Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 5: Shiroyama Hideo é Podre, no Fim das Contas ④

Os próximos períodos de aula foram da mesma forma. Todos me fitavam com um olhar pejorativo enquanto mantive minha expressão inexpressiva, deixando-os mais incomodados.

Fora isso, evitava qualquer problema que envolvesse luta corporal. Enquanto retornava para a classe alguns alunos haviam se reunido para me pegar nos corredores, o que me fez tomar outras rotas para chegar no local em segurança... eu era algum tipo de político, por acaso?

Também havia começado a receber mensagens de ameaça. Elas se variavam entre o que havia feito com o que eu era. Ora, se decidam com o que vão falar! Mesmo achando que a minha aparência seja culpa minha...

A maioria daquelas mensagens recebia durante as aulas, então aparentemente era um sinal de que estava sendo amaldiçoado pelas outras classes. Mesmo assim não poderia agir indiscriminadamente com quem estudava ali comigo, não que os conhecesse, de qualquer maneira.

Nos tempos livres entre as aulas, desviava minha atenção lendo algum livro que havia trazido de casa. Tinha que manter toda a calma e sanidade ao meu lado para que aquela atmosfera tóxica não me sufocasse.

No entanto, estranhamente parecia ser mais fácil de se lidar do que um ambiente tranquilamente errado. Quando a pessoa sabe que está certa em uma opinião e o resto do mundo pensa o contrário, nunca irá se abalar sob hipótese nenhuma. Esta é a convicção da mente humana de superar qualquer desafio que venha a enfrentar.

Enfim, o último período havia se passado. Durante as aulas havia descoberto de que provavelmente teria uma aglomeração de alunos na saída para me agredirem, sendo uma ameaça perfeita para me causar um desespero enorme de querer logo sair dali e ir para casa acuado, onde ficaria protegido e não desejaria mais retornar.

Mas não era aquilo o que iria fazer.

Estava mais preocupado com o fato de o Conselho Estudantil não ter vindo me abordar em nenhum momento... bom, se fosse o caso de querer aproveitar o momento sem mais obstruções, aceitaria de bom grado.

Eu peguei meu celular e mandei uma mensagem para o destinatário: — Estarei na Biblioteca. Vamos resolver isso de uma vez por todas.

Avancei pelo corredor contra a multidão de alunos que iam embora ou se encaminhavam aos seus clubes, todos me encaravam com olhares medonhos. Simplesmente os ignorei e continuei caminhando. Por sorte, havia pego a chave da Biblioteca com a professora Harashima mais cedo e não precisaria tomar desvios.

Havia evitado todo e qualquer contato desnecessário durante o dia inteiro para manter a minha mente e calma no lugar. Agora, estava pronto para finalizar aquele plano.

— Mesmo que não tenha 100% chance de dar certo... eu farei esta chance virar 100%.

 

A biblioteca estava vazia. Deixei a minha mochila na mesa em que usualmente costumava sentar e dei uma caminhada pelas prateleiras vendo seus títulos.

De repente, houve o som da porta se abrindo.

Uma garota havia entrado. Tinha cabelo violeta e duas tranças em cada lado recaindo sobre os ombros. Eu a encarei silenciosamente, longe um do outro Kumiko Horie exibia uma expressão confiante.

Se dissesse para alguém que decidi enfrentar um boss de fase final em uma biblioteca, ninguém acreditaria.

— Bem, devo considerar que tenha me chamado aqui para assumir sua derrota, não é?

— Derrota?

— Ora, não se faça de sonso — Ela jogou as tranças para trás. — Eu compreendo a sua ideia ridícula de tentar comprometer o clube de jornalismo com aquelas mensagens horríveis, apenas para salvar Yonagi.

— ...

— Mas tudo isso foi em vão! Já deve ter visto o quanto os alunos te odeiam, não é? E pensar que foi tão fácil de convencer todos... acho que o melhor seria dizer que você mesmo se afundou na própria mentira, talvez.

— Então é isso o que você pensa?

— Não precisa agir como um orgulhoso, você falhou miseravelmente! — A voz dela ecoou pelo recinto vazio da biblioteca. — Você não tem a popularidade de Yonagi e todas aquelas injúrias ditas contra você se espalharam como um vírus! É tão caótico que dá vontade de rir! Se eu estivesse no seu lugar, sentiria vergonha a ponto de querer morrer!

Kumiko Horie começou a rir desenfreadamente, como se fosse a piada mais engraçado do mundo, não achei nada engraçado.

Mas naquele momento estava tranquilo e a desestabilizou: — Mas o que é isso? Como pode estar tão calmo nessa situação? Parece que você é mesmo nojento como os rumores estão ecoando, viu...

De repente, ela pegou o seu celular do bolso.

— Bem, que seja. Vim aqui para tirar uma foto desse rosto deplorável que está por trás desta máscara... será que sua cara é tão horrível quanto sua própria existência?

Ela começou a se aproximar de mim. Provavelmente iria fazer de tudo para arrancar a minha máscara do rosto, mas não me movi nenhum centímetro, pois apenas disse: — Por que não chama logo a Senjou, que está no lado de fora da biblioteca?

— O quê? Mas...

— ...é falta de educação deixar uma pessoa que te chamou aqui fora da discussão.

— Hein? Como sabia disso?

Senjou Hana apareceu na entrada da biblioteca logo em seguida. Ela ainda estava cabisbaixa, como se nunca tivesse sido feliz na vida.

— Senjou, você disse a ele que eu viria?! Mas foi você que me disse que ele estaria aqui para ficar sozinho!

Ela se encolheu pela autoridade da outra, mas já assumi a dianteira: — Não, eu a pedi para que a trouxesse aqui.

— Hein?! Como assim? — Kumiko esbravejou contra mim, apontando para o meu rosto. — Você já perdeu! Já era! Não consegue ver isso?! O que você ganha me fazendo vir até aqui? Quer confirmar mais uma vez a sua existência miserável e ver o quanto sou superior?!

— Superior? Você?

Aquela tinha sido a voz de Senjou, não mais amedrontada. Em vez disso, exibia determinação em seus olhos.

— Acha que isso é se sentir superior, Kumiko? Está enganada!

— Hum, Senjou, o que houve? Por que está fazendo essa cara e falando essas coisas?

— É você quem está errada aqui! — A veterana rosnou. — É você que precisa enxergar o que está acontecendo! Acha que é correto o que fez com todos do nosso clube e no de literatura?!

— Como é?! Eu que ajudei a erguer a ideia de montar o clube de jornalismo aqui, lembra?! Ele não existia aqui na escola, então fui eu que mandei aquele formulário pra que fosse feito! Nada mais justo do que eu querer algum destaque e os meus louvores, não é?!

Senjou cerrou os dentes.

— Sim, foi você que enviou aquele formulário... depois de tantos outros que já tinha enviado! Você soube dessa informação e fez o envio por saber que havia membros o suficiente!

— Sim, ué. Eu fiz...

— Você só fez isso para que não precisasse competir com a Yonagi no mesmo clube, não é? E por isso tirou todos os outros do segundo ano do lado dela!

— Sua...!

— Eu sabia! Eu sabia de tudo isso e mesmo assim... eu queria que esse clube virasse realidade, pois em todos os anos anteriores nunca tive pessoas o bastante! Queria seguir com o meu sonho de ser uma jornalista, mas não queria que as coisas fossem desse jeito!

Kumiko grunhiu.

— E mais...! Seus amigos foram tão podres quanto você! Como puderam deixar alguém de lado por um desejo tão mesquinho?!

— Quem você pensa que é, sua tonta?! — retrucou Kumiko, contorcendo seu rosto de fúria. — Você deveria ser mais grata a mim, que consegui erguer este clube e ainda te coloquei como presidente! Ah, mas vejo que cometi um erro fazendo isso, já que você não fez absolutamente nada! Você apenas foi uma inútil que só prestou para dar status a mim!

— Inútil, é? Acho que não... — Ela tirou de sua bolsa uma papelada grampeada, em que havia vários tópicos organizados.

— Hum? O que é isso?

— Isso... isso é o esforço que tive para continuar seguindo o meu sonho! Graças a uma fonte confiável... pude correr atrás e enviar isso junto com o formulário de carreira! Esta foi a verdadeira razão para que o envio das redações havia sido cancelado! Não foi você, Shiroyama ou Yonagi que venceu esta competição ridícula, fui eu!

O rosto de Kumiko ficou pálido como giz. Ela começou a balbuciar desconcertada: — O... o quê? Hein? Mas como? Isso não é possível... você foi apenas uma inútil que não sabia como fazer nada sozinha... não é possível...

— Não é possível? — Me manifestei, o que a fez olhar assustada em minha direção. — Mas ela nunca esteve sozinha.

A porta se abriu e Kirisaki Touka entrou, ficando ao lado de Senjou.

— Senjou sempre pensa demais nas coisas e não fala com as pessoas. A apoiei durante esses dois anos na tentativa de o clube de jornalismo ser criado, mas isso não aconteceu. Decidi que neste terceiro ano iria correr atrás do quero fazer e ela parou de falar comigo. Mas a estive ajudando durante todo esse tempo juntando informações para ela, mesmo que não quisesse. Ela nunca esteve sozinha, sua pretenciosa!

— Não... não é possível...

— Isso é perfeitamente possível — intervi. — Não é raro alguém do último ano recorrer a ajuda de outros para conseguir reunir o máximo de informações possíveis. Mesmo submetida a esse plano idiota, ela conseguiu tirar algum proveito das suas ações ruins.

— Então... foi você... — grunhiu Kumiko. — Você chamou a atenção da outra para que voltassem a se falar...

— Bem engenhoso querer apressar sua recomendação de carreira pisando em cima de uma veterana, hein... — falei, indiferente. — Nunca conseguiria chamar mais atenção que Yonagi através das notas, certo?

Entretanto, ela deixou de rosnar e tornou a rir.

— Não importa. Esse é o último ano da Senjou, mesmo. Ela pode ter conseguido se sobressair, mas é só isso. Você por outro lado, ainda está condenado.

— Shiroyama... — expressou a veterana, preocupada. — Kumiko, você não pode fazer isso com ele!

— Cala a boca! Eu vou revelar esse rosto deplorável e fazê-lo se afundar de vez!

— Rosto? O que o rosto dele tem a ver com isso? — retrucou Kirisaki.

— Ah, você não sabe... desde que as aulas começaram, esse idiota sempre esteve com essa máscara no rosto. É um completo covarde! — exclamou Kumiko.

— ... — engoli em seco. Parece que a sua determinação de querer me ver desesperado estava ainda mais intensa.

Kirisaki me fitou curiosa, mas Kumiko não parou de falar: — Sim, isso mesmo! Você foi um ótimo bode expiatório, Senjou! Você e Yonagi foram considerados as melhores pelos professores, mas eu estou aqui agora para provar que estavam todos errados! Eu serei reconhecida como um gênio!

— Hum, acho que você se enganou quanto a algumas coisas... — disse, levantando a minha mão.

— O quê?

— Primeiro, não fui selecionado para entrar no clube de literatura por ter sido o melhor. Claro, teve o equívoco do professor Miyamura, mas para a professora Harashima tinha um outro propósito.

— Hein?

Eu tornei a demonstrar confiança, o que a deixou desconfortável. Aquela era a hora para virar aquele jogo. Havia prometido para Himegi de que não iria magoar ninguém, mas infelizmente não era o tipo de pessoa que faria isso da forma mais pacífica ou incrível.

Por isso eu havia sido a pior solução encontrada pela Harashima, como sempre aceitei que seria. O aluno problemático que distorce qualquer coisa.

Já tinha aceitado aquele papel desde o começo.

— Segundo, acho que você se esqueceu de um fator importante aqui...

— ...

— ... não era o seu objetivo ser melhor que a Yonagi? Pois devo te lembrar que isso não durou menos que um dia. Mesmo que eu seja uma pessoa pouco conhecida, você ter me incriminado repercutiu muito mais do que quando foi com ela.

— Ah...!

— Se era mesmo a sua intenção me derrubar, você foi formidável..., mas isso também valia para Yonagi e ela não se abalou. Não importava as zombarias ou os olhares tortos, sua postura não se alterou nem por um momento.

— Mas..., ela ficou ausente e não entregou o relatório a tempo! — ressaltou Kumiko. — Esta vitória é minha!

— Posso te assegurar que ela fez muito mais do que apenas montar o relatório... escreveu várias redações de variados temas e seu rendimento não caiu, mesmo faltando. Suas ausências não foram por causa das intrigas, e sim pela própria saúde.

Era verdade. Apesar de Yonagi ter se sentido mal e faltado, após ser desviada da rota de ameaça se tornou isenta de ser qualquer alvo.

— Aliás, tenho que te contar uma coisa que acho que não esperava... — sorri arrogantemente, fazendo-a se contorcer ainda mais. — Acha que eu, uma pessoa solitária e sem amigos iria me importar com mensagens de ameaça? Isso não foi nada para mim.

— Não... não venha blefar pra cima de mim...!

Mas logo notou que mantive meu semblante calmo o tempo inteiro. Não havia me descontrolado uma vez sequer e nem mesmo tinha sido visto chorando em algum momento... não que eu tenha feito isso. Lidar com a negatividade do mundo ao meu redor havia sido um dos meus treinos mais árduos. Eu era a pessoa mais preparada para aquele tipo de situação, em outras palavras...

— ...eu sou seu inimigo natural. Você não pode me atingir com esse tipo de provocação, porque não sou nada além de um aluno solitário e sem amigos. Não há nada aqui que pode me afetar e nem me abalar. Esse foi o seu segundo erro.

Kumiko Horie ficou sem reação, estando mais pálida ainda. O fato dela ter me direcionado o olhar de ameaça dos alunos da escola após tentar usar o bilhete para incitá-la à culpa foi o que a fez morder a isca. Isso tinha sido planejado desde o começo.

— E então? Eu sou seu predador natural. Você não pode me atingir, mas posso causar uma comoção para te derrubar.

— Não diga bobeiras, calouro — debochou Kumiko. — Mesmo que as ofensas não te atingem, a maioria da escola te odeia! Ninguém irá acreditar em você, nem mesmo os professores! Você não tem provas contra mim e não tem recursos próprios para se desfazer do peso de ser o criminoso. Você não pode fazer nada! É apenas um mero estudante transferido recluso e patético!

Foi nesse instante que sorri de forma mais arrogante ainda.

— Esse foi o seu terceiro erro, Kumiko. Eu tenho provas — concluí.

— O quê?

— Podem entrar, pessoal.



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