Volume 1
Capítulo 1: A Análise de Yonagi Kaede ②
Fomos do prédio principal ao prédio especial em que se encontravam os clubes. O acesso de um prédio para outro pelos andares superiores era seguindo um corredor suspenso entre as duas construções.
Podia-se ver os alunos passando pelo pátio central abaixo de nós e ouvir as vozes daqueles na quadra de tênis e do clube de futebol ecoando próximos dali, além de alguns instrumentos musicais sendo tocados em outros clubes. Nós subimos mais um andar de escadaria e fomos parar na biblioteca.
Como não tinha entrado nela ainda fiquei bem surpreso. Era um local bem amplo e podia muito ver as delimitações das seções totalmente organizadas. Hum, gostei bastante! Ainda mais com o silêncio que reinava por ali podia sentir a tranquilidade daquele lugar como o esperado do santuário dos introvertidos!
— Mesmo de máscara posso adivinhar que esteja feliz em ter vindo para cá, não é? — brincou a professora: — Nerds são sempre os mesmos não importa a idade.
— Pelo jeito você também é uma nerd, não é? O sujo falando do mal lavado...
A forma como ela se portava a dedurou completamente.
— O que disse?
— Não, nada...
Por estar com a mente focada nas atividades escolares não percebi no quanto estar em uma escola como aquela poderia ser incrível por si. Apesar do comentário da professora não tive como negar suas palavras. Eles não queriam desperdiçar nenhum talento dos alunos, era como se aquela fosse a própria instituição dos X-Men.
Por estar eufórico não tinha notado até então que não havia apenas nós ali. Em uma das várias mesas vazias uma única garota se encontrou próxima a janela e, por estar entreaberta uma pequena brisa esvoaçava seus cabelos pretos. A garota permaneceu estática ao seu redor com toda a sua atenção no livro, movendo apenas seus olhos através das páginas.
Não sabia dizer se era pela minha sonolência ou outra coisa, mas fitar aquela garota me fez sentir como se o tempo estivesse estacionado no puro vácuo. Nossas distâncias não pareciam ser medidas como corpos de matéria. De algum jeito, não consegui deixar de achá-la como um ser transeunte à parte de qualquer outra coisa existente naquele lugar.
Subitamente comecei a notar qualquer detalhe nela, como suas mãos pequenas pegando naquele livro pela qual capa me era familiar, sua presilha em formato de estrela no cabelo, seus cílios tremeluzentes...
Fiquei tão deslumbrado com tal presença que o tempo voltou a correr normalmente quando a emissão vocal da professora se manifestou: — Yonagi? Não ouviu a gente chegando?
— Ouvi sim... em alto e bom som... — respondeu a garota com uma voz suave e com uma expressão indiferente no rosto. — Achei que não viriam falar comigo.
Senti minhas mãos suarem e as coloquei nos bolsos. Droga, me senti tão desestabilizado que minhas pernas até cambaleavam. A atmosfera dali tinha mudado só daquela garota ter olhado para nós. Ou seria por ela estar me encarando?
— E-E aí? — gaguejei, rouco.
— Esse é Shiroyama Hideo. Segundo ano, classe C. Ele entrou esse ano por transferência e o professor Miyamura o achou muito bom para ingressar no clube de literatura. — Ela se virou para mim em seguida: — Essa é Yonagi Kaede, a presidente do clube.
— Se foi o professor de literatura que o recomendou, então ele deve ser bom com palavras... porque está de máscara? É um resfriado? — analisou Yonagi, pensativa. Céus, estou olhando demais para ela!
— Não... não estou resfriado... — foi o que consegui dizer.
Ela me encarou com uma expressão de dúvida.
— Acho um pouco rápido demais para alguém já recomendar alguém após ter se passado apenas uma semana do início das aulas...
— Parece que o professor gostou da redação que fiz, só isso... — respondi com uma voz menos engasgada. Olhei de relance na hora de responder, mas consegui sentir quanta curiosidade havia em seus olhos cintilantes e gélidos.
— Como pode ver, ele pode ser bom escrevendo palavras, mas é horrível de se comunicar e por isso usa essa máscara! — exclamou a professora, batendo em minhas costas tão repentinamente que o susto me enrijeceu todo. Sério, consegui ouvir minha coluna estalando.
Ótimo, ela acabou com o meu mistério de estar usando máscara. Pelo menos tirou a ideia da “síndrome do ensino fundamental”.
— Já dá para se ter um começo com isso, certo? — continuou a professora sob um olhar distante.
Aquilo me deixou um pouco confuso com sua mudança de atitude, mas a conversa continuou com a resposta de Yonagi: — Entendi. Sim, será mesmo. Creio que podemos continuar desta forma.
— Certo, então. Eu estou indo agora. Espero que possam se conhecer melhor... — acenou a professora ao nos deixar a sós naquela biblioteca.
— Ei...
Ao sermos deixados a sós, o silêncio se apossou do local. Aquela professora... ela não quis nem mesmo considerar minha opinião sobre essa situação?
Comecei a suar frio. Aquele lugar estava congelando ou era só ela me encarando novamente?
— Shiroyama Hideo, certo?
— Ah, sim. Acho que chamar de Shiroyama já serve... — falei ainda nervoso e puxei a cadeira da região oposta na mesa de Yonagi.
— Sei. Então, Shiroyama... — concluiu a garota ao retornar para sua posição original: — Hoje não teremos atividade de clube, então faça o que quiser. Está livre para ir embora caso queira cuidar do seu resfriado ou do que quer que esteja doente.
— Oh...
Apenas suspirei pela resposta. Pensei que teria mais a se fazer ali como falar sobre o nível de minhas habilidades (era uma entrevista de emprego?) ...e agora poderia ir embora, sem discussão?
Apesar de não poder opinar a respeito... não achei ruim. De alguma forma, provavelmente teria ingressado no clube de qualquer jeito pra garantir algum tempo sozinho naquele lugar mesmo...
Bom, tenho duas escolhas. Poderia ir logo para casa e cuidar do dever de casa que restou, já que havia a possibilidade de usar aquele mal-entendido do resfriado para me livrar daquelas atividades chatas que me passariam ou permanecer ali... e acabei decidindo ficar.
A presença daquela garota ainda me intrigou, já que retornou sua atenção ao livro e fui ignorado. No entanto, a curiosidade de querer mais a seu respeito apertou o peito.
Minha boca movia-se involuntariamente sem emitir som algum, como se o vácuo entre nós nos deixasse cada vez mais distantes... mesmo que estivéssemos próximos.
Não tive escolha já que não sabia o que dizer e abri a mochila, tirando alguns cadernos dali. Yonagi me encarou sem entender.
— Ah... tenho lição ainda para fazer, então... não vai fazer diferença em fazer aqui ou em casa.
— Você não gosta de afazeres domésticos? — indagou a garota. — Não prefere estar sozinho quando vai fazer estas tarefas?
— Sinceramente, não ligo. Eu sou do tipo que não gosta de levar trabalho pra casa... — disse, cansado. — Sendo bem direto, é algo irônico para mim que não pretende sair para trabalhar. Sinto que quero aproveitar o período escolar o máximo possível e me dedicar com outras coisas sem me atrapalhar...
— Ah, entendo... — comentou Yonagi, voltando sua atenção para o livro. — Você é do tipo que gosta de terminar as coisas rapidamente.
— Você também é... do segundo ano, então? — perguntei assim que vi o laço azul em seu colarinho.
Subitamente ela manteve sua atenção em mim: — Sim. Segundo ano, classe A. Estou aqui desde o ano passado. Então, sou bem conhecida pelos professores... você não compareceu à cerimônia de entrada?
Não foi apenas como se portou, mas também como a professora se resignou a ela... parece que estou na presença de alguém com algum status especial, mas...
— É, bem... eu participei da cerimônia, sim..., mas dormi grande parte dela...
Ela me encarou furiosamente como se pudesse me destruir a qualquer momento! Oh... que belo jeito de se aproximar de alguém, hein!
Ao seu redor, parecia haver uma redoma de vidro que nem todos poderiam tocar ou se aproximar a julgar pelo seu olhar gélido.
Resolvi parar de falar e mantive a concentração em minhas lições, enquanto minha mente cansada se sentiu sendo afastada daquela presença como um astro emanando sua gravidade. A impressão que tive era de que poderia ser desintegrado pela devida pressão se estendesse a mão.
E isto me deixou tenso naquele momento. Por mais que estivesse envolto por aquele vácuo e empurrado pela indiferença daquela garota me senti tentado a querer me aproximar...
Durante todo aquele tempo que pareceu uma eternidade Yonagi permaneceu em silêncio lendo, apenas expirando em intervalos. Meus olhos pesaram tanto que em segundos deixei de fitá-la para enxergar apenas a escuridão atrás das pálpebras.
Me deparei visualizando as mesmas imagens e sensações do sonho de mais cedo, atravessando espaços longínquos em questão de instantes enquanto meu corpo era atraído pelos corpos celestes em suas posições circundantes ao sol. Atravessei Júpiter e Saturno com suas órbitas ridiculamente enormes e após visualizar o sol se afastando cada vez mais, senti meu corpo se esfriando como nunca antes... Urano passou através de mim e logo a minha frente veio...
— Garoto? Você está bem?
— ... nem mesmo Netuno... quero o meu próprio satélite...! — Sob leves sacudidas de Yonagi em meu ombro acordei rapidamente. O ambiente da biblioteca encheu minha visão e aquele frio que senti sob meu corpo desapareceu. Ainda atordoado murmurei: — O que aconteceu?
— Você adormeceu durante pouco tempo... alguns minutos, acho... — explicou Yonagi incrédula. — Suas olheiras são profundas. Por acaso, está passando mal?
— Não, eu...
— Então não esteve dormindo bem, certo? Nunca vi alguém falando dormindo antes...
Grunhi, esfregando os olhos. Tudo o que menos queria era chamar atenção de maneira desastrosa com uma garota popular que nem mesmo conhecia.
— Que droga... — agarrei minhas coisas contra minha mochila tão rápido movia as mãos, até que algo me passou pela mente naquele instante: — Hum... por acaso, você só está aqui até agora por que ficou me esperando?
A minha pergunta a deixou surpresa inesperadamente. Para a minha sorte já havia terminado minhas atividades, mas não percebi tal intenção.
— Desculpe pela demora que causei, esqueça o que eu disse e já estou saindo daqui...! — Me levantei desengonçado da cadeira, enquanto ainda guardava as coisas na mochila. Fiquei completamente aturdido.
— Espere.
Minha mão tocou na maçaneta da porta, mas sua voz me deteve. Olhei para trás, confuso.
Ela se levantou da cadeira e veio até mim: — O que quis dizer com querer o próprio satélite?
Não soube como responder. O vácuo entre nós oscilou e durante um momento senti que aquela redoma de vidro a rodeando gerou uma abertura como rachadura.
— Você provavelmente riria de mim... foi só um sonho que tive na hora, esqueça.
— Você não percebeu que queria que fosse embora a partir do momento que disse “está livre para ir embora.” e agora quer que ignore o que falou dormindo?
Cocei a nuca. Provavelmente não tinha outra escapatória senão passar por aquela vergonha e torcer para que não houvesse consequências posteriores por já ter tantos outros problemas para resolver: — Está bem... acontece que não ando dormindo direito pelos meus hábitos noturnos de observar as estrelas e fico desejando toda vez em querer um lugar só meu...
— ...como um satélite... — deduziu a garota surpresa. Seus olhos reluzentes me fitavam intensamente.
Continuávamos a nos encarar como se o tempo tivesse congelado novamente, conforme ela se aproximava a passos ruidosos. Após alguns segundos nos fitando, senti uma vontade súbita de perguntar: — Você conhece a trilogia de Hisashi Masayoshi?
As mesmas falas se chocaram dado que Yonagi ficou sem reação. Como é possível... ela conhece meu autor favorito?
— A presilha em seu cabelo é um souvenir dos contos dele, certo? — indaguei.
Ela concordou ao tocar no objeto em seu cabelo e disse: — Então você também está na procura de um lugar para si... um satélite. Mas... por qual razão quis permanecer depois do que eu disse?
Engoli em seco ao ouvir aquelas palavras. Não estávamos tão perto um do outro, mas aquele olhar me atravessava por completo e tropecei no que dizer: — Acho... acho que apenas queria saber o tipo de pessoa que você é, Yonagi.
— O tipo de pessoa... que eu sou?
Ela pareceu estar mais confusa do que eu e fez uma expressão sincera de dúvida.
— Como espera descobrir o tipo de pessoa que eu sou se você esconde o seu rosto com uma máscara?
— !!
Meu peito ressoou fortemente, como se a cada passo que aquela garota desse adiante pudesse me esmagar naquele lugar afastado de qualquer outra coisa que nos trouxesse para aquela realidade conhecida. O recinto em que me encontrava repleto de vácuo pareceu se preencher de um ar gélido que senti me consumir sem conseguir oferecer nenhuma resistência.
Era como se realmente estivesse na órbita de Netuno, congelando a cada segundo. Dei uma rápida tossida para recompor minha atenção: — É... tem razão. Desculpe, fui pretencioso.
— Por acaso, pessoas reservadas te chamam atenção?
— Com certeza. Diferente dos outros, pessoas assim me dão vontade de querer mais sobre elas.
— Mesmo sabendo que sou a presidente deste clube e que sou considerada uma das melhores da escola?
Certo, agora minha tensão cresceu ao ouvir aquela resposta.
— Bem... isso me pegou de jeito..., mas a minha resposta continua a mesma.
— A mesma resposta? Então, não importa qual é o status da pessoa?
Não entendi a razão dela querer me questionar tanto, mas tive a sensação de que devo me manter firme no que preciso dizer e não sobre o que ela queira ouvir.
— O que é o status do que meramente um título? Se eu sei que há pessoas que preferem estar em paz e gostam de serem elas mesmas, não o que a rotulam?
— ...
Considerei que nossa conversa tomou um rumo normal para variar, mas Yonagi se conturbou em minha oposição. Suas bochechas ficaram levemente rosadas, deixando-a muito fofa.
— Eu... não esperava que fosse responder isso com tanta sinceridade...
— Ei! Foi você que perguntou isso, não foi?! Aliás, estou vendo muitas expressões suas que nunca imaginaria que fossem reais!
— Ah, verdade! Você é irritantemente sincero e não prestei atenção em mim mesma... — Ela tocou o próprio rosto vermelho.
Ah, chega! O que há com essa garota?! Ela me deixou totalmente sem jeito! Voltei a atenção para a maçaneta da porta agindo o mais rápido que conseguia, mas Yonagi percebeu a minha intenção de fugir.
— Espere! A conversa ainda não acabou! Agir desta forma com uma pessoa que acabei de conhecer é embaraçoso!
Ela segurou o meu braço, me impedindo de sair da biblioteca.
— Não venha com essa! Eu acabei de chegar nesta escola, não vou ficar espalhando por aí que você acha fofo pessoas que sejam tímidas sejam notadas por quem sejam!
— Neste caso, como já sou daqui poderia falar para a professora Harashima que você fala dormindo e tem uma queda por garotas reservadas, seja lá que tipos de intenções tenha a partir disso!
— Ei! Ei! Pare com isso! Vai parecer que sou um estranho que fica atrás de pessoas solitárias! Eu não sou nenhum estranho e não diga por aí que falo dormindo!
— Eu já disse, você não pode se safar de um pensamento desse se estiver disfarçando o seu rosto com uma máscara se nem está doente!
Sua mão ainda segurava meu braço direito e subitamente coloquei meu peso contra a outra mão, sob a maçaneta.
Porém, acabei empurrando a porta e escorreguei para trás. Fiquei tão surpreso que não pude reagir. Yonagi soltou o meu braço pelo susto e tentou pegar em meu ombro, mas sua mão só alcançou a alça de minha máscara.
Eu caí com tudo no chão, assustado com a queda.
No entanto, senti meu coração quase parando no instante seguinte.
Minha máscara caiu no chão bem na minha frente. Fiquei paralisado a ponto de prender a respiração. Permaneci imóvel e não consegui pensar, nem sequer agir. Uma parte de mim apenas queria ver o que iria acontecer a seguir.
Yonagi ficou atônita durante um bom tempo.
— Seu rosto...
Não consegui reagir por vê-la tão perto de mim. Demorei para formular as palavras: — Eu... tenho o rosto deformado. Tenho essa cicatriz desde que nasci.
Não há um espelho ali, mas sabia o que Yonagi viu neste instante. No espaço entre o meu nariz e minha boca há uma imensa cicatriz que desfigura todo o meu rosto.
Ela foi a primeira pessoa daquela escola que viu meu rosto. Não, isso não era pra acontecer! Ninguém deveria ver!
Aquele era o meu lado vulnerável, meu maior ponto fraco. Aquela pequena segurança através da máscara me garantiu uma atmosfera da qual poderia agir discretamente e foi arruinada por um simples descuido!
Não consegui escutar nada ao meu redor, apenas a respiração de Yonagi perto de mim. Minha mente se enevoou e minhas mãos tremiam. Não, meu corpo que tremeu, senti um frio desconfortável me preenchendo como se toda a gravidade ao meu redor me abandonasse, restando apenas um espaço gigante e vazio me sufocando...
Qual será a reação dela por me ver daquele jeito?
O que iria falar?
Como vai reagir?
Ela vai sentir repulsa e se afastar de mim?
Ela vai exigir que saía do clube?
Ela vai virar os olhos para não ver meu rosto?
Ela vai...
Ela vai...
Ela...
Ela fez uma expressão decidida em seu rosto dizendo: — Acho que... sem essas olheiras, você seria confundido com qualquer pessoa.
— Hein?
O quê? O que foi aquilo que ouvi? Ela disse aquilo mesmo? Não consegui acreditar.
— Porquê você está tremendo assim? — indagou ela.
— Eu...
De repente seu rosto enrubesceu e ela também ficou sem jeito.
— Me desculpe. Não devia ter ficado surpresa. Isso é apenas uma deformação, nada demais... — proferiu a garota ao me encarar diretamente.
Minha mente permaneceu aturdida, mas sua resposta me deixou ainda mais sem jeito. Senti no tom de sua voz que aquelas palavras não saíram da boca para fora. Foram palavras sinceras e gentis.
— Não se incomode com isso... — disse ao me levantar abruptamente. — Eu que devo pedir desculpas.
— Mas, Shiroyama. Você não deve se sentir deste jeito... — Yonagi levantou o rosto e me respondeu de maneira mais séria.
— Hein? Como assim?
— Shiroyama, isso não é algo para se envergonhar e muito menos de se esconder... — expressou Yonagi, suavemente. — Não sei o que passou quando era mais novo, mas nunca julgaria uma pessoa pela sua aparência exceto se ela mesmo não se importasse com isso e se julgasse como a melhor pessoa do mundo.
— Acho que isso é um senso comum...
— Você pode ter esses olhos mortos, mas seu rosto não é assim. Não deixe que uma máscara defina como deva agir e nem como precisar ser para ter seus objetivos.
Não consegui evitar minha surpresa.
Afinal... como ela mesma disse que era uma das alunas com notas altas naquela escola, não seria surpreendente se tivesse um ego grande ou algo assim. Era o que normalmente se esperaria de alguém com alto status, não é?
Por essa razão sua ternura me atingiu profundamente. Por causa do susto da queda não reagi de imediato e neste instante pegou em minha mão, dizendo:
— Imagino que deva ser algo muito difícil para você, então vamos manter isso em segredo. Desculpa se acabei sendo presunçosa sobre o que disse antes. Daqui em diante, nossos lados vulneráveis ficarão em segredo... — pontuou ela, curvando a cabeça. — Ambos temos razões de procurarmos o que deva ser melhor, certo? Algo que seja importante.
Não consegui responder, então apenas acenei a cabeça e coloquei minha máscara novamente.
Então, ela não costuma mostrar aquele lado dela aos outros com frequência?
Perto da porta, acenei uma despedida e saí dali rapidamente.
Por que tive que me despedir?
Cocei a nuca pela raiva... não, não foi raiva. Meu rosto corou pela vergonha de deixar uma garota na biblioteca me esperando sem perceber e de enxergar o que há em meu coração. Conferi o relógio do celular e me veio um alívio por ter finalizado os deveres bem antes do horário do clube terminar. Atravessei o hall após trocar os sapatos com ferocidade, torcendo para que ninguém me visse naquele momento.
— Ainda bem...
Pelo pôr-do-sol que cobria o ambiente de laranja pelo pátio, agradeci baixinho transparecendo o rosto da cor daquele mesmo céu.
— Ainda bem que ela não me viu fazendo essa cara ridícula...!
O fato de estar aliviado por aquela garota não ter visto meu rosto corado em vez da minha deformação era motivo suficiente para saber que não estava pensando direito no que aconteceu.
Fui para casa com um gosto ruim na boca e uma sensação de puro desgosto próprio. Podia ter percebido aquilo antes, mas acabei baixando a guarda.
Prometi a mim mesmo que na próxima vez não cometerei um erro como aquele. Não apenas de ter negligenciado minha percepção, mas também para o fato de saber distinguir as pessoas pelos que são de verdade.
Eu realmente não notei o quanto Yonagi me analisou naquele dia.
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