Paladinos da Noite Brasileira

Autor(a): Seren Vale


Volume 1

Capítulo 10: Sorte?

    Silver sentou no sofá com o notebook no colo, concentrado em suas atividades. Sua atenção foi repentinamente interrompida quando Rose correu pelas escadas e parou na frente dele.

— O que foi? — Silver fechou o notebook.

— Meu celular caiu no vazo.

— Deixa eu adivinhar, você quer outro? Você acha que eu cago dinheiro é?

— Se você não tivesse me demitido da loja.

— Fica com o meu — Silver entregou o celular para Rose — Agora some que estou trabalhando.

— Posso ir à sorveteira?

— Você não esta totalmente recuperada, então leve seu irmão — Silver disse e abriu o notebook novamente.

      Assim que Rose saiu, Sam adentrou a sala e parou em frente a Silver, o que fez ele  fechar o notebook novamente, e soltar um longo suspiro.

— Outro! O que foi?

— Eu queria conversar com você, papai!

     Silver estranhou o termo “papai” utilizado por Sam. O garoto nunca havia o chamado assim, o que despertou a atenção plena de Silver e a curiosidade.

— Que tal se o Johnny for o novo Paladino Azul?

— Não depende só de mim.

— Mas você pode sugerir para o conselho.

— Não vou solicitar uma reunião de horas e horas sobre algo que já esta decidido.

— É! Eu tentei — Sam deu as costas para Silver — Até mais, Silver.

— O que aconteceu com o “papai”—  Silver disse a si mesmo e tornou a digitar em seu notebook.

***

      Johnny olhou a grande casa que parecia estar vazia e abandonada, cada detalhe macabro: as teias de aranhas, as folhas secas, janelas e portas trancadas. Mas algo que chamou a atenção foram as rosa-brancas impecáveis.

— O Silver conversou com o proprietário, ele disse que não mora ninguém aí há anos. — Sam disse. — E sabe o que é mais estranho? Quando eu e Rose éramos crianças havia uma mulher que sempre nos dava doces a caminho para escola.

— E então? Falou com seu pai?

— Falei, ele disse “não”.

— Nesse caso, vamos falar com Daniel. Tenho certeza que ele vai dizer “sim”.

— É melhor fazer isso rápido, a cerimônia é daqui a três dias.

— Vou esperar seu tio aqui. — Johnny sentou sobre o meio-fio da calçada.

— O tio Daniel não mora mais aqui, ele voltou para casa — Sam estendeu a mão para Johnny. — Eu levo você lá.

       Johnny andou pela rua e tentou pensar em como convencer Daniel, mas o silêncio era inexistente, já que Sam andava junto; o garoto hiperativo cantou e falou coisas aleatórias para Johnny.

— E então você vai chegar lá, e tem a cerimônia dos novatos, ondem recebem o símbolo dos Paladinos: a cruz dourada. É um diferencial na sociedade.

— E por que você fugiu de lá?

— Sabe como é, fiquei com saudade de casa. — Sam passou a mão sobre o ombro de Johnny — Mas esse ano, você estará lá, e eu estou apostando em você em.

— Já chegamos? — Johnny disse e se desvencilhou de Sam.

— É logo ali! — Sam apontou para um prédio amarelo-creme. — Quinto andar, número 266.

     Enquanto subia as escadas do prédio, Sam reclamou do fato de não terem pego o elevador.

— Vou ter um ataque cardíaco!

— Já estamos quase lá.

— Para você é fácil falar, seu filé de borboleta. — Sam colocou o pé no último degrau, e comemorou que havia chegado.

      Antes de bater na porta, Johnny encostou a orelha na madeira envernizada, no interior do apartamento havia alguém que contava de zero a dez.

— É melhor voltarmos depois, parece que tem alguém com ele.

— Que nada, o tio Daniel é mais solitário que o próprio vazio. — Sam bateu na porta e chamou por Daniel. — Ei! Tio Daniel! Você está aí?

     Alguns minutos de silêncio deixaram Sam angustiado, o que o fez bater ainda mais na porta, até a voz brava de Daniel ecoar enquanto destrancava a porta.
     Daniel fez menção para que os garotos entrassem. Johnny sentou sobre o sofá branco de couro e analisou o recinto. Ele pegou uma foto que estava na mesa de centro, onde Silver e Daniel apareciam jovens e alegres. Johnny se perguntou como Daniel se tornou um adulto solitário e depressivo. Logo,  Johnny se recordou do caminho vingativo que Danie trilhou e sua caçada por Lebre Branca. De certa forma, o garoto percebeu estar no mesmo caminho. Ele soltou a foto no lugar, um indicativo de que não ligava para as consequências de seus atos.

— Fala o que vocês querem.

      Sobre a mesa de centro, ao lado da foto, havia um origami da sorte, o que chamou a atenção de Johnny. Esse pode ter sido o motivo de Daniel estar contando antes de abrir a porta.

— Quer escolher um número? — Daniel pegou o origami da mesa.

— Isso é besteira!

— Vai escolhe, vai ser divertido.

— Sete.

     Daniel contou de um a sete e desdobrou o origami onde havia parado.

— Ignóbil!

— Pera o quê? — Johnny puxou o origami das mãos de Daniel e viu que estava sem escrita — Isso não vale!

     Sam adentrou a sala com um gato preto nas mãos, o que chamou atenção dos presentes.

— De onde tirou esse animal? — Daniel disse ao pegar uma caneta.

— Se eu responder, você vai dizer “Estava falando com o gato” — Sam soltou o gato sobre o chão.

— Os gatos são usados como familiares das bruxas, vai ver foi por isso que ele gostou de você.

— Como você descobriu? — Daniel se ergueu do sofá e foi em direção à cozinha. — Você sabe que isso coloca a vida do Sam em perigo? Paladinos não caçam só vampiros; eles caçam demônios, espectros da morte e tudo que foge da percepção humana. — Daniel largou um prato com sardinha sobre o chão para o gato. — As bruxas eram caçadas na inquisição por Paladinos. Desde então Paladinos e bruxas são inimigos mortais.

— O senhor Silver quebrou as regras deixando o Sam entrar para Ordem dos Paladinos. Um bruxo como Paladino.

— Se alguém além de mim e você souber, o Silver será expulso da Ordem, o Sam será executado e você vai ter os ossos triturados por mim.

— Eu nunca contaria isso.

— Mas você disse... — Antes que Sam pudesse terminar, levou uma cotovelada do Johnny, o que fez ele calar a boca.

— Eu quero ser o próximo Paladino Azul! Você pode convencer o Silver e meu pai a me deixar tentar.

— Você nunca passaria no teste, por isso não foi escolhido de imediato.

— Mas...Mas...

— Somente aqueles de coração puro podem herdar o poder do Paladino Azul.

— Mas quem decide isso? Como uma pessoa é julgada boa?

      O brilho nos olhos do Johnny transparecia raiva. Ao ver esse ódio, Daniel percebeu que o garoto nunca fora o Paladino Azul. No entanto, ele quis apostar, pagar para ver.

— Você já viu um cachorro quando ele é mal tratado? Ele apanha desde filhote e quando cresce, todos que se aproximam dele são feridos. É como dizem “A fera ferida, ferir se torna seu conceito”. Vou pagar para ver se a fera pode se tornar algo melhor.

— E você nem precisou chantageá-lo.

     Sam disse há Johnny, mas percebeu que fez mal ao ver a cara de bravo de Daniel



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