Our Satellites Brasileira

Autor(a): Augusto Nunes


Volume 1

Capítulo 2: A Insistência de Harashima Miyagi ②

Por mais que aquela situação fosse pior do que imaginava, não queria fugir dela. Aquela massa de pessoas estava querendo intimidar qualquer um que colocasse os pés em seu território. Eles eram alguma espécie nova de Dodô? Eles deixaram de ser extintos ou voltamos à era do gelo?!

— Vão ter que fazer mais do que isso para me fazer desistir! — esbravejei com toda a determinação que tinha conseguido reunir naquele momento.

Caminhava com tanta convicção de chegar logo na biblioteca para poder impressionar a Yonagi com a minha atitude que não vi quando esbarrei em uma garota ao cruzar um corredor.

— Oh, me desculpe! Não estava olhando para onde estava indo — disse estendendo a minha mão para a garota.

— Ah, tudo bem! Eu também estava distraída! — ela aceitou a minha mão e se levantou, arrumando a saia. — Acabei me perdendo da minha sala de clube! Ainda não me acostumei com o ambiente da escola.

Comentou a garota dando uma risada envergonhada. Ei, isso foi bem fofo. Nisso, parei para notar como ela era bonita. Tinha cabelos castanhos que chegavam até os ombros e olhos brilhantes.

— Você também é uma caloura? — perguntei curioso.

— Ah, sim. Sou Himegi Kyouko, do primeiro ano. Sou péssima em me orientar com lugares grandes!

— Ah, te entendo. Por mais que seja bom ter tanto espaço, me sinto sufocado com o fato de me perder e nunca mais sair vivo.

— Isso soou muito negativo, mas tudo bem!

Após revelar minha personalidade perdida, decidi ir embora logo. Me curvei precisamente e prossegui para a biblioteca.

Quando finalmente cheguei lá me deparei com a mesma imagem de Yonagi lendo seu livro. Me aproximei e sentei no mesmo canto da mesa. Fiz um breve cumprimento com a cabeça e me apressei em fazer a próxima redação.

Enquanto escrevia estava tão absorto em saber o que havia planejado, não prestei atenção quando Yonagi olhava para mim em intervalos. Notei isso tardiamente por perceber sua apreensão e fui direto: — Está curiosa quanto à minha opinião do clube de jornalismo?

A garota ficou surpresa e apenas acenou discretamente com a cabeça. Droga, não faça essa cara envergonhada, desse jeito vou ficar atraído por ver isso.

— Bem, é como você disse. Aquilo parecia um completo inferno.

Yonagi apenas concordou com a cabeça rapidamente, orgulhosa. Ei, eu conheço essa expressão... não fique se orgulhando de ter me avisado antes e eu ter concordado! Não tinha duvidado de você, droga!

— Sinceramente, pensei que depois de ter visto aquilo teria fugido como um gato molhado. Já nem considerava que iria voltar para cá.

— Não seja ridícula. Estou acostumado com aqueles tipos de olhares por ser o tipo de atitude que mais me irrita. Por isso, quero fazer com que engulam essa fúria inútil e se envergonhem a ponto de enterrar suas cabeças no chão.

— Eles não são emas...

— Aliás, não vou deixar você levar todo o crédito. Quanto maior o ego de uma pessoa, maior sua queda! Vai ser interessante vê-los se arrependerem pelos próprios erros.

— Olha quem fala — Yonagi cruzou os braços. — Você tem um ego pior que o deles e ainda tem coragem de dizer essas palavras?

— Em minha defesa, não vou ficar remoendo de amargura e quero que me paguem por terem me feito sentir assim.

— E como pretende fazer isso?

— Vou mostrar para eles que sendo melhor no que faço e ainda sendo imparcial com a situação, verão que estão sendo mesquinhos demais e saberão o quão errados estão. Desta forma todos poderão evoluir juntos, é uma boa oferta, não acha?

Apresentei a minha tese em tom desdenhoso, mas Yonagi apenas devolveu um sorriso indiferente.

— Mesmo vendo a personalidade deles ainda tenta vê um jeito de fazê-los verem seus próprios erros? Achei que apenas se importasse com você mesmo.

— Você interpretou errado. Eu realmente não ligo para eles. — disse com meu coração batendo rápido. Por que estava tão nervoso? — Mas, se eu agir impiedosamente eles verão a si mesmos como os tolos que são. Seria o mesmo que olhar para um abismo, ele irá olhar para você.

— Bem, isso é verdade. Parece que você entendeu mesmo a situação e está ciente dos riscos.

— Com certeza. Participar de uma guerra desta não seria realmente ruim.

— Só há uma falha neste seu plano ardiloso, senhor precavido. — disse a garota.

— Hein? E o que é?

— Caso não tenha notado, muitos daquele clube estiveram comigo e me abandonaram. Mesmo que os humilhe, não sentirão remorso algum a não ser quererem te fazer sentir pior depois.

— Bom, vou fazê-los admirarem minhas redações. — disse, ciente que aquelas palavras ditas carregam algum sentimento.

— Impossível — disse Yonagi, balançando seu cabelo. — Não há como ser melhor do que eu. Você é apenas um ajudante para que os outros não se sintam culpados que eu cuide de tudo sozinha. É tudo para o meu próprio benefício. Os meus textos é que acabarão sendo escolhidos.

— Olha... isso soou muito bacana, mas é algo muito cruel de se dizer, sabia? — comentei, desanimado. Caramba, como aquela atitude dela era irritante! — Não era nessas horas que devíamos nos motivar a acabar com eles juntos?

— Quem disse que devo me juntar a você para conseguir acabar com eles? Já disse, posso fazer isso sozinha. Você apenas começou a fazer isso hoje e não se sabe se amanhã irá abandonar tudo. Não confio em você.

Certo, isso realmente doeu.

Não há exceções quando uma pessoa tem intenções de magoar alguém. Por mais que haja ocasiões que o motivo seja culpa de outra pessoa, não era este caso aqui. Vendo-a me intimidar daquele jeito com aquele olhar convencido me fez sorrir nervosamente.

— Bem... quem disse que estou fazendo isso por você?

— ?

— Não entenda mal. Ajudar uma pessoa na sua situação seria o normal, não? Além disso, alguém como você realmente não iria confiar em alguém como eu que não chama atenção e nem seja bonito. Isso estava óbvio desde o início.

— ... não preciso da sua compaixão! — relutou Yonagi, irritada.

— ... claro que mesmo que eu participe as coisas irão acabar como esteja prevendo. Não que me importe com isso, sabe – continuei a falar.

— Se já sabe, então por que querer insistir nisso? Apenas ajude com o que foi pedido e pronto.

— E que graça teria nisso? Isso tudo não teria sentido algum se não recebesse o próprio mérito, seja por cima de qualquer um.

— O que quer dizer com isso?

— Espere e verá — conclui a conversa e me levantei para sair.

— E se as coisas não forem como você estiver pensando? — entoou Yonagi para mim, já cruzando a entrada da biblioteca.

— Então... eu irei receber status em dobro por essa situação caótica — comentei com um sorriso provocante. Desta vez fui eu quem a deixou sem ter o que dizer e, com esta expressão confusa em seu rosto a deixei.

***

Foi a mesma situação em que me encontrei quando havia conseguido o prêmio de poesia no ensino fundamental. Na verdade, pode-se dizer que aquela vez foi algo mais diluído, já que os meus colegas de classe me conheciam fazia muito tempo. Porém, aquelas expressões fétidas não saíram dos seus olhos.

O pior era uma pessoa se sentir acostumada com esse tipo de situação. Realmente, a sociedade não te deixava ser você mesmo sem haver uma forte discriminação. Como era um novato por ali fui jogado contra um mar de tubarões raivosos e famintos, prontos para me devorar.

Nisso os dias se passaram até o final de semana. Havia conseguido deixar de acumular dever de casa e enfim poderia ter um tempo para descansar. Quanto às redações tive que lidar com mais temas sociocratas. Depois daquela discussão, eu e Yonagi mal falávamos de tão focados em ter as melhores ideias.

Quando veio o sábado tinha caído a ficha de que havia me equivocado demais. Não era um problema tão grande em não ser escolhido para ir para o jornal e sim por ter havido um conflito entre mim e Yonagi de sermos os melhores. Era um péssimo hábito meu fazer aquele tipo de coisa: incitar competições.

Decidi que o melhor seria relaxar já que não tinha os próximos temas para escrever antes do tempo. Mesmo assim, havia algo me incomodando.

E por esta razão não havia conseguido dormir bem naquela noite, com a mente em turbilhão de palavras em vez de qualquer outra coisa. Na segunda-feira estava parecendo um morto-vivo novamente.

— Olhem, o zumbi escritor parece mais ativo do que nunca! — ecoou Takahashi.

Será que poderia parar? Ela realmente gritou bem alto.

— Não deveria ser o contrário? — comentou Nana, gerando uma nova salva de risadas.

As coisas estavam agindo normalmente até a hora do intervalo em que os alunos começavam a sair das suas salas para irem ao refeitório. Uma comoção estava acontecendo nas escadarias justo quando estava querendo descer depressa para comprar meu sanduíche.

— Extra! Extra! O jornal voltou! — exclamou um dos alunos carregando montes de folhas em um dos braços e balançava a outra mão rapidamente. Havia outros alunos ali fazendo a mesma coisa.

— !! — tomei um susto e por impulso peguei um dos jornais. Folheei rapidamente e encontrei uma parte que dizia: — espaço dos motivadores! Leia a ideia do dia!

Meus olhos acharam palavras conhecidas de trechos, cogitei que pudesse ter sido a minha redação escrita ali. Procurei rapidamente o meu nome em cima daquele texto.

Shiroyama Hideo, segundo ano. Classe C.

Fiquei atônito em realmente estar vendo o meu nome ali por ter sido uma aposta bem alta feita com Yonagi e aquele foi o resultado. Mesmo assim, não me senti convencido... poderia apenas ficar feliz por ter algo meu publicado em algum lugar em que todos poderiam ler, mas não foi este o caso.

Dizem que as palavras que expressam nossas profundas emoções, mas isso é uma mentira. As palavras também podem enganar as pessoas, destruir relacionamentos e criar ilusões. Um papagaio pode copiar a língua humana, mas não significa que saiba o significado do que esteja falando, muito pelo contrário.

Enquanto as pessoas deixavam de se aglomerar para pegar seus exemplares me afastei e joguei o meu na lixeira mais próxima. Estava com uma ideia bem clara em minha mente: — as pessoas não querem a verdade, apenas querem coisas para acreditar que sejam uma verdade. Se você tem algo falso e cria uma ilusão de que ele será real, então aquilo pode ser visto como algo real.

Após o intervalo fui bajulado pelos alunos da classe por causa do feito. Porém, algo que tinha previsto estava acontecendo: muitas pessoas que não me conheciam haviam se surpreendido por alguém como eu ter escrito aquilo dizendo coisas como: — Nossa! Você... não aparenta ser esse tipo de pessoa —, ou — Apesar de você ser esquisito, você sabe escrever bem...

Mas já tinha escrito uma redação na classe e chamei até a atenção dos professores. Ao menos se lembrem do meu rosto, seus colegas tapados!

Toda aquela atmosfera havia me deixado enojado, então após as aulas do último período realmente considerei voltar direto para casa. Porém, como não sabia o que poderia ser discutido após aquele resultado relutei contra mim mesmo e tornei a seguir o caminho até a biblioteca mais uma vez.

— Acho que estou tomando a decisão errada, no entanto...

Ao chegar na biblioteca me deparei com Yonagi folheando as páginas do jornal sob um rosto cético. Ora, ela realmente aparentava estar bem aborrecida.

— Olá... — cumprimentei-a e me sentei no meu lugar de costume. Ela apenas balançou a cabeça como resposta e continuou atenta ao jornal. Não fiz nenhum comentário, apenas fiquei lendo meu livro. Em dado momento ela terminou de ler e pigarreou para chamar a minha atenção.

— Bem... acho que as suas opiniões foram boas, eu acho... — relatou, desviando o olhar. Ei, não precisava comentar isso se vai parecer como se estivesse sendo obrigada a comer um legume que odeia sem olhar para ele. Espera, eu sou um legume odioso agora? Por acaso estava exalando tanto betacaroteno assim? Minha pele não estava virando uma cenoura!

Notei que pela mesa várias das folhas espalhadas eram de redações que Yonagi havia feito. Pelo que tinha visto eram cópias da mesma escrita refeita várias vezes para chegar até o resultado entregue.

Ela relutou quando peguei uma das folhas para ler, mas se conteve. Ao ler aquele texto fiquei com um gosto ruim em minha boca. Devolvi a folha à mesa e tentei encontrar algo a dizer: — Hum... você, realmente... seu texto ficou muito bom...

Yonagi iria me dizer algo pois chegou a abrir a boca, mas neste momento a porta da biblioteca se abriu e vários alunos apareceram rodeando-a como se fosse uma celebridade.

— Yonagi, quem seria esse tal Shiroyama!? Não acho que ele tenha sido melhor que você! Olhe para isso!

— Não sei quem esse cara é, mas acho que deve ter trapaceado de algum jeito. Todos nós achávamos que era você quem seria a escolhida!

— Bem, eu... — Yonagi estava perdida no que iria dizer para todas aquelas pessoas. Talvez os conhecesse e até poderiam ser da mesma classe. Bom, não que soubesse.

— Ei, você! — Um deles virou para mim: — Sabe quem é esse cara? Por ser alguém novo, pouca gente sabe a aparência desse folgado!

— Ei... chamar alguém de folgado é... — Yonagi titubeou, mas a detive.

— Não, nem faço ideia de quem seja.

Ela olhou subitamente para mim com uma expressão confusa, porém, desviei o olhar e me levantei de prontidão. Os outros alunos pararam de prestar atenção em mim como se fosse invisível, talvez fruto do treinamento de longos anos por ter me mantido isolado na classe escrevendo. As pessoas tendem a não olhar para o rosto de alguém que está quieto. É uma tática infalível dos introvertidos!

Saí da biblioteca enquanto aqueles alunos continuavam com o alvoroço à Yonagi sob a suposta trapaça, oferecendo palavras de conforto e afeto para motivá-la.

Conforme saía dali surgiu um sentimento também fruto do meu costume de ser sempre quieto e ignorado: observar um momento de auxílio sempre aliviava os próprios corações mesmo que não fosse conosco.

Apesar de sentir que em algum momento poderia ser perseguido como um trapaceiro, fiquei aliviado em ter presenciado aquela cena.

***



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