Volume 3
Capítulo 2: Apesar de tudo, Chinatsu Chitose não quer Desistir. ③
Após tocar o sinal do último período, saí da classe com a mente fervendo. Aquela situação se tornou um verdadeiro problema para mim. Se as coisas continuassem daquele jeito, ficarei sobrecarregado a ponto de não conseguir atender a todas as expectativas.
Desta vez, Kumiko expandiu nossa briga pessoal pra toda a escola. Pois, haviam pessoas solitárias como eu que sofreriam da mesma forma.
Decidi pegar algo gelado pra beber, já que um café apenas enrolaria meu estômago. Porém, quando cheguei na máquina de bebidas do corredor, me deparei com uma grande aglomeração de alunos rodeando os professores, incrédulos.
— Que tipo de acordo é esse?! — exclamou uma garota, aflita.
— Quem ficar de recuperação será punido e até expulso, é isso?! — retrucou outro garoto.
Eu peguei minha bebida e dei meia-volta, indo contra a correnteza de alunos que se reuniam cada vez mais entorno dos professores.
Geralmente detenho muito orgulho das habilidades que desenvolvi, mas depois do debate com Kumiko, minha mente parecia estar em frangalhos. Como terei que ir ao museu mais tarde, resolvi ir para casa pegar meus cadernos e estudar o máximo que podia.
Kumiko abalou minha autoconfiança com tanta facilidade... como?
Enquanto trocava de sapatos no hall depois de ter ajudado os membros do clube de artes a carregar os materiais, vi vários alunos do lado de fora com panfletos. Como a medida do Conselho Estudantil foi instantânea, os clubes resolveram agir rapidamente pra recrutar mais membros, e obviamente que o clube de artes foi incluso.
Como todos os clubes terão que fazer avaliações próprias para recrutar esses membros, o concurso de artes se tornou ainda mais necessário de ser divulgado.
Na caixa de sapatos, vi uma folha dobrada num canto. Meu coração bateu rapidamente e o peguei de imediato. Abri a folha e reconheci a letra de Kirisaki:
“Shiroyama, não sei se você já está sabendo da decisão do Conselho Estudantil de reforçar a penalidade dos alunos nos seus rendimentos das avaliações... como estou no terceiro ano, é ainda mais difícil para nós. Acho que é melhor que esperemos esse período conturbado passar para conversarmos.”
Kirisaki teve uma consideração incrível. Não esperava aquele tipo de resposta, mas senti que o ela disse foi correto ao momento.
Meio que mandei aquela mensagem a ela por impulso, então ainda não tive certeza do que deveria falar quando nos víssemos. Por tanta coisa estar em minha mente, o melhor era aguardar que me preparasse psicologicamente para aquela ocasião.
No entanto, novamente houve outro bilhete ali presente. Aquela garota ficou mais assustadora que a própria Kumiko... era algum tipo de Nure-Onna à espreita de me esfaquear ou me matar de uma vez?!
Peguei o bilhete e o descartaria... até ver seu conteúdo:
“Eu estive afastado durante todo esse tempo, e agora vou resolver as contas com você, Shiroyama. Me encontre atrás do ginásio após o último período, se não quiser que as coisas fiquem piores pro seu lado!
Hiyatetsu Bara”
Aquele cara não foi suspenso? A punição durou apenas um pouco mais de uma semana? Onde isso é datado como grave, afinal?!
Suspirei, irritado. Provavelmente sua posição era realmente alta como se gabou de tal... não imaginei que estar no Conselho Estudantil fornecia vantagens do tipo.
E nesse ritmo, não poderei recuar. Se tal confronto terá de ser realizado, então o melhor é adiantar sua ocorrência. Mesmo que fosse contra o que planejei. Será que foi por essa razão que houve vários estudantes me encarando durante o decorrer do dia?
A influência desse “secretário” egocêntrico passou a me irritar cada vez mais...
Avancei pelos corredores e atravessei o pátio externo vazio, venci a distância das quadras de tênis e futebol e cruzei a pista de atletismo até o ginásio de basquete, da qual nunca tinha entrado.
Atrás do local — totalmente tingido pela sombra da construção —, duas pessoas aguardavam em silêncio. Hiyatetsu Bara permaneceu encostado na parede, irritado. Ao seu lado, Higusa Amari me afrontou franzida.
— Por um momento, achei que não viria... — expressou ele.
— O que pensa que sou? — retruquei. — Ficar tanto tempo fora te fez esquecer que aquele esquema foi arquitetado por vocês?
— Cala a boca, Shiroyama! — rosnou Higusa. — Por sua culpa, Hiyatetsu está a um passo de ser expulso, sabia?! Você tem ideia do que fez com uma pessoa inocente?!
— Inocente...
— Chega. Não foi pra isso que vim que viesse até aqui... — proferiu Hiyatetsu, estressado. — Por sua culpa, recebi uma suspensão e apenas retornei por causa das avaliações diagnósticas. Perdi minha posição do ranking geral e é capaz que seja expulso do Conselho Estudantil. O que quero realmente saber é: foi você que me denunciou para a Kiboumori?
— Isso mesmo — respondi, indiferente. — A notifiquei antes de ter ido falar com você. Apenas fiz o que qualquer pessoa sã faria...
Antes que terminasse de falar, Hiyatetsu avançou contra mim brandindo seu punho. Me desviei por reflexo e em questão de segundos tive de segurar seu chute repentino sob sequência.
— VOCÊ NÃO PASSA DE UM MALDITO! — Ele esbravejou. — POR QUE FEZ ISSO?! FOI INVEJA, É?! AMARGURA?! GANÂNCIA?! ME RESPONDA!!
Grunhi, desvencilhando-me de sua perna e recuando alguns passos. O rosto de Hiyatetsu ficou vermelho, com as veias saltando. Sua fúria instantânea era realçada pelo descontentamento de Higusa, atrás dele.
— Eu consegui a vaga de 1°secretário com muito afinco, no ano passado! — continuou o cara. — Com meu esforço, garanti minha popularidade e finalmente fui recompensado! E do nada... aparece um estudante transferido querendo ditar as próprias regras!! Qual é a sua, hein?!
Nada do que diga será ouvido. É a típica situação de alguém influente querer descontar sua frustração em alguém de menor valor. Que patético, como se tivesse algum direito de exercer sua autoridade para qualquer um...
— Vamos, responda! Você quer minha posição, não é?! Qualquer pessoa gostaria de ter o meu status!!
— Não, nada disso...
— Não se faça de sonso agora, garoto! — incitou Higusa. — Você não faria isso sem motivo! Nós sabemos muito bem que tentou prejudicar a nomeação de Kumiko como membro do Conselho Estudantil!
— Ela quem me odeia, pra começo de conversa... — respondi, inabalado. — É até ironia você querer vir me chamar de sonso, sabendo do plano daquela garota...
— Não fale assim com ela! Essa conversa é entre nós! — interveio Hiyatetsu, furioso. — Ou por acaso, veio até aqui por causa dela? É isso?
— De jeito nenhum...
— Ah, nem quero pensar nisso! — exclamou Higusa. — Nem pensar que daria bola pra um lixo como você, seu idiota!!
— Só pra te avisar que a própria Higusa que veio até mim! Por causa das minhas habilidades! Eu sou incrível! E não mereci todo esse tratamento que estou recebendo dos outros!!
A feracidade de sua voz se agravou cada vez mais. Eles apenas descontarão sua raiva em mim por uma razão sem sentido.
— Pare de ser exibido. Se tudo isso está acontecendo com você, é porque não passa de um imbecil mesmo.
— COMO É QUE É?! — Hiyatetsu avançou novamente sob fúria, da qual o contive com os braços. — ISSO É TUDO O QUE PRECISAVA OUVIR PARA ACABAR LOGO COM VOCÊ!!
— Isso! Acabe logo com ele! — Higusa pegou seu celular, animada. — Tenha certeza que vou gravar essa surra e mostrar pra todo mundo!
Como aquela situação chegou até aquele ponto? Hiyatetsu ficou completamente fora de si e já contava com tantos problemas que aquela garota estúpida quis me envolver em mais um?
Eu não deixarei isso acontecer.
Suspirei e o fitei seriamente. Larguei uma das mãos do seu bloqueio e desferi um soco contra o rosto, que o desnorteou. Higusa resfolegou no exato momento em que desprendi o outro braço e empurrei a cabeça de Hiyatetsu contra a parede do ginásio, próxima de nós.
— Ei, Hiyatetsu...!!
— Seu...! — Ele se levantou rapidamente, apesar de não deter porte atlético. Entramos novamente em um impasse entre nossos braços até pressionar seus dedos usando toda minha força. Iniciei uma joelhada para quebrar sua estabilidade, da qual usou uma das pernas para se proteger. — Não vai... me derrubar!
— Já era... — fiz um ricochete com o corpo que o desestabilizou e caiu pelo próprio peso devido ao desequilíbrio da posição. Agarrei seu braço e o pressionei contra suas costas, como fiz da outra vez.
— Me solta! Me solta, seu covarde!! — relutava ele, exausto. — Pare de usar os mesmos truques sujos!!
— Até que se acalme esse pavio curto, vai ficar aí desse jeito... — O encarei, imutável. — E sou bem teimoso, viu. Posso ficar aqui o dia inteiro.
— Solta ele, Shiroyama! Se não, vou correr e chamar os professores! — berrou Higusa.
— Faça isso, que enquanto te esperamos contarei pra ele tudo o que planejaram e como o envolveram como um ótimo bode expiatório.
— O quê?!
Higusa guinchou como um rato.
— Pare de ficar inventando mentiras, Shiroyama! Anda logo e chame alguém, Amari!
— Não me oponho. Vou adorar ter uma conversa franca, não me importo de esperar. Era isso o que você queria, certo?
— Não! — Higusa avançou contra mim, fazendo-me desvencilhar de Hiyatetsu.
— Que escolha interessante... — debochei. — Está com tanto medo que conte a verdade, assim? Que surpresa.
— Do que ele está falando, Amari?! — Hiyatetsu ficou incrédulo. — Que verdade é essa que não posso saber?
— Não... não é isso! É que... esse idiota... ele está só inventando...!
— Você teria vindo me ajudar bem antes se realmente não se importasse com o que ele disse! — Ele elevou a voz. — Do que esse cara está falando? Me diga!
Higusa se encolheu e subitamente pegou a mão dele, assumindo uma postura de corrida. No entanto, a intervi e Hiyatetsu se desvencilhou. A garota ficou acuada.
— Como se sente agora, idiota? É assim que alguém fica oprimido por aqueles que oprime. Que tal uma conversa franca, agora?
— Cale a boca! — indagou Hiyatetsu. — Vocês dois estão me tirando do sério com toda essa história! O que diabos está acontecendo aqui, Amari?!
— Droga! — Ela se afastou e rapidamente me contornou, correndo a toda velocidade pra longe dali. Poderia alcançá-la antes que saísse da escola, mas meu intuito não foi aquele.
Hiyatetsu se aproximou e agarrou meu colarinho, furioso.
— Vamos, me diga! O que está acontecendo?! Fale tudo o que sabe!!
O encarei novamente, cético ao que tentava me submeter... que cara estúpido. Por mais que não fosse alguém arrogante, sua posição subiu à cabeça a ponto de achar que tudo ao seu redor acontecia por causa do status... não tinha como algo ser mais falso do que tal pensamento.
— Até parece... seu imbecil.
Ele grunhiu, surpreso. O desprendi do meu colarinho à força, incitando ainda mais sua raiva.
— Você...!
— Antes de saber da verdade, vai pagar pela própria inocência... — proferi, ajeitando meu uniforme. — E terei a certeza de que isso aconteça.
— Maldito... pra onde está indo?! A conversa ainda não terminou!
Me virei, no momento em que ele tentou me manter ali. Fitar aquela cara patética me incomodou mais do que Kumiko.
— Vamos fazer assim... se no final das avaliações diagnósticas você estiver acima de mim no ranking geral, te direi tudo o que aconteceu. Do contrário, você fará tudo o que eu mandar.
— E por que devo te ouvir?!
— Não preciso te explicar... — entoei, farto. — Na hora certa, vai concordar com esses termos.
— Se eu vencer, farei uma revolução pra que seja expulso! Esteja certo disso! — esbravejou ele.
— Faça como quiser. Isso se tiver alguém do seu lado quando tudo isso acabar... — tornei a caminhar, contendo a frustração que arranhou minha garganta. Não suportei mais ver o rosto daquele cara iludido, era bem capaz que voltássemos a brigar se continuasse ali por mais um segundo.
Percorri o caminho de retorno e não visualizei Higusa em lugar algum. Aquela garota já deveria estar bem longe dali, procurando Kumiko para receber novas ordens... aquela garota era um Papaltine, por acaso?
De todo modo, é certo que terei algum confronto com ela se as coisas continuarem dessa forma. Fui encurralado de diversas maneiras diferentes pelo plano daquela garota... e eu ainda sou escorregadio?
Saí do hall e caminhei cabisbaixo por entre o aglomerado de alunos com cartazes e panfletos sendo jogados para todos os lados. Naquele momento, apesar da cacofonia pelos anúncios, não ouvi uma única palavra.
Minha mente fervia pela tramoia que Kumiko causou com apenas um punhado de palavras em uma apresentação de menos de dez minutos em cada classe — A situação seria pior se todo aquele discurso fosse feito no PowerPoint — e o embate que acabara de presenciar.
Fora este problema das provas, ainda há a questão do concurso de artes e da competição editorial de Chinatsu para tratar, já que não tive tempo de produzir nada ainda. Diante dos eventos, meu tempo para se dedicar ao desenho se tornou absurdamente curta.
O que devo desenhar, afinal?
Enquanto caminhei chateado com tal fato, um panfleto do clube de artes apareceu aos meus olhos. Surpreso, peguei-o e vi seu conteúdo:
“Competição do clube de artes para recrutar novos membros!
Fique entre os 10 primeiros e você será aceito pelo clube!
O tema da competição é: Retrato de Sentimentos! – Relate um sentimento desenhando um retrato!
Participe!”
Nunca pensei que simples palavras lidas aleatoriamente poderiam ajudar. Apesar que muitas pessoas digam que isso fosse uma maneira minha de distorcer as coisas.
Porém, não enxergo assim.
Se você prioriza suas próprias qualidades, deve ter em mente que todas suas habilidades são uma extensão de si. Por isso, se tornam ferramentas úteis que deve saber como e quando usá-las.
Isto pode ser abordada de várias formas, afinal, a mente humana pode chegar no mesmo resultado de diversas maneiras. Por isso que há a desigualdade na sociedade, já que as maneiras mais eficazes são as mais consideradas de serem utilizadas e o resto, é descartado.
É por isso que Kumiko chegou onde está naquele momento. Por isso que moldou todo aquele sistema na escola e a acataram. Pra começo de conversa, por sua causa que o clube de jornalismo foi criado. Não é uma surpresa ela deter potencial de abalar um sistema predefinido como aconteceu.
Sua capacidade de conseguir manipular qualquer um que não consiga compreender seus planos funcionou até aquele momento pela forma como manejou. Pessoas costumam ignorar que cada um possui a própria individualidade e aquela garota pisa em quem adota isso.
Como as coisas alteraram de forma, já que antes foi resumido a ela querer me expulsar e agora causar uma reforma estudantil generalizada, fiquei com medo de ser sugado por toda aquela pressão individualista que criou.
Mas depois de ler aquele panfleto, uma ideia me surgiu. Mesmo que já soubesse do tema do concurso de antemão dita pela própria Chinatsu. A ficha só me recaiu agora...
— Há! Há! Como sou idiota...
No fim, sempre tive as condições perfeitas desde o início para que não fosse manipulado por aquela situação.
— Eu não preciso mudar quem sou... vou poder perdurar até o fim.
Dito isso, segui pra casa sob aquele senso tranquilo e determinado.
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