Primordium Brasileira

Autor(a): Lucas Lima


Volume 1

Capitulo 11: Rosa Azul Banhada em Sangue parte 4

Com o bastão de ferro firme nas mãos, Miguel correu em direção a Hugo. A velocidade com que ele se movia era sobre-humana; em um instante, já estava diante do gigante. Hugo mal teve tempo de processar o choque antes de tentar erguer a espingarda. Porém, antes que conseguisse alinhá-la, um golpe brutal acertou seu ombro. O impacto fez o braço cromado de Hugo ceder por um instante, e ele gritou de dor enquanto mancava para trás.

Miguel não permitiu que ele se recuperasse. Cada golpe desferido era um ataque feroz, o som metálico do bastão ressoando em cada colisão contra o corpo de Hugo. A arma do gigante, embora devastadora, era pesada e lenta, um fardo mesmo para seu físico enorme, que o impedia de reagir à rapidez extraordinária de Miguel.

Hugo rugiu de frustração, girando o braço metálico em um arco horizontal, tentando acertar a cabeça do garoto. Miguel se abaixou no último momento, o braço de aço passando a poucos centímetros de sua cabeça. Ele aproveitou a abertura e desferiu um golpe ascendente com o bastão, mirando na mandíbula do adversário.

O impacto foi aterrador. Hugo sentiu o gosto amargo de sangue inundando sua boca, acompanhado de um estalo que reverberou por seu crânio. Ele cambaleou, cuspindo sangue misturado a pedaços de dentes. Mas sua reação foi quase instintiva. Antes que Miguel pudesse recuar, Hugo soltou um soco direto com o punho direito.

O golpe acertou com força brutal. Miguel foi levantado do chão, seu corpo girando no ar antes de cair desajeitadamente. Sangue escorreu por seus lábios, e seu nariz estava visivelmente deslocado.

Por um momento, ambos ficaram imóveis, respirando pesadamente. Coincidentemente, a música no ambiente cessou, deixando apenas o som da respiração pesada e dos gemidos de dor.

Miguel cuspiu um bocado de sangue no chão, limpou a boca com as costas da mão e, sem desviar os olhos de Hugo, empurrou o nariz de volta ao lugar com um estalo seco. Hugo, ainda cambaleante, cuspiu mais sangue e dois dentes, sua visão oscilando. Mesmo assim, sua raiva era palpável, uma força que o mantinha em pé.

— Filho da puta... Quem diabos é você?! — rugiu, o ódio em sua voz cortando o silêncio momentâneo.

Miguel não respondeu. Apenas estalou o pescoço, como se estivesse se preparando para o próximo round. Então, com um movimento repentino, ele chutou o chão e avançou novamente.

No mesmo instante, uma nova batida frenética explodiu nos alto-falantes da boate. Hugo ergueu a espingarda, apertando o gatilho em puro reflexo. Um disparo ecoou, mas um dos canhões de luzes no andar projetou um brilho intenso, ofuscando sua visão.

Miguel já havia se movido. Ele rolou para o lado, desviando do tiro antes mesmo que Hugo pudesse mirar corretamente. O projétil passou zunindo, atingindo uma coluna de concreto ao fundo, enquanto Miguel avançava rapidamente, o bastão elevado para desferir outro golpe.

Hugo, percebendo o perigo, largou a espingarda vazia e reagiu. Ele desviou por pouco do golpe que visava sua cabeça e, em um movimento rápido, desferiu dois socos em sequência.

O primeiro soco passou rente ao rosto de Miguel; o segundo quase atingiu seu ombro. Seus reflexos eram absurdos, mas não apenas isso: cada esquiva era precisa, sem um movimento desperdiçado, garantindo máxima eficiência no gasto de energia enquanto se posicionava para o próximo ataque. Miguel parecia quase uma máquina de combate perfeita.

Hugo, por outro lado, era pura força bruta e resistência. Sua raiva, combinada com o peso e poder de seu braço robótico, o tornava um adversário temível. Ele podia não ser muito ágil, mas se encaixasse um golpe sequer, as consequências seriam devastadoras.

Miguel desviou novamente, o punho cromado de Hugo passando a milímetros de seu rosto, deixando um zumbido no ar. Ele contra-atacou imediatamente, usando o bastão para acertar um golpe horizontal na lateral do joelho de Hugo. O gigante soltou um grunhido de dor enquanto sua perna cedeu momentaneamente, forçando-o a se apoiar no braço metálico para não cair.

Aproveitando a abertura, Miguel girou sobre o próprio eixo, desferindo outro golpe direcionado ao flanco exposto de Hugo. O bastão atingiu com força suficiente para fazer o grandalhão cambalear, mas não cair. Hugo rugiu, girando o tronco e lançando o braço robótico como um aríete em um arco largo.

Miguel recuou dois passos rápidos, evitando o impacto por um triz. Ele sentiu o deslocamento de ar passar perto de seu peito, mas sua concentração permanecia implacável.

Foi então que a voz de Mia irrompeu em tom urgente, acompanhando o aviso dos instintos afiados de Miguel:

— Cuidado! Suas costas!

Infelizmente, Miguel ainda estava no processo de recuperar sua antiga capacidade física, ter passado um século dentro de uma câmara criogênica afetou drasticamente seu corpo, por isso, mesmo que seus reflexos sobre-humanos fossem rápidos o suficiente para o alertar dos perigos a volta, seu corpo não conseguia reagir na mesma proporção, devido a isso, ele não conseguiu evitar a rajada de tiros que cravaram em suas costas.

A dor lacerante queimava como fogo vivo. A jaqueta à prova de balas o salvou de um destino pior, mas não foi suficiente para conter todos os projéteis. Alguns perfuraram a proteção, fazendo-o cuspir uma quantidade generosa de sangue enquanto sentia os ferimentos se abrirem como navalhas em sua carne.

Hugo aproveitou a brecha. Com um avanço brutal, desferiu um golpe esmagador com o braço cromado diretamente no estômago de Miguel, levantando-o do chão como se fosse um boneco. A consciência do rapaz piscou, fugindo por um instante, enquanto a dor se espalhava como uma onda implacável pelo seu tronco. Antes que pudesse reagir, Hugo o agarrou pela garganta, girou-o no ar e o arremessou contra uma mesa próxima. O móvel não resistiu, estilhaçando-se em dezenas de pedaços sob o peso do impacto.

— Te peguei, arrombado do caralho! — rugiu Hugo, em pura fúria.

Sem dar espaço para qualquer reação, ele começou a chover golpes sobre Miguel. Os punhos do gigante caíam como marretas, um após o outro. Miguel ergueu os braços em uma guarda desesperada, mas cada soco era terrivelmente poderoso, principalmente o do braço esquerdo. Seus ossos pareciam ranger sob a pressão; as costelas imploravam por alívio. O ar se recusava a entrar nos pulmões, e o sangue escorria incessantemente de sua boca e nariz, pintando o chão de vermelho.

Hugo, com um sorriso selvagem estampado no rosto, ergueu Miguel mais uma vez. Com uma única mão, segurou o rapaz no ar como se exibisse seu troféu. Então, com toda a força monstruosa de seu braço metálico, desferiu um golpe direto no peito de Miguel. O impacto foi devastador. Miguel foi lançado como um projétil desgovernado, colidindo com uma pilastra. Seu corpo caiu ao chão em um amontoado desajeitado, como se todas as forças tivessem sido arrancadas dele.

Hugo caiu sobre um joelho, ofegante. Cada respiração parecia um desafio, e seu corpo clamava por descanso, castigado pelos impactos da barra de metal que Miguel usara para atacá-lo. Ele não sentia uma dor tão excruciante havia anos, muito menos enfrentava alguém tão insano. Miguel era um enigma. Sua resiliência era desumana, e sua força e velocidade ultrapassavam os limites do natural.

Um homem cambaleou até Hugo, segurando uma pequena metralhadora. Sua camiseta estava empapada de sangue, resultado dos tiros que recebera, mas ele se mantinha em pé, como um cão leal ao seu mestre.

— Caralho, patrão... quem era esse filho da—

As palavras do capanga foram cortadas para sempre. Seus olhos se arregalaram por um breve instante antes de seu corpo cair para trás. Uma barra de ferro atravessava sua cabeça, deixando Hugo paralisado por um momento, encarando a cena horrorizado.

Então, ele viu.

Miguel estava de pé.

Deveria ser impossível. Seus braços tremiam, e seu peito arfava como um fole, mas sua postura exalava uma firmeza que desafiava toda a lógica.

— Hah... quanto tempo faz... desde que tomei uma surra dessas... — murmurou Miguel, sua voz áspera como se o próprio ar estivesse se transformando em lâminas dentro de sua garganta.

— Impossível! Que porra é você?! Espere! Você! Você! — Hugo gritou, como se de repente tivesse entendido algo terrível.

Miguel, como sempre, permaneceu em silêncio.

— Miguel! Você está muito machucado! — A voz de Mia ecoou, carregada de preocupação.

Miguel riu de forma breve, cuspindo um dente e mais sangue.

— Hehe... foi mal, Mia. Mas relaxe. Minha mãe batia muito mais forte.

Hugo não entendia com quem ele falava, mas o sorriso frio de Miguel congelou seu coração. Uma sensação horrível o dominou.

— Você... filho da puta... você é um maldito que possui o Parasita Primordium! — As palavras saíram como um sussurro horrorizado.

Em resposta, Miguel cuspiu mais sangue no chão. Sua postura mudou. As tremedeiras cessaram, e sua respiração ficou incrivelmente estável. Por dentro, seu corpo parecia pegar fogo; veias pulsavam com intensidade, como rios ferventes sob a pele. Suas pupilas assumiram um tom rubro, e veias carmesins se destacaram ao redor de seus olhos.

Sua pele, agora pálida, contrastava com as veias dilatadas que assumiram uma coloração vermelha vívida, como se sua própria biologia fosse reescrita. Os cortes superficiais começaram a se fechar a uma velocidade assustadora, algo que nenhum humano seria capaz de replicar.

— Não use isso por muito tempo, Miguel! — Mia o alertou novamente, seu tom carregado de angústia.

— Não se preocupe. Essa luta já acabou.

Hugo sentiu um arrepio gélido percorrer sua espinha quando Miguel inclinou levemente o corpo para frente, pronto para atacar. Seus olhos se cruzaram por uma fração de segundo, um instante que pareceu se arrastar como uma eternidade.

O coração de Hugo disparou. Um instinto primal tomou conta de sua mente, sobrepujando qualquer traço de lógica. O medo não vinha apenas do olhar carmesim de Miguel, mas de algo além dele—algo invisível, mas presente.

O desespero crescia dentro de si, apertando-lhe o peito como garras invisíveis. Era diferente de qualquer sensação que já experimentara, mesmo nos momentos mais sombrios de sua vida. Cada fibra de seu corpo gritava para que ele corresse, implorando por fuga.

Então, ele viu. Não apenas Miguel, mas algo à sua sombra. Algo inominável e grotesco, uma presença disforme, feita de trevas pulsantes, estendendo inúmeras mãos espectrais em sua direção. Um abismo de puro terror, pronto para devorá-lo, pronto para levá-lo ao inferno. Sua imaginação parecia dar vida a algo que não deveria existir sob um medo impossível de ser superado.

O medo foi tão esmagador que quase quebrou seu espírito. Se não fosse um homem acostumado à violência e à morte, talvez tivesse desabado ali mesmo.

Num reflexo desesperado, correu em direção à espingarda que estava próxima. Miguel avançou.

Com dedos calejados pela experiência, Hugo recarregou a arma em tempo recorde e girou, mirando o garoto. Mas Miguel já estava quase sobre ele.

Hugo atirou.

O disparo foi certeiro — ou teria sido, se Miguel não tivesse arremessado uma mesa no caminho. A bala explodiu o móvel em pedaços, mas Miguel deslizou agilmente pelo chão, escapando do impacto. Em um movimento contínuo, ele se levantou e desferiu um golpe com o punho esquerdo.

O soco atingiu as costelas de Hugo com uma força avassaladora, empurrando seus cento e cinquenta quilos de músculo e metal para o lado. Um estalo alto confirmou a fratura. Hugo cuspiu sangue, que respingou no rosto de Miguel, mas a expressão do garoto permaneceu fria e implacável.

— Filho da...! Urgh! — Hugo grunhiu, tentando um chute desesperado.

Miguel esquivou com um salto ágil e respondeu com um chute alto, direto no rosto de Hugo. Outro dente voou, acompanhado de uma explosão de sangue. O gigante, cego de raiva, correu com os braços abertos, tentando agarrar Miguel em um movimento bruto, mas o garoto girou habilmente, desferindo um chute na garganta de Hugo, seguido de uma poderosa cotovelada na testa.

Hugo cambaleou para trás, atordoado, incapaz de manter o equilíbrio. Desde que Miguel havia se levantado, ele parecia outra pessoa. Sua velocidade, agilidade, reflexos e força haviam aumentado em mais de três vezes.

— Por... que... alguém como você... urgh... — Hugo murmurava, sua voz entrecortada por gemidos de dor. O sangue e suor escorriam pelo rosto enquanto sua visão se tornava cada vez mais embaçada. Sua mente tentava compreender como alguém tão poderoso estava ali, lutando ao lado de pessoas de classe tão baixa quanto Samira. — Por... favor... me deixe... viver...

Miguel caminhou lentamente em sua direção, os olhos frios como gelo.

— Você ousou tocar em alguém importante pra mim. Isso é um crime imperdoável.

— Filho da puta...

O soco de Miguel veio rápido e implacável, atingindo o nariz de Hugo com força suficiente para quebrá-lo. A cabeça do gigante foi jogada para trás, batendo contra a parede de vidro. Não houve tempo para respirar. Outro soco explodiu em seu peito, as costelas se despedaçaram como galhos sendo pisoteados, seguido por golpes no ombro, rosto e estômago.

Os socos vieram em uma sucessão brutal, cada impacto fazendo o corpo de Hugo tremer como se fosse um saco de pancadas. Ele tossia sangue, os espasmos incontroláveis tingindo Miguel de vermelho. Mas o garoto não parecia se importar, continuando sua punição com a mesma intensidade impiedosa.

Finalmente, Miguel deu um passo para trás, permitindo que o corpo exausto de Hugo desabasse. Ele o levantou com facilidade, colocando-o sobre os ombros como se não passasse de um peso morto.

Miguel girou Hugo em um arco violento e o lançou contra a parede de vidro.

O vidro se estilhaçou em mil pedaços com o impacto, e o gigante foi arremessado para fora, despencando pelo andar abaixo. A força do lançamento o fez rolar descontroladamente, caindo até o primeiro andar.

Miguel, sem hesitar, seguiu pelo mesmo caminho. Saltou pela abertura no vidro e aterrissou com os joelhos sobre o tronco de Hugo. O impacto final foi devastador. Hugo soltou um último gemido acompanhado de um vomito sangrento que jorrou como um chafariz, antes que sua consciência se apagasse para sempre.

Miguel se ergueu lentamente, respirando fundo. Sua silhueta projetava uma aura sombria e intimidadora sob a luz artificial da boate. Ao redor, o público observava em completo silêncio, o horror estampado em seus rostos.

No centro da pista, o corpo inerte de Hugo, o gigante que minutos antes parecia invencível, agora estava desmoronado e sem vida, seu sangue, tingindo a enorme rosa azul pintada no chão. As pessoas ao redor começaram a perceber o que havia acontecido: não era apenas um homem qualquer que estava morto ali, era o dono do lugar.

— Puta merda... — alguém murmurou entre o público, quebrando o silêncio sepulcral.

Do outro lado do salão, Julia ajudava Samira a se levantar. A jovem, ainda meio tonta, olhou na direção do estrondo. Quando seus olhos encontraram Miguel e o corpo de Hugo, ambas soltaram o mesmo palavrão em uníssono.

— Puta merda...

Miguel, de pé no meio daquele caos, suspirou profundamente. O brilho avermelhado de suas veias começou a desaparecer, sua aparência voltando ao normal enquanto uma onda de exaustão o dominava. Suas pernas tremiam levemente, mas ele permaneceu firme.

— Vamos embora, Mia. — Sua voz soava grave e baixa, quase um sussurro. Sua franja escondendo os olhos desfocados.

— Sim. — A resposta veio de forma prática e objetiva, embora um toque de preocupação fosse evidente no tom de Mia.

Sem olhar para os espectadores ou se importar com o alvoroço crescente, Miguel deu as costas para a cena e começou a caminhar. Seu corpo pesava uma tonelada e a dor que sentia parecia devorar sua carne e músculos.



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