Volume I – Arco II
Capítulo 26: O Amaranto
Da boca de uma cornucópia, flores e frutas de todos os aspectos e cores extravasavam incessantemente. Era uma correnteza eterna por onde minhas memórias fluíam.
Minha infância não foi infeliz. Os problemas na minha família nunca foram impossíveis de resolver. O mundo de negócios das Metalúrgicas Kinjō não me interessava.
Mas, desde pequeno, eu tinha dificuldade para entender o que era fazer uma amizade genuína.
A maioria das pessoas com quem eu conversava eram adultos, como o vovô, o papai e a mamãe. Por eu ser um “prodígio” e nada mais do que isso, eu me via desconectado das crianças da minha idade.
Eu era esquisito. Eu era diferente delas em tudo, até na aparência. Existia um círculo invisível dividindo os que estão do lado de dentro e os que estão do lado de fora, e eu estava do lado de fora. Eu não fazia parte desse círculo.
O Teruki nasceu quando eu tinha quatorze anos, e eu não tinha o direito de depositar nele a responsabilidade de ser meu amigo. Ora, ele era só um bebê. O meu dever era cuidar dele, já que meus pais não eram sempre presentes.
Durante o fundamental, eu me confundi a respeito de muitas coisas. Sobre mim, e sobre meus colegas de classe. Por baixo da faceta que eu apresentava, eu estava buscando atenção. Eu me sentia sozinho e queria que olhassem para mim.
Cumprindo o meu papel na sociedade, eu serei amado. Eu serei como o ouro da melhor espécie. Era isso que eu pensava. Não importava se era atuação. Eu nunca estive do lado de dentro do círculo para começo de conversa.
A única vez em que eu me conectei com alguém da minha idade foi... quando conheci Tsubasa.
Com ele, eu não me sentia especial como o “Menino de Ouro”, e sim como eu mesmo. Eu não buscava a aprovação dele, mas não deixei de ser aceito e apreciado por isso. Com ele, eu não me sentia só. Eu era feliz.
Eu mal podia acreditar que havia criado uma amizade genuína com alguém, e que eu amava esse alguém. Nessa época, eu queria que o presente momento durasse para sempre, como o ouro. Talvez esse fosse o maior egoísmo meu.
Me pergunto quando foi que comecei a ser tão desonesto.
Em um dado ponto da minha adolescência, a persona que eu fabriquei de um bom menino sociável e prestativo se tornou uma peça fundamentalmente superficial. Eu comentei sobre ter confundido as coisas, não?
Eu me sentia superior aos meus colegas, intelectual e moralmente, e via orgulho nisso. Eu estava mostrando para todos o quanto eu era melhor; o quanto eu era gentil, respeitoso e só fazia o certo a todo momento.
A minha “humildade” era um fingimento. Até quando ingressei na Academia Kinran, no fundo, eu nunca deixei de ver as outras pessoas como inferiores. Isso incluia Tsubasa, a quem eu tratava como o objeto do meu apreço.
Antes de sequer imaginar o que viríamos a ser, eu me aproximei dele sob o pretexto de protegê-lo, mas a verdade era que eu o usava para reforçar minha postura de bom moço. Eu estava me compadecendo pelo quão miserável ele era.
Eu mudei. Eu quis mudar. Eu não estava mais andando com ele por pena de uma vítima de bullying. Mas... eu o disse mentiras. Eu o enganei muitas e muitas vezes. ... O que eu estava pensando que seria o nosso futuro?
Eu tinha medo de que as pessoas passassem a ver aquele Terumichi Kinjō como uma aberração e o excluíssem. Então, eu conservei a nossa amizade como era e me escondi dos meus sentimentos.
Tocá-lo, beijá-lo em suas bochechas e em seus lábios. Olhar seu rosto bem de perto, apreciar o quão sua pele era linda e delicada, e como seus cabelos pretos cheiravam bem. Esses eram desejos que eu reprimia.
Os anos se passariam, nós nos tornaríamos adultos e eu ainda não teria quebrado o faz de conta.
Eu empurrava esses pensamentos para debaixo do tapete, e junto disso, ignorava os problemas que surgiam entre nós dois. Eu não aceitava que nossa amizade não era perfeita, e que eu estava fazendo até dela uma mentira mesquinha.
Eu o revesti de tesouros e mantos dourados, fechando os meus olhos para seu sofrimento, tudo pelo bem do meu próprio ego. Tenho certeza de que ele guardou rancor de mim, assim como eu também guardei dele.
Sempre que Tsubasa se encontrava com outros garotos, o meu desgosto ia além do ciúme. Para mim, era o mesmo que violar a imagem pura e inocente que criei dele. Destruí-la, sujá-la, até restar o “gay promíscuo” dos boatos.
Eu tive nojo dessa parte dele, porque não era esse o meu Tsubasa. E eu tive nojo dessa parte de mim, pois eu era um mentiroso covarde, incapaz de vê-lo por quem ele era, e incapaz de aceitar a situação à qual fomos submetidos.
Não importava se ele era apaixonado por mim, ou se eu era apaixonado por ele. Não era sobre os conflitos com a minha própria sexualidade e autoimagem. Não era sobre nada disso.
Eu não levava a sério o que ele estava passando na escola. Eu era uma testemunha, e podia ter feito mais. Tive a oportunidade de gritar, enlouquecer, de ser sua voz em meio ao silêncio, mas continuei complacente.
Eu abandonei o meu melhor amigo. E eu deixei essas emoções apodrecerem dentro do meu peito, só para continuar a fingir ser alguém que eu não era. Daí, o vovô morreu, e o céu carregado começou a desmoronar.
— Teru — chamou-me, naquela madrugada de ventania.
— Sim?
— Eu preciso te falar uma coisa.
Depois de me contar o segredo sobre seu aniversário, deitamo-nos para dormir, e o barulho do aquecedor pairou.
Enquanto prestes a pegar no sono, ouvi Tsubasa se levantar do colchão. Senti algo quente se aproximar do meu rosto, e uma mão a me tocar em lugares indiscretos. Uma boca sendo pressionada à minha.
Eu não conseguia me mexer, nem abrir os olhos. Eu mal discernia se eu estava de fato acordado. Poderia muito bem ser fruto de um desejo pervertido meu, manifestado em uma experiência onírica.
Ao amanhecer, nós sorrimos um para o outro, como das outras vezes.
O meu melhor amigo nunca faria isso, não comigo. O meu Tsubasa era puro e inocente. Ele nunca abusaria de mim. Eu me convenci disso e confiei nele, porque, apesar de tudo, eu ainda o amava.
No entanto, no dia da excursão ao museu, eu me dei conta de que não foi apenas coisa da minha cabeça. Eu reconheci a sensação. E, congelado da cabeça aos pés, eu não podia acreditar no que ele havia feito.
No agora, e no antes.
— Pare. Não faça isso. — Desviando o rosto, eu o segurei pelo braço e afastei sua boca da minha.
— M-Me perdoe. Me perdoe, Teru. Isso é nojento, não é? Desculpa. Eu não devia-...
— Nunca mais faça isso, Tsubasa. Por favor — cortei. — Nós somos dois homens. Isso não está certo.
Eu não assumi o real motivo pelo qual o rejeitei.
A reprodução em vídeo das minhas memórias foi interrompida por um chiado, e parou. Na verdade, não havia uma continuidade. A minha história parou ali. No dia seguinte, e no que viesse depois, eu não teria o vovô e nem Tsubasa comigo.
Eu conquistei o ouro dos alquimistas. O sacrifício equivalente foi consumado, e um campo vasto se revelou para mim. Fui de encontro com a Torre dos Filósofos, o construto celestial que conectava as duas dimensões, e a subi.
O Anfiteatro da Eterna Sabedoria era o mundo dos mortos; um cemitério governado por um deus cruel. Ele era como um caixão, dentro do qual eu me refugiei daquela realidade que eu não conseguia aceitar.
Dentro dele, eu encontrei pessoas que se tornaram preciosas para mim. Dentre elas, um menino que carregava nas costas um peso maior do que podia. Ele tinha asas. Um mar triste e tumultuoso refletia no azul de seus olhos.
Eu via a dor que cumprir com seu destino o causava, e eu queria salvá-lo.
Ainda que me dissessem que eu estava “brincando de casinha”, eu queria que Hector parasse de lutar. Ele estava tão cansado. Ele não aguentava mais ter que repetir esse ciclo incessante de batalhas, sem poder recusar, ou fugir.
Eu me identificava com ele, embora não houvesse como comparar nossos sofrimentos. Eu tive medo de estar usando-o como um substituto de Tsubasa, depositando nele a afeição oriunda do meu arrependimento.
Mas, ao longo desses curtos meses em que nos conhecemos, eu vim a amá-lo. Eu vim a amá-lo de verdade.
Quis aprender seu passado, sobre o que o fazia feliz e sobre o que fazia triste. Sobre seu mundo, e a cultura na qual ele cresceu. Quanto mais a fundo eu procurava, mais eu me via hipnotizado, instigado a ir mais fundo, fosse isso bom ou não.
Em um sonho, eu percorria os corredores infindáveis de um castelo de ouro.
Todas as portas estavam trancadas por ferrolhos fortes. A “chave” que eu possuía — o medalhão que o vovô me deu no meu aniversário de oito anos — não destrancava nenhuma delas. Ela não passava de um objeto sem propósito.
Por fim, encontrei uma porta semiaberta, e me perguntei o motivo das outras sequer estarem trancadas. Alguém as trancou, afinal.
Eu temia de que, puxando a maçaneta dessa porta, eu descobriria algo terrível. Que talvez o vovô, uma das pessoas que mais respeitei na vida, tivesse alguma relação obscura com o infortúnio enfrentado pelo povo dos meus amigos.
A despeito disso, cerrei o punho, e, seguindo o claro da porta, tomei coragem para entrar. Esperava por mim a Arcadia que uma vez foi, em um passado há muito esquecido, quando os mundos divididos eram um só.
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EMBLEMA XXIII
Chove ouro enquanto Palas nasce em Rodes, e o Sol coabita com Vênus.
“É de se maravilhar que, na Grécia,
surgiu uma fé para ser celebrada entre os rodianos.
Dizem que uma chuva dourada caiu das nuvens,
as mesmas onde Sol fazia amor com Vênus.
E dizem, também, que Palas saiu do cérebro de Júpiter,
deixada cair como água de chuva em um cálice.”
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Estas são informações contidas nos escritos apócrifos, a respeito da história arcadiana.
O surgimento da alquimia se deu quando o Três Vezes Grande desceu dos céus portando a chama que roubara de um deus maior e mais poderoso. Esse temível deus era o Sol Sagrado.
Por intermédio de sua chama de cor azul-avermelhada, o profeta ensinou aos homens pastoris que o seguiam a técnica para transformar metais mais básicos em metais mais nobres.
Mas, como era possível transmutar um pedaço de chumbo em ouro?
A resposta estava na remoção das impurezas e superfluidades da matéria. Em outras palavras, na manipulação de partículas nucleares através das chamadas “fórmulas alquímicas”.
Diluíam-se os componentes numa solução junto à Pedra Filosofal — uma faísca condensada a partir da chama sagrada —, produzindo assim uma substância do mesmo modo incorpórea.
Quando um material é aspergido por ela, ele sofre modificações na estrutura até alcançar um resultado que seja do agrado dos “idealistas”, que vieram mais tarde a ser chamados de “alquimistas”.
A isso usaram para domar os mais pobres e ignorantes dos elementos e transformá-los em fontes infindáveis de riquezas, uma vez que descobriram o prazer de possuir mais do que o seu semelhante.
Esse era o poder advindo de deus. Ele era maravilhoso, sedutor e brilhante, e o homem comum quis mais.
A condição mortal era imperfeita e sujeita aos males da doença. Por isso, em segredo, houve uma tentativa de ungir o material genético humano com a substância.
No entanto, quando no intuito de garantir a imortalidade, o resultado foi a aniquilação total da vida in vitro, e, consequentemente, das cobaias humanas que se submeteram aos experimentos.
Viver para sempre ainda era impossível, ao menos com aquela fórmula imperfeita. Então, foi preciso se contentar com um elixir que concedia saúde e beleza estética, deleitável aos olhos.
“Eureka! Eureka!”
A elaboração foi um sucesso. Os laboratórios festejaram. Hermes Trismegistus era o Pai de Todos os Milagres! Ele era deus! Ele nos deu os meios para atingirmos um novo patamar — uma nova vida!
É claro, o efeito da fórmula não foi sentido instantaneamente. Em alguns indivíduos, só foi percebido ao terem filhos nascidos repletos de força e vitalidade, que cresceram com inestimável beleza corporal.
Vieram as próximas gerações. Arcadia passou a ser composta por pessoas tão belas quanto o ideal desejado pela sociedade. O terceiro desejo era o de voar pelos céus, como o símbolo ancestral do homem alado: Ícaro.
É claro, alterar o próprio conteúdo com esse fim não daria em nada. Asas de ouro eram pesadas demais, e asas de cera não se sustentariam por muito tempo ao calor de um Sol rancoroso.
Portanto, foi necessário instalar uma forma de vida parasitária que misturava o código genético de aves com o humano em uma fórmula mais complexa, como fizeram aos híbridos entre animais.
Por esta, cuja tabela foi constituída em tentativa e erro, criaram um homúnculo que nascia e retrocedia em crescimento, a fim de não esmagar os órgãos internos superiores como o coração e os pulmões.
Os impulsos nervosos se originavam desde o esterno, onde células-tronco da medula óssea vermelha formavam ligamentos que percorriam as costelas e toda a estrutura óssea e muscular das costas.
O resultado disso foram asas fortes, grandes o suficiente para planar e voar, e poderiam ser abertas quando bem quisessem, sem precisar abandonar a caminhada com os próprios pés.
Foi batizado esse protótipo bioalquímico de “Asas de Simurgh”.
A criação da nova fórmula sem a autorização de Hermes Trismegistus fez dele amargurado com o quão arrogantes seus seguidores se tornaram, pois perderam a pureza de quando foram visitados.
A comunhão do povo pastoril com a natureza, o que mais apreciava neles, havia sido abandonada por completo, e eles se aproximaram demais do que era ser um “deus”.
Isso denotava o pecado da húbris.
— Era dito que Hermes Trismegistus apavorou as multitudes, declamando: ao quebrar meus mandamentos, vocês ficaram feios — Kosmo explicava, cercado pelos muitos livros que investigamos. — Vocês são belos, mas, ao mesmo tempo, as criaturas mais horríveis e grotescas, e me arrependo do que vos dei.
— E aí, ele criou o Filho de Trismegistus — supus.
— Precisamente. Ele concebeu um homem absoluto em um tubo de ensaio; seu filho, que possuía as mesmas características do arcadiano e ambas as fórmulas, mas marcado com um brasão para limitá-lo de sua liberdade. Lembrem-se dele e nada perderão, dizia.
O Brasão de Ouro de Trismegistus permitiria que seu filho fosse amado e venerado por aqueles que temiam o castigo do mestre. Diligente para com as ordens do pai, ele jamais abria as asas.
E se por ventura o fizesse, a fórmula se quebraria e ele deixaria de ser querido, tanto pelas pessoas quanto por seu pai e seu deus.
Do mesmo modo, se o homem comum descumprisse os mandamentos e voltasse a usar da fórmula pecaminosa, não mais estaria sob a intercessão celestial. Os milagres concedidos pela alquimia seriam confiscados.
Assim, deu-se ao filho pródigo, cujo coração era uma romã pulsante, o mesmo amor que se dá aos castelos de ouro. Mas esse amor não era verdadeiro. Ele vinha do medo e da frustração para com as limitações impostas.
Nesse ciclo de pecado interminável, os “homens das ciências profanas”, antes meros idealistas, começaram a buscar uma terceira fórmula que subjugasse Hermes Trismegistus e capturasse seu poder divino.
Até que ele se foi para sempre, não se sabe exatamente o porquê, e o Sol Sagrado abrasou.
Uma catástrofe se acendeu. Era o advento da vontade da retribuição. Numa medida desesperada, a terceira fórmula foi utilizada para arrancar o continente do vasto oceano de Agartha e suspendê-lo de cabeça para baixo.
A noção de tempo e espaço se quebrou. As leis da natureza foram violadas. O que era uno se dividiu em dois. E para pertencer ao novo mundo que se originou a partir da grande cisão, o povo abriu as asas e voou.
Como sacrifício equivalente para prolongar a existência do reino humano, foi entregue o Filho de Trismegistus. O ideal puro, desprovido de ímpeto próprio. Uma existência vazia que servia ao propósito determinado pelo pai.
Ele aceitou a punição sem questionar, e tudo o que se ouviu depois foram gritos e lamentos vindos de seu abismo, ecoando com a convergência dos ventos da história. Todavia, a essa altura, a humanidade já estava manchada pelo pecado.
Como dizia a canção, os pássaros caíram dos céus, as árvores murcharam uma atrás da outra e os animais desapareceram das florestas. A terra se fez inculta e o gado morreu. Faltou da água, do peixe, da fruta e do legume.
Como consequência do uso indiscriminado da alquimia, o Declínio, os prelúdios da extinção absoluta, afligiu o reino, acometendo os ricos e os pobres com uma maldição que transformava toda e qualquer forma de vida em ouro.
Tendo a humanidade se afogado em desespero, houve um sinal no céu. Era um abutre que voava com um pergaminho no bico, espalhando a palavra do emissário da salvação — o Ícaro Messiânico —, que vinha para livrá-los do mal.
Ele foi enviado pela Correnteza Eterna, porta-voz do criador e atual ocupante de seu trono. Clemente por natureza, ela, que era a tempestade, o percuciente e a destruição dos homens, decidiu conceder uma esperança à humanidade.
O dia prometido, 333 anos após a cisão, era a data limite para o surgimento de um Messias. O Vento havia de carregá-lo no ventre; a Terra havia de nutri-lo. E a humanidade não se redimindo até lá, extinguir-se ia perante a ira final.
— Esse Messias era destinado a subir a Torre dos Filósofos — continuou Kosmo. — Lá ele encontraria o Filho de Trismegistus, que foi acorrentado numa rocha e teve suas asas expostas à força, pagando pela criação de seu próprio pai, era o portador da chave. Essa chave era a ferramenta formada a partir do líquido escorrido de suas asas derretidas, respingando sobre um cálice com uma chama inextinguível.
— O Amaranto, certo?
— Segundo as sagradas escrituras, sim. O fluido milagroso teria passado por um processo de destilação, misturando-se ao fogo incorpóreo e moldando o falo-duplo de deus: o cetro que você carrega. Como já deve saber, ele é o meio através do qual se destrancam os portões do Jardim de Rosas da Sabedoria.
Ilustração de “A Glória do Mundo” do livro
Musaeum Hermeticum Vol. I, por Arthur Edward Waite.
— Esse jardim existe mesmo?
— Eu não sei. Mas, de acordo com o pergaminho do abutre original, adentrá-lo garante um único desejo. Isto é, uma oportunidade de escolha para que a humanidade se desfaça de suas superfluidades em troca de restituir a dignidade perdida.
Contudo, só o mais belo, nobre e poderoso dos heróis, tecido pelo destino de ter seu vazio preenchido pelo vinho da santidade, serviria como o receptáculo adequado para o cumprimento de tal papel.
Unindo os polos desde o enxofre ao mercúrio; sublimando a dualidade em uma única máscara dourada. Até o dia prometido, não haveria essa máscara de cair, e o herói se manteria na posse do Filho de Trismegistus.
Por três séculos, esperou-se a época certa de gerir essa criança e dá-la um nome cheio de graça. Criá-la como um guerreiro solene, que extirpou de seu peito a carne mundana para tornar-se um símbolo de adoração.
Era uma joia lapidada pelas esperanças e expectativas do mundo. Um fruto tão digno, tão altruísta quanto o que nasceu do Pai de Todos os Milagres, detendo igual valor e preciosidade.
— Quer fazer uma pausa? — perguntou Kosmo, retirando o monóculo para limpá-lo com um lenço.
— Não. Vamos continuar — respondi.
— Há mais que você deve saber sobre o protótipo bioalquímico das Asas de Simurgh.
— É sobre o que o remédio fez com Hector?
— Sim.
Pedi que me contasse tudo. E se havia um motivo pelo qual ele não podia nos contar tudo, como Thes suspeitava, que me contasse até onde podia. Dessa forma, eu traçaria minhas próprias conclusões.
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