Volume 1 – O Segundo Setor
Capítulo 24: Apego Forçado
⟪ Momentos antes da queda da torre ⟫
— A situação não para de piorar! — Will mexia seu cabelo.
— Faça o seguinte! — Apontou para o Will. — Continue procurando aqui dentro. Eu vou dar uma olhadinha no lado de fora. — Saiu, correndo entre as pessoas que transitavam pela grande exposição.
A preocupação de Luri era extremamente nítida. Não era apenas uma questão de encontrar uma menina perdida — isso podia, para aquelas pessoas habilidosas, ser uma questão simples —, era a confiança que seu amigo depositou nela a zelar, uma missão simples quem merecia sucesso perfeito.
Quando saiu do local, os raios de sol eram fortemente direcionados para a entrada. Tinha dificuldade para enxergar, colocava sua atenção pelo horizonte. Sem qualquer sinal da garotinha, o ar entrou pelos pulmões e permaneceu lá, o suspiro de alívio, que gritava para sair, foi soterrado pela preocupação crescente.
Disparou, com outra corrida, na direção do prédio do terceiro nível. Estava cada vez mais nervosa, suava frio o tempo todo. Abriu a porta e quase a quebrou com o a puxada… não viu o tom de verde desejado, os cabelos pontudos da pequena estavam fora do campo de visão, e os dentes de Luri rangeram.
Espasmos nas pálpebras a destacaram com uma louca, as chuquinhas estáticas entregaram o ar de boneca. Um sorriso de nervoso apareceu. Virou-se e correu pelo lugar, revirando mesas e armários num ímpeto sobre-humano, não achou na cozinha, não achou na sala, não achou no banheiro, não achou nem no telhado. Subiu as escadas e foi até o quarto dos ex-órfãos, nada além de camas arrudas e limpinhas.
Apenas conseguia imaginar um único local na qual uma menina aborrecida talvez tivesse destino, as imagens do rosto estranho de Nirda pairavam na mente… a mulher se portou de forma estranha. Retomou a postura e visou pela janela o novo objetivo:
— E se ela tentou abrir a porta agora. Droga, droga! Ele vai me matar!
Nirda estava logo ao lado da entrada da área dos laboratórios, escondida em volta de um grupo de funcionários que nem perceberam sua presença. O olhar penetrante emitia um grande vermelho rubi, que fazia as pessoas que passavam a perceber sem querer com um sentimento misto de espanto e fofura.
No final do corredor, havia a grande porta reforçada. Ela deu passos delicados, desviando das pessoas com extrema cautela, emitindo barulhos singelos dos sapatinhos.
Cada vez mais perto, mais se atentava para trás. “Acreditei que seria diferente de Réviz, no fim, Nirda está muito triste por causa desse biscate, mesmo sendo por algo tão simplório. Maldita seja essa Luri”. O comportamento, novamente, era incompatível com os movimentos comuns de uma criança. A coluna reta e dedos quietos a definiram em uma verdadeira dama. Podia ser outra coisa.
A vista de uma criança curiosa e saltitante havia se destruído numa visão fechada para cada cômodo esticado que passava. Deve ser outra coisa. O rosto de desprezo revigorou na existência ao examinar a entrada do grande corredor, atenta para quem saia ou entrava. Era, sem dúvidas, outra coisa em Nirda.
“Despistei ela. Agora preciso achar o Mark num ligeiro passo. Só ele pode acalmar ela. Por que será que ele retornou para cá? Réviz não tem mais o que…” parou, tinha sua cabeça apontada para o chão e os cabelos cobrindo o rosto. Mas um sorriso surgiu, um sorriso que ia de orelha a orelha em uma expressão diabólica e desesperadora.
O dedo indicador enrolou pelos fios da franja. Invés de permanecerem rígidos e fortes, despencaram e tornaram-se lisos, como se fosse o cabelo de outra pessoa. “Ha, ele começou a se lembrar… Muito, muito, muito bom. Deveria pensar que ele esqueceu ou que...”
— Não é a filha do Réviz? — sussurrou um dos guardas.
— É… Acho que era pra estar acompanhada pela líder do tático-não-sei-das-quantas, né? Fingimos que vimos nada ou a gente tem que fazer algo? — respondeu o outro, receoso.
A garota apertou os dentes após ouvir prontamente. Apressou o andar em ritmo pesado. Interrompeu-se novamente. Seu rosto se contorcia, voltando ao tom sério de não-Nirda. “MAS QUE!”, pensou enquanto se segurava para não chutar uma parede, agoniada. “Precisa se controlar, sem agir do nada!”, se balançou ao escorar na parede próxima.
— Acalme-se, Nirda. — Examinou os dedos.
A menina esboçava uma preocupação que só mostrou quando estava no hospital. Isto foi refletido fisicamente, o fio de cabelo que estava liso exigiu a forma original e tomou para si novamente no comportamento rígido. A menina tentou recuperar o folego e notou estar bem perto do objetivo, aprontou o equilibro e começou uma caminhadinha muito lenta.
— Oi, tudo bem? Quem é você?
Virou o rosto lentamente para a militar ao lado, que agachou, tentando chamar atenção à altura.
— Oi, e-eu acabei me perdendo. Vo-você sabe onde meu papai tá? — perguntou, envergonhada.
— Oh! É a mocinha que Réviz adotou! Sei, sim. Deixe que eu te acompanhe até lá! — Levantou, sorridente.
A mulher tomou a frente com o mesmo objetivo. A suposta Nirda levantou os braços para cima, agradecendo e seguindo a moça. E olhava a cada segundo para trás.
Quando chegaram, o olhar rubi acendeu um brilho intenso ao sentir um arrepio. A vontade de proteger algo era o real sentido daquele comportamento anormal, um aviso de emergência se propagou pelo corpo da garotinha, invadiu a espinha e alertou o cérebro para enrijecer cada célula para um susto que ainda viria.
Apesar das vozes e barulhos que espalhavam no lugar, um ruído sutil havia atiçado a garotinha. O abrupto gelo que fez o corpo virar para trás fez o azul distante ser reconhecido entre inúmeros rostos que transitavam.
Luri havia chegado, as duas pisadas fortes emitiram ondas sonoras que aterrissaram na menina com grande precisão. Estava no início do corredor, com uma visão afiada e centrada na fujona.
Pressionou os lábios com certa angústia e admitiu o local correto:
— Estava aqui o tempo todo.
A garotinha conseguiu despistar instantaneamente a líder do terceiro nível com muita facilidade mais cedo, mas durou pouco. Medo passou a retorcer a cara de desprezo, a menina começou a ruir ao notar o tempo se esgotar. “Nirda não pode ver ela de novo antes de Mark, não e não…” pensou.
A cientista estava com o painel do portão reforçado logo em sua frente, digitava com cautela o código para transportar a saída entre as dimensões. Dedos ligeiros começaram a cutucar e puxar a farda da mulher enquanto escutou:
— Moça, tô sentindo que tem de algo ruim acontecendo, po-pode ir mais rapidinho?
— Pode ficar tranquila! O senhor Réviz não entraria em confusão.
Ficou surpresa com o pedido, porém, assentindo, devolveu uma resposta otimista. Um barulho de erro saiu do painel e deixou ela aflita. O sinal de bloqueio explicava o erro da senha. A mulher coçou a cabeça e continuou:
— Sempre esqueço o código. Desculpa, menininha, quero só garantir que não bloqueie novamente por minha causa.
Luri, indignada desde o início, se preparou numa largada com nervos à flor da pele. Ignição azulada surgiu, e a aura apareceu, emitindo um brilho azul-claro quase imperceptível. Com sua mão rígida, deu um peteleco em sua própria testa; o som de vidro se estilhaçando chamou a atenção de todos os próximos.
A aura que cobriu o corpo foi quebrada instantaneamente pelo micro minúsculo golpe. Remexeu os ombros, estalou o pescoço e alongou as pernas. Abaixou o corpo e completou a pose da corredora. A aura estilhaçada canalizou suas partes nos pés. Olhos brilhantes em branco, ignição sumiu por completo, contraiu mais as coxas e:
— Cinética.
Respirou fundo e… explodiu em velocidade instantânea. Correu pelo imenso corredor, desviando das pessoas, pulava e percorria de parede em parede. Sua velocidade não abaixava, não houve nenhuma aceleração — era uma bala viva. Cada pegada deixava um rastro de eletricidade.
— Ah! Aí está. — A entrada se mostrou em um enorme clarão para a militar, que sorriu e juntou as mãos, aliviada.
Eventos muito incomuns no dia a dia daqueles funcionários. Uma menina perambulando sozinha esquisitamente, Luri com sua energia ativa, uma militar que se arrisca em se envolver nos assuntos do terceiro nível e… muita poeira.
Pouco antes de Luri atravessar quase duzentos e cinquenta metros em quase dois segundos chegar; um estrondo percorreu o corredor com ventania e bastante terra.
As chuquinhas quase perderam cor com outro gelo que sentiu, apesar da mesma porta ter dado entrada ao local arsenal de testes da ODST, também dava origem ao lugar onde o seu amigo estava, o único lugar que não devia estar.
— Me lasquei!
Luri chorava lamentos ao lado ao perceber o que acabou de presenciar. Do lado de dentro do imenso resplandecer, estava o garoto de cabelo hipérbole com o joinha estendido sobre escombros.
— Mark! — Sorriu Nirda, com o vermelho rubi apagado.
O medo da pequena sumiu, e a tristeza da verdadeira Nirda se esvaiu em alegria.
A poeira que infestou por todo o lugar deixou os funcionários irritados. A situação ressoava em confusão junto a um imenso centro de nervosismo, constituído exclusivamente por Luri.
Nirda sorria de orelha a orelha. Correu, atravessando a nuvem marrom, até esbarrar sua testa no pai adotivo. Quando a ventania cessou, Réviz se virou com um olhar intrigado, percebeu a plateia fora de planejamento que existia na porta e a menina feliz abaixo.
— Uh! — Luri tampou os olhos, com vergonha de si mesma que corroia até átomos de sua alma.
— Luri? — Mark abaixou o joinha, desentendido. — Nirda?!
O jovem ficou com receio da menina presente, sabia que o propósito do tour em partes era separá-lo do resto para que Réviz pudesse explicar mais sobre o destino tão misterioso. Entretanto, as sobrancelhas tencionaram e desceu do pedestal improvisado. “Por que Nirda tá sozinha com ela!?” Apressou para baixo, desceu pelos escombros até atingir a grama verde.
Mas parou. A iluminação esquisita do lugar — que ficava de noite para sempre — emitia o luar pelos dois que não deviam ter se encontrado desta forma. Apertou os lábios com medo da reação de seu pai, sabia que era capaz de muita coisa.
A visão de sua postura estática à frente de sua irmã apenas trazia piores expectativas.
— Nirda! Tudo certo? Hm. — Réviz deu uma olhadela sutil na líder. — Chegou numa hora boa! Já ia te chamar para apresentar este lugar.
— HAN? — A dona das chuquinhas arregalou a cara.
— Senhorita Luri? — questionou a militar, limpando a farda praticamente marrom. — De onde você apareceu?
As sobrancelhas dela se contraiam em surpresa, os braços foram para trás e ficou sem mais qualquer outra reação — uma face repartida em emoções complementares do inesperado. Talvez o sumiço da menina foi algo certeiro para seu amigo.
Entretanto, antes que pudesse absorver mais, somente pode prestar atenção nos velozes passos do jovem de cabelo branco, que parecia estar ainda mais preocupado logo atrás.
— Eu… Eu! E-eu… — Tentou recuperar o fôlego, apoiando o peso sobre os joelhos.
— Tá tudo bem, cara. Rela…
— Eu não a achei! Olhei por aqui dentro em todo lugar, então fui lá fora um pouco depois de você e não te achei também! Uai, por que o arsenal tá diferente? — Contorcia, incrivelmente rápido, seus cabelos de loucura.
A atenção da moça foi controlada pelo filho adotivo mais velho, que se abraçava como um desgovernado louco, mas o clima não estava coerente com a conversa mais adiante.
O líder dava cafunés pela franja pontuda de Nirda, fazendo o alívio tomar controle e deixá-la mais aliviada. Mark, logo ao lado, não sabia como devia reagir, andou com cautela e viu o rosto de sua irmã mudar completamente entre uma piscada — um olhar sério e desconfiado que penetrava a alma em uma aparição de pesadelos e, depois, voltar ao normal durante o sossego do cafuné do pai.
Uma expressão descomunal para a infantilidade de uma menina o fez sentir medo antes de dar passos ligeiros para trás, assustado. De forma certeira, era a mesma expressão que viu no tour que Luri fez.
— Algum problema? — perguntou Réviz, com simpatia improvisada e um sorriso carismático.
— Não. Não. Só quero descansar um pouco.
A calma de seu pai era algo exatamente forçado e fazia assemelhar como se soubesse que isso tudo ia acontecer, um plano arquitetado às pressas em nano segundos. Desta forma, se levantou e pediu para Nirda chamar os dois na entrada do campo.
De costas para o derrubador de torres, disse:
— Apenas concorde. Terei uma conversa séria com o esquadrão mais tarde. No instante em que os outros dois adormecerem, desça as escadas. Faça questão de cooperar e me dizer que pensa antes de provocar outro deslize. Me ouviu bem? — Virou o queixo para trás.
— Ei, ei! Se é pra manter as aparências, como tiro isto? — Apontou para o rope dart, ainda sentindo o calafrio da ordem.
De fato, um equipamento muito delicado controlado por ignição não tinha nenhum botão que pudesse desprendê-lo do pulso. O cientista que o guiou estava no meio das pessoas, tentando acalmar qualquer preocupação que pudesse espalhar para o resto da instalação.
Réviz suspirou, virando para o instrumento.
— Desarmar! — Sua ignição esteve ativa por um mísero pequeno segundo.
A arma simplesmente se tornou invisível. O garoto ficou impressionado com o comando de voz, passava a mão pelo pulso e sentia cada detalhe — afinal, estava apenas invisível, era possível sentir e perceber através da deformação da sua blusa.
— Ué, ela ainda tá aqui… Ai, ai, ai — comentou enquanto passou o dedo pelo braço, apertando a ponta do arpéu por acidente.
— Percebeu que é apenas superficial. Vamos esperar até que o cientista desse projeto retorne. — A voz de Réviz ficou meio desajeitada, a frieza se tornava uma máscara fina demais.
O ligeiro balançar de ombros demonstrava um comportamento que reconheceu facilmente: uma mania. Seu pai adotivo não era perfeito, bastou esse mero ato para que o calafrio reduzisse a um sorriso sem jeito.
— Você não sabe como tira, né?
— N-não, não sei. Só vi até a parte do desarme no relatório. A arma responde a quem a energia está cadastrada nela, dizia para “ativar a ignição ao executar o comando de voz”.
— Ah... sei, legal. Então o terceiro nível tem preguiça de ler um relatório? — Não possuiu desprezo, possuiu um carinho aconchegante. Ficou tranquilo, descobrindo mais sobre a personalidade de seu pai. — Pera… Então fico com esse negócio preso até quando?
Mesmo assim, não era como se o que passou resumisse a tristes tentativas de última hora e sem planejamento…
— São, por segurança... dois meses, eu acho — Réviz sorriu com os lábios.
— “Eu acho”?!
Mark ficou de cara, não por ter que esperar mais tempo, o fato de algum cientista ter programado para ser especificamente dois meses foi o que o deixou inconformado.
Pouco depois da sua mão esquerda tentar achar com desespero e agito um botão ou trava de emergência, a garotinha havia chegado trazendo os dois que deviam estar acompanhando desde sempre, tinha os braços para o lado na direção de seu irmão do meio, dando um abraço forte enquanto Mark desviou a arma do rosto fofo.
Luri engolia sua ansiedade com força, e apenas isso. Will, que espirrava constantemente, foi para perto do seu irmão e certificou se estava tudo bem. A líder foi de encontro com a vice, recebeu a mensagem anterior com um sussurro. Ficou arrepiada pelo cuidado recebido. Apesar de, no papel, Luri ser a líder, todos os funcionários tinham uma impressão contrária.
O protocolo do tour de distração recomeçou. Continha como atração os destroços que, supostamente, um jovem as causou; obstáculos, crateras causadas por uma mulher que, hipoteticamente, as causou; e muita, muita poeira.
Local peculiar. Os dois irmãos desavisados achavam um máximo. A luz da lua, que atravessava o centro, chamava muita atenção da menininha.
— Cê tá legal? — perguntou Will.
Nirda assentiu como se estivesse em um show de metal. Enfim, o passeio foi totalmente encerrado com um joinha em grupo dos três ex-órfãos.
⟪ Mais tarde ⟫
A noite verdadeira chegou para a ODST. Mark estava com os olhos vidrados ao teto, esperava os irmãos adormecerem como havia sido instruído. Olhou para o lado e viu, na cama do meio, sua irmã dormindo como anjo e cabelo espetado, mesmo quando viu Luri tratar dele como um agrado devido ao que ocorreu mais cedo.
Assustou quando ouviu a respiração pesada ressoar pelo quarto, o ronco de seu irmão deu as caras, estava claro que o momento na qual aguardava chegou. Sem perder tempo, foi em direção ao destino planejado. “Você vem comigo”, pensou enquanto pegou sua blusa azul.
Ao descer as escadas para o combinado repentino, observou os dois adultos à mesa, com caras fechadas, encarando um holograma no centro.
— Oiá ele aí — comentou Luri ao ajeitar sua postura na cadeira. O comportamento de madame delicada instalou em seu ser, o qual não combinava nem um pouco.
Mark sentou-se ao lado e esperou qualquer outro comando. Um silêncio perturbador ficou. A mente apenas guiava ao caminho monótono: apenas ouvir. Entretanto, notava sempre a oportunidade de retomar o controle sobre os atos das coisas todas. Tentou iniciar a conversa, mas foi interrompido pelo soar seco de seu pai:
— Tenho algo que merece ver. — Réviz empurrou o holograma para perto do filho.
Era uma tela grande, tinha o mapa do Segundo Setor com marcações estranhas par o jovem.
— Indo direto ao ponto, verá eventos anormais de fato a partir de agora — continuou.
— Me avisa agora?
As chuquinhas estavam congeladas em meio a estrutura de refinamento. Luri parecia imitar uma mulher de ponta com um sutil teatro forçado. Queixo levantado e um mindinho erguido sobre um mísero e simples como d'água.
— Vamos ter que viajar novamente, só que nosso destino agora é a Cidade Flutuante, iremos para o setor da Passagem. — Relaxou os ombros de pedra. — Então, acho que é a minha vez de explicar a parte anormal.
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