Volume 1
Capítulo 18: Possuído
Crossy passou a noite acordado, nunca tinha trabalhado em ácidos e venenos, então trabalhou na base de tentativa e erro. No começo, temia que causasse explosões quando mexesse com o ácido, porém apenas uma nuvem de gás era expelida quando ele misturava o elemento errado.
Não que isso não fosse preocupante! Mas era no mínimo um pouco melhor, o teto do quarto não derreteu então... tudo parecia bem.
O sol já raiava quando o garoto finalizou seus experimentos.
a...
Ufa...finalmente terminei!
Consegui fazer bem pouco das duas, mas aprendi muito sobre venenos e ácidos! Talvez Michiko possa envenenar a adaga dela, acho que seria útil.
O garoto se espreguiçou e andou para o andar de baixo, onde o café da manhã estava sendo servido. Estava com tanta fome que encheu seu prato com pães e ovos cozidos, deixando o atendente perplexo.
Cara.... Ser rank B é demais! A comida e hospedagem é de graça! Tudo bem que esse pão não tem o melhor gosto do mundo, mas saber que não vou morrer de fome é no mínimo algo relaxante.
— Oh! Você já acordou? — questionou uma voz fina.
— Bom dia, Michiko! Pra falar a verdade eu nem dormi.
A garota parecia estar de bom humor, rapidamente pegou um prato e começou a se servir junto com Crossy, comendo tanto quanto ele.
— Sério? Por quê?
— Passei a noite trabalhando com o ácido e o veneno que comprei! São muito interessantes! Pareciam muito complexos no início, mas até que não são depois que você aprende a equalizar a solução!
— Não entendi! Mas fico feliz por você!
Crossy riu educadamente e continuou comendo seu pão com ovo, Michiko fez o mesmo. Aquela refeição juntos lembrou o garoto de como ela agia antes.
— Sabe Michiko, você contumava ser bem mais tímida! Fico feliz que esteja se sentindo mais confortável comigo e com o Leo, afinal, agora somos um time!
— A-Acho que sim! Vocês são legais, sinto como se fossemos amigos antigos! Acho que arriscar a vida juntos cria intimidade bem rápido...
— Imagino que sim — respondeu Crossy, finalizando sua refeição.
Os dois sorriram gentilmente um para o outro.
— Eu me sinto tão incrível sendo uma aventureira rank B! Que tipo de missões será que vamos pegar agora?
— Espero que os inimigos sejam bem fortes! — disse uma voz grossa e rouca.
Os aventureiros viram Leo, se espreguiçando e sentando na mesa.
— Bom dia, Leo! Você precisa ver o curandeiro hoje, Olka disse que é velho amigo dele, tá lembrado? — perguntou Michiko.
— Vou ver porra nenhuma! Como se eu fosse deixar um primata me curar...
— Ei, já disse pra você parar de chamar humanos de primatas! — advertiu Crossy.
— Por que!? Não é o que vocês são afinal!?
— Claro que não! Quero dizer... tecnicamente sim! Mas...
Crossy percebeu que todos no refeitório estavam olhando para seu grupo. O local era uma hospedagem patrocinada pela guilda, então muitos aventureiros marrentos pareciam irritados com o barulho de Leo.
— É melhor a gente sair desse lugar — sussurou Michiko.
Rapidamente o grupo foi para fora, dando de cara com Olka totalmente bêbado, sentando na calçada. Observaram a cena com tédio.
— De novo isso? — questionou Michiko.
— É melhor ir se acostumando — respondeu Crossy.
O regente abriu a boca e começou a balbuciar algumas palavras sem sentido.
— V-Você não vai me matar... Yharon! Seu desgraçado!
Quando terminou de xingar, o velho socou a parede da hospedagem com força. O ataque criou um buraco enorme na parede, rachando a estrutura inteira.
Todos na pousada ficaram alerta, sacando suas espadas, preparando seus tomos e olhando para a direção do ataque.
— É-É UM MONSTRO!?
— Oh, eu errei... a porra do ataque.
O grupo de aventureiros estava perplexo, porém, Crossy se preparou rapidamente e disse:
— Vamos segurar doido bêbado logo!
— Espera... essa é a voz do pivete! — disse Olka, parecendo um pouco mais lúcido.
— Ei! Crossy! Por que você...
— Feitiço de fogo: Akara! — encantou um mago.
Antes que pudesse terminar a fala, uma magia de fogo atingiu Olka diretamente. Foi lançada por um dos magos dentro da pousada, sua aparência era assustadora, com uma túnica preta e olhos vermelhos como sangue.
Todos na hospedagem esperavam que o feitiço destruisse o invasor, porém Olka deu um tapa no próprio rosto, criando vento o suficiente para esvair as chamas como se fossem nada.
A cara do regente ficou mais séria do que nunca, ele entrelaçou seus dedos e se agachou um pouco. Todos no ambiente puderam sentir um medo profundo, um calafrio vindo da alma.
— Finalmente te achei... Yharon! Quero ver você sobreviver a isso... Feitiço de invocação: Hyoragami!
O local ficou em silêncio absoluto, todas as vozes perderam o som, a mana se localizou nos punhos de Olka, como um concentrado de energia. Crossy não podia se mover, seu corpo tremia incessantemente graças a energia absurda.
De longe um homem chega correndo, ignorando a pressão absurda do feitiço e aparecendo em uma velocidade incrível do lado de Olka.
Era baixo, seu cabelo era o clássico "cabelo de tigela", parecia de descendência asiática. Estava vestindo uma túnica verde com alguns símbolos dourados.
— E aí? Quanto tempo Olka! Eh... acho melhor eu cancelar isso — disse a pessoa misteriosa, com uma voz gentil.
Assim que o homem estranho tocou na cabeça de Olka, faíscas vermelhas corromperam o feitiço, toda a pressão sumiu e a mana voltou a circular normalmente na área.
— Sabe... não é uma boa ideia lançar esse feitiço aqui, a não ser que você queira destruir a cidade toda...
— Mazo? Por que você cancelou a invocação!? Eu iria matar o Yharon! Não se lembra da guerra!? — questionou Olka, com uma voz oscilante, porém repleta de fúria.
— Calma, calma — repetiu gentilmente o estranho — Yharon não está aqui meu velho amigo, você andou bebendo de novo? Se o alto escalão saber disso...
— EU TÔ POUCO ME FUDENDO PRA AQUELES FILHOS DA PUTA! — gritou Olka, golpeando a parede da hospedagem novamente em fúria.
A estrutura da hospedagem se quebrou completamente, assim que o prédio começou a desmoronar o estranho olhou com seriedade e disse:
— Deixa que eu cuido disso — Mazo juntou seus dedos indicadores — Makagama.
Uma aura azul celeste envolveu os escombros enquanto eles estavam caindo, toda a mana se uniu e agarrou tudo que foi destruído como um pano. Assim que tudo estava envolvido foram gradualmente voltando ao lugar, a mana estava reconstruindo a estrutura, revertendo a destruição.
— Q-Que magia incrível! — afirmou Michiko — E-E nem precisa encantar!? Que majestoso! Algo tão poderoso com somente um gesto de mão e uma palavra!?
Mazo sorriu gentilmente enquanto olhava para a garota. Sua magia reconstruiu o prédio inteiro destruído por Olka, parecia novo em folha.
— Que tal a gente ter uma conversinha, Olka?
— Tá, tá! Que saco! — respondeu o regente, segurando um cigarro e tentando acende-lo com uma pequena chama, que invocou em seu dedo.
Quando aproximou a chama para seu cigarro ela sumiu, como se tivesse sido soprada bem forte.
— Acho melhor você se concentrar...
— QUE MERDA! DA PRA VOCÊ PARAR DE CANCELAR TODA MAGIA QUE VÊ!?
— Hahaha! Foi mal, é a força do hábito!
Antes que pudessem ir para um lugar reservado, os aventureiros de dentro da pousada perceberam que Olka estava saindo ileso, portanto, cobraram alguma atitude de Mazo.
— Ei! Mazo! Você é do alto escalão! Vai deixar um maníaco desses sair impune? — gritou um aventureiro rank B.
— Exatamente! Ele quase matou todos nós! E também...
— Calem a boca seus lixos, se retirem agora antes que eu mate vocês, tudo bem?
Mazo dizia tudo com muita calma, era assustador, seus olhos gentis pareciam mais ameaçadores do que a raiva repentina de Olka, o que combinado com seus poderes misteriosos o tornava um sujeito misterioso e muito perigoso.
— Então, vamos lá?
— Esperem! Será que a gente pode ir com vocês? — questionou Michiko.
Crossy ficou confuso, "por que ela iria querer andar com esses dois malucos?", porém depois de ver a expressão enigmática de Mazo finalmente entendeu.
Parando pra pensar... ele é um sujeito muito forte, não entendo muito de magia elementar nem sobre mana, mas se ele consegue impressionar a Michiko, que a maga mais forte que eu conheço, então esse cara tem muito pra ensinar.
— Eu pensei que tinha dito para todos os lixos se retirarem...
Olka agarrou o ombro do amigo com uma expressão ameaçadora e disse:
— Ei, esses aí são meus discipulos.
Mazo ficou de queixo caído, ele perguntou diversas vezes para si mesmo se tinha mesmo ouvido aquilo, olhou para o grupo de Olka com tanta surpresa que eles pareciam até mesmo sobreviventes de uma guerra.
— Nem ferrando que você aceitou ensinar de novo! Isso é ótimo Olka!
— Não enche Mazo, vamos acabar com isso logo, quero comer alguma coisa.
Olka andou o caminho todo para a padaria com raiva, pensando em como odiaria a conversa que estava por vir, porém, Mazo continuava olhando para Crossy, Michiko e Leo, totalmente surpreso e empolgado.
Antes de chegarem Michiko se aproximou de Mazo e começou a conversar com ele.
— Então... você consegue cancelar magia? Como faz isso?
— Oh, você é a maga do grupo?
— S-Sim! Q-Quero dizer... eu só sei o básico, espera, como você soube?
— Sua mana tem um fluxo bom, é claro que tem algumas imperfeições... mas você definitivamente é uma maga de fogo habilidosa.
— Espera! Consegue saber que eu sou uma maga de fogo só vendo minha mana? Que incrível!
Mazo sorriu gentilmente.
— Bom, respondendo sua pergunta... a mana tem um fluxo muito difícil de se mudar, mas, digamos que tem uma forma de reverter esse fluxo, é algo difícil de se fazer na primeira vez, quando você consegue, cria tipo uma mana com energia negativa, que aniquila a mana positiva.
Michiko prestou o máximo de atenção possível na explicação, porém mesmo assim não conseguiu entender boa parte da conversa.
— Infelizmente com seu nível atual creio que seja impossível... mas se você tiver interesse, eu posso te ensinar alguns feitiços!
— Oh! Eu adoraria!
Assim que chegaram todos se sentaram e fizeram pedidos simples, Mazo respirou fundo e começou a se apresentar:
— Olá, discipulos do Olka! É uma surpresa muito boa vê-los! Meu nome é Mazokuna, sou um mago do alto escalão, ex aventureiro de rank especial.
Todos os aventureiros arregalaram seus olhos e questionaram:
— Rank especial!?
Olka suspirou fundo e disse:
— É um rank acima do rank S, para chegar nesse nível precisa ser muito, mais muito forte, além de precisar de uma recomendação do alto escalão da guilda.
— Tanto que nós eramos um dos únicos! Haha! — zombou Mazokuna.
— O QUÊ!? VOCÊ RANK ESPECIAL!? — questionaram os aventureiros rank b.
— Por que essa surpresa? Espera... Olka, você não contou nada pra eles!?
O regente colocou sua mão na testa, com sentimentos de raiva e tédio visíveis.
— Olha... o passado não importa! E sim, eu costumava ser de rank especial, mas quando me revelei contra a família real o alto escalão me sabotou, atualmente sou rank S.
Mazo parecia um pouco decepcionado, embora tentasse manter a empolgação perante os dicispulos.
— E eu achando que você era um bêbado qualquer — disse Leo.
— Haha! Esse cara foi um dos mais fortes durante aquela...
— Não fale sobre isso Mazo — proibiu Olka, com uma seriedade anormal na voz, seus olhos estavam fixados no amigo.
Mazo rapidamente ficou sério também, sua empolgação e gentileza sumiram, adotando uma postura estranha ele perguntou:
— E por que não? Eles merecem saber a sua história, você é o mestre deles! Não acreditei que fosse ensinar ninguém depois do que aconteceu com Shinkouki.
Olka se levantou, sua aura estava praticamente explodindo em fúria, agarrou o pequeno homem pela túnida e disse:
— NÃO FALAMOS DO SHINKOUKI!
Depois de olhar severamente nos olhos de Mazo, Olka decidiu sair para tomar um ar, percebendo que não poderia lutar com seu antigo companheiro.
— Céus, o que deu nele? — questionou Crossy.
Mazo rapidamente voltou a ser gentil e falar com empolgação.
— Então, eu já me apresentei! Agora por favor se apresentem!
Os aventureiros olharam entre si e começaram a falar.
— Meu nome é Michiko, sou uma maga como você já sabe, aprendi magia na infância e desde então venho usando ela para tentar ganhar dinheiro para minha família.
— Que legal! É um objetivo bem nobre se me permite dizer!
— Eu sou Leo, sou um meio-fera leopardo, não entendo nada de magia a não ser a de transformação básica, luto corpo a corpo, se for em uma luta física ninguém me ganha!
— Wow, um porradeiro... isso é muito interessante!
Crossy suspirou e disse:
— Bom... meu nome é Crossy, eu luto usando algumas poções...
Mazo prendeu os olhos no garoto, olhando fixamente para ele, abriu a boca e disse:
— Mentira. Você não contou tudo!
— O quê!?
Antes que Crossy pudesse perceber, Mazo estava sentando em cima da mesa, de frente para ele, com um sorriso bizarro.
— Não sei muito sobre energia espiritual... mas você tem muita pra não ter citado nada sobre isso, então, pare de mentir, Crossy!
Mazo abriu a palma de sua mão e agarrou o pescoço do garoto, o levantando até o teto.
— Saia daí! Espírito medroso!
Crossy apertava o pulso de Mazo, em puro desespero. Michiko puxou seu tomo sem hesitar e Leo se transformou rapidamente, recitando seu encantamento como um sussuro extremamente baixo.
A garota mirou uma bola de fogo récem criada para a cabeça de mazo, enquanto Leo segurava a cabeça do homem com suas garras extremamente fortes, pressionando o crânio dele.
— Solta ele — mandaram Leo e Michiko.
— Eu vou soltar depois que eu entender o que ele é.
A cor de Crossy mudou, ele parou de pressionar o pulso de Mazo e simplesmente desmaiou. Michiko atirou sua bola de fogo, que fez todos no local saírem correndo, porém não causou nenhum dano a Mazo.
— Seu desgraçado! — gritou Leo.
O meio fera tentou tira-lo do chão com toda sua força, porém o aventureiro de alto escalão não se moveu nem mesmo alguns centimetros do chão.
— Que porra é essa!? — questionou Olka, vendo a cena — Explique-se Mazo! Agora!
— Vai ser mais fácil eu explicar daqui a três... dois... um!
Assim que finalizou a contagem Crossy abriu seus olhos, como se tivesse voltado a respirar, embora a pressão continuasse a mesma. Os olhos verdes do garoto mudaram para olhos vermelhos escarlate, a ponta de seus dedos necrosaram e se tornaram puro osso.
Mazo sorriu e disse:
— Quem diria... isso é loucura.
Os olhos vermelhos do garoto se voltaram para Mazo, que estava super empolgado. O ser fincou seus dedos no pulso do aventureiro e disse, com uma voz tremendamente assustadora:
— Me solta, humano maldito!
Uma aura maligna na cor roxa impermeava o corpo do ser, conforme o tempo passava a pele do garoto se tornava mais branca, até que fosse totalmente semelhante a ossos.
O lábio e bochecha do garoto tinham sumido com a transformação, deixando a mandíbula totalmente exposta, como um esqueleto morto-vivo.
— É-É o Licht! — afirmaram Leo e Michiko.