Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 5: Shiroyama Hideo é Podre, no Fim das Contas ③

 

Ao andar de uns passos me deparei com Himegi, que estava sem fôlego de tanto correr. Ela parecia estar muito aflita.

— A... Senjou. Onde ela está?

— Ah, ela está ali no almoxarifado. Eu...

Não terminei de falar por me assustar com os socos que Himegi me dava no peito.

— Como... como você pôde escrever aquelas coisas?! Se eu soubesse daquilo antes, eu... que vergonha!

Ah, tinha imaginado que após de ver o conteúdo ela viria me bater... fiquei até surpreso de que mesmo assim exerceu a tarefa.

— ... deveria ajudar ela mesmo assim, não é? — conclui, o que a deixou surpresa. — Você sabia mais do que ninguém que ela não estava querendo que isso acontecesse e mesmo assim, se calou sem fazer nada.

— Hein? Eu... Será que tudo isso gerou tantos problemas assim?

— Bom, a meu ver o responsável poderia acabar suspenso. Isto seria um grande problema. Inclusive, já estou enrascado com o Conselho Estudantil por causa dos murais.

Himegi se afastou de mim chocada. Porém, senti que não havia remorso nela, o que foi bom.

— Mesmo assim, eu não te contei o que eu ia fazer. Desculpe.

Ela fez uma expressão emburrada.

— Sério, vocês dos anos superiores só ficam abusando do primeiro ano!

— Sei que estou sendo egoísta... você conseguiu chamá-la?

— Sim. Ela está vindo neste instante. — Himegi bufou.

Dito isso, uma garota cruzou a esquina do corredor e veio em nossa direção. Havia pedido para Himegi descobrir quem era a amiga mais próxima de Senjou. Afinal, não tinha certeza de que a ideia do único a coletar material pra ela a convenceria. Então, precisava de um apoio seguro.

Himegi era bem capaz de se aproximar dela e pedir ajuda. Este era o seu tipo de personagem.

Senjou era uma garota radiante e animada. Por isso, era estranho não ver outro estudante do terceiro ano junto a si.

Se a Kumiko havia a subjugado, então só poderia representar uma coisa: — Senjou havia se afastado dos seus colegas de classe.

Claro que era difícil imaginar que alguém próximo não iria querer saber como se encontrava. Também esperava que Himegi trouxesse mais gente, mas apenas aquela garota que se aproximava de nós tinha aceitado nos ajudar.

Bom, era melhor que nada.

A garota nos alcançou arfando. Ela aparentava estar correndo aflita por causa da situação atual.

Entretanto, não fiquei chocado por isso e sim por causa dela em si.

— Oh... desculpe a demora. Vim o mais rápido que pude! — exclamou a garota de cabelos ondulados. — Sou Kirisaki Touka, do terceiro ano!

— ...!

Ela... também tinha uma cicatriz de seu nariz até a boca.

Como estava de máscara a garota não entendeu a minha confusão. Himegi também achou estranho a minha reação.

Engoli em seco. Soltei um pigarro para poder voltar ao normal.

— Ah, bem... obrigado por ter atendido a um pedido de pessoas que nem conhece...

— Shiro? — Himegi inclinava a cabeça, confusa.

— Não tem problema, não é nada... — ressaltei, ainda agitado.

— Himegi me explicou que é do mesmo clube que a Senjou e que ela estava passando por problemas... ela sempre foi assim.

— Assim? Assim como? – perguntou Himegi.

— Senjou nunca quer preocupar as pessoas com os seus problemas. Desde sempre tentei me comunicar com ela pra saber do que estava acontecendo, mas nunca me contava nada.

Isso explicava a incerteza de Senjou Hana em relação às discussões que ocorreram. Ela não era do tipo de pessoa que sabia lidar com esse tipo de situação.

— Bom, mesmo que ela não te peça você irá ajudá-la. Não é?

— Sim. Sei do seu sonho e posso ajudar. Ela sempre achou que iria se tornar uma jornalista e nunca soube lidar com as adversidades que encontrava pelo caminho, além de não haver um clube de jornalismo na escola.

— É difícil encontrar apoio e direcionamento onde não há... — murmurou Himegi.

— Aí é que está. Depois que tal coisa passou a existir, ela preferiu apenas acreditar que as coisas ocorreriam por conta própria. — disse.

— Não posso... negar isso.

Kirisaki parecia ser alguém paciente e tranquila, disposta a querer ajudar. Estava com receio de que Senjou fosse recusar qualquer ajuda de alguém do terceiro ano, ainda mais de alguém do próprio círculo de amizade.

Por isso ao ver que ainda havia alguém que faria de tudo para lhe apoiar, senti um alívio em meu coração após ter dito todas aquelas coisas pesadas para uma garota fragilizada. Aquelas palavras haviam me tornado um vilão e Kirisaki a salvaria. Ela iria melhorar e evoluir desta forma.

Alguém teria que fazer esse papel, por mais desagradável que fosse.

E por isso, curvei minha cabeça para a veterana à minha frente que não entendeu o ato.

— Por favor, fui horrível com sua amiga. Por isso, se você a confortar será uma grande ajuda. Deixo a coleta de referências com você, também.

— Certo. Eu vou levantar o ânimo de Senjou. Deixa comigo!

Eu e Himegi acenamos em aprovação. Terminamos a conversa e Kirisaki foi até o almoxarifado.

— Sei que pedi muitas coisas para ti, Himegi — disse a ela. — Mas preciso que faça mais uma coisa para mim.

Himegi pareceu surpresa por um momento, mas suspirou logo em seguida e exibiu um sorriso cansado.

— Sim, você não tem jeito mesmo. Estou ouvindo.

***

Havia recebido uma notificação da professora Harashima de que não haveria atividades de clube naquele dia e poderia ir direto para casa, o que achei ótimo. Precisava descansar bastante, já que tinha dormido tão pouco naquela noite. Nem mesmo Himegi ou o grupo de Takahashi me contataram depois da conversa que tive com Senjou Hana, então supus que as coisas estavam indo muito bem.

Mas a realidade era que nada poderia ser 100% perfeito.

Os meus panfletos haviam sido todos retirados dos murais e era uma questão de o Conselho Estudantil vir atrás de mim. Não esperava que aquela medida seria tomada em tão pouco tempo, apesar da maioria dos alunos terem visto as mensagens contidas naqueles bilhetes.

Mas não tenho uma mente absoluta, então isso não deixou de me preocupar.

Avancei pelos corredores até o hall de entrada para trocar os sapatos, então escutei: — Ah, é aquele garoto...

— Hum?

— O garoto que estava espalhando notícias falsas...

— Olha como ele parece ser deplorável...

— Que cara estranho...

— Desde que ele chegou aqui, nunca tirou aquela máscara do rosto? Será que vive doente?

— Espero que a doença dele não seja contagiante...

Troquei meus sapatos casualmente e avancei para a porta de entrada, enquanto continuava a escutar aqueles comentários: — Ele parece ser o tipo de pessoa que faria isso... que bizarro.

— Bizarro mesmo é a aparência dele... está sempre de máscara e com olheiras... ele não sabe se cuidar, não?

— Com aquele olhar morto de zumbi não me surpreende que tenha feito aquilo para prejudicar os outros.

— Soube que a Senjou Hana do terceiro ano tentou dialogar com ele, mas foi totalmente insultada!

— Ele não sabe valorizar o esforço dos outros... mesmo que tenha sido o escolhido para representar no jornal...

— Aposto que ele fez a mesma coisa com a Yonagi Kaede do segundo ano! Nem pensar que um cara como esse seria melhor que ela!

Considerei que todos os envolvidos com aquela situação tivessem já ido embora, o que achei ótimo.

— Então, é assim que você irá jogar? — murmurei nervoso. Ri internamente e isso fez meu coração se acalmar, pus as mãos nos bolsos e continuei a seguir em direção para casa com uma sensação triunfante internamente.

É, por mais que as coisas não deem 100% certo, há algumas ocasiões em que você se favorece mais do que imagina.

Afinal, era assim que um asteroide solitário jogaria contra um planeta chamado sociedade.

***

Naquela manhã de terça-feira, enquanto trocava os sapatos no hall de entrada, comecei a escutar mais murmúrios desagradáveis. Pelo canto do olho pude ver grupos diversos se aglomerando para cochichar.

Apenas segui pelo corredor que conduzia às escadas, mas como todos estavam indo ao mesmo tempo os comentários não cessavam e a todo momento diziam: — Cuidado, ele pode ouvir! —. Tarde demais, seus idiotas. Quem é que não ouviria estando tão próximo?

Mas exibi um sorriso vitorioso, afastando quem estivesse nos arredores. Não era exatamente o que tinha em mente, o tiro saiu pela culatra... mesmo que negativamente, deveria ser considerado um gênio por esse feito todo aquele lugar prestar atenção em mim em tão pouco tempo!

Naquele instante, era chamado de — Aluno doente de máscara. —. Odiado por todos.

Na classe, Takahashi se aproximou de mim murmurando para que apenas eu pudesse ouvir: — Não sei se era isso o que queria, mas conseguiu a mesma coisa quando foi com Yonagi, senão pior. Tem certeza de que ainda irá prosseguir com isto?

— Hum, é claro — respondi, confiante. — Hoje será o dia em que iremos resolver isso. Conseguiram todas as provas?

— Sim... — murmurou ele, ainda preocupado. — Quando faremos?

— Eu darei o sinal. Tudo está se encaixando, então só precisaremos de uma chance para atrair o inimigo.

— Seria menos desanimador se você não colocasse as coisas desse jeito...

— Certo, certo. Apenas aja como sempre. Sou um mártir agora, então isso vai continuar o dia inteiro.

— Como você consegue ficar tão calmo em uma situação como essa?

— Acho que nunca te disse isso: sou o tipo de pessoa que gosta de chamar atenção pelo que sei fazer, não por status de aparência.

Takahashi não disse mais nada. Mesmo na classe, os murmúrios continuavam. Meus ouvidos só sossegaram quando todos prestavam atenção nas lições, estavam ardendo tanto que poderia virar um Motoqueiro Fantasma... oh, mas não tinha nenhuma moto por ainda ser menor de idade. Ciclista Fantasma não transmitia a mesma intensidade...

Yonagi deve ter passado por algo semelhante na semana passada.

Não havia feito muito e aquela sociedade inteira havia se virado contra mim, mostrando o quão desprezível era aquela massa de pessoas opinando sob convergência mútua. Mesmo que os ideais de todos fossem diferentes, o desejo de excluir alguém do âmbito em que um grupo vive por não se adequar aos seus gostos os unem para derrubar tal inquilino que não lhes convém.

No momento, eu era essa pessoa excluída.

Por incrível que pareça, aquela opinião massiva recaída sobre mim negativamente era mais harmônica do que quando havia recebido os elogios pela minha redação escolhida para o jornal. A seleção de cada um sobre o que quer apoiar era um dos males que causava a desigualdade social em que o mundo se encontra, seja onde fosse.

Mesmo quando fazia coisas coerentes como ir a lousa resolver um problema de matemática ou a responder uma pergunta do livro de sociologia não mascarava a figura detestável que haviam me colocado.

Isso perdurou até o intervalo, em que avancei para a cantina para comprar um sanduíche e o aglomerado de alunos me fitavam com uma expressão enojada em seus rostos enquanto permanecia imutável, tampouco me importando com seus comentários que já diziam em voz mais alta.

Sentir aquela agressividade contida nos rostos e nas palavras de tantas pessoas me fazia querer dar meia-volta, retornar para a classe e não sair de lá nunca mais. Estava em uma escola cheia de mortos-vivos para querer construir uma barricada longe deles?

Era o tipo de exposição que nenhum solitário queria encarar em sua vida.

Não era algo necessário e muito menos importante. Eu havia me tornado um alvo de entretenimento para que aliviassem seus estresses constantes, sendo que a maioria nem me conhecia e só queriam participar daquilo. Que patético.

Comprei meu sanduíche e peguei uma lata de cappuccino na máquina de bebidas, indo para o pátio central que estava vazio. Suspirei aliviado por estar sozinho no único momento de paz naquele dia inteiro. Por estratégia havia me preparado para não encontrar ninguém conhecido.

Naquele instante não queria consolos e visitas superficiais. Eu não queria ajuda, nem conversar com alguém. Apenas queria ficar sozinho.

Meu peito ficou mais leve após sentir aquela brisa suave. Meus ombros cederam e relaxei naquele banco. Fiquei algum tempo apenas olhando para as nuvens no céu que se movimentavam lentamente e com uma beleza sem igual.

Pelo canto do olho notei que alguns alunos se juntavam em grupos e olhavam para mim... isso ocorria em intervalos constantes.

Quando o sinal do final do intervalo tocou me endireitei no banco e olhei para o chão, cruzei minhas mãos e fiquei pensativo durante alguns segundos. Na minha linha de visão, um par de sapatos apareceu. Ao levantar a minha cabeça, vi Himegi que estava com um rosto complacente. Ela não me disse nada, nem uma única palavra.

— Por favor, Himegi. Pode fazer o que eu te pedi?

Ela apenas assentiu com a cabeça, deu meia-volta e voltou para o prédio principal.

Suspirei profundamente e me levantei. Minhas mãos estavam suadas, estava ansioso novamente. Joguei a lata de café no lixo e retornei para o prédio.

Peguei o meu celular e sorri.

É hora do show.

***



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