal de baixo e cria uma ligação, permitindo às pessoas passarem.
— Uau! É algo mais incrível do que eu pensei que seria! Enfim posso morrer em paz, desvendei um dos maiores mistérios desde que cheguei aqui!
— O senhor se conforma com pouco, essa é uma informação que poderia obter com qualquer civil.
— Sempre me dizem que eu tenho que ter mais ambições.
— Realmente, ambições… Oh não, preciso ajudar na construção de uma barraca!
— Tem algum problema se eu te acompanhar? Tô sem nada pra fazer. — "E tô na casinha de cachorro, a Rory me mata se eu voltar agora."
— Nenhum, na verdade, toda ajuda é bem-vinda.
O local onde Flugel e Kurone se dirigiam ficava próximo à praça da igreja. Seriam dez minutos a mais para a garota, considerando que ela não poderia voar e deixar o jovem para trás.
— A galera daqui é meio deprê, não é?
— Desculpe, não compreendi o que o senhor quis dizer com "deprê".
— É meio que uma gíria para triste.
— Acho que compreendi. Acontece que as pessoas daqui vivem preocupadas com a "influenza". É difícil sorrir quando não se sabe quando alguém próximo infectado pode morrer… — A garota olhou para o céu do meio-dia, pensativa.
Os pés do jovem pararam por um instante ao escutar as palavras da garota. "Influenza"? Era a mesma influenza que ele conhecia?
— O senhor sabe sobre ela? Digo, a influenza?
— Espero que não seja o que eu estou pensando…
Flugel suspirou antes de continuar:
— Os moradores de Eragon são assolados por uma enfermidade conhecida como "influenza", essa doença atinge apenas os humanos e, para evitar a disseminação, as pessoas foram trancadas aqui. A igreja tem um remédio que é distribuído todo mês, a fim de evitar a morte das pessoas.
— Que coisa horrível… pelo menos a igreja…
Foi apenas por um segundo, porém Kurone pôde sentir olhos o observando. Ao virar o rosto, ele viu nitidamente o semblante da mulher que lhe assombrara anteriormente, era a figura da deusa Annie, com um sorriso perverso na face. A silhueta ficou ali, parada, encarando o jovem. O corpo do garoto tremeu.
Instantes depois, a assombração desapareceu da mesma maneira que surgiu, deixando apenas o pavor no peito do jovem. Por que aquela deusa o perseguia? Seriam apenas alucinações por conta da falta de remédios? Não, não era isso…
— Senhor… Kurone…?
— N-não foi nada! Você falou alguma coisa?
— Ali! Olhe!
— É uma multidão…
Aquilo não era um bom sinal. Kurone lembrou-se da morte dolorosa há um mês em que uma multidão estava ao seu redor enquanto os paramédicos tentavam reanimá-lo. Multidão reunida era sinônimo de tragédia. As pessoas estavam próximas a uma barraca grande, cada uma tinha uma expressão diferente no rosto melancólico.
— O que aconteceu!? — perguntou Flugel, empurrando os moradores até chegar ao centro, onde os olhos mortos de todos focavam. — Não é possível. Quem fez isso! — A voz da garota, séria e firme, estava alterada.
— Porra! — Kurone também sentiu repulsa ao ver a cena à frente.
Saiu do Instituto para Reencarnados a fim de esfriar a cabeça, mas um evento após o outro mostravam que estava repleto de inimigos ao seu redor.
O rosto de uma garotinha, aparentemente de dez anos, estava estático em uma expressão doentia, com os olhos arregalados e a língua para fora. A causa da morte foi um buraco do tamanho de um punho em seu peito, de onde vazava sangue em abundância.
O gosto de suco gástrico subiu à garganta do garoto e um suor frio escorreu pelo corpo. O que era aquilo? Quem era responsável por uma morte tão brutal? Por que matariam uma garota inocente? Por que as pessoas daquele mundo eram assim? Por que os alvos eram apenas crianças? Lixos assim mereciam uma morte dolorosa como a que planejava dar a Edward Soul Za! Aquilo era algo que implicava diretamente com seus princípios e título de "Lolicon Slayer".
— S-senhor Kurone, por favor, acalme-se!
Sem perceber, o jovem espalhou um ar hostil por todo o local, assustando as pessoas ao redor. Ele estava irritado, muito irritado, pois aquilo lembrou que se Frederika não fosse uma vampira, ela poderia estar morta àquela altura.
Precisava matar alguém para apagar a sede de sangue, e o autor daquele crime era um alvo perfeito.