Volume 1
Capítulo 4: Meu Aniversário III
O que é isso?
Esse leve feixe de luz verde num tom de jade cobrindo o machucado da Jennifer. Reconstruindo cada tecido rompido... Isso é absolutamente incrível! Não há nada em minha mente racional que consiga explicar tal fenômeno após presenciar isso. Por alguma razão minha mente renega isso com todas as forças do mundo como se fosse impossível disso existir ou que possa ser apenas um truque barato. E por ser algo impossível de acreditar, ganhou meu interesse particular.
Bom, minha mãe não parece ser é nenhum tipo golpista que fez as pessoas acreditarem que ela possui algum tipo dom milagroso, sem falar que o machucado da Jennifer realmente está melhorando. Aliás, está melhorando numa velocidade absurda, diga-se de passagem. Quando vi a Jennifer se ferir, pude de antemão calcular que levaria pelo menos uns 10 meses para se curar, isso considerando a possibilidade de deixar sequelas.
É como se fosse Magia?
Magia... Esse nome existe em minha mente para classificar esse tipo de coisa, mas como algo inexistente. Como uma espécie lenda, um conto, ou na melhor das palavras, como uma fantasia. Vi algumas citações sobre magia nos livros que li, mas nada que aprofundasse no tema, apenas considerei como algo meramente fantasioso como uma forma de explicar fenômenos inexplicáveis.
Mais uma vez minha mente não reagiu ao presenciar a magia como nas outras coisas vezes que eu testemunhei algo novo. Isso me faz refletir e pensar que provavelmente não serei um usuário de magia no futuro igual minha mãe, por exemplo.
Talvez seja hereditário, talvez seja limitado apenas para pessoas com possuam algum dom. Não faço ideia. Aliás, será que existem outras magias? Minha mente continua martelando como se fosse algo impossível de existir, mas ao mesmo tempo considera alta a possibilidade de existir vários tipos de magias. Mas não é apenas uma questão de achar como algo puramente instintivo ou que seja parte de algum conhecimento prévio meu. É muito além disso.
Se na minha vida passada eu não fui uma praticante de magia, tentarei nessa se eu não tiver limitações inatas.
De qualquer forma, todos estão em volta observando, mas ninguém está muito assustado ou interessado pelo o ato em si. Parece que todos já conhecem de antemão o que minha mãe está fazendo. Mas não é como se ninguém estivesse gostando do que estão vendo, muito pelo o contrário, parece que todos estão observando atentamente.
Claramente é algum tipo de magia curativa, mas o que pode ser? Até que ponto ela pode curar? Pode recuperar membros decepados? Pode recuperar danos celebrais? Essas dúvidas ecoam em minha cabeça.
Além dessa revelação, não foi a única coisa "impossível" que vi hoje. Aquela aranha gigante, então isso que é um monstro.
Hoje sem sombra de dúvidas não foi um dia como os outros. Hoje foi um dia de inúmeros conhecimentos adquiridos e principalmente, um dia que vai fazer com que talvez consiga mais liberdade para acessar as verdades do mundo. Quando chegar a hora vou me dedicar em estudar sobre essa tal magia curativa. Não posso simplesmente abordar minha mãe com tais perguntas agora numa situação dessas.
Embora eu esteja animado para aprender sobre novas coisas, o ambiente em nossa volta está pesado a um nível em que todos estão em silêncio, com medo e com a moral um pouco baixa pela a morte da jovem menina. Não vou mentir dizendo que não fui afetado também de alguma forma por aquelas cenas terríveis. Mas a razão pela a qual eu consegui me controlar nesse cenário de vida ou morte foi o mar de conhecimentos que adquiri nesse processo. Soa como se eu já tivesse presenciado a morte incontáveis vezes o que me deixou mais calejado para suportar o cheiro enjoativo de sangue no ar e afins.
O cheiro foi o que trouxe o maior fator nostálgico no momento em que adquiri tais conhecimentos. Ele foi o gatilho que me fez lembrar de uma série coisas, não muito concretas ou objetivas, mas sim como experiências passadas, de forma abstrata. É difícil descreve-las, pois não possuem formas. Não são sonhos ou memórias propriamente ditas, mas como instintos e experiências adquiridas pela a tentativa ao erro.
Se pudesse comparar, seria de forma parecida quando adquirimos tamanha proficiência em algo que podemos realiza-la sem precisar pensar cuidadosamente em cada movimento durante o processo. Conseguindo fazer de forma instintiva devido a maestria alcançada ao longo de inúmeros anos de experiência.
Eu chamo esses episódios de Epifania.
Desde que cheguei ao mundo já presenciei dezenas de Epifanias sobre os mais variados assuntos. Desde como usar um garfo e faca até agora sobre como entender a morte e suportar o medo. De longe a Epifania de hoje foi uma das maiores até agora.
Sinto minha mente cansada, como se precisasse descansar depois de adquirir tantas informações de uma única vez e sinto uma ligeira dor de cabeça. Mas nada tão preocupante. Decido me desaproximar da minha mãe por um momento para tentar por minhas ideias em ordem. Não posso ser afobado e preciso parecer que sou apenas uma criança que está com medo do que está acontecendo. Me sento numa área vazia próximo ao meio do salão, perto de uma estoa. Há diversas pessoas sentadas no chão em pequenos grupos de 2 ou 3 pessoas ao redor do centro do salão. Ninguém próximo as janelas por motivos óbvios.
Parando para analisar, minha mãe me observou atentamente enquanto ela curava Jennifer. É a segunda vez que ela me olha com um olhar analítico afim de entender minhas intenções e isso é algo que preciso tomar cuidado eu acho. Nem mesmo meu pai me olhou dessa forma. De algum modo me sinto estranhamente triste por isso. De fato, ela é a minha mãe e apesar das minhas circunstâncias excepcionais afetarem a forma como eu vejo a nossa relação, gosto dela ao ponto de querer protege-la.
Não há intenções malignas da minha parte, pelo menos.
Enquanto reflito sobre isso olhando para o chão a minha frente, duas belas pernas aparecem no meu campo de visão. O seu tom de pele e sua forma se assemelham a uma linda escultura de porcelana esculpido por algum mestre escultor. Eu reconheço esse tom de pele e reconheço essas vestimentas de pouco tempo atrás. Não precisei olhar para cima para reconhecer quem está minha frente.
— Oi...— diz Alexandrina com uma voz doce e um pouco envergonhada em me abordar diretamente. Nitidamente ela não está acostumada com isso e numa situação em que quase morremos, é natural que não consigamos nos expressar perfeitamente.
— Oi, você está bem?
— Sim, graças a você...
Sinto que ela deseja conversar comigo. Pela a forma em que ela ainda se mantém em pé na minha frente, é como se precisasse de um convite formal meu para que possa se juntar mim em uma conversa casual entre jovens. Isso mostra que ela foi disciplinada e educada aos moldes de um Nobre. Uma menina não pode simplesmente se sentar perto de um homem casualmente independente das circunstâncias, mesmo que eu seja uma criança de apenas 7 anos.
— Por favor, sente-se comigo. Vamos conversar.— convido enquanto indicava com minhas mãos para ela sentar ao meu lado para que ambos pudéssemos dividir a estoa como um local para nos encostarmos e descansarmos.
— Agradecida. — Alexandrina se senta de uma forma graciosa como uma verdadeira dama dobrando suas pernas de modo que o seu vestido não fique dobrado. Não duvido que ela tenha tido aulas de como se sentar no chão.
— Primeiramente gostaria de agradecer em nome da minha família pelo o que fez por mim agora apouco. Eu definitivamente teria sido morta se você não tivesse voltado por mim.
— Não foi nada, fico feliz que esteja tudo bem com você.
— Foi sim, e você sendo tão novo, seu renome precede.
— Renome?
— É, seu pai fala muito sobre você ser tão inteligente e proativo.
— Sério? Isso é novidade para mim.
Aquele cara, nem olha direito para mim quando está em casa, mas não mede palavras para se vangloriar do filho que tem.
— Não comente nada sobre isso com ele. Eu apenas ouvi uma conversa entre nossos pais.
— Eles são amigos né?
— Sim, amigos de longa data. Parece que já foram aventureiros juntos muito tempo atrás.
Eu sabia que meu pai já foi aventureiro, mas não sobre nossos pais trabalharem juntos. Embora ainda não tenha certeza exatamente do que se trata ser um aventureiro, tudo que eu sei até hoje foi sobre explorar regiões inexploradas e no sentido mais literal, aventurar-se em regiões inóspitas.
— Interessante. Seu pai trabalha com meu, né? Perdoe minha ignorância.
— Não se preocupe, você ainda é muito novo. E bom, respondendo sua pergunta podemos colocar que de certa forma sim. — Alexandrina coloca gentilmente uma de suas franjas para trás de uma de suas orelhas pontiagudas e continua: — Meu pai é o Barão dessa pequena província. Essa região apesar de respeitar uma hierarquia Heráldica de nobreza, ela é conquistada através de merecimento. Você conhece o sistema?
— Sim, estou ciente.
Eu tive a oportunidade de ler um livro sobre modelos governamentais e em específico sobre a nossa situação aqui nessa região de colonização e exploração. O caso do pai da Alexandrina não é tão incomum assim. Ser agraciado por seus feitos e ganhar um título de nobreza ocorre bastante quando se trata de despachar pessoas fortes para regiões de difícil sobrevivência.
— Então, essa região aqui é considerada de exploração e é meio inóspita. Muito afastada das grandes regiões urbanas que não tem muitos monstros. Nesses países o que reina lá é um sistema mais antigo por herança familiar. Aqui os terrenos são dados a pessoas como presente por seus feitos. Seja como aventureiro ou benfeitor. Não é como se fôssemos uma família historicamente nobre. Meu pai que sempre foi aventureiro e plebeu, apenas acabou ganhando esse título de nobreza para poder colonizar e explorar tais terras. Mas na ótica de outros nobres, somos vistos como meros caipiras.
— Que insensível da parte deles.
Sem sombra de dúvidas uma boa parcela desses nobres vive de usura e sua participação em grandes causas é quase nula. Vive do legado de um patriarca como o Pai da Alexandrina. Isso é algo que adquiri através de uma Epifania. Meu entendimento sobre como sistemas políticos funcionam parece ser decente.
— Aqui é uma região que não tem total controle sobre ataques dos monstros. O que aconteceu hoje aqui, acontece em outros lugares com certa frequência. Ainda há um enorme trabalho a ser feito até pacificarmos tal região.
Agora estou começando a entender.
— Não fazia ideia disso. Esses monstros são sempre fortes assim?
— Aqui nessa região, infelizmente sim. Por isso há poucos moradores. Mas quando conseguirmos normalizar a segurança da região, a cidade prosperará.
— Tenho certeza que tendo uma filha tão bem educada como você, seu pai conseguirá estabilizar essa região e prosperará muito na próxima geração.
Conversar sobre assuntos tão pesados quanto política e mundo requer quebrar o gelo volte e meia para evitar um ambiente ruim e maçante. Sem falar que é perceptível que Alexandrina ainda está afetada pela a morte da menina.
— Você acha? — Alexandrina olha para o chão e seu rosto cora ficando um pouco envergonhada com meu comentário anterior.
Olhando dessa forma, fica claro que ela é tímida e não tem muita experiência por reagir dessa forma a um elogio simples desses.
— Claro!
— hunf... Que cordial. Obrigada.
Demos uma leve risada e agora que o ambiente está um pouco mais descontraído, na medida do possível, posso tocar num assunto que tive interesse mais cedo.
— Alexandrina, você sabe alguma coisa sobre magia?
— Sei algumas magias sim, por quê?
Perfeito. Ela sendo de uma família nobre, a mais poderosa daqui e com seu alto nível de educação, achei que seria no mínimo estranho ela não ter aprendido nada sobre magia. Não esperava que ela soubesse fazer magia, mas isso é um bônus. Tenho que aproveitar o momentum.
— Sério!? Por favor me ensine!
Alexandrina me fita com um olhar surpreso e logo depois volta a dar uma leve risada.
— Bom, eu posso tentar, mas é difícil e pode ser que você não consiga. Não é todo mundo que consegue usar magia. Não crie expectativas.
— Sem problemas, eu só desejo aprender mais sobre. Obrigado!
Foi mais fácil do que eu esperava.
Alexadrina se ajeita em sua posição para ficar em minha direção e avisa: — Mas não se engane, veja isso como uma retribuição pelo o que fez por mim mais cedo, apenas isso.— seguido de uma leve piscada num tom de brincadeira, ela continua: — Bom, quando tudo isso passar, falarei com meu pai que com certeza não verá problema algum. Fale com seu pai e eles acertarão um dia para você visitar minha casa. Lhe ensinarei o básico de magia e caso tenha aptidão, também emprestarei um livro sobre o básico da Magicologia. Por enquanto pode parecer inútil, mas quando você aprender a ler, comece a estuda-lo.
— Já sei ler.
— O que!? Você tem quantos anos mesmo? — Alexandrina instantaneamente para com o seu leve sorriso e me encara com um olhar de dúvida misturado com espanto.
— Fazendo 7 hoje. Aprendi ano passado com ajuda da minha mãe e irmã.
Eu consigo entender esse espanto. É anormal saber ler por si só, imagine tão cedo assim. Ainda mais por essa região remota.
— Incrível, eu aprendi apenas com 9 anos e isso é considerado algo muito atípico. Você realmente e inteligente, Lucy.
— Que nada, eu apenas gosto muito de livros e sempre tive interesse em aprender. Você é muito mais. — entrego minha simpatia com um belo sorriso humilde de um garoto de 7 anos.
— Você é muito cordial, mas não seja um desses cafajestes que só falam o que as meninas querem ouvir. Não aguento mais esses pretendentes o tempo inteiro me perturbando com suas poesias mal escritas.
— Você pode ficar tranquila sobre isso, minhas intenções são puras. Sem falar que já tive que presenciar esse tipo de pensamento de algumas pessoas sobre a minha irmã.
— Pera, eu estava apenas brincando. Você tem apenas 7 anos. Está muito novo para essas coisas.— responde dando uma leve risada no final e completa: — De qualquer forma, ótimo então, fico tranquila em saber isso.— Alexandrina se encosta de forma mais relaxada na estoa com um semblante mais relaxado.
Esse tipo de comportamento relaxado, logo após a morte de uma menina me mostrou que de alguma forma, as pessoas aqui já estão acostumadas com esse tipo de ocorrência. Não pude deixar de reparar isso. Não é como se pudéssemos sofrer eternamente por algo. As pessoas aqui estão cientes que essa é a realidade delas. E agora que descobri a existência dos monstros, tudo faz muito sentido. Eu constantemente ouvia relatos de falecimentos nas conversas da minha família e todos agiam com uma certa naturalidade, como algo triste que ocorreu, mas apenas isso.
— Estarei em seus cuidados.— finalizo o assunto e também me encosto na estoa.
Após isso, continuamos conversando por mais 1 hora sobre os mais variados assuntos. Adquiri informações importantíssimas acerca do mundo, o que vai me ajudar bastante no futuro, mas pensarei melhor sobre isso depois.
Ficamos aguardando até que nossos pais voltassem, visto que o pai de Alexandrina também estava lá fora com meu pai caçando os monstros. E após um tempo e já não havendo mais monstros para derrotar, removeram o bloqueio da escadaria e as pessoas que estavam lá em baixo começaram a voltar para o salão. Várias pessoas começaram ir em direção a suas esposas e maridos.
— Pai! — grita Alexandrina, ao perceber a chegada de seu pai subindo as escadas. Me viro para ver quem era o tal pai de Alexandrina, barão desta província e percebo que meu pai estava ao seu lado, o acompanhando.
Os dois logos nos avistam, mas antes que pudessem vir em nossa direção para falar conosco, o grito de choro esperado por todos começa. Os pais daquela menina receberam a notícia e foram correndo para o quarto para ver o estado de sua filha.
Nossos pais ficaram sem entender e antes que corressem em direção do grito, eu mesmo me levantei e fui falar com eles. Alexandrina veio logo atrás de mim para me acompanhar.
— Olá, Pai! — olho para o Pai da alexandrine e o complemento: — Olá, senhor Boruta. Fico feliz que estejam bem e não se feriram.
Alexandrina passa pelo o meu lado como um vulto e abraça o seu pai.
— Pai! que bom que você está bem, fiquei com muito medo.
— Está tudo bem filhinha, fico feliz que esteja bem também. Mas me fale... o que aconteceu com os Kerusit?
Eu e meu pai observamos a troca de afeto parental entre pai e filha. Isso serviu para deixar claro o abismo que existe entre mim e meu pai. Trocamos olhares e o mesmo veio perguntar sobre meu estado:
— Você está bem? E a mãe e sua irmã?
— Todos estão bem, pai. Mamãe e Jennifer cuidaram bem de todos, mas aconteceu uma coisa.
Meu pai olhava para a direção dos gritos como se já tivesse entendido a situação. Antes que desse espaço para a Alexandrina responder, preferi dar as notícias ruins no lugar dela.
— Senhor Boruta, tivemos uma perda aqui. Uma aranha gigante entrou no quarto onde estávamos escondidos e acabou matando uma menina.
Tento emular uma voz de medo e pena diante da situação, mas acho que soei frio demais.
— O Kerusit tem uma filha pequena né? — Abraçado a Alexandrina, o Sr. Boruta pergunta olhando para meu pai para ter uma confirmação.
— Sim, provavelmente é a filha deles.
— A Jennifer protegeu todos nós, pai. Se não fosse por ela, todas as crianças estariam mortas. Mamãe estava a curando algum tempo atrás. Elas estão ali descansando.
— Jennifer? Essa não é a sua maid!? — O tom de dúvida e surpresa do Sr. Boruta evidencia a surpresa de uma empregada conseguir segurar um monstro daquele porte.
— Sim, mas ela já foi aventureira como nós. Fizemos parte de uma mesma party quando eu e você estávamos brigados. Por isso você não a conhece.
— Ah, tudo certo então.
— Pai, preciso também contar uma coisa.— interrompendo a conversa dos dois, Alexandrina se solta de seu pai e vai ao meu lado.
Tanto meu pai e o Sr. Boruta ficaram atentos após ela ir ao meu lado esperando explicações do que poderia ser tal coisa.
Até eu fiquei curioso.
— Pai, o filho do Sr. Sapphirus salvou minha vida. Se não fosse por ele, eu estaria morta. Quando o monstro entrou no quarto, eu fiquei com tanto medo que caí no chão. Ele foi o único que voltou para me salvar.
Nossa, não esperava que ela fosse fazer isso. Ganhar pontos com o atual regente da região pode ser importante no futuro.
Tanto meu pai quanto o Sr. Boruta arregalam os olhos em surpresa. O pai de Alexandrina olha para mim imediatamente e me analisa dos pés à cabeça. Não sei por que fazer isso, talvez só queira ver quem é o tipo de pessoa que salvou sua filha, independente dele ter apenas 7 anos ou não.
Meu pai fica meio encabulado, tenta falar algo, mas é interrompido pelo o próprio Sr. Boruta: — Seu nome é Luci.... Qual é mesmo seu nome? Me desculpe, sou péssimo com nomes — Sr. Boruta para por alguns instantes, em reflexão, constrangido por não se lembrar do meu nome.
— Pode me chamar apenas de Lucy, Sr. Boruta. É assim como todos me chamam.
— Certo, Lucy. — Ele olha pra meu pai, que dá um leve assente com a cabeça e volta a olhar pra mim.
Sr. Boruta tem uma idade próxima ao meu pai, cabelos compridos abaixo do ombro, num tom azul petróleo, veste uma capa vermelha, muito bonita por sinal, digna de um nobre, mesmo sendo apenas um barão de uma região pobre, é perceptível que não foi barato.
Ele se ajoelha para ficar próximo a minha altura, mas mesmo assim, ele ainda é mais alto do que eu.
— Bom, Lucy. Muitíssimo obrigado por salvar a vida da minha filha. Alexandrina é uma menina difícil de se lidar, e se ela disse aquilo então definitivamente é verdade.
Alexandrina faz um beicinho de menina mimada enquanto olha para o lado em reprovação e faz seu característico "Hunf."
Meu pai dá um leve sorriso e Sr. Boruta dá uma leve risada cansada. Imagino que ele realmente deve penar pra aturar o gênio dela.
— De qualquer forma, Lucy, estou em débito com você. O que você precisar, pode pedir que providenciarei.
Acho que agora entendi o porquê a Alexandrina foi tão longe para fazer essa declaração.
Quando procuro olhar para a Alexandrina, a mesma já estava me fitando, esperando que a olhasse para que eu entendesse a situação. Seu olhar dizia algo como "Siga com o plano".
Faz sentindo. Um homem não pode simplesmente visitar a casa de uma menina assim. Mesmo que nossas idades divirjam tanto assim, não é incomum que casamento ou relacionamento sejam consumados mesmo com diferenças de idade gritantes. Para eu ir à casa dela e aprender magia, é preciso ter uma razão forte para isso. Não posso simplesmente chegar lá.
Alexandrina preparou o terreno para que eu possa pedir ao pai dela e assim ele não ter outra escolha a não ser aceitar meu pedido.
Obrigado, não desperdiçarei essa oportunidade.
— Bom, Sr. Boruta, tenho algo que gostaria de pedir.
Meu pai que estava quieto e relaxado, recobra a atenção para ouvir meu pedido.
Percebo agora que minha mãe e minha irmã se aproximaram de mim, mas não interromperam, visto que eu estou a conversar com o Sr. Boruta. Mas não sei há quanto tempo elas chegaram, não sei o quanto ouviram, mas acho que já entenderam o que está acontecendo.
— Certo, Lucy. O que você deseja?
Sr. Boruta deu seu aval, irei aproveitar. Preciso fazer minha cara de criança inocente, pura e imaculada que apenas quer aprender. Não posso ser recusado.
— Bom, Sr. Boruta.... Eu estive a conversar com sua filha e após ver minha mãe usando magia, fiquei muito interessado nisso. Alexandrina disse que sabia algumas magias e isso me interessou. Ela também disse que poderia me ensinar algumas coisas a respeito disso. Se não for pedir muito, gostaria que desse o aval para que ela possa me ensinar o caminho da magia.
— Claro, por mim tudo be.... Que? — Sr. Boruta que estava respondendo positivamente com um belo sorriso devido a minha fofura, é interrompido por uma áurea opressiva vindo do meu pai e minha mãe.
Até eu mesmo percebi isso. Na verdade, todos sentiram isso.
Droga, o que eu fiz de errado?
Olho para meu pai e tudo que vejo em seus olhos é receio misturado a raiva, talvez. Olho pra minha mãe e ela me encara com o mesmo olhar sério de antes.
Cometi alguma gafe? O que eu fiz de tão de errado? Não consigo entender. Será que eles sabem que sou reencarnado? Não, é impossível. Minha mãe sempre cuidou bem de mim como uma criança de verdade. Tirando essa situação em específico ela nunca demonstrou essa hostilidade antes.
Passaram-se 5 segundos de puro silêncio. Meu pai meio que sai do seu estado de fúria momentânea e sem pensar duas vezes se vira para o Sr. Boruta e diz: — Amigo, perdoe a insolência do meu filho. Ele ainda não é versado na etiqueta e sobre como funciona o mundo. Ele é inteligente e estudioso, mas ainda precisa entender algumas coisas.
Minha mãe também intervém e completa: — É, Sr. Boruta, Lucy é muito jovem e ainda não entende que não se pode pedir algo para o barão da província dessa forma. Ainda mais para aprender magia com sua única filha diretamente. Apesar do Lucy ser jovem, ainda é um homem. Isso seria mal visto.
Apesar de entender isso, como já tinha ponderado anteriormente, sinto que de alguma forma eles estão reagindo de maneira desproporcional ao meu pedido.
Olho para o Sr. Boruta que está com um olhar confuso, olhando tanto para meu pai e minha mãe, provavelmente achando a mesma coisa que eu.
— Pera lá, Hector, não há problema algum nisso. Vai ser um prazer receber seu filho na minha casa. Ele salvou minha filha e é o mínimo que posso fazer. Me espanta que você ainda não tenha ensinado uma magia sequer pra seu filho. Você sempre foi um mago excepcional. Se bem que o Lucy é realmente jovem... mas não importa. Faço questão. Aliás, a Alexandrina não fala com muitas pessoas, pode ser bom pra ela ter que ensinar algo para alguém.
Pera, meu pai foi um mago?
Mago... quando penso nessa palavra, associo a um usuário de magia. Será que meu pai foi um praticante de magia também? Bom, ele não ensinou a minha irmã, senão eu saberia disso.
Olho pra meu pai que está com uma expressão esquisita. Ele está numa saia justa. Olha sem esperanças pra minha mãe, que demonstra estar receosa em deixar seu filho ir aprender magia com a Alexandrina, mas nada podem fazer após a permissão do Barão da cidade. Apesar do meu pai e ele serem próximos, há um limite na forma que eles podem interagir entre si.
Meu pai dá de ombros e diz:
— Certo, tudo bem. Se o Sr. Boruta não vê problemas, e como forma de retribuir um favor, por mim tudo bem.
— Perfeito, amigo. Aviso quando a Alexandrina estiver pronta e o pequeno Lucy poderá aparecer lá em casa.
Ótimo, meus pais não tiveram a menor chance. Não entendo a razão deles serem tão contrários a isso, mas não importa. Olho para a Alexandrina que voltou a ficar agarrada ao seu pai e a mesma me recebe com um leve sorriso.
Todos nós nos despedimos. Alexandrina foi para casa logo em seguida escoltada por vários guardas, meu pai e minha mãe foram com Sr. Boruta resolver os problemas decorrentes da morte da menina e eu fiquei junto a minha irmã, com ela "cuidando" de mim, mas que na verdade, o que ocorreu foi o completo oposto.