Possessão Brasileira

Autor(a): Matheus P. Duarte


Volume 1

Capítulo 12: A Ganância de um Tolo

As luzes já iluminavam a rua em frente a mansão de Ishida. O próprio olhava escorado na parede eles se ascenderem pela janela, praticamente no escuro, exceto pela luz do abajur ao lado.

Ele mantinha uma mão coçando seu queixo e a outra cruzada sobre seu abdômen, mas não demorou até serem ouvidas batidas na porta.

Entre.

Perdão, jovem mestre. Uma convidada sua chegou — falou o mordomo envelhecido.

Diga que já estou indo.

Não demorou em ir de encontro aos corredores luxuosos de estilo ocidental e deixar o som de seus sapatos ecoarem pelo piso de madeira.

Descendo um lance de escadas, chegou até o hall de entrada, onde era aguardado por ninguém menos que Hisen, que olhava para as decorações da casa, especialmente o grande quadro de seu dono.

Eu e o seu pai nos conhecemos a bastante tempo. Adorávamos falar sobre quando teríamos o poder de fazer todos a nossa volta se ajoelharem para nós… Acredito que hoje é sua hora de querer isso.

Ela se virou e olhou para ele que a encarava com o punho direito cerrado e os ombros rígidos.

Diga-me, Ishida Hayashi, o que você deseja?

Eu quero que me traga a Kaori.

Hahaha… Então vai mesmo querer ela a força? Mesmo eu tendo oferecido outras opções?

Não… Quero ela e também Keishi Chikuma. Quero os dois se afogando em amargura por terem me humilhado!

Ganancioso, impiedoso… Igualzinho o seu pai. Isso me lembra de quando o conheci, desesperado para afogar suas magas em bebida e descontando sua frustração batendo em minhas funcionárias, mas aí eu vi uma oportunidade…

Hisen se aproximou mais de Ishida, colocou suas mãos em seu rosto e o olhou nos olhos.

Sua fome por poder…

Ela o soltou e deu um passo para trás.

Quer mesmo ver sua amiga de infância e sua paixão não correspondida ser reduzida a um mero objeto, rastejando a seus pés? Está disposto a corromper sua alma por isso?

Ele começou a olhar as coisas ao seu redor. Uma entrada maior que a casa de muitas pessoas, móveis em detalhes de ouro e prata, um candelabro que brilhava tanto quanto suas luzes.

Um dia vou herdar tudo isso — falou de braço abertos e continuou — Uma fortuna que vou ser capaz de nadar nela, uma das maiores empresas farmacêuticas do Japão, um mundo ondes todos me respeitam. Terei tudo, menos a mulher que quero. Ela ousou me rejeitar e todo meu império pra ficar com aquele traste de pessoa, agora vai ter o que merece!

Ele baixou os braços e Hisen começou a rir, não em deboche, mas de forma nefasta.

Sim, conheço esse espírito muito bem! Eles que foram os culpados, então não tem problema se vingar! Considere feito!

Ela estendeu sua mão para apertar a dele e deste modo, seu pacto foi selado.

// — // —

Em Nagasaki, Kasumi voltava para o bunker após um longo dia compilando informações de seus contatos. Ela se escorou na parede da sala anterior a entrada e suspirou de olhos fechados.

Uma vibração vinda de seu bolso a impediu de seguir seus segundos de sossego, então levou sua mão até o bolso e abriu os olhos no momento em que seu celular tocou seu ouvido.

Alô.

É sobre aquela mulher que você queria que vigiasse. Um cara trombou com ela e o irmão daquela Chikuma hoje.

Alguém suspeito?

Suspeito chega a ser pouco. Ele é o filho de um ricaço, dono daquela farmacêutica, Hayashi.

Kasumi franziu o cenho e ficou olhando para o chão em silêncio.

Isso te ajuda em alguma coisa?

Ajuda… Obrigada.

Ela desligou o telefone, continuando seu caminho pelas escadas do bunker e pelos seus corredores até encontrar o refeitório, por coincidência na hora do jantar.

E aí queima a ferida com pólvora pra parar de sangrar.

Que horror!

Você sabe que isso não faz o menor sentido, né?

Yuudachi, Mutsuki e Satsuki estavam sentadas na mesa, esperando a comida ficar pronta, discutindo sobre um filme amado pela mais infantil delas.

Quando Kasumi abriu a porta, ela o fez com seu rotineiro sorriso, diferentemente de sua expressão mais séria de poucos minutos atrás.

Kasumi! — exclamou Yuudachi apontando seu dedo para ela de maneira espalhafatosa e continuou — Você concorda que o melhor filme do Rambo é o dois?!

Pega de surpresa pela pergunta repentina, ela vestiu um olhar de paisagem por um breve tempo.

Eu gosto mais de história de suspense.

Traidora! Ah…! O que seria de mim sem a Mutsukinha?! — falou se abraçando nela.

Kasumi aproveitou o fato delas seguirem conversando para ir rumo a cozinha, onde estava Asashio sobre as panelas.

Preciso falar com você. É importante.

Eu vou assim que terminar nosso jantar.

Kasumi falou em um tom mais sério.

Peça pra alguém terminar por você.

Se é tão importante, então mais um motivo pra mim mesma fazer, porque elas vão precisar de energia pro que virá.

Ela não transparecia preocupação ou qualquer tipo de apreensão, mas apenas afeto inabalado.

Kasumi saiu de lá, deixando ela com seus afazeres.

Dez minutos depois, Asashio terminou e serviu o jantar para as outras, mas não se sentou a mesa.

Comão sem mim.

Aconteceu alguma coisa? — perguntou Satsuki.

Banheiro… — respondeu em um tom baixo, como uma confissão.

Mas então, Satsuki, de Grey´s Anatomy você gosta?

Aquilo lá é uma novela mexicana — afirmou contorcendo o rosto com total repulsa.

Assim, elas seguiram com sua discussão saudável sobre seus programas favoritos, rindo e falando de seus gostos, como garotas normais.

Asashio, por mais contente que seu rosto dissesse que estivesse, saiu de lá visivelmente menos alegre, mas ainda feliz.

Quando abriu a sala, Kasumi estava esperando sentada, com a cabeça apoiada em um das mãos e uma ficha sobre a mesa.

Se lembra daquele Haysahi que estávamos investigando? O filho dele foi visto tendo uma discussão com um dos alvos em potencial, ainda por cima acompanhada do irmão da Mutsuki.

Um breve silêncio foi feito antes dela dar uma resposta.

Coitada…

Ela estalou a língua e olhou para o chão.

Não basta terem feito o que fizeram e agora querem envolver a família dela nisso… Descobriu mais alguma coisa sobre o grupo dele?

Descobrimos alguns capangas da Hisen que tem transportado cargas de uma das fábricas dele. Há também alguns boatos de esquemas de corrupção com o governo.

De repente, ambas foram surpreendidas por alguém vindo do corredor, que entrou na sala de braços cruzados.

Infelizmente ela é o alvo mais provável… — falou Matheus ao surgir das sombras e prosseguiu — Suzuya, quero que você vá para vigiar ela pessoalmente, se não for pedir demais.

Ela estufou o peito e suspirou antes de responder.

Eu vou…

Ele sorriu, então correu sua mão sobre a mesa com um objeto.

Pode levar esse cartão de crédito, digo, pra aproveitar quando não estiver fazendo nada, com os cumprimentos de nosso patrocinador.

Sua postura séria se tornou mais relaxada, então estendeu sua mão, pegou o cartão e saiu, sem fazer perguntas.

// — // —

Kaori estava sentada em sua sala de aula que se encontrava em um silêncio quase perfeito, atrapalhado somente quando alguém se mexia na cadeira ou deixava a caneta cair.

Todas as suas questões já estavam respondidas a bastante tempo, mas se matinha sentada por alguma razão.

Suas unhas arranhavam a madeira vagarosamente. Seu olhar melancólico ora estava sobre sua prova a frente, ora para seus arredores.

Depois de um longo momento, passou seu dedo indicador envolta dos lábios e abriu um grande e sincero sorriso. Foi quando a monotonia do local foi quebrada por uma declaração do professor presente.

Acabou o tempo. Entreguem as provas.

Alguns reagiram bufando, outros xingaram baixo e ainda ouve aqueles que se apressaram em tentar escrever algumas últimas palavras, de todo modo, Kaori foi uma das primeiras a se levantar e entregá-la, já com sua bolsa em mãos, pronta para sair.

No corredor, se apressou por entre a multidão de alunos, porém, não em direção a saída e sim para mais para o interior. Não tardou até abanar um certo rosto familiar.

Kaori? Achava que já tivesse ido embora.

Eu quis te esperar. Pra onde tá indo?

Pra biblioteca. O professor pediu que eu fizesse um trabalho por ter ido mal em um das provas.

Você foi mal?!

Eu também acho difícil acreditar… Talvez seja o estresse.

Nesse caso eu vou te fazer companhia — disse se agarrando no braço dele como de costume, entretanto, com mais afeto desta vez.

Ele olhou um pouco para os arredores e coçou a nuca, meio sem jeito.

Obrigado…

De nada — respondeu dando o primeiro passo.

A biblioteca era particularmente pouco movimentada nesse horário, com os remanescentes se apressando em fazerem suas tarefas para irem para suas casas, ainda que os funcionários se mantivessem para o turno da noite, que estava prestes a chegar.

Segure esse pra mim, esse outro e aquele ali também…

Kaori aos poucos segurava os livros um a um para Keishi, com a boca entre aberta e um olhar confuso conforme iam se acumulando.

Não acha que é… Um pouco demais?

Se rodar nesse trabalho, estarei encrencado — falou escolhendo os últimos materiais que precisava — Se estiver pesado pode soltar naquela mesa.

Ela imediatamente seguiu a orientação de bom grado, ao mesmo tempo que aproveitou para se sentar e suspirar. Keishi logo a acompanhou com mais um punhado de livros e mãos.

Por muito tempo ele manteve seu foco nos estudos e deixo de dar a devida atenção a ela, que se manteve quieta observando, mexendo no celular vez ou outra.

Antes que se dessem conta, mais de uma hora havia passado.

Ele esticou os braços, suspirou e largou os óculos sobre a mesa para esfregar os olhos. Quando terminou, notou algo.

Não tem ninguém aqui?

Sua companhia, que estava imersa no celular, levantou a cabeça, intrigada com a pergunta estranha e repentina. Ela olhou para os lados para averiguar sua afirmação.

Que estranho… Deveria ter gente aqui do turno da noite. Cadê os funcionários?

Keishi caminhou até o balcão, olhando entre as estantes procurando por alguém. Nenhum vulto pôde ser visto, nem mesmo do bibliotecário, então tentou sair para o corredor.

Assustado, ele se virou para Kaori.

Está trancada.

Quase no mesmo instante, as luzes se apagaram.

Ela foi de encontro a ele se guiando com a luz do celular. No meio do caminho, algumas passos pesados foram ouvidos do corredor.

Ele estalou a língua e correu para alcançá-la, colocando o dedo indicador virado por cima dos lábios, segurando seu braço e correndo com ela para trás das estantes.

Os dois ficaram encolhidos de modo que ainda podiam ver a porta, que se abriu com quatro homens usando lanternas.

Um par ficou vigiando a saída e o outro seguiu para dentro de lá.

Tem alguém aí? Tem um incêndio no prédio e precisamos evacuar.

Kaori olhou para Keishi, que respondeu sussurrando.

Não tocaram o alarme e eles não estão de uniforme.

As luzes iluminavam entre as mesas, livros e estantes atrás deles. Com a única saída fechada, era só uma questão de tempo até serem descobertos.

Ambos correram abaixados de uma estante para outra, tentando controlar sua respiração, com os passos de seus perseguidores fazendo pequenos ecos espaçados.

Kaori caminhou para olhar o que estava acontecendo em uma das esquinas. Um homem, com a luz apagada, a encontrou no meio da penumbra e tentou segurá-la. Ela reagiu dando para trás a tempo de não ser pega, embora na mesma os tivesse alertado.

Achei eles!

Outros dois capangas correram para onde eles estavam e os encurralaram entre um canto e outro da estante.

Keishi imediatamente correu para o lado com apenas um deles, segurando a mão dela. Ele tentou investir contra o abdômen do homem com força bruta, mas foi segurado, golpeado com o cotovelo na cabeça e arremessado contra parede.

Quando tentou se levantar, aquele que o atacou puxou uma arma debaixo do casaco. Sob a mira dela, não teve alternativa se não ver enquanto sua amiga era posta contra uma das estantes para ser amordaçada e amarrada em prantos.

Seus gemidos, provenientes de sua luta fútil para se soltar, só serviram para amargurá-lo, expondo de maneira cruel sua impotência.

O mesmo se seguiu com ele, levando-o para um destino cuja única certeza era a angustia de seu desenrolar.

// — // —

Na cafeteria da universidade, Kasumi desfrutava de um café com bolo de amendoim.

Eu adoro esse gosto meio amargo — falou para o rapaz que lhe atendeu.

Isso me lembra de massagem nas costas. É um pouco desconfortável no começo, mas ao mesmo tempo bom.

É um gosto refinado…

Na segunda garfada que daria, uma pequena multidão saindo do prédio de sua protegida, escoltada por alguns funcionários, lhe chamou atenção.

O que está acontecendo?

Estranho… Já treinamos evacuar o prédio algumas vezes, mas não soube de nada marcado pra hoje…

Ela parou tudo que estava fazendo, pegou sua bolsa e deixou para trás sua refeição.

Não deve ser nada sério! — gritou o atendente em vão.

Alguns dos seguranças ficaram vigiando a entrada depois de retirarem alguns dos funcionários, se tornando eles alvos das indagações de Kasumi.

Aconteceu alguma coisa?

Incêndio. Peço que se afaste.

Sem fumaça?

Sim. Felizmente não parece grave.

Ela ficou olhando para o prédio com afinco. Nada fora do ordinário podia ser visto.

Viu uma garota sair? Se chama Kaori, um pouco mais baixa que eu, cabelo escuro, preso.

Não. Provavelmente já devia ter deixado o prédio. Nos certificamos que não havia mais ninguém.

Ela deu as costas sem dizer, mais nada, andando com presa para o outro lado do prédio.

Eu a vi entrar… — sussurrou franzindo o cenho.

Existia uma entrada na parte traseira do prédio feita para ser usada por equipes de emergência, exatamente para onde estava indo. Como não era uma área movimentada, nem ao menos podia ser usada, era o local perfeito para sair sem ser percebido.

Ao espiar pela esquina, nada podia ser visto, entretanto, isso logo mudou quando duas pessoas vestidas como civis abrindo aos poucos a porta de emergência, investigando sorrateiramente o local, acompanhadas logo em seguida de mais duas, que traziam encapuzados com eles.

Kasumi reagiu largando sua bolsa no chão e retirando sua submetralhadora silenciada de dentro dela.

Ela disparou contra os dois mais a frente, fazendo-os tremer por causa dos diversos acertos, ao ponto de espalhar sangue pelo chão e a parede de onde estavam perto.

Sem ter para onde fugir ou se esconder, só restava fazer aquilo que criminosos faziam de melhor, se defender atrás de inocentes.

Sobre seus escudos humanos, eles dispararam em direção dos tiros, que acertaram a esquina que foi usada como cobertura.

O som, obviamente, atraiu os outros seguranças do local e agora era uma questão de tempo até ela estar entre fogo cruzado. Para piorar a situação, uma van parou perto dos sequestradores.

Com suas opções limitadas, ela pegou seu revolver e carregou uma munição espacial, um transmissor e o atirou na lateral do veiculo.

Os criminosos, jogaram Keishi e Kaori para dentro do automóvel, disparando seus últimos tiros antes de fazerem o mesmo.

Eles aceleram o máximo que puderam e fugiram.

Kasumi, sem alternativa, guardou sua arma de volta na bolsa e começou a correr dos guardas que ordenavam que parasse.

Asashio, siga o transmissor! Eles levaram o alvo e o irmão de Mutsuki!

Então, suas pernas correram o máximo que seu corpo era capaz de oferecer, mesmo mordendo os lábios até sangrarem.

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