Volume 3
Capítulo 5: O Passado que Eu Queria Esquecer e o Passado que não.
“—Waaaaahhh!”
Um dia depois de ir ao zoológico com Charlotte-san, ouvi a voz chorosa de Emma-chan quando Charlotte-san e eu fomos buscá-la na pré-escola depois da escola.
Ao ouvir a voz dela, nós dois entramos apressadamente na pré-escola. E então-
“Waaaaahhh! Onii-chaaaaan!”
Emma-chan, que tinha me notado, veio correndo em minha direção com lágrimas nos olhos. Quando ela chegou aos meus pés, ela agarrou-se firmemente à minha perna. Eu não sabia por que ela estava chorando, mas a peguei no colo e acariciei suavemente sua cabeça. Com isso, Emma-chan pareceu recuperar a compostura e parou de chorar e pressionou o rosto contra meu peito. Enquanto continuava acariciando a cabeça de Emma-chan e confortando-a, voltei meu olhar para a professora da pré-escola.
“Mas o que foi que aconteceu?”
“Bem, veja...” A professora da pré-escola desviou desajeitadamente o olhar de mim para o gato de pelúcia com uma das orelhas quase arrancada. Foi o que eu dei de presente para Emma-chan ontem. Por que diabos a orelha de um gato de pelúcia novinho em folha quase foi arrancada…?
“Esse é o pelúcia que dei para Emma-chan?” Decidi verificar com Charlotte-san, que estava ao meu lado.
“Sim, isso mesmo… Ela trouxe hoje, então tenho certeza que é o mesmo…”
Parece que eu estava certo. Ela estava segurando-o desde que chegou ao meu quarto esta manhã, sem soltá-lo nem por um momento. Emma-chan devia estar chorando muito porque o gato de pelúcia que ela tanto amava estava danificado. No entanto, não deveria ter sido fácil para um gato de pelúcia quase novo rasgar apenas por brincar com ele normalmente. E não há como Emma-chan tê-lo rasgado deliberadamente. Isso significa que há uma grande possibilidade de que terceiros tenham feito algo.
“Você poderia me dizer como isso aconteceu?” Tentei perguntar à professora da pré-escola, que parecia saber o que aconteceu, mas tomei cuidado com meu tom e expressão. Ela então abriu a boca hesitantemente.
“Na verdade… Uma amiga queria pegar emprestado o gato de pelúcia, mas Emma-chan não queria dar. Eles acabaram brincando de cabo de guerra, e bem, isso aconteceu... Eu não percebi o que estava acontecendo até ouvir Emma-chan chorar. Outra criança me contou o que aconteceu… Me desculpe, não prestei mais atenção…” A professora da pré-escola explicou tudo e depois fez uma reverência, desculpando-se. Em vez disso, isso me fez sentir um pouco culpado.
“Não, eu entendo que seja difícil para uma única professora da pré-escola ficar de olho em todas as crianças. Já que Emma-chan não se machucou nem nada, por favor, não se preocupe muito com isso.”
Na realidade, existe um problema social com a falta de professores de pré-escola e a sua incapacidade de vigiar todas as crianças. Embora muitos pais possam não perdoar tal descuido e responsabilizassem os professores da pré-escola, é equivocado culpá-los quando eles não são necessariamente os culpados, dadas as circunstâncias. Se aumentarmos o seu fardo desta forma, isso poderá levar a um ciclo vicioso em que ainda menos trabalhadores que cuidam de crianças permanecem na profissão. Desta vez, Emma-chan não se machucou, e eu sempre posso comprar outro gato de pelúcia para ela, então não há nenhum problema.
“M-muito obrigada…!” Parecia que a professora da pré-escola havia se preparado para uma dura reprimenda, enquanto soltava um suspiro aliviado, o rosto mostrava seu alívio. Com tantos pais autoritários hoje em dia, aqueles que são encarregados de cuidar dos filhos enfrentam muitas dificuldades. Bom, deixando isso de lado…
“A propósito, onde está a criança que tentou tirar a pelúcia à força de Emma-chan?” Abri um sorriso e perguntei à professora da pré-escola sobre a situação. Por alguma razão, ela estremeceu de medo, mas hesitantemente abriu a boca para responder.
“Hum... ali...” Seguindo a direção que ela apontou, vi uma garotinha, com lágrimas escorrendo pelo rosto, olhando para mim com apreensão. Ela provavelmente pensou que eu iria repreendê-la porque Emma-chan veio chorando até mim. Aquela garota…
“Charlotte-san, por favor, cuide de Emma-chan.”
“Ah, sim, espere, ela não vai me soltar...” Quando tentei entregar Emma-chan para Charlotte-san, ela estufou as bochechas e agarrou-se firmemente às minhas roupas. Aparentemente, ela não tinha intenção de desistir.
“Emma-chan, você pode deixar Charlotte-san te carregar só um pouquinho?”
Eu senti que com ela por perto seria difícil conversar com sua amiga com lágrimas nos olhos, então tentei fazer com que ela ficasse com Charlotte-san. No entanto, Emma-chan recusou-se a me deixar ir. Além disso, ela olhou para mim com aqueles olhos grandes e úmidos, implorando silenciosamente. Seu olhar era tão lamentável que me fez querer ceder a qualquer uma de suas exigências. Eu era incrivelmente fraco contra aqueles olhos.
…Mas agora, há uma garota confiável ao meu lado para momentos como este.
“Sinto muito, Emma.” Percebendo os olhos de Emma-chan cheios de lágrimas, Charlotte-san rapidamente cobriu os olhos com as duas mãos. Pode parecer um pouco duro, considerando como Emma-chan estava chorando há pouco, mas se ela não fizesse isso, não haveria vitória contra as táticas chorosas de Emma-chan. Percebendo quem estava cobrindo os olhos por causa da voz, Emma-chan começou a ficar furiosa com Charlotte-san. Ela deve estar descontando sua frustração nela.
Aproveitando isso, entreguei Emma-chan para Charlotte-san. Talvez tendo algumas reclamações sobre ela, desta vez Emma-chan voluntariamente se mudou para seus braços. E então, como se quisesse desabafar sua raiva pela pelúcia, ela começou se agitar com Charlotte-san. Apesar de tudo, Charlotte-san permaneceu calma e serena. Quando a vejo assim, não posso deixar de pensar que ela realmente é uma ótima irmã mais velha. Agora então…
Casualmente voltei meu olhar para a garotinha que ainda nos observava com medo. Ela se encolheu só de fazer contato visual, mas eu não tinha intenção de brigar com ela. Eu só queria dar alguns conselhos a ela para que ela não tivesse problemas no futuro.
“Claire-chan, está tudo bem, você não precisa ter medo.” Me aproximei da garota assustada, Claire-chan, agachei-me ao nível dela e falei com ela com um sorriso. Ela me olhou surpresa, mas assim que recobrou o juízo, recuou cautelosamente. Porém, como ela já estava perto na parede, ela imediatamente esbarrou nela. Percebendo que não poderia mais recuar, ela manteve os olhos em mim e começou a se mover para a esquerda ao longo da parede. Ela é uma criança bastante ágil. Ela provavelmente pretendia manter distância de mim e então sair correndo assim que houvesse espaço suficiente entre nós. As crianças muitas vezes pensavam assim, mas com a diferença de tamanho, eu poderia alcançá-la facilmente, mesmo que ela conseguisse criar alguma distância. Ainda assim, deixá-la pensar que correr era a solução não era uma boa ideia.
“—Está tudo bem, não vou ficar com raiva. Vamos conversar um pouco.” Para fazê-la entender que não havia escapatória, fechei a distância que Claire-chan havia criado em um instante e falei com ela novamente com um sorriso. Claire-chan, percebendo que não poderia fugir, olhou para mim com lágrimas escorrendo pelo rosto, mas sua expressão estava completamente cheia de medo. Nesse estado, não importa o que eu dissesse, isso não chegaria até ela. Achei que tínhamos feito algum progresso no nosso relacionamento, mas parecia que estávamos de volta à estaca zero.
Primeiro, eu precisava criar uma situação onde pudéssemos conversar, então lentamente estendi minha mão para Claire-chan. Quando fiz isso, ela fechou os olhos e se encolheu como se estivesse escondendo alguma coisa. Talvez ela pensasse que levaria uma surra por fazer algo errado. Claro, não era por isso que eu estava entrando em contato.
“Pronto pronto. Está tudo bem, você não precisa ficar com tanto medo.” Eu disse, acariciando sua cabeça com delicadeza e cuidado para remover o medo de suas emoções. Com isso, ela abriu os olhos hesitantemente e olhou para mim com aqueles olhos cheios de lágrimas. Parecia que ela estava verificando se eu realmente não estava com raiva. Então, eu dei a ela um sorriso gentil.
“Você gosta de gatos, Claire-chan?”
“Sim...”
“E você queria pegar emprestado o gato de pelúcia da Emma-chan, não é?”
“......... Sim...” Embora as respostas de Claire-chan tenham sido apenas “sim”, ela estava, no mínimo, respondendo corretamente. Sua resposta sobre querer pegar a pelúcia emprestada foi lenta, provavelmente porque ela pensou que eu ficaria com raiva se ela concordasse. Mas eu nunca ficaria com raiva.
Não é incomum que uma criança queira algo que pertence a outra pessoa, e as crianças crescem vivenciando essas coisas.
“Entendo… Mas sabe, não é certo tentar tirar algo de uma amiga à força, certo?”
Tendo o cuidado de manter uma voz gentil, fiz questão de ensinar corretamente a Claire-chan o que ela não deveria fazer. Ela pareceu entender que havia feito algo errado e acenou com a cabeça obedientemente. Eu pensei que ela era uma criança mais egoísta desde que ela puxou a orelha do bicho de pelúcia até quase rasgar, mas vendo ela assim, ela parecia uma criança honesta. Ela também tinha ouvido obedientemente quando cantávamos juntos antes, então imaginei que ela era fundamentalmente uma boa criança. Por enquanto, parecia que ela entendia que tinha feito algo errado, então senti que não havia necessidade de repreendê-la.
—No entanto, ao mesmo tempo, pensei que isso tornava a situação ainda mais problemática. Para as crianças que não entendem que estão fazendo algo errado, basta explicar-lhes o que não devem fazer. Mas essa criança, apesar de saber que o que fez foi errado, ainda assim agiu de acordo. Isso pode ser devido à incapacidade das crianças de controlar suas emoções. E assim, mesmo que eu a fizesse entender agora, eu tinha certeza de que ela faria a mesma coisa novamente se encontrasse uma situação semelhante. Afinal, as emoções não são lógicas. Agora, o que fazer…?
Eu me perguntei como poderia ter certeza de que essa criança não tiraria mais coisas dos outros à força e coloquei a mão no queixo, pensativo. Foi quando avistei o gato de pelúcia que Emma-chan adorava, com a orelha quase arrancada… Pode valer a pena uma tentativa. Ao ver o gato de pelúcia, tive uma ideia, então fui pegá-lo de onde estava no chão. Assim que peguei, levei de volta para Claire-chan.
“O gatinho está falando que a orelha dói muito porque está prestes a cair, sabe?” Eu disse a Claire-chan como se o bicho de pelúcia estivesse realmente falando com ela, mesmo sendo apenas um bicho de pelúcia e não conseguindo falar. Claire-chan olhou para a orelha quase rasgada do gato de pelúcia e seu rosto virou como se ela fosse chorar de novo. As crianças têm um coração tão puro que, mesmo que seja apenas um bichinho de pelúcia, elas não conseguem deixar de vê-lo como uma verdadeira dor.
"Eu... sinto muito, gatinho... sinto muito..." Claire-chan murmurou, com suas mãozinhas acariciando ternamente a orelha machucada do peluche. Durante todo o tempo, ela continuou se desculpando em lágrimas. Eu senti que deixar uma criança sentir a dor de um objeto como esse iria repercutir mais nela do que apenas ficar com raiva. Agora, eu só precisava dar-lhe um último empurrão e então poderia ficar tranquilo por enquanto.
“Enquanto o gatinho, com a orelha quase arrancada, chora de dor, Emma-chan, que quase perdeu algo que ela amava, está chorando da mesma maneira. Então, você entende que não podemos fazer coisas assim de novo, certo?”
Eu não sabia o quanto do que eu disse Claire-chan poderia entender na idade dela. Além disso, embelezei um pouco a história. O resto dependia de quanto isso ressoasse em seu coração – mas provavelmente tudo ficaria bem.
“Claire… irá… pedir desculpas a Emma-chan também…” Mesmo sem eu dizer nada, Claire-chan se ofereceu para pedir desculpas a Emma-chan. Para os adultos, as desculpas muitas vezes acabam sendo meras formalidades, um ato em prol das aparências. Mas tais ideias nem sequer ocorreriam a uma criança como ela. Ela deve estar pensando genuinamente que precisa se desculpar com Emma-chan.
“É, entendi. Então, vamos juntos pedir desculpas a Emma-chan?”
“Ah… sim…!”
Quando falei com um sorriso, Claire-chan assentiu vigorosamente. Quando começamos a ir até Emma-chan, Claire-chan surpreendentemente estendeu a mão para segurar a minha, provavelmente porque eu tinha me oferecido para irmos juntos. E assim, de mãos dadas, voltamos para onde Emma-chan estava conversando com Charlotte-san.
“-Entendeu? Se uma amiga pedir algo emprestado, você deve emprestar para ela, certo?”
“Hmmph…!”
“Inchar as bochechas não vai te ajudar. Quero que você se torne uma pessoa que possa ser gentil com os outros.” Quando voltei com Claire-chan, Charlotte-san estava gentilmente advertindo Emma-chan com um sorriso. Em resposta, Emma-chan estufou as bochechas e lançou uma série de tapas leves em Charlotte-san, que facilmente os rejeitou. Ela já deve estar acostumada com isso.
[Del: “Standing here, I realize.”]
Parecia que elas estavam tendo algum tipo de conversa enquanto eu falava com Claire-chan, mas o motivo da frustração de Emma-chan parecia diferente de quando eu saí. Que tipo de conversa poderia ter deixado Emma-chan tão irritada? Sem saber da situação desde que acabei de voltar, resolvi observar a interação delas por um tempo. A professora da pré-escola percebeu minha presença imediatamente, mas as duas estavam muito absortas na conversa para me notar.
Não senti necessidade de interrompê-las, então apenas ouvi sua conversa, tentando entender o que estava acontecendo. Aparentemente Charlotte-san estava repreendendo Emma-chan por não ter emprestado seu gato de pelúcia para uma amiga. Do ponto de vista de Charlotte-san, ela provavelmente queria que sua irmã fosse uma pessoa gentil e atenciosa. Se Charlotte-san foi criada e ensinada por seus pais dessa maneira, ou se essa era sua maneira de pensar, eu não sabia, mas achei que era muito duro para uma criança pequena. Era natural que Emma-chan ficasse com raiva e protestasse. Desta vez, eu estava completamente do lado de Emma-chan.
“Charlotte-san, espere um momento.” Eu interrompi com minha mão na frente de Charlotte-san, que ainda estava dando um sermão em Emma-chan. Charlotte-san, que estava absorta na conversa e não percebeu minha presença, olhou para mim surpresa.
“Qual é o problema…?”
“Desculpe por interromper, mas acho que o que você está dizendo a Emma-chan está errado.” Confrontei Charlotte-san com uma leve dor no peito. Naturalmente, ela não esperava que eu dissesse tal coisa e olhou para mim com uma expressão confusa. Do ponto de vista dela, ela estava apenas transmitindo conhecimento comum, então minha refutação repentina, compreensivelmente, a pegou desprevenida. “Charlotte-san, você quer que Emma-chan se torne uma pessoa gentil e atenciosa, certo?”
“Sim, está certo. Não quero que ela cresça e se torne uma pessoa que não consegue pensar nos outros…”
“Eu entendo como você se sente. Mas acho um pouco cruel dizer a ela para emprestar até mesmo as coisas que ela ama aos outros.”
Por exemplo, se alguém estava com problemas e você tinha algo que poderia ajudá-lo, você deveria emprestar a ele. Da mesma forma, se um amigo próximo deseja algo que você tem e emprestá-lo não seria um inconveniente para você, você também deveria emprestá-lo. No entanto, não há necessidade de emprestar algo que você aprecia, mesmo para amigos.
E estava claro que Emma-chan adorava seu gato de pelúcia e nunca o perdia de vista. Então, ensiná-la que ela deveria emprestar até mesmo aquele pelúcia para uma amiga me pareceu muito duro. Foi por isso que decidi intervir.
“O que há de tão cruel nisso…? Estou apenas ensinando a ela a coisa óbvia de emprestar seus brinquedos para amigos…”
Charlotte-san se referiu propositalmente ao gato de pelúcia apenas como um brinquedo. Ela provavelmente queria dizer que era natural emprestar brinquedos aos amigos do ponto de vista geral. Ela não estava na defensiva; ela realmente parecia não entender meu argumento e estava procurando esclarecimentos.
“Isso é verdade, é ‘apenas um bicho de pelúcia’. Mas isso é apenas da nossa perspectiva, não da Emma-chan, certo? Para nós, pode ser apenas mais um bichinho de pelúcia, mas para ela é algo precioso que ela não quer abrir mão. Não devemos ignorar essa distinção.”
O valor que Emma-chan, a dona da pelúcia, e outras que não são, têm pelo brinquedo de pelúcia é diferente. É por isso que Charlotte-san pode facilmente dizer que deveria emprestá-lo a uma amiga.
No entanto, para Emma-chan, é algo que ela não quer abandonar, então é natural que ela proteste contra isso. No entanto, ela não tem palavras para explicar por que não quer emprestá-lo, então só consegue expressar isso por meio de suas emoções. Como resultado, Charlotte-san, sem perceber os sentimentos de Emma-chan, inadvertidamente impõe a ela sua própria maneira de pensar. Se isso continuar, há o risco de Emma-chan ver Charlotte-san como uma irmã mais velha incompreensível.
“Mas... mesmo que seja algo precioso, eu quero que ela seja o tipo de pessoa que pode emprestar coisas para seus amigos...” Charlotte-san provavelmente faria exatamente isso - ela toleraria isso e entregaria algo que ela aprecia se uma amiga ou amigo quisesse. Parece algo que ela faria sem pensar duas vezes. No entanto, acredito que esse modo de pensar é fundamentalmente falho.
“Perdoe minhas palavras rudes… mas você quer deixar Emma-chan infeliz, Charlotte-san?” Eu deliberadamente usei palavras duras com Charlotte-san, que ainda não estava convencida. Ela nunca pensaria em deixar Emma-chan infeliz, mas pensei que, a menos que dissesse dessa maneira, ela não reconsideraria sua posição. Ela havia se tornado tão arraigada na crença de que alguém deveria se sacrificar.
[Del: Olha quem fala...]
“E-eu nunca pensaria em tal coisa…! Por que você diria algo tão cruel…!?” Charlotte-san levantou ligeiramente a voz e, pela primeira vez, continha uma pitada de raiva. Por causa disso, Emma-chan, Claire-chan e a professora da pré-escola, que estava ouvindo nossa conversa em silêncio, estremeceram visivelmente. Emma-chan, com um olhar assustado, olhou para sua irmã, enquanto Claire-chan apertou minha mão com mais força.
Para as duas pequenas, qualquer demonstração emocional dos adultos pode ser intimidante. Emma-chan, que conhece a normalmente bondosa Charlotte-san, pode estar ainda mais assustada do que Claire-chan. Eu não pude fazer nada por Emma-chan, que estava embalada nos braços de Charlotte-san, mas dei um tapinha gentil na cabeça de Claire-chan, tentando confortá-la enquanto ela segurava minha mão. Assim que confirmei que a ansiedade de Claire-chan havia diminuído, voltei meu olhar para Charlotte-san.
“Se você continuar a ensiná-la dessa maneira, Emma-chan poderá ficar infeliz.”
“Por que é que…?” Charlotte-san lançou um olhar insatisfeito para mim. Pode ser a primeira vez que ela demonstra raiva ou insatisfação comigo. Mas mesmo que isso significasse ser odiado por ela, eu não poderia recuar.
“O que você está ensinando a ela, Charlotte-san, se eu fosse reformular, é apenas engolir, certo? Ensinar isso não é necessariamente uma coisa ruim; na verdade, acho que é essencial para crianças pequenas. Mas, sabe, fazê-la desistir até mesmo das coisas que são preciosas para ela, não é como dizer que ela deveria suprimir todos os seus desejos? Se ela se acostumar com esse modo de pensar, Emma-chan não acabará suprimindo todos os desejos ou vontades que ela tiver no futuro? Não ser capaz de fazer o que você quer é uma pena, você não acha?”
“………” Ao ouvir minhas palavras, Charlotte-san ficou em silêncio, sem oferecer qualquer resposta. Para ser honesto, eu não sabia o que ela estava pensando agora. Eu ainda não conseguia entender que tipo de pensamentos ela tinha sobre resistência, o que se tornou algo natural para ela.
【Resistir é difícil, mas resistimos para deixar todos felizes.】
【Resistir não é difícil, e se resistir deixa todos felizes, então não há problema.】
O significado por trás de “resistir” muda significativamente entre esses dois pontos de vista. Como Charlotte-san responderia à questão de “resistir é miserável” dependeria de qual maneira de pensar ela tinha. Por outro lado, também pude ver seus verdadeiros sentimentos com base em como ela respondeu.
Decidi não dizer mais nada e apenas esperar Charlotte-san dar uma resposta. É claro que, mesmo que ela pensasse assim, eu não tinha intenção de recuar. Mesmo que Charlotte-san não tenha achado doloroso, ainda assim foi doloroso para Emma-chan. Não havia como eu ignorar isso. Eventualmente, ela lentamente abriu a boca.
“… Você está certo… Insistir para que ela desistisse até mesmo das coisas que ela ama… foi um erro. Suportar demais… é doloroso afinal…”
—A resposta de Charlotte-san foi uma afirmação de que “resistir é miserável”. Isso significava, como pensei, que ela estava suportando as coisas, embora as achasse dolorosas. Eu já sabia o motivo pelo qual ela sofreu excessivamente com seu passado, mas se ela achasse que era doloroso, ela ainda poderia fazer algo a respeito sozinha. Ainda não se sabe se eu posso ou não ser alguém em quem ela possa se apoiar durante esses momentos…
“Obrigado pela compreensão. Dito isto, como mencionei anteriormente, ainda precisamos ensiná-la adequadamente a como suportar isso.” Expressando minha gratidão a Charlotte-san por acomodar minha perspectiva, sorri calorosamente para ela. Mudar uma mentalidade que se mantém há muito tempo pode realmente ser um desafio. Essa adaptabilidade deixou claro o quão notável ela verdadeiramente era. Ainda…
“…Mas Aoyagi-kun… acho que você também emprestaria seus pertences preciosos para amigos, certo?”
Quando eu estava prestes a voltar nossa conversa para o tópico Emma-chan e Claire-chan, Charlotte-san interrompeu com uma voz suave, e uma pitada de evidente descontentamento. Ela parecia ter entendido o que eu quis dizer, mas talvez quisesse sugerir que eu provavelmente faria o mesmo que ela. Não foi surpresa que ela pensasse assim, considerando que ela viu como eu costumo agir. No entanto, sua suposição estava errada.
“Quando algo verdadeiramente precioso entra na minha vida, eu não daria a ninguém, não importa quem eles possam ser. Afinal, eu tenho meu próprio senso de possessividade.”
Enquanto eu compartilhava esse sentimento com um sorriso, por algum motivo, o rosto de Charlotte-san ficou com um tom profundo de vermelho.
[Del: Senso de possessividade, hein.]
◆
“Desculpe por fazer você esperar,” eu disse assim que minha conversa com Charlotte-san terminou, virando-me para Claire-chan, com quem eu ainda estava de mãos dadas, e eu me dirigi a ela. Embora ela tivesse voltado para se desculpar, nossa conversa foi desviada inesperadamente. Mesmo assim, agora eu tinha que desempenhar meu papel corretamente. Mudando meu olhar de Claire-chan para Emma-chan, percebi que ela havia redirecionado sua atenção de Charlotte-san para mim. Um sinal de que ela poderia em breve pedir para ser carregada, eu suponhei.
“—Mmm, carrega...”
Veja, eu sabia. Ultimamente, eu senti como se tivesse aprendido a prever quando Emma-chan pediria para ser pega. Ou melhor, ela procuraria qualquer chance de ser carregada. Mas eu estava segurando a mão de Claire-chan. Segurar Emma-chan com apenas um braço seria precário. Eu poderia simplesmente soltar a mão de Claire-chan, mas idealmente, eu queria que Emma-chan descesse sem ser pega. Dada a intenção de Claire-chan de se desculpar, seria melhor se elas conversassem no mesmo nível dos olhos.
“......?” Emma-chan inclinou a cabeça, intrigada, pois eu não estendi a mão para segurá-la como de costume. ‘Ele geralmente me pega agora mesmo’, quase pude ouvi-la pensar isso. Antes que eu pudesse inventar uma maneira de encorajar a fofinha Emma-chan a descer, seu olhar se concentrou nitidamente em meu braço esquerdo, depois gradualmente desceu. Momentos depois, ao avistar Claire-chan, sua expressão mudou.
“Nh! Nh!!”
“Ei, cuidado! Você vai se machucar se debater assim!”
Talvez abrigando ressentimento pelo gato de pelúcia danificado, ao ver Claire-chan, Emma-chan começou a lutar nos braços de Charlotte-san. Por instinto, soltei a mão de Claire-chan para pegar Emma-chan. Porém, uma vez em meus braços, ela começou a bater furiosamente em meu peito.
“Emma-chan, acalme-se!”
“Nhh! Nhh!”
Meus apelos pareceram cair em ouvidos surdos, enquanto Emma-chan estufava as bochechas de raiva. Eu entendia os sentimentos dela; algo precioso para ela foi destruído. Mas se ela continuasse se debatendo enquanto eu a segurava, eu poderia deixá-la cair. No entanto, colocá-la no chão pode levá-la a dar um soco em Claire-chan, dado seu humor atual. Nem doces nem seu gato de pelúcia, que normalmente a acalmaria, estavam disponíveis. E também não era como se um gato de verdade passasse convenientemente por ali. O que fazer em tal situação…
“Emma! Se você continuar assim, o onii-chan ficará chateado com você!” Enquanto eu lutava para lidar com a explosão de Emma-chan, Charlotte-san, estranhamente, levantou a voz. Ela provavelmente imaginou que seu tom normal não alcançaria a criança agitada. Enquanto eu me perguntava se as palavras dela tinham algum peso, para minha surpresa, Emma-chan interrompeu sua agitação abruptamente. Ela então levantou o rosto com cautela, olhando para mim com olhos lacrimejantes e suplicantes. Parecia que ela estava tentando avaliar minha expressão.
Atordoado pelo impacto inesperado das palavras de Charlotte-san e aproveitando o momento, acariciei suavemente a cabeça de Emma-chan. Em resposta, ela agarrou minha camisa com força e pressionou o rosto contra meu peitoral. Um olhar fugaz para ela revelou não raiva, mas uma expressão um tanto taciturna. Ela poderia estar fazendo um esforço para reprimir a raiva que fervia dentro dela. Continuei acariciando sua cabeça com ternura até que ela finalmente decidiu olhar para cima novamente.
◆
“Mmm…”
Dez minutos depois – embora as bochechas de Emma-chan ainda estivessem um pouco inchadas, ela levantou lentamente o rosto. Sendo uma criança precoce, apesar da pouca idade, ela provavelmente chegou a algum tipo de resolução interna antes de levantar o olhar.
“Você está bem?”
“Mhm…”
Quando procurei confirmação, Emma-chan deu um leve aceno de cabeça. Eu gentilmente acariciei sua cabeça, murmurando suavemente, e então comecei a colocá-la suavemente no chão. Eu meio que esperava que ela fizesse uma birra assim que fosse colocada no chão, mas talvez entendendo por que ela estava abatida, Emma-chan obedeceu sem resistência. No entanto, ela ainda não estava pronta para soltar minha mão. Mas, bem, isso foi uma coisa pequena.
“Claire-chan disse que queria se desculpar pelo gatinho. Você vai ouvi-la?” Retransmitindo os sentimentos de Claire-chan, Emma-chan fixou o olhar nela. No entanto, a visão do gato de pelúcia surrado, com a orelha quase arrancada, pareceu ameaçar novamente sua compostura. “Mantenha-se firme…”
Ansioso para evitar uma nova explosão, acariciei suavemente sua cabeça de uma maneira reconfortante, encorajando-a. Com meu apoio, Emma-chan conseguiu conter as lágrimas e virou seu rosto para Claire-chan mais uma vez. Claire-chan, preparando-se para uma possível reação negativa, entregou o brinquedo de pelúcia danificado para Emma-chan.
“Emma-chan... me desculpe... por pegar o gatinho... E por... quebrar a orelha dele... eu realmente sinto muito...”
O pedido de desculpas de Claire-chan, embora hesitante, foi repleto de remorso genuíno. Mas Emma-chan, enquanto segurava a pelúcia do gato com força como se fosse preciosa, permaneceu em silêncio. Charlotte-san parecia prestes a dizer alguma coisa, mas eu a silenciei com um gesto. Este não era o nosso palco para tocar. Este era um assunto para Emma-chan e Claire-chan resolverem entre si. Comuniquei minhas intenções a Charlotte-san com um olhar significativo. Embora ela possa não ter compreendido todas as nuances, ela pareceu entender meu ponto principal e permaneceu em silêncio.
Agora, como Emma-chan responderia?
Para ser sincero, esperava que ela perdoasse Claire-chan. Claire-chan só queria brincar com o gato de pelúcia, ela não o danificou intencionalmente. Mas meu desejo de que Emma-chan perdoasse não se baseava apenas nisso. Eu queria que ela crescesse compreendendo a graça de perdoar os outros. Mas, esses eram meus sentimentos egoístas. Embora eu possa impressioná-la de maneira diferente quando ela for mais velha, não posso impor minhas emoções à nova Emma-chan. E mais do que tudo, eu queria que o perdão dela resultasse de sua própria vontade, não de pressão externa.
“Emma-chan… me desculpa…” Talvez desanimada pela falta de resposta, Claire-chan se desculpou mais uma vez. Desta vez, porém, houve uma reação de Emma-chan.
“O gatinho… está quebrado…”
As palavras que saíram da boca de Emma-chan não foram perdão nem ressentimento. Ela simplesmente afirmou o fato de que seu bicho de pelúcia estava danificado. Mas para Claire-chan, foi provavelmente a declaração mais penetrante que ela pôde ouvir. Poderia ter sido mais fácil para ela se Emma-chan tivesse ficado com raiva. Se ela tivesse desabafado sua raiva, Claire-chan talvez pudesse ter encontrado alívio para sua culpa. Mas se ela se deparar com tristeza em vez de raiva, quem causou tal emoção se sentirá ainda pior.
Emma-chan certamente não fez isso de propósito. Achei que ela se absteve de expressar raiva, pensando que não era a coisa certa a fazer. Essa falta de comunicação nascida da preocupação com um amigo estava agora acontecendo diante de nós… Seria muito cruel deixá-las se separarem assim… Embora eu tivesse decidido apenas observar, senti a necessidade de intervir, pois as coisas pareciam estar indo em uma direção ruim.
“Emma-chan, se for uma pelúcia de gato, posso te dar uma nova, okay?” Esperando que um novo brinquedo pudesse animá-la, eu sugeri, mas Emma-chan balançou lentamente a cabeça de um lado para o outro.
Ela então me mostrou o bichinho de pelúcia do gato.
“Gatinho foi… o primeiro presente… do onii-chan… É o tesouro da Emma…”
“!!”
Isso era apreciado porque foi o primeiro presente meu. Mesmo que ela recebesse outro idêntico, nunca poderia substituir o original. Entendendo o que Emma-chan queria transmitir, meu coração se encheu de emoção. Nunca percebi que ela valorizava tanto isso... Senti vergonha de mim mesmo por ignorar os sentimentos dela. Mesmo depois de ter dado um sermão hipócrita em Charlotte-san, eu não tinha entendido completamente os sentimentos de Emma-chan.
“Obrigado por apreciar ele.” Gentilmente, dei um cafuné na cabeça de Emma-chan, que segurava seu bichinho de pelúcia tão preciosamente. Neste momento, tudo que pude fazer foi oferecer palavras de gratidão. Em troca, eu faria o meu melhor para cumprir os desejos de Emma.
“Charlotte-san, você é boa em costura?”
“Ah… não sou particularmente ruim nisso, mas nunca costurei um bichinho de pelúcia antes…”
“Certo…”
Se Charlotte-san pudesse concertar, as coisas teriam sido mais simples, mas se ela não estivesse confiante, não havia muito que pudéssemos fazer. Tirei meu smartphone do bolso. Depois de digitar e enviar uma mensagem rapidamente, uma resposta voltou em um instante. O conteúdo lido era—
《Deixe comigo…!》
Foi uma resposta tranquilizadora.
“Emma-chan, o gatinho será consertada.”
“Mesmo…!?”
Ao ouvir que a pelúcia do gato seria consertada, os olhos de Emma-chan reluziram. Ela parecia absolutamente feliz. Eu não tinha certeza se poderia ser restaurado perfeitamente, mas acreditava que aquela pessoa se sairia bem.
“Emma-chan, você pode perdoar Claire-chan?”
Tendo visto seu humor melhorar, sutilmente direcionei o olhar de Emma-chan para Claire-chan. Ela estava inquieta, as pontas dos dedos se tocando, aparentemente esperando pelas palavras de Emma-chan.
“... Gatinho… vai melhorar… então está tudo bem…”
“—Ah! O-obrigada!”
Aliviada pelo perdão de Emma-chan, o rosto de Claire-chan se iluminou em um instante. As lágrimas que corriam livremente eram diferentes de antes; provavelmente eram de alívio.
Assim que eu pensei que eles tinham feito as pazes — huh? Justo quando eu pensei que tudo estava resolvido e comecei a relaxar, Emma-chan começou a caminhar até Claire-chan. Ah... talvez ela esteja prestes a fazer algo como sinal de reconciliação. Sendo crianças, talvez elas apertem as mãos ou algo assim? No entanto, assim como eu estava perdido em um pensamento tão casual—
“Mas… Você não pode pegar… o onii-chan…!”
—Andando bem na frente de Claire-chan, Emma-chan bateu levemente seu gato de pelúcia contra a testa de Claire-chan.
“Emma!?” “Emma-chan!?”
Acreditando que elas estavam simplesmente se reconciliando, fomos todos pegos de surpresa pelo movimento inesperadamente desafiador de Emma-chan.
◆
—Eu pensei que Emma-chan dar uma cabeçada em Claire-chan com o bicho de pelúcia a deixaria chateada, mas talvez devido à força gentil, Claire-chan não ficou com raiva. Em vez disso, ela sorriu e abraçou Emma-chan com força, que a abraçou de volta com a mesma força. Parecia uma espécie de ritual de reconciliação entre elas. Com as duas voltando a ser boas amigas, saímos da pré-escola tranquilos.
Agora, estamos a caminho de alguém que possa consertar o bicho de pelúcia danificado. Só para constar, Emma-chan, aparentemente cansada de chorar, estava dormindo profundamente em meus braços. Seu rosto pacífico e confiante me fez sentir aliviado.
“—Este é o lugar…?”
“Huh? Oh, certo…”
Olhando para cima em resposta à voz de Charlotte-san, o que encontrei nos meus olhos foi completamente inesperado. Um prédio que parecia ter saído de um mangá; velho e desgastado. Só para ter certeza, verifiquei novamente o endereço. O endereço que eu inseri no aplicativo de mapa correspondia ao endereço que recebemos, e o aplicativo confirmou que esse era de fato nosso destino. Aparentemente, nossa pessoa de contato, Karin Shinonome-san, morava aqui.
Embora surpreso com a aparição inesperada da casa, toquei a campainha sem hesitar. Pouco depois, ouviram-se pequenos passos e a porta se abriu.
“B-bem-vindo…!” A pessoa que surgiu foi uma Shinonome-san ligeiramente sem fôlego. Ela não precisava sair com tanta pressa ...
“Desculpe pela visita repentina, Shinonome-san.”
“Sinto muito, Shinonome-san.”
Charlotte-san e eu pedimos desculpas. Ambos entendíamos que passar inesperadamente na casa de alguém, especialmente durante as noites dos dias de semana, poderia ser inconveniente. Mas Shinonome-san balançou a cabeça de um lado para o outro.
“N-não, está tudo bem... Você ficou... surpreso?” Imaginei que ela estava se referindo ao estado da casa. Pode ser rude ser honesto sobre isso, mas mentir poderia prejudicar nosso relacionamento, o que não era algo que eu queria. É melhor evitar mentiras quando elas não são necessárias.
“Só um pouco. Mais importante ainda, este é o gato de pelúcia. Acha que pode consertar?” Eu admiti, mas rapidamente desviei o assunto. Emma-chan ainda estava segurando o brinquedo apesar de estar dormindo, então mostrei Emma-chan e o gato de pelúcia para Shinonome-san.
"Sim... só está desmanchando nas costuras, então deve ficar bem... Provavelmente... tinha uma costura fraca para começar... Caso contrário... não sairia tão limpa..."
Como esperado, o julgamento após ver o bicho de pelúcia foi rápido. Certamente, como apontado, a orelha do gato de pelúcia foi arrancada de maneira peculiar e limpa. Em circunstâncias normais, se algo fosse puxado com força, o tecido ao redor da área costurada rasgaria junto. Porém, com esse bicho de pelúcia, apenas a área que parecia ter sido costurada saiu.
Assim como Shinonome-san mencionou, a linha usada para costurar devia estar fraca para começar. Era para ser novo, mas parece que tive azar. Talvez seja por isso que, em uma briga entre Emma-chan, que mal tinha forças, e Claire-chan, ela se desfez facilmente.
“Estou feliz. Posso confiar em você?”
“Sim, mas…”
Shinonome-san mudou seu olhar para Emma-chan, parecendo querer dizer alguma coisa. Parecia que ela queria dizer que não poderia consertar a menos que a pelúcia do gato fosse entregue a ela. Embora não fosse impossível consertá-la em seu estado atual, seria bastante inconveniente. Mais importante ainda, ela provavelmente não queria acordar Emma-chan, o que poderia representar um risco.
Com cuidado, gentilmente e sem causar nenhuma dor, afrouxei cada um dos dedos de Emma-chan do gato de pelúcia. Optei por não acordá-la, em parte porque para Emma-chan, Shinonome-san era uma estranha e ela poderia resistir em deixar o brinquedo de pelúcia. Além disso, ela provavelmente ficaria mal-humorada logo depois de acordar. Então, eu pretendia deixá-la dormir – esse era o plano de qualquer maneira…
“... Hmm…? Ah… gatinho…! Gatinho!”
Quer eu não tenha afrouxado seu aperto com sucesso ou a súbita ausência do gato de pelúcia a tenha deixado inquieta, Emma-chan, que deveria estar dormindo, acordou. E com Shinonome-san ainda diante dela, ela estendeu os dois braços tentando pegar a pelúcia do gato de volta.
Shinonome-san, surpresa, estava prestes a devolvê-lo para Emma-chan, mas eu segurei Emma-chan, impedindo-a de pegá-lo. Consequentemente, Emma-chan olhou para mim com uma expressão que parecia perguntar: “Por que você está me impedindo...?” Então, respondi com um sorriso tranquilizador.
“Esta moça vai consertar o gatinho para você. Você pode emprestar para ela um pouco?”
“… Nh.” Parecia que Emma-chan acreditou em minhas palavras. Após um momento de contemplação, ela assentiu suavemente e se acalmou. Quando dei um tapinha na cabeça de Emma-chan para elogiá-la por seu bom comportamento, ela riu e aninhou a cabeça no meu peito. Ela deve ter pensado nisso como uma forma de demonstrar afeto.
“Não tenho certeza do que você disse… mas Aoyagi-kun, você é realmente incrível…”
(Charlotte) “Sério, eu sempre penso isso...” Reagindo às vozes delas, levantei a cabeça para ver Shinonome-san e Charlotte-san olhando para mim com sorrisos suaves. Eu me senti um pouco envergonhado.
“De qualquer forma… é uma coisa boa…”
“O que é?”
“Eu também… tenho algo para conversar com você, Aoyagi-kun…”
Reagindo às palavras de Shinonome-san, por algum motivo, ela olhou para meu rosto com uma expressão um pouco envergonhada. Então, Charlotte-san olhou para Shinonome-san com uma expressão surpresa.
“Uma conversa?”
“Eu gostaria de fazer isso mais tarde… Por enquanto, por favor, entrem…”
Eu estava curioso sobre o que ela queria falar, mas parecia que Shinonome-san ainda não estava pronta para discutir isso. Portanto, decidi aceitar a oferta dela e entrar na casa.
“Por favor, desculpe a intrusão” “Estou entrando”
“Claro… mais uma vez… bem-vindos…”
Seguindo Shinonome-san, nós a cumprimentamos e entramos em sua casa. O interior era bastante antiquado, tal como o exterior, mas estava bem conservado e livre de pó.
“—Ah, amigos? É raro Karin trazer amigos.”
Enquanto seguia Shinonome-san, uma mulher logo saiu de uma sala. Ela era um pouco mais alta que Shinonome-san, talvez um pouco mais velha que nós também? Ao contrário de Shinonome-san, seus olhos não estavam cobertos pela franja e ela era uma mulher muito bonita. Ela provavelmente era a irmã mais velha de Shinonome-san.
“O qu-!?”
Porém, por algum motivo, quando a senhora viu meu rosto, seu lindo rosto se distorceu com uma expressão assustada. O que aconteceu?
“Ka-Karin, não me diga… Isso é preocupante…! Não temos nenhuma confirmação ainda…!”
“Uh-huh, está tudo bem… Ele simplesmente passou por aqui…”
De alguma forma, Shinonome-san e sua irmã mais velha começaram a sussurrar uma para a outra. Eu não sabia o que elas estavam discutindo, mas Charlotte-san, ao meu lado, tinha uma expressão um pouco confusa.
“Qual é o problema?” Eu perguntei, atraído por sua expressão. Mas Charlotte-san apenas balançou a cabeça.
“Não… eu também não sei…”
Eu me perguntei o que chamou a atenção dela. Como eu nutria tais dúvidas, parecia que a conversa de Shinonome-san com a senhora chegou ao fim.
“Por enquanto, mãe, vamos apenas consertar um bicho de pelúcia, então vamos usar a sala…”
“O qu-!?” “Huh!?”
Mãe…? Não é sua irmã mais velha, mas...? Com as palavras que Shinonome-san falou alto o suficiente para nós dois ouvirmos, Charlotte-san e eu ficamos perplexos.
“O que foi…?”
“Uh, bem…”
Vendo nossas reações, Shinonome-san perguntou com uma expressão confusa. Fiquei dividido, sem saber se era ou não apropriado perguntar sobre isso. Mas discutir a idade de alguém poderia ser considerado rude, então engoli em seco, contendo a curiosidade. Além disso, provavelmente não a ouvi mal.
“Não, não é nada”
“É? Bem, se você diz...” A inocente Shinonome-san parecia não se importar com minha evasão. Portanto, balancei a cabeça sem expressar minhas preocupações infundadas. Então a mãe de Shinonome-san falou.
“Obrigada por ter vindo. É um lugar pequeno, mas por favor sintam-se em casa”, disse ela com um sorriso antes de se distanciar e seguir em direção ao que parecia ser a cozinha. De alguma forma, senti que seu sorriso continha uma pitada de desconforto.
“Talvez a mamãe esteja apenas cansada do trabalho… Não vamos nos preocupar com isso e vamos para a sala”, sugeriu Shinonome-san.
Fiquei preocupado com o sorriso no rosto da mãe dela, mas Shinonome-san começou a caminhar em direção à sala, então segui em silêncio, sem dizer mais nada.
◆
“Onii-chan, Onii-chan! Olha, um gatinho!” O que Emma-chan mostrou com entusiasmo não foi o brinquedo de pelúcia que eu dei a ela. Em vez disso, foi um presente de Shinonome-san, provavelmente algo para mantê-la ocupada enquanto seu brinquedo original estava sendo consertado.
Claro, foi feito à mão por Shinonome-san e incrivelmente bem trabalhado. O tecido era macio, agradável ao toque e parecia ter enchimento de algodão, o que o tornava confortável de segurar. Graças a isso, Emma-chan estava nas nuvens (was over The moon).
Uma coisa que me chamou a atenção foram os muitos bichinhos de pelúcia presentes na sala para onde Shinonome-san nos levou. Honestamente, não achei que tivessem meios para gastar com tantos brinquedos de pelúcia.
“—Ei, Shinonome-san,” hesitei, decidindo abordar o assunto com delicadeza para garantir que ela não desanimasse.
“Hmm…? O que foi?”
“Você tem uma bela coleção de bichinhos de pelúcia. Você mesma fez tudo isso?”
“Ah… Cerca de oitenta por cento deles, eu acho… O resto foram presentes da vizinha, que faz bichinhos de pelúcia… Ela também me dá os materiais que não pode usar na sua loja…”
Entendo, então a vizinha fornecia a maior parte dos materiais, o que significa que ela não precisa gastar muito com eles. Os únicos custos seriam com linha e agulhas. Inspecionando a pelúcia de gato que Emma-chan recebeu, notei que ela era costurada com tecidos ligeiramente diferentes. Como Shinonome-san provavelmente estava pegando os restos, talvez nem sempre houvesse o mesmo material suficiente para criar um bicho de pelúcia completo. Mas ela parecia ter um talento especial para combinar perfeitamente tecidos com texturas e tons semelhantes. A costura também ficava discretamente escondida dentro da pele. Ela era bem habilidosa.
“Ah, falando nisso, estava pensando em comprar alguns materiais para consertar o bicho de pelúcia. Achei que seria melhor ir às compras com você, Shinonome-san, mas você acha que a vizinha nos ajudaria a escolher?” Eu provavelmente só precisava de um tópico, mas me senti mal por ter imposto à Shinonome-san, então pensei que essa poderia ser uma boa solução. O que restasse poderia ser dado a ela. No entanto-
“Eu tenho… muitos materiais…” Shinonome-san balançou a cabeça e, do armário, tirou uma infinidade de tecido. Havia tanta coisa que me perguntei por que ela tinha tanto. “A senhora da casa ao lado muitas vezes me dá… então eu economizei… Graças a ela, eu nunca fico sem materiais agora…”
Embora Shinonome-san falasse com evidente prazer, era realmente tudo excesso de tecido da loja? Tive uma sensação incômoda de que a senhora poderia ter mentido, comprando um pouco e dando para Shinonome-san. Caso contrário, seria pouco provável que houvesse tanto tecido sobrando.
Parece que ela conheceu uma senhora muito gentil. E, provavelmente, esta senhora gostou bastante de Shinonome-san. Caso contrário, ela não teria dado essas coisas tão livremente.
“Mas esses materiais são destinados à criação de bichos de pelúcia de Shinonome-san, certo? Devíamos comprar o nosso próprio—”
“Para começar… eu não preciso… do tecido…”
“……”
Tentei levar adiante meu argumento, mas Shinonome-san apontou o cerne da questão. Verdade seja dita, eu queria dar a ela um fio naturalmente como agradecimento pelo conserto, mas vendo a situação agora, isso parecia impossível.
“Aoyagi-kun… você é surpreendentemente… desajeitado, não é…?”
Enquanto eu refletia sobre isso, Shinonome-san interpretou mal meu descuido e suas bochechas relaxaram em um sorriso divertido. Ela estava rindo de mim, mas não parecia ruim. Não foi um sorriso zombeteiro cheio de malícia; em vez disso, o sorriso de Shinonome-san foi de calor e aceitação. Mesmo que ela esconda os olhos com a franja, se ela pudesse sorrir assim na aula, nossos colegas poderiam aceitá-la também... Bem, cruzar esse obstáculo pode não estar muito longe.
“Então, vamos começar.”
“Claro, vá em frente.”
Depois de preparar as ferramentas de costura, Shinonome-san iniciou a ‘cirurgia’ no bicho de pelúcia. Ela prendeu a orelha com um alfinete e rapidamente enfiou a linha na agulha para começar a costurar. Como esperado, suas mãos habilidosas trabalhavam rapidamente, costurando o brinquedo de pelúcia com grande perícia. Embora ela não estivesse com pressa, sua costura meticulosa parecia rápida por causa da eficiência de seus movimentos. Observá-la foi incrivelmente educativo.
—Dito isso, ela estava apenas costurando uma orelha quase separada, então a tarefa da Shinonome-san foi concluída rapidamente. Nunca costurei um bichinho de pelúcia, então queria aprender, mas vou pedir para ela me ensinar outra hora.
“Aoyagi-kun… você estava observando Shinonome-san atentamente… Poderia ser que…”
“O qu-!? O-o quê!?”
Um arrepio percorreu minha espinha quando me virei para Charlotte, que estava me lançando um olhar significativo. Com o que é que ela está chateada…!?
“Uhm... eu estava apenas observando a técnica de costura da Shinonome-san para aprender, só isso...?”
Expliquei a razão pela qual eu estava olhando para Shinonome-san enquanto suava frio. Ao ouvir minha explicação, Charlotte inclinou a cabeça com curiosidade: “Aprender observando, você diz…? O chamado ‘roubar a técnica assistindo’?”
“Bem, sim. Primeiro você aprende observando os especialistas. Então você tenta você mesmo para ver se consegue imitá-lo ou ajustar com base no que observou. O físico de cada pessoa é diferente, então copiar diretamente muitas vezes não funciona.”
Claro, provavelmente seria melhor aprender diretamente, mas nem todos estariam dispostos a dedicar um tempo para ensinar com cuidado. Havia aqueles que se recusavam a ensinar por despeito, e pode até haver aqueles que lhe contaram mentiras deliberadamente. Especialmente entre os adultos trabalhadores, havia muitos que tinham temperamento de artesão, e eu tinha ouvido pessoas sendo instruídas a aprender observando os outros.
Então, minha primeira abordagem foi aprender observando sempre que encontrasse um bom modelo. A partir daí, posso tentar fazer perguntas ou descobrir coisas sozinho, dependendo da personalidade do indivíduo.
“Akihito-kun, você é realmente incrível, não é…”
“Não há nada a ganhar com elogios, mas…” Fiquei um pouco envergonhado e rapidamente voltei meu olhar para Shinonome-san.
“Mm... Emma-chan... aqui está...”
Enquanto Charlotte-san e eu conversávamos, Shinonome-san, tendo terminado de limpar os fios e outros materiais, ofereceu o gato de pelúcia para Emma-chan. Parecia que ela não estava realmente com medo de Emma-chan, ela só tinha se assustado antes.
…Bem, se ela tivesse medo de uma garotinha, não haveria nada que pudéssemos fazer.
:Gatinho…! Obrigada…!”
Emma-chan provavelmente não entendeu as palavras de Shinonome-san, mas aceitou alegremente o bicho de pelúcia que foi apresentado diante dela. Uma garota tão boa, dizendo ‘obrigada’ corretamente.
Enquanto eu acariciava suavemente a cabeça de Emma-chan, ela alegremente esfregou a nuca em mim. Ela adorava os dois bichos de pelúcia de gato que segurava com força. Parecia que ela também gostou do bicho de pelúcia que recebeu de Shinonome-san.
“Bem, então, agora que o bicho de pelúcia está consertado… você poderia ouvir o que tenho a dizer…?”
Tendo terminado sua tarefa aqui, Shinonome-san tocou no assunto. Provavelmente era sobre o assunto que ela mencionou querer discutir anteriormente.
"Sim, claro."
“Obrigada… Nesse caso, acho que seria melhor se Charlotte-san… fosse para casa primeiro…”
Sugerindo inesperadamente que Charlotte-san fosse para casa primeiro, ela e eu ficamos surpresos quando olhamos para Shinonome-san. Especialmente Charlotte-san, que parecia pouco convencida.
“É inconveniente para mim estar aqui…?”
“Hum... não é que eu queira excluir você... é só... pode não ser bom para os outros saberem, ou melhor... eu não me importo, mas... Aoyagi-kun pode se sentir desconfortável por causa disso... ”
Posso me sentir desconfortável? Poderia ser sobre algo dos nossos tempos de colégio fundamental…? Mas por que Shinonome-san mencionaria algo assim…? Eu não pude deixar de ter dúvidas, mas se fosse como eu suspeitava, eu realmente não gostaria que Charlotte-san ouvisse. Mas ainda assim…
“Hum, Aoyagi-kun… não estaria tudo bem se eu ficasse…?” Charlotte-san procurou fracamente minha confirmação. Mesmo que ela entendesse que poderia estar exagerando, ela ainda perguntou.
“……”
Eu fechei os olhos com Charlotte-san. Em resposta, ela olhou diretamente para mim. Depois de alguns momentos de silêncio, soltei um suspiro profundo.
“Sim, tudo bem se você ficar aqui enquanto conversamos, Charlotte-san.”
Decidi que ela deveria ficar, julgando que ela não estava pedindo por mera curiosidade. Shinonome-san, parecendo um pouco perturbada, alternou olhares entre Charlotte-san e eu antes de falar.
“V-você tem certeza…? Você não vai se arrepender…?”
“Não posso dizer com certeza sem ouvir primeiro. Mas se eu acabar me arrependendo de algo que me perguntaram, a culpa é minha.”
Em algum momento, não poderei mais continuar escondendo coisas de Charlotte-san. Se eu realmente quisesse seguir em frente com ela, eu não poderia continuar escondendo meu passado de culpa.
“Certo…”
Talvez entendendo minha determinação, Shinonome-san levantou-se lentamente. Então, ela pegou um porta-retratos da cômoda e mostrou para Charlotte-san e para mim.
“Você reconhece esse homem...?”
Na foto havia uma jovem Shinonome-san, sua mãe e um homem, e ela estava perguntando sobre aquele homem. Não, não se trata de reconhecê-lo ou não... este homem é... eu?
“Oh, esse homem… do festival de esportes…”
Charlotte-san parecia ter alguma lembrança. Isso faz sentido, mas – o termo “festival de esportes” chamou minha atenção.
“O festival de esportes?”
“Uhm… fui abordada por ele durante o festival de esportes anteontem. Será que ele é o pai de Shinonome-san…?” Aparentemente, Charlotte-san encontrou esse homem na foto sem meu conhecimento. Então, ele realmente existe, hein…
“Sim, está certo… O papai mencionou falar com você, Charlotte-san.”
“Por que ele se aproximou de Charlotte-san?”
“Isso é…” Shinonome-san deu uma olhada fugaz em Charlotte-san. Em resposta, Charlotte-san desviou os olhos desajeitadamente. O que no mundo eles discutiram?
“Meu pai… ele perguntou a Charlotte-san seu primeiro nome, Aoyagi-kun…”
“Por que ele perguntaria tal coisa…?”
“Isso é porque-”
Assim como Shinonome-san estava prestes a explicar, a porta se abriu abruptamente. Ali estava a mãe de Shinonome-san, olhando para nós com uma expressão severa.
“Mãe…?”
“Desculpe por interromper… Mas dada a natureza do assunto… De agora em diante, gostaria que seu pai e eu explicássemos…”
Parecia que toda a família Shinonome estava envolvida neste assunto. Até entrar no ensino médio, eu nunca conheci Shinonome-san e não conheci os pais dela até hoje. Portanto, considerando as circunstâncias, era intrigante como os pais dela poderiam estar envolvidos. Porém, quando Shinonome-san me mostrou a foto, uma coisa me veio à mente. Tive um pressentimento horrível e esperava desesperadamente estar errado. “Aoyagi-kun...?” Charlotte-san olhou para mim com uma pitada de preocupação, notando o suor frio que se formou na minha testa.
“Estou bem”, respondi, tentando reunir um sorriso, embora não tivesse certeza se ele parecia genuíno. Por que... Por que agora, entre todos os tempos? A pergunta me incomodou. Mas, estatisticamente falando, as probabilidades de as minhas suspeitas estarem certas eram mínimas. Tentei me consolar com esse pensamento, acreditando que meu palpite estava errado.
—Suprimindo minhas emoções o melhor que pude, me vi esperando o retorno do pai de Shinonome-san.
◆
“—Prazer em conhecê-lo, sou o pai de Karin.”
Ao entrar na sala, o pai de Shinonome-san nos cumprimentou dessa maneira. A propósito, na sala naquele momento estávamos Charlotte-san e eu, junto com Shinonome-san e seus pais. Quanto à pequena Emma-chan, ela cochilou, cansada da espera.
“Prazer em conhecê-lo, meu nome é Aoyagi.” Baixei a cabeça com cautela enquanto me apresentava. Então, o pai de Shinonome desviou o olhar para Charlotte-san.
“Boa noite, Bennett-san. Peço desculpas por falar abruptamente com você outro dia.”
“Não… eu realmente sinto muito. Eu menti e isso foi indesculpável.”
Essa mentira foi algo que Charlotte-san me contou antes do pai de Shinonome-san retornar. Parecia que ela achou suspeito quando lhe perguntaram meu primeiro nome, então mentiu para evitar mais perguntas. Considerando que ela fez isso pensando no meu bem-estar, eu não poderia culpá-la.
“Bem, é natural ser cauteloso. Sem danos causados. De qualquer forma, parece que deixei você esperando por um bom tempo. Vamos ao assunto principal?”
O pai de Shinonome-san parecia muito bondoso. Eu realmente tive uma boa impressão dele. Será que eu estava pensando demais e tudo era apenas uma coincidência…? Foi o que pensei, mas então...
“Aoyagi-kun, você veio de um orfanato, não foi?”
Parecia que meu sentimento desconfortável estava, infelizmente, certo.
“Aoyagi-kun é de um orfanato…?” Charlotte-san olhou para mim com uma mistura de choque e descrença, como se tivesse visto algo inimaginável. Dado que eu nunca tinha compartilhado isso com ela antes, sua surpresa era compreensível.
“Sim, eu sou. Por que você pergunta?”
Tentei manter a compostura apesar de me sentir um pouco irritado, quando encontrei o olhar do pai de Shinonome-san. Ele continuou sua linha de questionamento: “Seu nome é Akihito, nascido em 11 de novembro. Seu tipo sanguíneo é A, certo?” Parecia que ele estava tentando obter algum tipo de confirmação, provavelmente verificando se tinha as informações corretas.
“Sim, está correto.”
“Como eu pensava…”
O pai de Shinonome colocou a mão sobre a boca, com uma expressão séria se estabelecendo em seu rosto.
Olhando ao redor, Charlotte-san ainda estava olhando para mim com uma expressão confusa.
A mãe de Shinonome-san parecia se desculpar, enquanto a própria Shinonome-san parecia exultante enquanto olhava para mim. Pelas reações de Shinonome-san e de sua mãe, ficou evidente que meu palpite provavelmente estava correto.
“Charlotte-san, seria melhor se você fosse embora por enquanto.”
Achei que seria melhor não deixá-la ouvir mais nada disso. Esse pensamento naturalmente me levou a expressar minha preocupação.
“Aoyagi-kun… Você não quer que eu esteja aqui…?”
Talvez interpretando minhas palavras como rejeição, seus olhos refletiram ansiedade ao encontrar os meus. Balancei a cabeça de um lado para o outro em resposta: “Não é isso... só acho que o que está prestes a ser discutido pode ser angustiante para você ouvir.”
Dada a sua natureza gentil, ela provavelmente ficaria profundamente preocupada, até mesmo com assuntos relacionados a mim, um virtual estranho. Talvez fosse melhor se ela não estivesse presente. No entanto...
“Se você não é contra, Aoyagi-kun, por favor, deixe-me ficar…” Ela parecia determinada a não ir embora.
“… Sim, está bem.”
Charlotte-san expressou claramente seus sentimentos, então decidi deixá-la ficar. E além disso, tê-la por perto me ajudaria a manter a compostura.
“Aoyagi-kun… não, Akihito-kun,” Enquanto eu olhava para Charlotte-san, o pai de Shinonome-san me chamou deliberadamente pelo meu primeiro nome. Ele então respirou fundo antes de falar: “Eu sei que isso pode ser confuso de repente, mas… eu sou seu pai biológico.”
“Huh…?” Quem exclamou em resposta às suas palavras não fui eu, mas Charlotte-san. “Uhm, o que você quer dizer...?” Incapaz de esconder sua confusão, Charlotte-san perguntou, tentando entender a situação.
“Bem, para explicar, precisamos voltar à época em que Akihito-kun e Karin nasceram. Eles nasceram como gêmeos fraternos.”
“Aoyagi-kun e Shinonome-san são gêmeos…?”
Charlotte-san olhou entre mim e Shinonome-san, aparentemente achando difícil de acreditar. Provavelmente porque Shinonome-san e eu não somos muito parecidos. Mas, sendo dizigóticos, não surpreende que nossos rostos sejam diferentes.
“Sim, eles são gêmeos. No entanto... naquela época, eu havia assinado o empréstimo de um amigo, e quando esse amigo fugiu, fiquei com uma dívida enorme... eu não tinha condições de levantar os dois...''
“Então, você mandou Aoyagi-kun para o orfanato…? Mas pensar que Aoyagi-kun foi uma daquelas crianças que ficaram lá…”
“Deixou lá? Não, não foi isso. Quando bebê, fui colocado dentro de uma caixa de papelão e abandonado na frente do orfanato.”
“O qu-!”
Quando esclareci, Charlotte-san olhou para os pais de Shinonome-san como se tivesse visto algo inacreditável. Até Shinonome-san pareceu surpresa, como se não soubesse desse detalhe. No entanto, os pais de Shinonome não negaram.
“O engraçado é que havia um bilhete dentro da caixa em que eu estava. Você consegue adivinhar o que dizia?”
“…Seu primeiro nome, data de nascimento… e tipo sanguíneo… certo?”
“Como esperado, isso está correto.”
Dado o quão inteligente Charlotte-san é, ela provavelmente deduziu isso do fluxo da conversa.
“Por que eles não foram pegos por isso…?” Abandonar uma criança é crime. Claro, é um julgamento totalmente óbvio. Dado que esses pais não tinham sido presos, não era de admirar que Charlotte-san estivesse intrigada.
“Não tenho certeza, mas acho que as pessoas nas instalações em que estive fizeram algo a respeito”, comecei. “Além disso, eles estavam endividados, certo? Shinonome-san e eu nascemos em casa, não em um hospital?”
Eu não tinha ouvido os detalhes sobre as circunstâncias em que fui deixado. Mas o que a equipe da instituição me disse foi o seguinte: o simples fato de eles terem se dado ao trabalho de anotar seu nome e data de nascimento mostra que, talvez, embora eles amassem você, não puderiam criá-lo devido a algumas circunstâncias inevitáveis.
Eles provavelmente me disseram isso, esperando que eu não crescesse guardando rancor. Além disso, se tivéssemos nascido em casa, talvez fosse possível manter em segredo o nascimento de gêmeos. Bem, de qualquer maneira, não tenho certeza sobre os detalhes reais.
“Na verdade, nós amamos você… É por isso que anotamos seu nome e data de nascimento no papel.” A julgar pelo seu comportamento sincero, ele pode não estar mentindo. No entanto, o fato de terem me abandonado não mudou. E por causa disso, as provações que enfrentei...
“Então, por que trazer isso à tona agora?” Eu perguntei, meu tom neutro. Não poderia ser apenas para explicar o motivo de me abandonarem.
“Na verdade, recentemente terminamos de pagar todas as nossas dívidas. Então — vamos morar juntos novamente.”
“O qu-!” Era uma frase que eu esperava nunca ouvir na minha vida. Como eles poderiam dizer tal coisa depois de descartar seu filho? Eles realmente acreditavam que eu não guardava ressentimentos em relação a eles?
“Aoyagi-kun…” uma voz rompeu minha raiva. Olhei para cima e encontrei Charlotte-san me observando com uma expressão preocupada. Eu não posso deixar ela me ver assim...
“U-uhm, Aoyagi-kun…!” Enquanto eu tentava reprimir minha raiva, Shinonome-san entrou na minha frente. Foi um movimento incomum para a garota normalmente reservada.
“O que…?”
“E-eu estava feliz…! Em descobrir que você era meu irmão mais velho, Aoyagi-kun…! Então, vamos morar juntos…!”
Shinonome-san era, para o bem ou para o mal, de coração puro. Ela ficou genuinamente feliz ao descobrir que eu era seu irmão e acreditava que, se nos tornássemos uma família, seríamos felizes. Ela provavelmente nem havia considerado nenhum outro fator.
“…Desculpe, preciso de um pouco de tempo para pensar.” Embora eu quisesse recusar abertamente, senti que se respondesse agora, acabaria atacando por raiva. Se fosse só eu, tudo bem. Mas na presença de Charlotte-san e Shinonome-san, eu não consegui. Acima de tudo, eu não queria trair o olhar esperançoso de Shinonome-san. Droga…
“Vamos voltar,” peguei Emma-chan, que estava dormindo no canto, e dei um sorriso tranquilizador para Charlotte-san. Em resposta, os olhos de Charlotte-san se arregalaram e ela dirigiu um olhar penetrante para os pais de Shinonome-san.
“Por que você faria algo tão terrível—”
“Charlotte-san, está tudo bem. Temos escola amanhã, vamos para casa.”
“… Tudo bem.”
Quando peguei o braço de Charlotte-san, ela assentiu relutantemente e parou de falar. Ela me seguiu quando comecei a sair da sala. Mal me lembro do que aconteceu a seguir. Tudo que eu sabia era que, quando me realizei, estávamos em casa.
“Aoyagi-kun, hum...”
“Desculpe, preciso de um tempo sozinho.”
“Ah…”
Ela parecia querer dizer mais, mas eu entreguei Emma-chan para ela, destranquei a porta e entrei. Uma vez lá dentro, fechei a porta e me encostei nela, deslizando lentamente para sentar no chão.
“Porque agora, de todos os tempos...” eu sussurrei, relembrando memórias dolorosas, e então fechei os olhos.