Volume 2
Capítulo 37: Laços doces e dolorosos
— Naquela hora, quase me apaixonei por você.
Luna agarrou o braço de Victor e riu ao dizer aquelas palavras.
Victor balbuciou algo que ela não conseguiu ouvir — um resmungo, talvez —, mas Luna não se importou e o soltou logo em seguida.
— Os homens dessa nossa família problemática são todos incríveis, que orgulho! Hehehe.
— Você tá falando como uma velha gaga — debochou Victor.
— Cala a boca — reclamou a garota, fazendo beicinho.
Victor bufou enquanto pegava um cigarro. Ofereceu um a Luna, que recusou com um aceno de mão. Ele acendeu o seu, tragou e deixou a fumaça escapar num longo suspiro. Luna o observou por um instante, mas o deixou afundar nos próprios pensamentos. Ela também estava distante desde que deixaram a mansão de Cezar.
O casal caminhou em silêncio pela avenida comercial lotada no centro do Distrito 4. De tempos em tempos Luna parava diante de alguma vitrine — roupas, cosméticos, acessórios fofos — e Victor não reclamava das pausas. Nenhum dos dois tinha obrigações naquele dia.
As operações da Crimson Wolf, exceto a produção e venda de Aurora Phase, estavam suspensas. Um descanso coletivo para a gangue.
— Acho que ficaria muito bom em você.
Victor gesticulou com o queixo em direção a uma lingerie azul exibida por uma manequim robótica, que mudava de pose para destacar os detalhes da peça.
Luna lançou um olhar resignado, suspirando. Não comentou nada. Continuou andando.
— Ei... foi mal.
— Okay.
De novo isso, pensou Luna.
— Victor, eu... você sabe que eu te amo. Mas também sabe que isso não daria certo.
Victor contraiu os lábios; seu semblante endureceu.
— É por causa dele...? Não, esquece.
Luna parou. Suspirou mais uma vez, os ombros caindo.
— Virou a Rita agora? — zombou. — Miguel não tem nada a ver com isso. E você sabe disso.
Sob o neon rosa e laranja, o casaco corta-vento dela parecia brilhar. Victor tentava não encarar suas pernas sob o shorts branco, mesmo com aquele olhar de culpa pesando nele. Luna soltou outro suspiro — estava cansando de suspirar.
— Percebe? Você só me olha desse jeito. Querendo ou não.
Ela sorriu, mas o sorriso carregava tristeza. Aproximou-se e tocou o rosto dele com cuidado.
— Eu sei que me ama. Acho que não percebeu, mas eu percebi. E sei que você fica preso entre a culpa e o desejo.
Beijou a bochecha dele. Victor permaneceu em silêncio.
— Não te culpo. No seu lugar, qualquer um ficaria assim.
— Não Miguel... — murmurou, desviando o olhar.
Luna riu. — Pois é. Ele é... peculiar. Cresceu de um jeito estranho.
— Hah... não dá pra competir com ele, né?
Luna apertou a bochecha de Victor, fazendo-o franzir o rosto.
— Esse é um dos seus problemas. Vive se comparando. E olha quem fala... quão hipócrita eu sou.
Seu olhar suavizou.
— Você é tão excelente. Só você não vê.
Victor soltou o ar pelo nariz, sorrindo de lado.
— Miguel disse a mesma coisa.
Luna riu. — Tá vendo?
Achando que o assunto tinha terminado, virou-se para continuar o passeio, pronta para se distrair com alguma vitrine. Mas sentiu o puxão no braço.
— Pelo menos uma última vez? — disse Victor, evitando olhar em seus olhos.
Ele parecia menor. Não o líder da Crimson Wolf, mas um garoto ferido. Ainda assim, Luna não riu. Nem sentiu pena.
— Não foi o que disse da outra vez?
— ...
Ela soltou o braço com delicadeza e se aproximou outra vez.
É realmente uma pena. Você é tão lindo e confiável. Eu daria meu coração pra você. Parte dele já é seu, Victor. Mas nós dois sabemos que não funciona. Você até aceita meu passado, mas as sombras que me seguem também te engoliriam. Engoliriam nós dois. E acabaríamos nos machucando mais do que agora.
Talvez eu nunca encontre alguém pra amar e me amar. É triste. Mas quero preservar o pouco de paz que ainda tenho.
Victor pareceu captar cada pensamento dela; seus olhos ficaram tão melancólicos quanto os dela.
Então Luna o beijou.
Lembrou do quanto gostava daquele beijo. Ficou na ponta dos pés, segurando-o; o cheiro dele trazendo memórias doces, mas também confusas. Momentos íntimos envoltos em ambiguidade e jogos de poder.
Por um instante, quase cedeu ao desejo de transar com ele outra vez.
Mas sua determinação se manteve.
Quando seus lábios se separaram, ela sorriu com carinho.
— Isso é o máximo que posso oferecer... — Seu olhar oscilou entre culpa e alívio, emoções demais para explicar. — Ainda quer me acompanhar?
Era um pedido egoísta, quase cruel. Mas ela queria sua companhia — a do primeiro homem que amou.
E ficou aliviada ao ver o semblante dele retornar ao habitual.
Victor sorriu de leve.
— É claro.
♦♦♦
No Red’s, a hamburgueria mais famosa do Distrito 4, Luna e Victor comiam de forma descontraída. O peso que quase quebrara o clima naquela tarde já não pairava mais.
Mesmo lotado, como sempre, o casal ainda conseguiu uma mesa graças a sua influência.
— Ainda é cedo pra isso, mas o que acha da proposta de Cezar? — Luna molhou a batatinha no milkshake de morango super cremoso antes de dar a primeira mordida.
Victor mastigou seu hamburguer devagar, como se mastigasse também a dúvida dela.
— Eu ainda não sei — disse, tomando um gole do refrigerante de melão. — Posso pensar nisso depois?
O olhar frio e desaprovador de Luna falou por si.
Victor riu de si mesmo e suspirou.
— É claro que não. — Deu outra mordida no sanduíche. — Nos aliarmos a Cezar quando estivermos mais fortes, ou sermos dizimados. Parece óbvio, mas não é tão simples assim...
— Pois é... — Luna apoiou o queixo na mão, sugando o canudinho enquanto os dedos tamborilavam na mesa. — Nem sabemos se Cezar tem certeza de que nada tivemos a ver com a morte do sobrinho dele. Ele não falou nada, mas sabe que tivemos treta com Hugo. É preocupante. Talvez ele só não tenha nos confrontado porque naquele mesmo dia também fomos atacados... mas, mesmo assim... complicado.
— Prefiro não focar nisso agora. Vamos esperar Vic e os outros voltarem. Além disso, você percebeu a desconfiança de Cezar em relação a Miguel e Mia. Nem um Black Quill conseguiria reunir informações sobre eles. Conveniente pra gente, afinal, esses dois são valiosos demais. Se Cezar soubesse quem realmente são, estaríamos fodidos.
Luna lembrou-se daquele momento: Cezar tinha todos os dados relevantes sobre cada membro da Crimson Wolf, exceto Miguel e Mia. Durante a conversa, ele parecia genuinamente interessado em Miguel, mas também cauteloso por não ter informações suficientes.
Se Cezar descobrisse que Miguel possui o Primordium, estenderia a mão quando a gangue ficasse forte? Luna riu da ideia.
— E agora, para o bem ou para o mal, temos Nina também.
Victor franziu os lábios, como lembrando-se de um fator chave.
— O que você acha, Luna? O que faria no meu lugar?
Ela se balançou na cadeira, olhos fechados, terminando o milkshake.
— Na sua posição, a melhor manobra é se aliar a Cezar quando a hora chegar, mesmo que isso signifique virar subordinado. Depois seria difícil sair desse controle, mas ainda é melhor do que enfrentar inimigos que não podemos vencer de todos os lados. Mas...
— Miguel e Mia podem desestabilizar tudo, é isso que você pensa, né?
— Hm-hum.
Miguel tinha o Primordium. Só isso já significava potencial evolutivo ilimitado. Se se mantivesse vivo, superaria qualquer um — não apenas em força, mas em alcance estratégico. E Mia, limitada por tecnologia do século passado, ainda assim tinha poder significativo. Se conseguisse um corpo novo, talvez chegasse a superar Miguel a curto e médio prazo.
— Se fosse pra apostar, eu apostaria minhas fichas em Miguel e Mia, mas... complicado demais.
Não havia resposta fácil. Mas não precisavam se preocupar agora. Precisavam ainda passar do estágio de “gangue conhecida”. Até lá, talvez Miguel e Mia já estivessem fortes o suficiente para decidir o próprio destino. Assim como eles próprios. Luna nunca entregara seu destino a ninguém, e sabia que toda sua família agia da mesma forma.
— Ei, Luna.
— Hm?
— E se Miguel nos abandonar? Ele é do tipo que sacrificaria qualquer coisa para proteger quem ama. Mesmo que esteja com minha irmã e a sua, Mia ainda é a prioridade máxima dele...
Luna semicerrava os olhos, provocando uma careta em Victor.
— Você não é exatamente como ele? Se fosse forçado em uma situação que tivesse que escolher entre Vic e a gente, quem escolheria?
— ...
Ela sabia a resposta, e não a incomodava.
— Não é por isso que confiamos tanto nele? É por isso que confiamos em você também. Alguém assim é mais confiável do que quem age pensando em todos. Eu mesma abandonaria todos vocês por Samira se fosse necessário.
Victor sorriu resignado, amassando a embalagem do hambúrguer antes de deixá-la na bandeja.
— Ainda tá cedo. Quer dar mais uma volta? — mudou de assunto, parecendo cansado, querendo relaxar.
— Eu até queria, mas vou passar no Lar dos Casados. Não posso deixar Leo cuidando de tudo sozinho.
— Entendi. Ele parece empolgado, não acha?
— Hahaha, claro! Ouvi dizer que tem recebido muitos agradecimentos pelo esforço — Luna riu alto.
— Sério? Talvez eu passe lá pra ajudar também...
Victor empalideceu com a gafe, mas Luna riu, sem se importar.
— Seria bom. Não estou brava, sério. — Luna então lembrou-se de uma dor recente de Victor. Talvez o comentário desleixado do rapaz fosse um jeito de fugir da realidade por um momento. Por isso ela não ficou com raiva dele. — O que aconteceu com Veronica... vocês combinavam... sinto muito.
Victor balançou a cabeça. — Tudo bem, não se preocupe.
Apesar do clima pesar um pouco na despedida, ambos saíram do Red’s com sorrisos leves, se despedindo com um abraço carinhoso.
♦♦♦
Luna atravessava o bairro da luz vermelha mais conhecido da Zona Sudeste com o olhar distante, nostálgico e pesado.
Muitas meninas dançavam em roupas sensuais, algumas sem nenhum filtro, se expondo completamente em cápsulas transparentes, como produtos em vitrines. As lembranças vieram sem pedir licença, lembranças que ela nunca poderia apagar.
Sozinha, era abordada de vez em quando por alguém oferecendo dinheiro para transar com ela. Luna lançava um olhar frio, suficiente para afastar a maioria. Aos mais agressivos, a ponta do cano da arma encostando na testa resolvia rápido.
Por um instante, sentiu-se responsável pelo mal-entendido. Olhou para as pernas torneadas sob o shorts branco, o tênis branco e as meias invisíveis não escondiam muito. A jaqueta grande aberta deixava à mostra o umbigo sobre a blusinha preta. Fechou o corta-vento e seguiu. Não fazia sentido se sentir assim, mas era inevitável.
Quando chegou ao Lar dos Casados, boa parte do peso se desprendeu. A casa era mais agradável, mesmo sendo um puteiro. Luna riu da ironia ao atravessar o portão. Olhou para a van, que continuava no mesmo lugar de sempre. Pneus furados, mas pelo menos lavada — provavelmente trabalho de Leo.
— Luna! — o grito a fez erguer a cabeça. Andressa vinha na direção dela, a longa camiseta cinza balançando junto do cabelo cacheado, impossível saber se havia algo por baixo. Era decente para um dia de folga. Andressa a envolveu em um abraço. — Você não visita a gente faz um tempão!
— Foi mal. Tava ocupada esses dias.
— Ah, tá de boa. Vem, entra.
A enorme casa estava irreconhecível. Paredes limpas, escadarias concertadas, quadros novos. A elegância do século passado ainda presente, criando um contraste com o mundo lá fora. O ar cheirava a orquídea e laranja, leve e fresco.
— Porra, aquele Leo deve tá ralando pra caralho — Luna suspirou.
— Hahaha, tá mesmo! — Andressa riu. — Mas sendo tão bem recompensado quase todo dia, dá pra entender.
— Vocês estão mesmo mantendo esse tipo de relação?
— Ah, nem todas! Eu só dei pra ele duas vezes — disse Andressa, espreguiçando-se e levantando a camisa sobre o shortinho jeans. — Quem mais transa com ele é a Sabrina. Parece que se apaixonou por ele, mas também aceita boquetes e massagens da Aline e da Emily. Homem simples, né?
Andressa riu de novo.
— Não é todo dia, e hoje é mais papo do que sexo. Leo é legal, então todo mundo gosta dele.
— Que bom. Por um momento achei que ele tava manipulando vocês.
— Hihihi, manipular? Bobo daquele jeito? No começo, a Sabrina o fazia de gato e sapato, mas depois ficou com pena e parou. — Andressa gargalhou. — E a Emily também usava e abusava dele, mas hoje em dia pararam com isso.
Luna riu, imaginando a cena. Subindo para o segundo andar, perguntou sobre a reformulação do Lar dos Casados proposta por Miguel e Mia.
— Sinceramente, a gente não botava fé no plano deles, mas no último mês a gerente mostrou crescimento de 20% nos lucros da casa. Caralho, a gente comemorou com três barcas de sushi! — Andressa bateu palmas. — Aquele Miguel é esperto, ele e a namorada dele.
— Além disso — continuou —, trabalhamos menos que antes. Aquelas aulas chatas compensam, são bem mais fáceis que chupar um pau cabeludo e suado. Pensando bem, as aulas até divertem.
— Esses dias, um cliente me pagou o triplo do que cobro e nem me comeu. Ficou chorando no meu colo, falando da mãe que morreu de câncer mês passado, tadinho. — Andressa riu, mas sem malicia. — Outro dia, a Miriam atendeu um cara que pagou um extra só pra ela dar conselhos de como reatar o casamento.
Luna quase não segurou a risada.
— E tem mais! — Andressa prosseguiu. — Sabrina arrumou um cliente que chegou aqui parecendo um mendigo, mas ela reclamou e disse que só faria o programa se ele tomasse banho. Ele foi embora. Todo mundo achou que tinha perdido o cliente, mas o filho da puta voltou! Nem parecia o mesmo cara: novo corte de cabelo, barba feita, roupa decente, alto, parecia executivo. Ele tinha sido despedido e não sabia o que fazer da vida. Nem transou, só queria alguém pra ouvir as frustrações.
Luna sorriu, ouvindo os relatos. Miguel e Mia tinham enxergado algo simples, óbvio, mas que ninguém mais tinha pensado. Fazer das meninas mais do que putas, mas quase psicólogas foi realmente um tiro certeiro.
— E sobre aquela outra questão? — perguntou Luna, mais baixa, mais fria.
Andressa ficou séria.
— Hm. Ainda não conseguimos nada muito interessante, mas estamos no caminho. Faltam os clientes certos, eu acho. Mas todas estão focadas nisso.
Luna assentiu. O Lar dos Casados agora tinha potencial para reunir informações valiosas para a Crimson Wolf, quase como os Black Quill, mas de uma forma que ia por outra tangente, algo que nem mesmo esse grupo misterioso e famoso poderia usar.
Apoie a Novel Mania
Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.
Novas traduções
Novels originais
Experiência sem anúncios