Volume 1
Capitulo 10: Rosa Azul Banhada em Sangue parte 3
Quando Miguel foi arremessado por Hugo, o impacto foi brutal. O corpo do jovem colidiu com a multidão de maneira inesperada. Alguns gritos e vozes surpresas ecoaram pelo ar, com as pessoas tentando se afastar rapidamente para evitar serem atingidas.
Uma garota, que estava no meio da pista de dança, mal teve tempo de se desviar antes de Miguel cair sobre ela. Ela gritou, tropeçou, e quase caiu, mas rapidamente se levantou, olhando para o corpo de Miguel com os olhos arregalados.
— Miguel!
— Miguel!
Samira e Mia gritaram ao mesmo tempo.
— Estou bem.
Miguel se levantou, afastando-se dos desafortunados que haviam servido de amortecimento para sua queda. Seu braço esquerdo, o único que conseguiu usar para se proteger no último instante, estava dormente. As costelas e as costas latejavam com uma dor aguda, mas ele se forçou a permanecer em pé.
— Samira, saia dai. — A ordem foi dita com firmeza enquanto ele ajustava a postura, apesar da dor que o consumia.
Antes que pudesse ouvir uma resposta, um grito ecoou. O som inconfundível ecoando pelo seu fone era de Samira, e isso o fez travar no lugar por um segundo. Seus olhos subiram instintivamente para o segundo andar. Lá estava Hugo, segurando Samira pelo pescoço com seu braço cromado.
Samira se debatia, mas era um esforço inútil. O aperto de Hugo era implacável, e, pouco a pouco, ela perdeu as forças. Quando seus braços caíram inertes, Miguel sentiu algo se romper dentro de si.
— Droga. — Ele murmurou, o cenho franzido de preocupação. Em questão de segundos, a preocupação deu lugar a algo muito mais sombrio. Seus olhos se tornaram duas fendas cruéis. — Mia, não perca Samira de vista. Vamos atrás dela.
— Entendido. — A resposta veio breve, carregada da mesma urgência.
Miguel sacou sua pistola, correndo em direção ao segundo andar. O segurança que antes havia barrado seu caminho surgiu novamente, mas desta vez, Miguel não perdeu tempo com palavras. Sem hesitar, apontou a arma para a cabeça do homem e puxou o gatilho.
O som do disparo foi abafado pela música ensurdecedora. Apenas alguns poucos olhares se voltaram para a cena, mais por curiosidade do que por choque. Quando o enorme corpo rolou escada abaixo, os presentes reagiram com nada além de sustos momentâneos, antes de voltarem a dançar. Para muitos, aquele tipo de coisa parecia banal, quase corriqueiro.
A boate estava mergulhada em um caos festivo. A música eletrônica pulsava como um coração descontrolado, e as luzes multicoloridas piscavam em sincronia com a batida frenética. Feixes cortavam o ar denso, carregado de fumaça e suor, criando uma atmosfera hipnótica e alheia à violência que se desenrolava.
Outro segurança surgiu à frente de Miguel, mas ele sequer teve tempo de reagir. Um disparo certeiro atravessou o homem antes que este pudesse levantar sua arma. Miguel prosseguiu sem hesitação, os passos pesados contrastando com a leveza do ritmo da música.
Finalmente, Hugo percebeu a presença de Miguel. Ele se virou bruscamente, ainda com Samira jogada sobre o ombro. Seu olhar se estreitou, confuso e furioso.
— Achei que já tivesse acabado você. — Ele rosnou, incrédulo.
Miguel permaneceu em silêncio, os olhos fixos como lâminas.
— Matem o filho da puta! — Hugo vociferou, enquanto se afastava, levando Samira para o terceiro andar.
Os capangas de Hugo reagiram imediatamente, sacando suas armas e disparando contra Miguel. O confronto irrompeu ali mesmo, em meio à multidão, que, estranhamente, parecia alheia à violência. Chapados e imersos na música pulsante, os frequentadores da boate mal percebiam os tiros, os gritos e os corpos caindo ao redor deles.
Miguel sentiu uma presença se aproximando lentamente. A arma foi apontada para a figura, mas, no último segundo, ele hesitou. O dedo não pressionou o gatilho.
— Calma! Sou eu! — Julia gritou, o olhar horrorizado refletindo o choque. A implacabilidade de Miguel a surpreendia tanto que ela mal acreditava que era o mesmo garoto que ela havia conhecido minutos antes.
Miguel manteve a arma em posição, mas sua voz foi firme:
— É melhor ir embora.
Usando uma mesa como cobertura, ele conferiu o pente de sua arma. Ainda restavam algumas balas, apesar da intensa troca de tiros.
Balas zumbiam, estourando garrafas e copos ao redor. Julia se aproximou, colocando-se ombro a ombro com ele. Sem hesitar, ela puxou sua própria arma — um revólver rosa decorado com adesivos de pandas fofinhos.
— Eu vi o Hugo levando a Sam, mas... você vai realmente enfrentar todo mundo sozinho?
— Não estou sozinho. — A resposta de Miguel a confundiu, mas ele não tinha tempo para explicações sobre Mia. — E mesmo se eu estivesse, não mudaria nada. Ele tocou em alguém importante pra mim, e por isso ele vai morrer.
As palavras de Miguel soaram como uma sentença, implacáveis. Julia sentiu um aperto no peito, o sangue gelando em suas veias. Havia algo sombrio e fatal nas palavras dele.
— Sam também é minha amiga. Deixa eu te ajudar a pegar aquele filho da puta.
Miguel demorou um segundo para responder, os olhos fixos na linha de frente dos capangas de Hugo. Ele não estava muito disposto a aceitar a ajuda de Julia, mas a urgência da situação falou mais alto. Além disso, ele sentia a preocupação dela com Samira.
— ... certo.
Por conta de seus instintos afiados, Miguel sabia que Julia era capaz, mesmo sem conhecer a extensão de suas habilidades. Ele não pretendia dar ordens — tinha confiança que Julia possuía experiência o suficiente em situações assim.
— Vamos? — ele perguntou.
Julia sorriu, confiante. — Depois de você.
O segundo andar da boate era um espaço amplo e mal iluminado, com corrimões de madeira que davam vista para a pista de dança abaixo. O chão de vidro reforçado tremia levemente sob os passos dos frequentadores e a pulsação pesada da música eletrônica. Luzes estroboscópicas dançavam pelas paredes cobertas por grafites fluorescentes, criando um cenário de caos e movimento constante.
Colunas metálicas, decoradas com tubos de LED em tons neon, ofereciam cobertura parcial para aqueles que procuravam se esconder.
Miguel acenou com a cabeça e, sem hesitar, saiu de trás da mesa cheia de furos de balas. Em movimento rápido, avançou para trás de um dos pilares iluminados, disparando enquanto corria. Foi atingido duas vezes, mas a jaqueta que usava, além de estilosa, era resistente a balas, absorvendo os impactos sem grandes danos — ainda que a dor permanecesse.
Julia, aproveitando a distração dos inimigos, também avançou pelo lado oposto. Como ainda não era vista como uma ameaça, conseguiu matar dois capangas de Hugo antes que percebessem sua presença. Apenas quando ela alcançou a cobertura de outro pilar, começaram a disparar contra ela.
Só agora, as pessoas que dançavam ali, bom, aquelas que ainda estavam vivas ou lúcidas o suficiente, se deram conta do perigo e começaram a correr aleatoriamente para qualquer lugar que servisse de proteção.
O ar estava carregado com o cheiro de pólvora, suor e fumaça das máquinas artificiais, que acrescentavam uma atmosfera enevoada ao ambiente. As luzes multicoloridas piscavam de forma irregular, misturando-se com os flashes dos disparos, enquanto a música parecia quase estar incentivando a adrenalina com sua batida ensurdecedora.
— Miguel, na próxima troca, avance sem hesitar. — A voz de Mia surgiu clara e precisa. Monitorando o campo de batalha pelas câmeras, sua visão era um misto entre os dados analíticos do Cyberespaço e a perspectiva das lentes.
Miguel não questionou o plano. Após recarregar a arma, respirou fundo e chutou o chão, lançando-se para frente com confiança absoluta em Mia.
No momento em que os inimigos o avistaram e começaram a ajustar a mira, feixes de luzes intensas cortaram o ar. O brilho ofuscante cegou todos os oponentes, deixando-os temporariamente incapacitados.
Miguel não perdeu tempo. Com movimentos rápidos e precisos, disparou sucessivamente, eliminando os inimigos à sua frente, ao mesmo tempo desviava das pessoas que vez ou outra tinham o azar de entrar em seu caminho no meio do fogo cruzado. Algumas pessoas acabaram sendo baleadas e ainda que não fosse a intenção, serviram de escudos de carne para Miguel, mas ele não tinha tempo para se preocupar com elas.
Julia, logo atrás, avançou com igual determinação, abatendo adversários com tiros certeiros, sem hesitar.
Quando a última bala foi disparada, o silêncio foi breve, preenchido logo pelo pulsar contínuo da música eletrônica. A fumaça dos tiros ainda pairava no ar, mesclando-se com o ambiente carregado de luzes que piscavam em tons vibrantes. O segundo andar da boate era um caos: garrafas quebradas, móveis destroçados e corpos espalhados formavam o cenário de destruição.
— Cara, você não desperdiça bala, né? — Julia comentou, ainda incrédula com a precisão cirúrgica de Miguel.
Ele não respondeu. Seus olhos estavam fixos na escada que levava ao terceiro andar. Havia uma determinação fria nele, geralmente ao se concentrar em algo, Miguel se absorvia naquilo até concluir sua tarefa, quase como se fosse um foco compulsivo.
Do outro lado, Hugo lutava para controlar a raiva e a frustração. Ele largou Samira no chão sem o menor cuidado, o impacto arrancando um gemido fraco dela. Hugo gesticulou para seus capangas e, com passos firmes, pegou sua espingarda de cano triplo. Seu rosto carregava um misto de ódio e desconforto; aquela situação estava fugindo de seu controle.
Antes de chegar as escadas que conectava os andares, um disparo veio rápido demais. A bala passou raspando por sua cabeça, arrancando um pedaço de sua orelha. Hugo que recuou reflexivamente no instante em que sentiu o perigo, sentiu sua orelha latejar, a dor ardente subindo rápido. Ele olhou para o outro lado e viu Miguel o encarando com olhos sombrios.
— Filho da puta! — Hugo rosnou, enquanto se jogava atrás da coluna da escada.
De repente, as luzes do andar inteiro se apagaram. A música continuava, abafada pelos gritos esparsos daqueles quem dançavam no terceiro andar, que notaram que havia algo de muito errado. Hugo mal teve tempo de reagir quando os primeiros tiros cortaram o ar. Miguel avançava em meio à escuridão, seus passos firmes, aproveitando cada sombra para se camuflar.
Os capangas abriram fogo imediatamente, atirando às cegas, provocando inúmeros gritos de dor e desespero. As balas atingiam pilares, mesas e paredes, e é claro, pessoas que nada tinham a ver com aquela situação; estilhaçando tudo ao redor. Garrafas explodiam em chuva de cacos, enquanto os flashes das luzes do andar de baixo iluminavam brevemente a cena caótica.
Julia, posicionada do lado oposto, começou a disparar. Sua entrada forçou os capangas a dividir o foco, criando brechas para Miguel avançar ainda mais. Ela se movia com agilidade, aproveitando a cobertura que o ambiente destruído oferecia, enquanto derrubava os adversários com tiros precisos.
A escuridão já tomava conta do ambiente, mas agora a fumaça começou a se espalhar pelo terceiro andar, densa e sufocante, dificultando ainda mais a visibilidade dos oponentes de Miguel. A boate, projetada com máquinas que criavam efeitos para impressionar a clientela, agora se tornava uma ferramenta nas mãos de Mia. Miguel ficou sem balas, mas avançou mesmo assim.
Ele se moveu como uma sombra entre os vultos confusos. O primeiro inimigo que tentou atacar não teve tempo de reagir. Miguel o desarmou com um movimento rápido, segurando seu pulso e girando seu corpo em um movimento de alavanca que o jogou contra a parede com força. O homem tentou se levantar, mas Miguel não deu nem uma chance a ele, sua cabeça foi brutalmente pisada pelo garoto, levando-o a perder a consciência.
Outro adversário veio por trás, mas Miguel já estava um passo à frente. Ele se abaixou, esquivando-se de um golpe com faca, e contra-atacou com um chute giratório que acertou a lateral da cabeça do homem, fazendo-o cair de joelhos antes de desabar no chão.
— À sua esquerda! — avisou Mia.
Sem hesitar, ele girou e interceptou o braço de um terceiro capanga que tentava atingi-lo com um bastão que pulsava com descargas elétricas de cor azul. Ele torceu o braço do oponente em um ângulo antinatural, arrancando um grito de dor e mais um após dar um chute na lateral da perna esquerda, quebrando seu joelho.
A fumaça, combinada com a escuridão, era quase insuportável para os outros, mas Miguel parecia navegar por ela com uma precisão assustadora. Quando outro capanga tentou disparar cegamente, Miguel se lançou em um avanço veloz. Ele saltou sobre uma mesa e, antes que o homem pudesse reagir, o desarmou com um chute alto no pulso. Miguel agarrou a cabeça do inimigo e, com um movimento seco, o jogou contra o chão. Roubando a arma deste último, Miguel atirou sem hesitar, o cano encostado a nuca de seu inimigo.
Outros dois caíram mortos depois que Miguel pegou essa nova pistola. Teria matado outros três, mas a arma acabou travando e isso o fez receber alguns tiros. Ele rolou pelo chão, usou uma mesa tombada de cobertura. Sangue tingia sua camiseta, mas não tinha nenhum dano profundo, sua jaqueta era mesmo conveniente.
O ambiente era caótico. Vidros quebrados, móveis tombados, e o som de tiros perdidos ecoando pelo espaço. Mesmo assim, Miguel manteve um foco inabalável. Quando um dos oponentes tentou surpreendê-lo com uma faca, ele a desviou com um movimento ágil, agarrando o braço do inimigo e puxando-o em direção a si. Um golpe rápido de cotovelo no rosto foi seguido de um combo com mais de dez golpes sucessivos em apenas um segundo, todos socos curtos e explosivos, uma autêntica técnica de Wing Chun.
Hugo, ainda escondido atrás de uma pilastra, assistia com olhos arregalados enquanto seus homens caíam um a um. O medo crescia, mas ele não estava disposto a fugir. Pegou sua espingarda e começou a carregar os canos com munição incendiária.
— Ele está recarregando, munição incendiária — alertou Mia.
Miguel, sem perder tempo, pegou uma barra metálica caída no chão. Ele girou o objeto nas mãos, testando seu peso, antes de avançar em direção a Hugo.
Hugo disparou na direção de Miguel assim que o viu sair da fumaça. O tiro incendiário explodiu, iluminando o andar por um instante, mas Miguel já havia saltado para o lado, se esquivando do ataque.
Miguel rolou para o lado, tentando sair da mira de Hugo, que o seguiu com os olhos. Antecipando o movimento do jovem, Hugo alinhou sua espingarda e disparou.
Mais uma vez, o brilho amarelado cortou a penumbra, iluminando a fumaça e o caos ao redor. O impacto foi brutal. Miguel foi arremessado pelo chão, suas costas colidindo com uma mesa de vidro que estilhaçou sob o impacto. No entanto, ele não havia sido atingido diretamente.
Entre o tiro e o impacto, Miguel usara o corpo inerte de um dos capangas como escudo improvisado. Ao se levantar, tossindo com o esforço, ele jogou para o lado o que restava do cadáver — a metade superior do homem, grotescamente dilacerada pelo disparo de Hugo. Sangue e vísceras o cobriam, criando uma imagem aterradora.
Miguel limpou o rosto com a manga da jaqueta ensanguentada, o sangue misturando-se à sujeira acumulada na roupa. Ele ergueu o olhar para Hugo, e, apesar da dor pulsando em suas costelas, seus olhos transmitiam algo quase selvagem — uma determinação que Hugo não podia compreender.
Hugo deu um passo atrás, surpreso com a resiliência de Miguel. Mas aquela fração de segundo de hesitação custou caro.
Bang!
— Argh! — O grito ecoou pelo ambiente quando sangue jorrou do ombro direito de Hugo. Ele cambaleou, os olhos arregalados e cheios de raiva voltando-se para Julia, que surgira em meio à fumaça, a arma ainda apontada a ele.
— Julia, sua putinha! Você me devia, caralho! — ele cuspiu as palavras entre gemidos de dor.
Julia apenas deu um sorriso malicioso, avançando em direção a ele com uma tranquilidade quase debochada. A pistola dela disparava de forma cadenciada, sem hesitar.
Hugo, agora acuado, usava o braço metálico para proteger a cabeça enquanto recuava desesperadamente. Cada disparo fazia os estilhaços da pilastra próxima voarem em todas as direções, criando faíscas que cortavam a penumbra do terceiro andar.
Finalmente, ele se lançou para trás de uma pilastra mais espessa e, respirando pesadamente, soltou um rugido que reverberou no ambiente abafado pela fumaça:
— Piranha do caralho! Eu vou acabar com esse filho da puta, e depois vou te foder até você parar numa cadeira de rodas!
A tensão no ar era quase palpável, enquanto os tiros de Julia cessavam momentaneamente. No fundo, a música eletrônica continuava, pulsante, um contraste perturbador com a violência explícita daquele andar.
Julia chegou ao lado de Miguel, ofegante, enquanto recarregava sua arma com movimentos rápidos e precisos. Mesmo no meio do caos, ela esboçou um sorriso desafiador.
— Tu tá ensopado de sangue, não é seu, né? Que bom. Agora, vamos foder esse merda.
Miguel soltou uma risada breve, quase um suspiro, enquanto balançava a cabeça.
— Samira está ali. Pegue ela e saia daqui. Deixe o resto comigo.
Julia estreitou os olhos, hesitando por um instante. Mas então deu de ombros, como se dissesse “sua escolha”, e respondeu:
— Tudo bem. Tome cuidado, idiota.
Eles se separaram, Julia correndo em direção à figura desmaiada de Samira, enquanto Miguel avançava mais fundo no ambiente enevoado e caótico.
— Vamos pôr um fim nisso, Mia.
— Bora.
Miguel respirou fundo, ajustando a postura. Ninguém ali podia perceber, mas um brilho carmesim brotava em suas pupilas negras.