Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 5: Shiroyama Hideo é Podre, no Fim das Contas ②

O que era preciso para um solitário chamar atenção?

Era uma pergunta contraditória, já que apenas pessoas com presença podiam fazer isso. Pessoas que impõem sua existência à vista dos outros. Isso é uma natureza oposta de como os solitários vivem, pela nossa filosofia de vida ser justamente não chamar atenção.

No meu caso, aquilo podia ser chamado de orgulho.

Não importava como você visse aquela situação era impossível não magoar alguém, visto que as questões emocionais dos envolvidos só eram do controle dos próprios. Fatores externos dificilmente acarretariam em mudanças drásticas.

Essa sociedade selvagem não tolera esse tipo de desilusão. É algo inconcebível que você fique sofrendo por algo o tempo inteiro, a vida não permitiria. Era por tal razão que as pessoas abandonam tantas coisas enquanto lidam com obstruções. Eu quis manter minha integridade pessoal e por isso me afastei de tudo e todos.

Eu não me importava se acabaria magoando alguém, mas tinha algum problema em magoar?

Frustração também era uma forma de evoluir.

Quando estava de volta à classe, Takahashi e seu grupo acenaram para mim. Todos estavam com seus celulares na mão, então peguei o meu e segui com o plano. Além de colocar aquela papelada nos murais, também tirei fotos. Para que aquilo fosse mais efetivo tinha que ser divulgado de todas as formas possíveis.

Também tinha recebido a informação de Himegi que tinha lhe pedido. Havia chegado em uma boa hora.

— Bom, agora é esperar... — disse indiferente enquanto me sentava na cadeira e tornei a prestar atenção na aula.

 

Próximo da última aula terminar alguém começou a bater na porta da classe. O professor a abriu e uma garota apareceu ali, era a presidente do clube de jornalismo Senjou Hana. Todos os alunos da classe ficaram curiosos.

Senjou Hana era uma garota energética com sua aparência exalando animação e alegria. Mas naquele momento aquela garota exibia uma cara séria e cabisbaixa.

— O que deseja? — perguntou o professor Miyamura.

— Preciso falar com o aluno Shiroyama Hideo, por favor. É sobre coisas do clube — respondeu Senjou, com uma voz arrastada e pesada.

Eu me virei para o grupo de Takahashi em que assentiram com a cabeça. Me levantei e respondi: — Está bem. Eu irei.

Nós saímos da sala e paramos no corredor. Assim que fechei a porta de correr notei que a garota estava tremendo. No entanto, agi normalmente: — Acho que isto é uma conversa particular, não? Vamos falar sobre isso longe daqui.

Ela não se virou para mim, apenas assentiu com a cabeça. Sugeri para que fôssemos para o almoxarifado já que não teria problemas de ninguém ouvir a conversa.

Ao chegarmos lá continuei mantendo a minha calma, enquanto ela demonstrava fúria em seu rosto.

— Certo, pode falar.

Ela respirou profundamente antes de me mostrar seu celular e o que exibia na tela dele.

— Primeiro... o que significa isso?!

Eu ignorei seu berro furioso e prestei atenção no que estava na tela do celular. Era uma das cópias que havia colocado no mural da escola. Ele dizia o seguinte:

“Vocês acreditaram facilmente na mentira criada pelo clube de jornalismo!

Aqueles alunos foram liderados por uma presidente que não tinha nenhum senso de direção. Tudo isso aconteceu por falta de liderança dela!

Este clube só deveria ser desfeito logo.

Se apenas entregassem a cola seria muito mais simples, mas é claro que onde há pessoas podres, há intenções podres também.

Afinal, somos todos de uma escola de Elite, não é? Acima dos panos tudo deve ser conquistado com suor e esforço, sem considerar as fraudes de quem está por trás de tudo isso.

Pessoas que dependem das outras para subirem sob os esforços dos outros não deveriam ter destaque ou mérito algum.

Apenas se afoguem em seus arrependimentos.”

 

— Você por acaso sabe o que fez?! — esbravejou Senjou. – Isso aqui foi divulgado em todos os lugares, até mesmo em fóruns!

— Antes de querer me afogar com suas mágoas há alguma prova de que tenha sido eu que tenha escrito isso?

Esta resposta a fez contorcer o rosto de fúria, pude até ouvir o som do seu ranger de dentes.

— Muitos dos meus colegas o viram colocando esses papéis nos murais e já o denunciamos para o Conselho Estudantil! Você não tem como escapar disso!

Soltei uma risada que a deixou confusa.

— Sim, está certo. Fui eu mesmo. Precisava chamar a sua atenção da forma mais indireta possível.

— Chamar atenção...? Você chama isso de chamar atenção?! Tem ideia do que isso pode causar para o andamento do clube e quanto as recomendações que irei receber?!

— Não, acho que você é quem não está percebendo a situação aqui — expressei, indiferente. Manter a calma e a voz fria aqui era algo essencial. — Você não percebeu o erro que seria seguir adiante com esse plano orquestrado pela Kumiko. Você nem ao menos percebeu o quanto ela te usou para conseguir o que queria até ter sido tarde demais, certo?

— Isso...

— ...é exatamente o que eu disse — completei, triunfante. O rosto dela se contorceu cada vez mais. — E isso é tudo culpa sua. Se reconhecesse que não tinha habilidades para conseguir seguir a carreira que tenha em mente poderia evitar chegar a esse resultado. Poderia ter chegado a uma alternativa muito melhor, sabe?

— Quem... quem é você para me dizer isso?! — berrou a garota com lágrimas nos olhos. — O que você sabe sobre mim?! Você não sabe de nada! Não sabe o quanto quero seguir na carreira de jornalismo! É o meu sonho desde que era criança!

— Sério? Pois me parece... que você abandonou a si própria.

— Ah...!

— Se tivesse planejado mais e encarado a realidade talvez estivesse mais próxima do seu sonho. Sim, eu não sei nada sobre você e nem ao menos me interessa querer saber. Você se prendeu em um paradigma de querer ser isso o que desejava se tornar e não lutou por isso. Há! Acha que vai ser o que deseja apenas por força de vontade?

— Por que... por que está fazendo isso? O que eu fiz para você?! Eu não queria causar problemas para ninguém!

Ela se desestabilizou, o que me deu tempo para respirar. Mesmo assim estava satisfeito como planejado.

— Sim... isso foi culpa sua. Mas não totalmente.

— ... como assim?

Senjou não retrucou, apenas me fitou confusa.

— Você deixou que te dissessem o que deveria fazer e mesmo assim foi atrás das próprias fontes. Deve ter revirado aquela biblioteca inteira para procurar evidências para enriquecer seus artigos. Ninguém nunca deve ter te questionado pelas suas escolhas por saberem que você é responsável e esforçada.

O semblante dela se alterou. Percebi que parte de sua tensão havia se esvaído.

— Eu... eu realmente pesquisei bastante, mas...

— Você mesma sabe os procedimentos e por isso assumiu a presidência do clube de jornalismo — continuei. — Você queria passar os seus conhecimentos para a próxima leva de alunos, o que é algo honrável. Mas seu coração se abalou por já estar no terceiro ano do ensino médio e isso a fez tomar muitas irresponsabilidades e atitudes.

— Não, eu...

— Não é errado querer contar com a ajuda dos outros para conseguir resultados. Mesmo que eu seja alguém solitário, sei o quanto isso deva ser valioso, mas não pode deixar que alguém que não esteja correndo riscos como você deixe esconder o seu esforço para receber algum ganho pessoal.

— Eu...      

— Se isso tudo acontecer irá receber toda a responsabilidade de algo que não tinha necessidade de ter acontecido. Deixa-me te perguntar uma coisa...

Eu me agachei para olhar diretamente em seus olhos.

— ... há algum mérito em querer pisar no talento de outra pessoa se você pode simplesmente conseguir a mesma coisa usando seu esforço?

— Não...! Eu não... não sou assim!

Senjou resfolegou e soluçou. Ela estava lacrimejando e deliberadamente tentava procurar por uma saída.

— Não pode ser...! Ainda há alguma chance de conseguir assumir isso por minha conta?!

Eu suspirei e me levantei seguindo para a entrada do almoxarifado. Estava esperando chegar àquela conclusão.

Ela ainda estava chocada, então me virei para lhe dizer mais uma coisa: — Eu posso te ajudar. Mas para isso, quero que me dê algumas informações sobre o que eu preciso.

— O quê? Informações?

— Você sabe sobre as avaliações que dão para os transferidos, certo? Sei que haver alunos transferidos nesta escola é algo raro, mas não é algo que você não deva ter visto nesses seus três anos aqui, certo?

Desde que Takahashi quis me ajudar com as anotações das lições de classe, notei que os alunos transferidos são considerados pessoas que necessitam de ajuda para acompanhar o ritmo da escola e que por isso era provável da supervisora aplicar um teste especial de alta escala. Eu pude obter informações diretamente por ele naquele dia em que fomos limpar a classe, mas não era dele que precisava de uma moeda de troca para lidar com a supervisora, e sim de Senjou.

— Você irá me dizer que tipo de teste a supervisora irá me aplicar e o que essa situação entre os dois clubes tem a ver com isso.

Àquela altura muitas coisas faziam sentido. Enquanto a supervisora não estava presente, a professora Harashima analisava as minhas ações e Senjou cuidava da parte do clube de jornalismo. As ações de Kumiko a deixaram transparente diante dos outros, mas Senjou ainda seria a melhor fonte de dados que poderia obter diante daquela confusão.

— Eu... conheci uns alunos que se transferiram para cá no passado e tiveram que fazer um teste com perguntas do primeiro e segundo ano com dificuldade acima da média.

— Certo, quero que me passe em detalhes o conteúdo do teste depois.

— Hein?! Por que eu deveria fazer isso por você?!

Parece que ainda se recusava a cooperar totalmente comigo.

Mas já estava preparado para esse tipo de cenário, então apontei para as caixas que estavam no almoxarifado.

— Dentro dessas caixas separei alguns livros que consegui encontrar em livrarias que fala bastante sobre várias referências, já que verifiquei todos os referenciais que usou.

— Como?

— Vários dos livros que usou estavam gastos, capa ou páginas, não importa. Só alguém com afinco os usaria da maneira como foi, então tive certeza.

Ela me encarou, seus olhos marejavam.

— Deve ter mais conteúdo se você pesquisar a fundo, considere isso como ajuda de uma fonte confiável.

Senjou ficou quieta por algum tempo, até que se pôs a falar: — Confiável... você?

— Posso ser o que quiser, mas não digo mentiras.

— Verdade... mesmo assim, você é horrível.

— Não se preocupe. Afinal, não serei o único que te dará material para referência.

— Como assim?

— Considere isso como um aviso para que você volte a olhar ao seu redor.

— Isso não faz sentido nenhum! — exclamou a garota, enfurecida.

— Que seja. Apenas me dê os detalhes do teste depois, acho que tenho motivos o bastante para te deixar em dívida comigo.

Já havia conseguido o que queria, ao menos em parte. Após dizer aquelas palavras a deixei sozinha ali e avancei para o corredor.



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