Possuídos Brasileira

Autor(a): Guilherme Alves


Volume 1

Capítulo 6: Os Anjos do Diabo

“Eis que nós seus servos não confia e nos seus anjos encontra loucura;”

Jó 4:18

 

 

— Vamos realmente resolver isto desta forma? Ainda há tempo para pedir desculpa, depois vamos beber alguma coisa e esquecer os nossos problemas. 

— Eu já disse, isso não vai compensar o que fizeste. Aqueles chocolates eram um presente da minha mãe. — O caçador fazia os últimos alongamentos, antes de partir para a luta. 

Andrey, sentado num banco enquanto lia o jornal, observava tudo pelo canto do olho. Desconcertado com toda aquela gritaria, não viu outra solução a não ser intervir: 

— Como responsável, enquanto o Michael está fora, não posso permitir que lutem, pelo menos sem regras. Sendo assim, serei o árbitro. — Dobrou o jornal e colocou-o sobre o colo. — Não prometo ser imparcial, até porque já tive o mesmo problema que o John. 

— Isso não é justo, são dois contra um. 

— Queres mesmo falar de justiça agora. — A mão de John cobriu todo o rosto do Anjo. A sua respiração estava envolta em sede de vingança.

O Senhor dos Mangás afastou-se sem grande problema, contudo percebia agora que o seu companheiro estava a usar grande parte da sua força. Aceitando essa conclusão, abriu as suas asas majestosas, feitas de diversas páginas de quadrinhos japoneses. 

— Sempre ouvi dizer que, quando um anjo mostra as asas, não é bom sinal. — Andrey deu um leve sorriso e continuou a sua fala, mas desta vez dirigia-se a si mesmo. — Talvez, este combate seja mais interessante do que o que eu tinha pensado. 

John arregalou os olhos, o seu oponente tinha soltado todo o seu poder. Isso fazia a sua adrenalina pulsar por cada centímetro do seu sangue. 

— Vem com tudo, filho da puta. Como se eu fosse perder para um anjo tarado, — Esticou o dedo, apontando-o bem para a cara do inimigo. — como tu. 

— Isso é o que vamos ver… Smash Power Ultra… — Com a mão direita, usou dois dos dedos para concentrar o ar e, segundos depois, projetá-lo em direção ao caçador.

O vento avançou a toda a velocidade, o chão soltou-se sem grande resistência e voou pelo ar. Porém, o ataque passou ao lado do alvo. 

— Realmente, foi uma boa tentativa. — O caçador começou a bater palmas. — Se eu fosse um humano normal, claro… eu não iria aceitar esta luta sem chance de vencer…

O som do riso do Anjo cobriu toda a sala. Atrás dele, as asas começaram a movimentar-se, criando uma nuvem de pó pela sala. John, tentando evitar uma possível emboscada partiu para cima do adversário. 

Parando ambos os pés, sentiu que estava perdido no meio da camada acinzentada, não via nada a menos de dois metros e os sinais do Anjo pareciam escassos. 

— Porra, para onde ele foi? 

— Ele vai errar o ataque, mas se quiseres mesmo assim saber, basta olhares para cima — retrucou Andrey, apontando o dedo para o lugar onde a criatura se escondia. 

John seguiu a dica, todavia continuava difícil de enxergar. Mesmo assim, aos poucos viu algo aproximar-se, dentro do seu campo de visão surgiram dois pedaços de páginas de Mangá. Ele, de imediato, soltou um sorriso, pensando serem as asas do oponente, sem nem hesitar retirou a arma da cintura e virou-a para cima.

Contudo, logo após, no céu surgiram mais páginas, todas estavam soltas e embateram na terra como se fossem lâminas assassinas.

 O agente recuou e esperou envolto na neblina. A criatura angelical, era matreira, sem dúvida iria aproveitar essa chance para drenar o máximo de sorte do companheiro.

Ao lado do banco de Andrey, um estrondo. O movimento das portas fez a poeira em volta do atirador dissipar-se em segundos. Ele olhou confuso, mas acabou a contemplar uma bela mulher, morena de cabelos longos, estes tão negros quanto a noite. Sabia que a tinha visto antes. Todavia, ainda era atrapalhado pelos restantes focos de poeira. 

— Eu não acredito, o Michael sai por um dia, e vocês já conseguiram destruir a sala de treinos!!!! — A mulher perplexa levou a mão à cara desaprovando a atitude. — E tu Andrey, não era suposto impedires estas coisas? Como Sub-capitão era o mínimo… 

— Eu sei, mas eu estava realmente curioso para saber o quanto estes dois tinham evoluído, parece que é um progresso aceitável. — Agarrou rapidamente num controle que tinha junto a si. — Isto vai ficar como novo rapidamente.

Bastou ele clicar num dos vários botões, que pavimentavam o comando, para toda a poeira e neblina ser consumida e os pedaços do chão substituídos.

A mulher, continuou a encarar Andrey com desaprovação, soltando agora um monólogo rodeado por uma voz sussurrante: 

— Já não basta as despesas que dão nos dias de trabalho, agora têm de gastar os últimos centavos nos dias de descanso. — Deixou em seguida escapar um leve sorriso e mais algumas palavras. — Mesmo assim, eu acho que não conseguiria viver sem eles…

— Disseste alguma coisa?

— Nã…. Não, nadinha de nada.

Acima do solo, ainda pairava o Anjo dos Mangás, que ao avistar uma bela dama, prontamente, desceu ao solo para a encarar. Chegando ao chão, recolheu ambas as asas e avançou sobre a mulher com uma vénia.

— Vossa Senhoria Jamilla, a que se deve a honra desta visita. — Desviou rapidamente o olhar e fez a sua pele tomar a cor vermelha. — Sempre ouvi dizer que era amado por muitas mulheres, mas nunca pensei que fossem assim tão belas. 

Ela ouviu aquilo e limitou-se ao silêncio, porém as suas bochechas rosadas deixaram as emoções escapulir. O Anjo, parecia ter gostado da reação, ao levantar o corpo e ver a timidez contida nela, tentou avançar, contudo algumas balas passaram a raspar o seu corpo. 

— Oh… chupa saco, melhor ficares bem afastado de…

Com uma cara de desprezo, a criatura olhou no fundo dos olhos de John e fomentou um discurso irónico: — Por quê? Não me digas que ela tem o Demónio do Toque… Ai que medo, talvez eu morra se tocar nela. 

— Caralho, não me digas que não sabes que ela é a porra da amante do Capitão — Bruscamente dirigiu o seu discurso ao céu com os braços levantados. — Eu só posso estar rodeado de idiotas, ele trabalha aqui há três anos e ainda não tinha percebido, por favor leva-me daqui Deus.

 Os olhos da figura arregalaram-se. A mente nem conseguia processar aquilo, poucas eram as palavras que queriam sair.

— Não pode… Eu jurava que eles eram amigos de infância, sei lá. 

— John… Anjo, vão comer algo por minha conta, eu já vou ter com vocês. 

O caçador ainda com a arma na mão foi ter com a criatura angelical e empurrou-a com o pé, ordenando-a em seguida: — Ouviste o homem, sempre em frente. 

Incomodado com a atitude do humano, o Anjo virou-se e mostrou o dedo do meio junto da língua, disparando para dentro dos corredores do edifício em seguida. John, logo depois, deu por si a pensar o que tinha feito para merecer um castigo tão grande como cuidar de um anjo, que mais parecia um erro no sistema.

— Bem, já que eles foram, vamos ao que importa. Não vieste aqui só para dares o discurso habitual, certo? — Deu umas leves palmadas sobre a parte do banco ainda livre. 

Agradeceu com simples palavras o gesto e tomou depressa o lugar. Não era o mais confortável, mas era sempre melhor do que ficar em pé. 

— Tens razão, depois do que ele disse naquele dia… e agora ouvi dizer que a próxima integrante é uma mulher… Eu precisava de desabafar com alguém. 

Andrey encarou-a confuso, como assim uma mulher? E como ela sabia daquilo? A sua boca encheu-se de perguntas. Porém nenhuma era apropriada no momento, trancou-as a sete chaves no estômago e tentou continuar a conversa. 

— Talvez ele só esteja a ter uma das suas fases. Não que eu seja bom a entender isso, sentimentos não são, e acho que nunca vão ser para mim…

— Eu sei John, mas será que eu fiz algo errado, eu queria tentar entendê-lo, mas ele nunca se abre para mim. — De olhos entristecidos, encarou o chão e sentiu o gosto salgado das lágrimas banhar-lhe o rosto.

— Uma vez, no meio de uma guerra na África, eu falei com uma mulher, ela contou-me que às vezes as pessoas demoram tempo até se abrirem totalmente a quem amam, por vezes têm pavor de serem julgadas, ou só morrem de medo… — O atirador hesitou por um momento, esfregando os cabelos com a mão. — Havia mais alguma coisa, mas em geral acho que era assim.

Ambos se encararam, o agente parecia quase inexpressivo, ao mesmo tempo que a mulher explodia de pensamentos sobre o amado. 

— Não foi de grande ajuda isto, eu acho, mas pensa positivo, com uma mulher na equipa já podes falar sobre isso com uma pessoa que entenda.

— Acho que sim…

— Espera por mim Anjo, porra, eu não consigo correr assim tão… rápido… — Cansado, o caçador, respirava ofegante com as duas mãos sobre os joelhos. 

A alguns metros, estava quem ele perseguia a correr incessantemente, ao mesmo tempo que soltava caretas para trás. 

— Porque a merda… da cozinha tem… de ser tão longe… 

— Não me digas que, um caçador tão renomado, não me consegue apanhar… 

De repente, ele parou as pernas, diante de si, estava uma parede espessa de negridão. Encostou uma das mãos e uma corrente fria arrepiou-lhe o corpo todo. Saltou para trás de imediato e deu um grito:

— Mas o quê? Isto não estava aqui antes? Estava?

Uma mão humana, em seguida, saiu do escuro e acertou a cara do Anjo. Logo depois, talvez, por ação do vento gerado pelo soco, a parede ruiu e revelou Michael com uma mulher desconhecida para ambos. 

— Eu não posso sair por algumas horas, que vocês saem do controle. Ainda bem que a Jamilla estava por aqui, haja alguém responsável. 

Do fundo, a voz de John levantou-se e trespassou os ouvidos do chefe:

— Ela parecia mais descontente com outra coisa.

Ele fingiu nem ouvir, mudando a atenção para a senhora que estava a seu lado. Com uma das mãos, fez um pequeno gesto e mandou-a avançar. 

— Mesmo que essa porra tenha doído, não posso negar que as tuas saídas só trazem coisas boas. — Com os olhos arregalados, o Anjo rastejou até à mulher.

Avançando, um pouco, para junto da criatura, Michael agachou-se e sussurrou ao ouvido dele:

— Se te aproximas mais, aquele não vai ser o último soco. 

Amedrontado, ele olhou de baixo para a cara do caçador. Sem forças, deixou o corpo cair sobre o chão desistindo da sua caça.

— Que bom que entendeste a mensagem. — Esticou as pernas erguendo o corpo. — Bem onde eu ia… esta é a nossa nova integrante, o nome dela é Maria. É um pouco tímida, então tenham cuidado. 



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