Padre em Outro Mundo Brasileira

Autor(a): Raphael


Volume 1

Capítulo 12: Espíritos são estranhos!

Depois de muita bebida e farra os novatos finalmente apagaram na mesa. Crossy foi o primeiro a acordar. Tomou um susto quando percebeu Leo estirado encima da mesa e Michiko encolhida no canto.

— Cacete... que horas são?

— Sete horas da manhã, tá na hora de trabalhar, pivete.

O garoto tomou um susto graças a voz grossa que emergiu de repente, se virou e viu Olka, fumando um cigarro, sem camisa.

O superior cheirava a torresmo velho e bebida, tinha uma cara de cansaço e tédio.

— Oi, Olka... como assim trabalhar? — perguntou o novato, tentando manter a calma.

— Tá na hora de pegarem sua primeira missão, moleques!

— SÉRIO!?

Os outros rapidamente foram acordados pela ansiedade de Crossy. Leo e Michiko pareciam confusos, porém se esforçaram ao máximo para prestar atenção em Olka.

— Então!? Vamos caçar uma besta ou algo assim!? — perguntou o meio-fera.

— Que nada — respondeu Olka, com um tom simples e engraçado.

— O gato da senhora Vanda sumiu faz três dias! Localizem o pestinha e tragam ele antes do meio-dia!

A face dos novatos era hilária. Crossy tinha uma cara de ódio, Leo parecia não acreditar e Michiko estava muito decepcionada.

— VOCÊ FERROU NOSSO TESTE E QUER MANDAR A GENTE PRA UMA MISSÃO ASSIM!? — questionou o garoto.

— Como assim, pivete? O desaparecimento de um pet é extremamente preocupante! HAHAHA!

Os garotos começaram a reclamar e gritar alto enquanto Olka ria. Sem qualquer preocupação ele estendeu o cartaz do animal até Crossy, que o pegou com angústia no rosto.

Olka viu a cara desanimada dos novatos e parou de rir, coçou a cabeça com uma mínima expressão de culpa e disse:

— Vamos lá... Essa é a melhor missão para o rank F que eu achei...

— É O QUÊ!? — gritaram os novatos.

— Vish.

— COMO ASSIM RANK F!? NEM FIZEMOS O TESTE DIREITO POR SUA CULPA! — reclamou Leo.

— VAMOS TER QUE CAÇAR GATINHOS POR MESES GRAÇAS A SUA IDIOTICE!? — perguntou Crossy.

— I-ISSO É UM ABSURDO! — completou Michiko.

A face de Olka estava estranha, não aparentava preocupação nem nada, era como se estivesse pensando:

E agora... qual desculpa eu invento?

— O-Olhem... eu vi potencial em todos vocês! Belos guerreiros começam de baixo sabia?

— TEU CU! — gritaram os novatos

— CALEM A BOCA! — ordenou Eva, que entrou pela porta dos fundos.

Os novatos exigiram explicações da recepcionista, que apenas olhou para Olka e seu sorriso ousado. Eva suspirou decepcionada depois de dar uma bronca no regente, que apenas disse:

— Relaxe, relaxe... não é o que pensa... Enfim, vão logo, pivetes!

Assim que pisaram fora da guilda Olka e Eva suspiraram aliviados.

— Tem que parar de fazer isso, sabia?

— Relaxa! Esses moleques são diferenciados!

Mesmo indignados, os novatos caminharam para fora da guilda. Crossy reclamou o caminho todo até a casa da senhora Vanda, porém, antes de acordar a idosa o grupo decidiu tomar café da manha (graças a barriga falante de Leo.)

Crossy pediu um pão seco, enquanto Leo exigiu um pedaço gigantesco de carne e Michiko pediu apenas um café.

— Sério! É um absurdo! Que missão ridícula! Tudo por causa de um regente preguiçoso! — reclamou o garoto.

— Olhe pelo lado bom, Crossy! Você não trouxe muitas poções para o teste... se ele tivesse pegado pesado podíamos ter reprovado! — argumentou Michiko — Vamos tentar nos destacar nessa missão! Aí ele pode reconsiderar a avaliação!

— Como se esse viado fosse escutar a gente! — insultou Leo — Caralho! Cadê minha carne!?

O atendente tentava dizer para Leo que eles não tinham carne de javali da montanha, porém a fera se recusou a dar ouvidos, até que Crossy o impediu com um sinal de mão.

— Eu estava pensando... e se essa missão... não for o que parece ser?

— Como assim? — questionaram Michiko e Leo.

— Tudo parece tão estranho... Claro, Olka parece ser um idiota, mas o cara é um veterano super forte! Se ele viu algo na gente, não tem porquê nos mandar pra uma missão tão idiota!

Os dois amigos reagiram com surpresa, como se fosse algo óbvio, mas impressionante de perceber. Rapidamente eles correram para a casa da senhorinha, sem pagar é claro.

A casa de Vanda era antiga, tinha uma cor bege clássica. O cheiro do interior remetia a um incenso que Crossy poderia jurar ser uma das plantas que cultivou na casa de Icarus, o que o trouxe uma imensa nostalgia.

— Então... Tem alguma ideia de onde seu gato pode estar? — perguntou Michiko, com um sorriso reconfortante.

— Ele costuma sair pelos fundos! Mas nunca ficou tanto tempo fora! Tenho certeza que não foi muito longe! Por favor, jovens... Salvem meu Mike!

Meu deus... até nesse mundo dão nomes de humanos pra animais de estimação? Sempre achei isso estranho pra caramba.

— Vamos procurar na praça primeiro — disse Crossy.

Os novatos levantaram rapidamente, Leo e Michiko pediram licença e saíram, porém, Crossy ficou parado por alguns segundos dentro da casa, se lembrando de Icarus e da despedida.

— A-Algum problema, garoto? — perguntou Vanda.

— Ah! Não é nada senhora... Eu só... sinto saudades de casa.

A idosa se aproximou do garoto e deu alguns tapinhas nas costas, com um sorriso gentil ela disse:

— Você parece ser um bom garoto! Tenho certeza que vai reencontrar sua família logo! Aqui, leve um biscoito!

Crossy pegou o biscoito da senhora, era feito de uma espécie de trigo, tinha um cheiro amanteigado e extremamente convidativo. Repleto de felicidade o novato o guardou na mochila e se despediu.

— Boa sorte! — disse Vanda.

— Obrigado! Nós vamos achar o seu gato!

Ao sair Crossy encontrou seus dois amigos esperando do lado de fora, aparentemente discutindo sobre como iriam se dividir para procurar o gato. A cena, embora simples o surpreendeu, Leo não costumava se dar muito bem com outras pessoas, mas estava lá conversando e discutindo saudavelmente com Michiko, que parecia bem confortável.

— Então... vocês definiram alguma coisa?

— Sim! Eu vou procurar na praça pública e Leo vai procurar nas redondezas! — respondeu Michiko.

— Pelo que eu sei, tem uma mata bem profunda por aqui! Acho que consigo me virar mesmo sem falar com outros animais igual você! Haha — completou Leo.

Caraca... eles tão se virando! Tô tão orgulhoso... Quase não consigo acreditar! O Leo socializando? Parece até piada!

— Bom... Eu vou tentar procurar informações! Vamos lá!

Com uma rápida resposta entusiasmada, os novatos foram cada um para seu lado. Leo rapidamente entrou na mata e começou a procurar pelas árvores, Michiko tentou interagir com alguns aldeões na praça e Crossy andou pelos becos da cidade em busca do gato.

Duas horas se passaram, os aventureiros estavam sentindo os efeitos de não tomar café da manhã conforme se aproximava a hora do almoço.

Porra... Eu não defini nenhum horário pra a gente se encontrar! As aranhas não sabiam de nenhum gato foragido e a poção já acabou... Isso vai ser mais difícil do que eu imaginei.

— Crossy! Achei! — gritou uma voz feminina.

Enquanto o garoto caminhava por um beco escuro e estreito ele ouviu uma voz fina, um tanto quanto doce...

O quê? Parece a voz da Michiko... mas ela não foi para o lado contrário?

— M-Michiko!? Não estou te vendo!

— Onde você... está?

Na frente de Crossy um ser emergiu da escuridão, com uma coloração vermelho sangue, repleto de manchas brancas em formato de espiral.

É o gato! Finalmente achei ele! Mas... cadê a Michiko? Ela deveria estar com ele!

Que cores estranhas... Será que é de alguma raça desse mundo?

— Ei! Bichinho, você viu alguma garota por aí?

O gato olhou diretamente para Crossy, com suas pupilas estreitas e desconfiadas, ele parecia encarar a alma do garoto, que se arrepiou em um instante.

A alma do garoto congelou quando o gato abriu sua boca e disse:

— Por que está me perguntando isso, Crossy?

O quê... é isso? Eu estou ficando louco? Esse gato acabou de falar!?

Sem hesitar o garoto colocou as mãos na sua bolsa e agarrou uma poção e uma faca. O gato continuava o encarando, com uma face totalmente neutra, como se não soubesse o que realmente era, como se ele fosse algo diferente.

— O-O que você é!? — berrou Crossy — VOCÊ NÃO É UM GATO!

Pela primeira vez as pupilas do gato dilataram e sua feição mudou. Ele fez uma pose confortável e andou tranquilamente na direção do garoto.

Crossy segurou sua faca em direção ao animal, até que escutou outra voz familiar atrás de si.

— Ah! Finalmente achamos ele! — disse uma voz grossa.

— Nossa! Crossy encontrou o gato! — afirmou uma voz fina e fofa.

Desconfiado e repleto de adrenalina o garoto se virou e enxergou seus dois amigos, Leo e Michiko, que ficaram preocupados com a face extrema do amigo.

— P-Pessoal! Escutem! Ele não...

Antes que pudesse terminar de avisar Crossy viu o gato laranja se esfregando em seus pés, com uma feição amigável enquanto olhava para seus olhos, quase como se estivesse dizendo:

Silêncio, garoto idiota!

Michiko segurou o gato e começou a o abraçar, ignorando a preocupação de Crossy. Leo observou a cena com atenção, assim como Crossy ele percebeu algo diferente no animal, seu instinto gritava para mata-lo, porém o meio-fera o ignorou em respeito a amiga.

— Vamos entrega-lo a senhora agora? — sugeriu Michiko enquanto segurava o gato sem quaisquer preocupações.

— Pode ser — respondeu Crossy com um tom de seriedade.

O trio andou em ritmos totalmente diferentes para a casa de Vanda. Michiko ia na frente, cantarolando enquanto segurava o gato misterioso, enquanto Leo e Crossy ficavam atrás, observando o animal totalmente desconfiados e preparados para caso algo aconteça.

— Essa porra é um demônio — sussurrou Crossy no ouvido do amigo.

— Você também percebeu algo estranho nele? O que a gente deveria fazer? Michiko gostou dele...

— Foda-se se ela gostou dele! O gato falou Leo!

— Como assim!? — questionou o meio-fera, um pouco alto demais.

— Eu o ouvi dizer! Ele falou com a voz de Michiko! É uma criatura desconhecida!

— Da pra parar de fofocar vocês dois! — insultou Michiko — Vanda deve estar preocupada! Vamos apressar o passo.

O grupo chegou na casa da senhora e entregaram o animal, que olhou para Michiko com certo carinho e com olhos desconfiados para Leo e Crossy. Vanda derramou algumas lágrimas de felicidade quando viu o bichinho.

— Muito obrigado por terem recuperado ele! Não consigo imaginar como seria perder meu primeiro espirito...

— ESPIRITO!? — questionaram os aventureiros.

A senhora gargalhou com a reação dos garotos.

— Olka não falou pra vocês? — questionou Vanda — Aquele cara é um idiota!

Todos sentaram no sofá, atentos a explicação da senhora.

— Bom, meu caro bichinho é muito especial! Mike é um espirito dualista, ele tem duas almas contrárias dentro de si, as vezes é sério com algumas pessoas e fofo com outras.

— Olka achou que a gente não iria conseguir achar um gato maluco? — sussurrou Crossy no ouvido de Leo.

— A questão é... ele não aparece para pessoas comuns — explicou a senhora — Espíritos costumam ser meio... antissociais com humanos. Olka provavelmente queria testar a determinação e força de vontade de vocês.

— Por que a senhora não avisou isso pra gente!? — perguntou Leo — Eu tô sem almoçar até agora!

— Oh meu pobre garoto... Se eu dissesse não teria graça! Hahahaha...

Leo olhou a reação da idosa e um pensamento atravessou sua mente me um instante:

Velha desgraçada!

Porém incrivelmente ele conseguiu evitar de falar isso mordendo sua própria língua.

— Olhem pelo lado bom garotos! Se conseguiram achar o meu espírito isso significa que vão ser grandes aventureiros! Ele pode ser teimoso as vezes, mas o instinto de Olka nunca falha! Aquele veterano sabe mesmo reconhecer bons recrutas.

— Agora vamos conversar enquanto comemos! Eu preparei um almoço para animar vocês quando falhassem, mas vocês conseguiram! Esperem um segundo, vou confirmar que conseguiram fazer a missão.

Vanda segurou o cartaz da missão e colocou encima da mesa, estendeu a palma da mão no centro do papel e transmitiu sua mana. Uma pequena chama azul incendiou o papel, que adquiriu uma cor branca cintilante, como se tivesse sido limpo e renovado. Aquela era a indicação de que a missão tinha sido completa e aprovada por quem a requisitou.

— Agora vamos almoçar!



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