Padre em Outro Mundo Brasileira

Autor(a): Raphael


Volume 1

Capítulo 13: Lorde das almas

— Agora vamos almoçar! 

A comida da senhora era deliciosa, tinha um gosto semelhante a culinária de Icarus, o que rendeu a Crossy e Leo uma sessão de nostalgia. 

O almoço era um belo ensopado de carne, com alguns vegetais que o garoto nunca tinha provado. 

— Vanda... essa carne é maravilhosa! Parece diferente das outras, é de qual animal? — questionou Crossy. 

— Fico feliz que gostou! É carne de besta mágica! Muitas delas ficam andando pela floresta de Eldia aqui perto... 

Os novatos quase se engasgaram quando ouviram a resposta. 

— BESTA MÁGICA!? — berraram todos ao mesmo tempo. 

— A senhora consegue caçar isso nessa idade vovó!? — disse Leo, com um tom engraçado. 

— Oh não! Meus espíritos fazem este trabalho pra mim, e não me tratem como se eu fosse fraca! Pode não parecer..., mas na idade de vocês fui uma grande maga espiritual! 

— Maga espiritual? — questionaram Michiko e Crossy. 

Vanda se levantou e pegou sua bolsa de couro, soltou seus cabelos brancos e disse com entusiasmo: 

— Magos espirituais lutam utilizando espíritos e almas! Minha especialidade são com youkais e almas acorrentadas. 

A senhora estendeu sua mão para dentro da bolsa, onde retirou uma pequena esfera, totalmente perfeita. A esfera era transparente como vidro, dentro dela parecia que tinha uma tempestade vermelha de sangue, emanava uma energia estranha para os garotos. 

Assim que apertou um pouco a esfera a tempestade vermelha saiu dela, como um redemoinho girou por toda a casa e então caiu com toda a força sobre a mesa, porém, não destruindo nada, como se fosse fumaça.  

Do caos surgiu um espírito estranho, parecia um pequeno lobo ciano, com olhos amarelos e garras afiadas, ele flutuava como uma pena envolta da sua dona. 

— Este aqui é Suguru! Encontrei ele vagando por Eldia há dez anos atrás, era um espírito vingativo de um lobo que caçava e matava diversos caçadores. Livrei ele da energia maligna e desde então tem lutado ao meu lado! 

Crossy não pode segurar seu entusiasmo e interesse, a criatura parecia mística, era extremamente bela, embora pudesse parecer ameaçadora. Leo não conseguia sentir o mesmo, para ele a criatura era como uma assombração, portanto se manteu longe dela e para Michiko ela era extramemente fofa. 

— Será que... eu posso tentar tocar nela? — perguntou Crossy. 

— Receio que não seja uma boa ideia — respondeu Vanda — Suguru não costuma ser muito receptivo com outros humanos, mas você pode tentar. 

Mesmo com o aviso o garoto andou em direção ao lobo, estendeu sua mão com um certo medo, porém o espírito se esfregou nele com grande afeto, como se fossem amigos de longa data. 

— Impressionante! — afirmou Vanda — Nunca vi ele gostar tanto de outro humano! Talvez você tenha um dom com os espíritos garoto!  

Aquela última frase fez Crossy se sentir desconfortável. 

Depois da tentativa do garoto, Michiko também tentou se aproximar, porém Suguru rosnou como um demônio quando a garota estendeu sua mão em direção a ele. 

— Por que só você consegue!? — questionou a menina. 

— Hahaha! Não fique triste mocinha! Seu amigo deve ter uma enorme energia espiritual! É algo incrivelmente raro. 

— Acho que devemos falar com Olka logo — disse Leo, desconfortável. 

— Ok, podem ir na frente por favor? — pediu Crossy. 

Os amigos estranharam o pedido, porém o aceitaram e foram para a guilda. 

— Vovó dos espíritos... posso conversar um pouco com você? — questionou Crossy, desconfortável e ansioso. 

— Claro, garoto! 

— Você acha que Deus existe? — perguntou o garoto. 

— Como assim? 

— Digo, um Deus onisciente, onipotente e onipresente! Alguém que condene e salve os humanos pelos seus atos, entende? 

Vanda parecia pensar um pouco, refletindo consigo mesmo, depois de algum tempo ela respondeu: 

— Nunca conheci um panteão com somente um Deus. 

— O quê? — respondeu Crossy, surpreso. 

— Existem várias religiões, garoto. Os Deuses vêm abençoando certas culturas e destruindo outras através dos séculos. 

— Tá, mas... e se existisse um único Deus? E você... conhecesse ele? O que faria? Como seguiria sua vida? 

Merda! Por que estou perguntando isso!? Ela não vai saber me responder nunca! 

— Acho que me sentiria em paz — respondeu Vanda, com um tom agradável e relaxante. 

A resposta foi um baque para Crossy. O garoto sentia um grande incômodo desde quando renasceu, repleto de dúvidas e desejos sua mente entrou em conflito. 

— Mas por que está me perguntando isso?  

Um silêncio se instaurou entre os dois, a mente de Crossy pensava em milhares de coisas. A mente de adolescente brigava com a mente de adulto, porém, os sentimentos falaram mais alto. 

— Eu reencarnei nesse mundo... não sei como você vai reagir a isto, talvez pense que sou louco, mas eu não aguento mais esconder isso! Eu vivia em um mundo completamente diferente, até que morri e fui para um paraíso! Mas depois eu simplesmente... caí para esse mundo. 

A expressão de Vanda era de surpresa, porém sem interromper ela prestou atenção na história do garoto, se surpreendendo cada vez mais. 

— Tem sido... difícil! Muito difícil! Na teoria eu tenho mais de quarenta anos! Mas toda hora me vejo tomando atitudes idiotas! Parece que a mente desse corpo briga com a minha! Nem sei se ainda sou eu mesmo!  

Crossy começou a se desesperar, ele reviveu tudo que passou desde sua morte, repleto de traumas ele chorou sem nem mesmo perceber. 

— D-Digo! O que eu deveria fazer!? Será que estou sendo punido pelos meus pecados? Será que devo ser um herói ou algo do tipo? EU NÃO SEI DE NADA! 

Quando percebeu o garoto estava sendo abraçado pela idosa, em prantos ele revelou todo seu desespero e confusão. 

— Você... não acredita em mim — disse Crossy, sem forças. 

— Nada é impossível nesse mundo, mas se quer um conselho, você deve fazer o que quiser! Viva! A maioria dos espíritos que conheci se arrependiam de nunca terem seguido seus sonhos, se esse Deus que você disse é tão benevolente, então você deve viver. 

Ela... tem razão, eu quero viver! Minha vida passada foi um total lixo, eu... não posso gastar essa também! 

O garoto se levantou em uma onda de entusiasmo. 

— M-Muito obrigado! Vou seguir seu conselho! — afirmou Crossy, secando suas lágrimas. 

A senhora sorriu enquanto se despediu do garoto, sentia uma imensa felicidade observando seu entusiasmo.  

O garoto saiu da casa correndo em direção a guilda. 

— Que garoto... interessante — sussurrou Vanda. 

— Acha que o que ele está falando é verdade? — questionou Suguru, o espírito. 

— Por que não poderia ser? Uma velha como eu não tem o direito de duvidar da juventude, de toda forma, ele tem problemas e está lutando contra isso, pra mim é a única coisa que importa. 

O espírito parecia ter se conformado com a resposta. 

— Olka... realmente encontrou jovens interessantes desta vez. 

Crossy correu tanto que chegou um pouco depois de seus amigos. Quando entrou pelas portas quase caídas da guilda viu Leo entregando o cartaz verificado magicamente para Olka. 

A face do chefe mudou totalmente, ele sorriu intensamente de uma forma bizarra. 

— Finalmente! Achei novatos que prestam pra algo! — gritou Olka erguendo os braços para cima. 

— Está decidido! Vou levá-los comigo nessa missão Eva! 

Os olhos da recepcionista ficaram esbugalhados e ela gritou do fundo do coração: 

— VOCÊ É MALUCO!?  

— Quero dizer... que você é maluco eu tenho certeza! Mas não pode ser tanto assim! — continuou a recepcionista — É uma missão para caçar vampiros na floresta da morte! Precisa de no mínimo um grupo de 6 ranks b talentosos! 

— Sem preocupação! Eles estão comigo! E nada nem ninguém me vence! — disse Olka, com um sorriso confiante. 

Eva respirou fundo e continuou. 

— Olka, você é forte! Não tenho dúvidas que consiga exterminá-los, mas você vai arriscar a vida deles! 

Crossy observava a discussão junto de Michiko e Leo, que pareciam tensos sobre a ideia de enfrentar vampiros. 

— O ministro da guilda nunca permitiria isso! — berrou Eva. 

— Ainda bem que ele não vai saber — falou Olka, com um sorriso arrogante. 

— Estou falando sério! 

— Tá, tá, tá! Sem vampiros...  

O veterano andou até o painel de missões com os olhos fixados na recepcionista, rapidamente ele leu algumas missões e suspirou. 

Só tem coisa idiota aqui... Slimes, pessoas desaparecidas, ladrões? Que sem graça... Espera aí... Esqueletos no cemitério de Hage? É de rank C... Deve ser um Licht de nível baixo, ele tem que morrer antes de ficar mais forte, é perfeito! 

Rapidamente o homem arrancou o papel do painel e entregou a eva, que fez uma cara emburrada e disse: 

— Mesmo sendo um pouco mais seguro... ainda é muito perigoso! É um licht! 

— De baixo nível! — argumentou Olka — Esses novatos aqui conseguem quebrar alguns ossos! Sem falar que os três tem uma boa energia espiritual, não tem perigo algum! Não comigo lá! 

Depois de encarar Olka por um tempo Eva cedeu e permitiu, carimbando o cartaz da missão com um selo mágico, fazendo o papel tomar uma coloração amarelada.  

— Vamos garotos! Está na hora de brincar um pouco!  

Os novatos tentaram dizer que estavam cansados e com fome, porém Olka os fez pegar a estrada mesmo assim. Rapidamente atravessaram as estradas graças aos cavalos que a guilda fornecia, eram robustos e enérgicos, conseguiam correr por horas, embora comessem muito. 

Mesmo com a força dos cavalos no final da tarde o grupo decidiu parar. 

— Vamos montar um acampamento! — disse Olka. 

— Você não disse que dava pra chegar lá até o final da noite? — questionou Michiko. 

— Bom, sim, mas monstros assim ficam mais poderosos ao luar! E eu quero conhecer vocês melhor. 

— Pode começar sabendo que estou com fome — falou Leo, com um toque irônico. 

Olka emburrou a cara e dividiu as tarefas para cada um. 

— Ei, garota, você faz a fogueira, o meio-fera vai te ajudar e o garoto idiota vai me seguir. 

— Tudo bem — responderam os três. 

Crossy seguiu Olka através da mata, sem saber o que seu chefe pretendia fazer. Conforme escurecia ele viu o regente acender um cigarro marrom e se virar. 

— Aqui deve ser longe o suficiente, ei, moleque, A velha Vanda aprovou você, não é? 

— Haha, ela te falou? 

— Suguru me falou. 

— Ah. 

Olka soltou a fumaça para o lado e olhou nos olhos de Crossy. 

— Ele me disse que sua energia espiritual é gigantesca, o suficiente para ver os youkais da velha, então você tem um poder que no momento não usa. 

— Vamos enfrentar um Licht de baixo nível, eu não pretendo intervir, então se querem cuidar dele sozinhos, você vai precisar usar essa energia gigantesca. 

— Pera aí! Como assim não pretende intervir? — interrompeu Crossy. 

— Ué, vocês vão fazer a missão, eu só vou observar para caso der merda — explicou Olka. 

— Mas essa missão não é... tipo, muito mais difícil do que as missões que deveríamos estar fazendo? 

— Pra tudo tem um começo, para de chorar. Agora eu vou te ensinar o básico da energia espiritual, então vê se presta atenção! 

O regente se sentou no chão com suas pernas cruzadas e Crossy fez o mesmo. 

— Cada ser humano tem um certo controle sobre sua alma, esse controle e a manipulação da energia espiritual. É como se sua alma fosse uma taça e você moldasse o líquido como quisesse, podendo até controlar outros corpos, como os youkais que a velha usa. 

— A questão é — continuou Olka — Você tem uma taça que transborda energia e não faz nada com ela. Não faço ideia do porquê, mas tenho uma ideia de como resolver. 

Olka colocou a palma de sua mão na testa de Crossy, o garoto sentiu uma pressão esmagadora, diferente do poder que ele usou para subjugá-lo no começo, era uma pressão quase que divina. 

— Não ouse desmaiar! Precisa resistir a tranca! 

Uma luz branca extremamente forte saiu da testa do garoto como um raio, ela iluminou o lugar em que eles estavam em um instante. 

— Q-Que energia incrível! Continue fluindo garoto! 

A luz branca cessou, Olka pensou que tinha acabado, porém quando tentou retirar sua palma algo a mais saiu, uma energia negra, totalmente maligna, que rastejou pelos braços do regente como tentáculos e se expandiu pelas árvores como um parasita. 

— I-Isso é... energia demoníaca... Não, impossível! Será... Miasma? Não faz sentido estar incrustrado na alma! 

O corpo de Crossy estava quase que completamente negro, emanava uma energia com aparência carmesim, era repulsiva. Todos os animais em um raio de um quilometro saíram correndo, predadores e presas fugindo lado a lado. 

Um mau sinistro foi liberado. 



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