Volume 1
Capítulo 16.1: Interlúdio na Capital
Uma mosca, um inseto insignificante, voava de um lado para o outro na sala de aula.
Apesar de ter mais de vinte pessoas, a mosca produzia mais barulho que qualquer um ali.
Fazia mais de dez minutos que o inseto tornou-se alvo do olhar de alguém, a garota de olhos pesados olhava fixamente para o pequeno animal voando de um lado para o outro, às vezes pousando na cabeleira de uma garota sonolenta.
A voz vinda do quadro negro não chegava aos ouvidos de ninguém no fundo da sala, ou simplesmente, não havia quem realmente quisesse ouvir.
A aula do último período era sempre a mais maçante.
Um dos principais motivos era que a senhora Ryth tinha uma voz que provocava uma sonolência inexplicável em seu interlocutor — não foi uma boa ideia deixar essa senhora a cargo da aula de aritmética avançada.
O som do livro gigante se fechando com um “pup” anunciava o fim da aula.
A garota que acompanhava a odisseia da mosca levantou-se, jogando os seus longos cabelos para trás e despedindo-se do companheiro inseto em seus pensamentos.
Aquela mosca era ágil, evitou o ataque de todas as estudantes da sala e sobreviveu por mais um dia para continuar disseminando doenças. Uma verdadeira mosca aventureira.
“Aventureiro.” Para a garota, essa palavra era um sinônimo de liberdade.
Ela esfregou os olhos ainda sonolentos e bocejou. Não havia mais ninguém no local, até mesmo a vagarosa senhora Ryth já tinha ido à sala dos professores.
— Ahhhhh! Certo, hora de ir.
A garota atravessando o corredor, vagarosamente, usava o uniforme padrão da escola: um blazer vermelho e uma camisa branca com mangas longas por baixo.
As mechas loiras destacavam-se no vermelho tanto do blazer quanto do laço que prendia o cabelo em um rabo de cavalo.
Os olhos sonolentos contrastavam com a silhueta esbelta.
“Os olhos são a janela da alma”, lembrou da poesia da aula de literatura. “Nesse caso, os belos olhos das pessoas que conheço devem estar danificados”, refletiu enquanto lavava o rosto com água de um dos bebedouros do corredor.
Do lado de fora do prédio, uma carruagem a esperava. Pôde ver o cocheiro impaciente pela janela.
Certamente, o homem ficou irritado por esperar tanto, ainda mais após ver todos os outros indo embora e apenas ele ficando à espera do seu passageiro.
Após deixar o prédio, a garota entrou direto na carruagem, sem falar ou fazer contato visual com o cocheiro. Provavelmente, o homem já estava habituado àquilo.
— Iahhhhh!
Com o grito do homem e o barulho das rédeas batendo, a carruagem começou a andar, devagar como sempre. Era a preferência da garota, se pudesse, voltaria para casa a pé, mas sabia que se fizesse isso, não voltaria para casa.
— Se bem que um sequestro seria empolgante…
A menina melancólica olhava para as pessoas, as tendas, os aventureiros e para tudo ao seu redor com braço apoiado na janela da carruagem. O olhar voltado para a paisagem estava repleto de um sentimento de inveja.
Os olhos foram baixando lentamente. Não conseguiu dormir nada na última noite, assinando papéis sem parar. “Tudo isso por causa das terras do Edward.”
Bem distante dali, vivia um nobre chamado Edward Soul Za, era alguém importante e bem próximo do seu pai, ou seja, era um puxa saco que tentava a todo custo forçar intimidade com o rei. As terras desse nobre eram afastadas da capital e raramente acontecia algo lá, mas…
“Dois ataques em menos de dois dias, isso é demais até para a capital!”
Se não fosse por seu pai, já teria fugido de suas responsabilidades há muito tempo, era demais para uma adolescente de apenas dezesseis anos.
“Não, não, tem abutres demais rondando ele, como o Edward e o Santo.”
Depois da morte da mãe, coube à garota o papel de cuidar do pai, mas esse acreditava que depois da morte da esposa, era papel dele zelar da filha, mesmo em meio a tantos problemas.
— Hmmm…?
O tombo da carruagem acordou a garota quase adentrando no mundo dos sonhos.
O cocheiro sabia que ela dava preferência para andar a pé pela floresta que se estendia até a entrada do castelo, ali não correria risco de ser sequestrada e conseguia um tempo para pensar enquanto apreciava a paisagem.
Naquele dia foi diferente, porém ela ainda não havia se dado conta, sua cabeça estava muito cheia para dar atenção a trivialidades.
Era difícil ser uma princesa quando não se queria ser uma princesa.
“Por favor, passe essa responsabilidade para alguém que não seja eu”, pensava isso diariamente, mas sua irmã mais velha, Kastella Andeavor, teve a ideia primeiro e fugiu quando a garota tinha apenas doze anos. Sem outro familiar, foi obrigada a assumir o papel de princesa regente.
Os pensamentos eram o seu refúgio, quando estava imersa neles, o tempo se passava em uma velocidade diferente do exterior — a cara de paisagem mostrava quando ela estava viajando nesse outro mundo.
— Estranho…
Ela encarou a paisagem que não estava habituada, era uma parte da floresta que nunca explorou antes.
A carruagem parou de repente.
— Por favor, princesa, leia isso. — O cocheiro passou uma carta pela abertura da carruagem.
O envelope continha as iniciais “S.S.S”.
— Sophia? Por que ela…
O conteúdo da mensagem era direto, porém escrito de maneira formal. O que estava escrito na carta era o seguinte:
“Querida Elisabella, peço desculpas por não ter ido ver os seus novos vestidos, acabei atrasando na vila Grain, mas temo que o ataque às terras do marquês Soul Za seja apenas o prelúdio do que está por vir, alguns nobres não concordam com suas ações e desejam lhe tirar do trono, por favor, seja cautelosa e escute tudo o que o cocheiro vai lhe contar, ele sabe quem é o verdadeiro culpado pelo último ataque, e esse culpado também é o líder dos Corvos…"
— O que foi que deu na marquesa Sophiette…?
O coração da garota começou a palpitar em ritmo desordenado, as mãos tremendo incessantemente ajudaram a rasgar a carta.
O cocheiro fez o som que lembrava uma risada presunçosa e começou:
— Os nobres vêm investigando isso há algum tempo, aparentemente as pessoas influentes de uma facção autodenominada “Corvos” vem agindo por trás dos panos e o alvo deles é a princesa de Andeavor, mas isso não importa, Sophia descobriu isso tarde demais, é uma pena.
— Quê?
— Eu esperei muito por esse dia, princesa, não é nada contra você, mas isso é necessário…
— Você não é o meu cocheiro! Quem é você?!! — a garota perguntou em um tom sério.
Apesar das vestimentas, não era comum que o seu condutor utilizasse um chapéu que cobria o rosto, o corpo também parecia mais magro, sem a presença dos músculos.
O homem retirou o chapéu, revelando não ser nenhum dos subordinados do castelo.
— Eu te conheço, você é…
— Me desculpe por isso.
— Quê?!
Algo foi jogado dentro da carruagem, fazendo a garota dormir no mesmo instante.
— Tsc, tsc, ela nem teve tempo de resistir. Bem, irmã… mestre… Corvos… nossa vingança começou!