Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 4: Afinal, Takahashi Kuroshima fala bem ③

No meio do caminho, no entanto, encontrei muitos alunos pelos nos corredores. Não que fosse algo incomum, mas àquela hora deveriam estar todos em seus clubes. O pôr-do-sol decorou o céu de laranja pelas janelas conforme avancei o percurso, dando uma sensação esquisita e melancólica dada a quantidade de pessoas presentes. Porém, em algum momento percebi que os alunos cochichavam entre si e meus olhos nervosos captavam isso como um mal pressentimento.

Em um senso comum quando as pessoas fofocam entre as outras geralmente se dá por um assunto popular naquele meio que incita aquelas conversas. Eu não tinha certeza e nem passava na minha cabeça se houve algum evento do tipo naquele momento que entrava naquele quesito exceto pelo impasse do jornal da escola, sendo aquilo que me deu calafrios.

Pessoas solitárias tendem a achar que estão envolvidas em fofocas justamente por não quererem chamar a atenção. No meu caso, achava que Kumiko Horie tivesse usado algo contra mim e me tornado motivo de chacota para todos, o que não fazia coerência já que não havia ninguém ali me encarando.

Mesmo assim, não consegui me acalmar. Algo me dizia que deveria procurar Himegi ou apenas conferir o mural de informações.

Infelizmente pude não reconhecer a razão daquela multidão pelos corredores, mas reconheci a pessoa atingida por ela. Um círculo de pessoas rodeou Yonagi, chocada. Meu corpo todo paralisou, pois, pareceu emboscada por vários leões. Todos a encaravam com expressões ferozes e foi então que percebi que todos continham folhas em suas mãos. Me deparei com uma delas pelo chão e a peguei, que continha os seguintes dizeres:

— Yonagi Kaede é uma mentirosa!

— Falsificou todas as informações! Usou antologias que usavam informações falsas e omitiu documentos!

— Essa é a estrela Yonagi que todos vocês admiravam?

— Para ela todos daqui não passam de pedras para que os pise se estiverem em seu caminho!

— Pessoas como ela não entendem o valor que ajudar os outros possui. Ela não tem sentimentos!

Minhas mãos tremeram só de reler tais palavras. Apenas a fitei lidando com aquelas expressões irritadas sob um olhar perdido, até que olhou para mim e, naquele momento foi como se houvesse apenas nós dois. Meus tímpanos vacilaram e não ouvi nada ao meu redor, envolto em vácuo.

Sua expressão confusa se endureceu como gelo no mesmo instante, o que gerou surpresa a todos ali reunidos. Ela tornou a caminhar e abriu caminho entre os alunos ainda chocados com sua atitude.

Aquele corpo celeste passou ao meu lado de forma tão majestosa que não consegui reagir, assim como ela. Sua elegância é o que a tornava um astro diferente de qualquer outro presente naquele lugar e tudo parecia ser meramente poeira cósmica ou asteroides avulsos pelo espaço.

Alguns saíram do transe de serem intimidados por ela e tentaram chamar sua atenção, conforme caminhou cada vez mais distante gritavam-lhe insultos como: — se explique, Yonagi! Como ousa pensar dessa forma só porque está no topo?!

Ignorando aquela cacofonia, agi por puro impulso em quebrar aquele imenso vácuo abrindo a minha boca: — Ei!

Todos se viraram em minha direção e pude sentir aquela pressão esmagadora daqueles olhares de expectativa e confusão encima de mim. Até mesmo Yonagi me encarou com seus olhos mais afiados do que nunca. Aquelas pupilas gélidas que exibiam beleza e confusão invadiram todo o meu ser.

— Eu...

Não conseguia encontrar palavras. Toda aquela multidão me olhando me fez tirar a concentração. Não tinha mais lógica, racionalidade ou planejamento. Era apenas um eu cru que estava ali sem saber o que expressar, consciente de que não poderia agir do mesmo jeito que aquela garota à minha frente.

Ah, conheço este sentimento. Aquela sensação em que apenas conseguia enxergar Yonagi era algo da qual conhecia muito bem. E não era por apenas querer enxergar alguém e sim como nós éramos vistos.

— O que há com esse cara? — A aglomeração me fitava incrédula, como se fosse algum tipo de louco em ter chamado a atenção de todos daquela forma...

Sem parar para notar que o tempo corria novamente conforme minha mente desvanecia, Yonagi virava as costas para mim.

Eu compreendi o motivo de se tornar tão gélida, mesmo em uma situação caótica como essa. Pude notar a diferença da reação das pessoas sobre nós.

Yonagi é considerada a estrela da escola, alguém especial. O espaço que havia dela entre o resto daqueles corpos se distanciava como uma lua escapando de uma órbita. O astro que representava era observado por todos constantemente.

Eu sou... exatamente o contrário.

Ser comparado a um asteroide seria a melhor especificação plausível. Eu poderia fazer alarde, mas no fim não teria a mesma atenção que Yonaria causaria como qualquer um presente naquele corredor.

Os olhares dirigidos a mim causavam aquela sensação tão costumeira...

— O que está acontecendo aqui?! — exclamou a professora Harashima chegando por outro corredor à frente da direção de Yonagi, que passou por si sem lhe dizer nada. — Ei... preciso de uma explicação!

Enquanto os alunos saíam do local às pressas, notei que a professora me encarou também sem entender. Desta vez, não pude conter a minha frustração e apenas dei meia-volta.

— Ei, Shiroyama! Volte aqui! — entoou ela vindo até mim. Eu a entreguei aquele bilhete no qual fez uma expressão horrorizada. Voltei a caminhar, mas me deteve pelo ombro.

— Você deveria ver a Yonagi, não eu... — grunhi, irritado. Acho que a minha voz saiu mais arrastada do que imaginava, pois a professora me virou em sua direção.

— Se ela foi a mais afetada... por que está fazendo essa cara de tristeza?

Desde que li aquelas injúrias, não parei de cerrar os meus dentes. Eu sentia que se tentasse falar normalmente sabia que não iria parar de tremer, frustrado comigo mesmo apesar daquele momento e das circunstâncias me sentia decidido.

Endureci o meu rosto para esconder aquelas angústias e disse com toda a coragem que tinha: — Fiz uma promessa comigo mesmo e iria falar isso para ela, mas já não importa mais. Aquela garota é muito mais forte do que eu... por isso, tenho que fazer algo quanto ao que estou sentindo agora.

— Shiroyama, isso não é uma questão de ser forte ou não...

— Eu sei, mas ela quer que nós a vejamos desta forma. Essa é a maneira mais forte que os solitários têm para se defender de algo assim.

— O que você irá fazer?

— Isso não é óbvio? Eu vou me desfazer deste sentimento de amargura própria que há em mim, virar este jogo e resgatar a certeza de que sou incrível para todos que até mesmo a Yonagi verá isso.

— Até numa hora dessas você pretende ser orgulhoso? — suspirou a professora.

— Vá apoiar a Yonagi, não preciso de nada disso... — rosnei, cabisbaixo: — Não quero mais me sentir como um qualquer... seja uma rocha no meio da estrada ou no espaço. Não importa!

— O que quer dizer?

— Já disse: eu estou sempre sozinho e, portanto, irei resolver isto do meu jeito porque estou sozinho.

A professora tirou sua mão do meu ombro e me deixou ir embora. Os alunos voltaram a cochichar e desta vez soube que eram de mim pela atenção que chamei. Coloquei as mãos no bolso conforme caminhava calmamente até a volta à classe, em que Takahashi terminou a limpeza da sala e soou preocupado.

— Ei, isso que aconteceu com a Yonagi foi...

— Não se preocupe, a professora Harashima já dispersou os alunos. Tudo já ficou sob controle.

— Mas isso...

— Eu quero te pedir um favor... — expressei de forma que me olhou confuso pela mudança súbita de assunto.

— Um favor? Por quem?

Naquele momento, pensei em muitas coisas que poderia ter pedido àquela pessoa. Apesar de tudo, decidi considerar a situação atual e no que aquele “maldito social” poderia ser capaz de fazer naquela ocasião.

Como disse antes, apenas consegui falar direito com as pessoas quando era submetido a um conflito ou situação cômica. Sentia um ódio profundo de mim mesmo naquele momento, mas era a hora certa para fazer aquilo:

— Para uma pessoa em que deveria ter dito algumas palavras... — apontei para o próprio peito, usando o Takahashi como um intermediário para endurecer a convicção do que planejei em fazer. — “...Eu vou resolver isso”. Takahashi, vou precisar de sua ajuda.

***

Naquela segunda-feira os alunos não deixavam de comentar sobre o ocorrido. Como suspeitei, diante daquela exposição a todos Yonagi não apareceu na escola.

A professora resolveu conversar comigo a respeito antes de ir para classe e ainda complementou: — Mesmo que eu tenha adiado a entrega final para hoje, ela também não entregou o relatório completo. Se não me engano, apenas Kumiko Horie veio mais cedo entregar o do clube de jornalismo.

— Espere, não era a Senjou Hana que deveria fazer isso? Ela é a presidente do clube, certo?

— Segundo a Kumiko, Senjou não veio hoje assim como quase todos do clube. Parece que eles resolveram não presenciar o que poderia acontecer.

Seria possível que a pressão do Conselho Estudantil tivesse assustado ainda mais Senjou Hana?

Dentro da classe, fora as conversas sobre o assunto todo mundo agia normalmente. O grupo de Takahashi continuou a fazer suas brincadeiras e a rirem tranquilamente.

Quando os seres humanos encaram uma situação fora do padrão de suas vidas naturais têm duas opções: uma era entender o que acontecia ao redor e se adaptar ao novo. A outra era apenas continuar a agir como ignorante e observar que tipos de mudança poderia acontecer com naturalidade.

Aqueles ali realmente eram espertos para apenas quererem agir normalmente. Não odiava isso por ser um modo de vida que gostaria de adotar. Forçar uma mudança própria apenas para se adequar ao seu arredor apenas iria te fazer sofrer por mudar.

O dia passou em uma tranquilidade impressionante com direito a temperatura ambiente e agradável, não estar nublado e uma ventania suave atravessando as janelas abertas pela classe.

Fala sério, aquela calmaria toda depois de tudo o que aconteceu me incomodou a ponto de querer prestar atenção na zombaria de Takahashi. Porém, as coisas ocorreram sem imprevistos que nem mesmo Kumiko Horie se manifestou.

A única coisa mais desagradável que aquela dedução foi o fato de não ter provas...

Durante o intervalo, permaneci no pátio central enquanto almoçava e subitamente Himegi apareceu no meu campo de visão, distante da minha posição. Ela aparentou não ter me visto, mas percebi uma coisa...

Ela se isolou em um canto para chorar sozinha.

Pelos seus movimentos, secou as lágrimas do rosto antes que algumas de suas amigas aparecessem para cumprimentá-las com um sorriso. Isso foi um tanto comovente para mim.

O que Kumiko Horie fez foi imperdoável, sem dúvidas.

Mas fazer isso com alguém, por mais que fossem apenas do mesmo clube foi simplesmente doentio. É um tanto distorcido se você for parar para pensar em quando pessoas fracas usam outras para atingir pessoas fortes. Num sentido analógico, aqueles com mente fraca são desprezíveis, pelos seus métodos serem ainda piores dos que possuem mente preparada em infligir algum senso de superioridade.

Kumiko Horie é fraca, mas ao se reunir com todos seus comparsas e conseguir apoio da escola inteira contra Yonagi, se tornou poderosa... uma ameaça, ou ao menos considerei que virou uma.

— Felizmente, achar os pontos fracos de pessoas que se iludem de possuírem poder não é tão difícil. Pessoas fracas não se tornam fortes sozinhas, afinal.

Com o som do intervalo terminando, me levantei e segui para dentro do prédio escolar, mas acabei seguindo o mesmo caminho de Takahashi.

Fomos até uma máquina de bebidas e peguei um café. Takahashi pegou um energético e bebeu de uma só vez. Enquanto o solvi, resolvi comentar algo para quebrar o silêncio: — O professor não vai ficar bravo se chegarmos atrasados?

— O professor de matemática fica preguiçoso depois do almoço, então ele sempre demora uns dez minutos para chegar na sala de aula. Estamos bem.

— Entendi.

Continuei bebendo meu cappuccino até que Takahashi perguntou: — Então, sobre aquilo que você me disse... você irá mesmo fazer isso?

— Sim. É a única coisa que podemos fazer. Vamos derrubar Kumiko Horie do seu trono falso.

— Como faremos isso?

— Bom, isso vai levar algum tempo como esperado. Mas é algo que pode ser resolvido neste final de semana. Takahashi, preciso de toda ajuda possível para termos mais chance. Quanto mais pessoas, mais rápido poderemos resolver isso.

— Você apenas não quer ter tanto esforço, não é?

— Claro. Trabalho terciário é uma das coisas mais práticas do mundo. Pense nisso como uma ação solidária em escala rápida.

— Vai ser difícil convencer a todos de colaborarem...

— Se for você, vai convencer a qualquer um... — ressaltei.

— A única coisa que quero saber aqui é: você fará tudo isso por ela?

— Já te disse... — retruquei coçando a cabeça. — ...por mais que você ou os outros não entendam, isto será por mim mesmo. Kumiko me fez sentir como se aquela exposição fosse para me atingir, além de continuar pressionando Yonagi.

— Você não foi usado como um boneco nessa situação toda? Por que insistir tanto?

— É algo que somente os solitários compartilham em igual: odiar serem expostos ainda mais por algo que não fizeram. O que ela fez foi pisar no orgulho de alguém que é forte por não agir desta forma com os outros, então iremos devolver isso a altura.

— Sim... eu realmente não vou entender mesmo.

— Dessa vez, eu que quero te perguntar... — disse encarando-o. — Kumiko Horie alguma vez teve alguma obsessão pelo seu grupo? Pode ser qualquer um.

A pergunta pegou Takahashi de surpresa, que ficou pensativo durante algum tempo até falar: — Bom, todos nós nos conhecemos no primeiro ano. Mesmo assim nosso grupo se conhece desde o ensino fundamental. Chegamos a fazer algumas coisas juntos ano passado, mas tudo mudou esse ano... começando por ela ter ficado em uma sala diferente da nossa.

— Entendi, isso foi bem útil. Mais uma coisa... — soltei um pigarro antes de continuar. — Hum... há algum interesse pessoal dela? Não pelo grupo em si, mas por alguém?

— Você se refere a...

— Veja, eu não conheço nenhum de vocês. Mas todos frequentaram o primeiro ano aqui, incluindo Yonagi. Seria estranho se ela apenas quisesse esperar até agora para se vingar de alguém, não?

— Sim... você tem razão.

Takahashi não demonstrou surpresa.

— Estou apenas usando isso para resolver as coisas da melhor forma possível, sabe. Uma amiga... uma pessoa me pediu para que ninguém se ferisse e gostaria de evitar este cenário o máximo possível.

Se não sou um aliado de Yonagi mesmo estando no mesmo clube, então a relação que tinha com Himegi era de uma oponente em clubes diferentes? Que bizarro.

Takahashi pareceu entender a mensagem, pois riu. Ei, não ria dos meus equívocos! Minha cabeça está uma bagunça aqui!

— Certo, então. Entendi a situação. Faremos o possível neste final de semana. E quanto a você?

— Eu vou ficar na biblioteca para concluir os textos que Yonagi deixou incompletos. É como diz o ditado: “podemos perder a batalha, mas não a guerra”. Vamos superar as dificuldades por todos os meios possíveis.

— Não sei se esse ditado pode ser interpretado dessa forma, mas tudo bem...

Terminei de tomar o meu café e joguei a lata no lixo. Me virei para a sala de aula, deixando Takahashi onde estava com uma expressão decidida no rosto.



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