Os Prelúdios de Ícaro Brasileira

Autor(a): Rafael de O. Rodrigues


Volume I – Arco I

Capítulo 9: A Máscara, ato I

A “cura” que nosso povo procura é uma palavra bonita para “ressurreição”. São muitos os que esperam que o poder do Messias devolva milagrosamente os mortos de volta à vida, por ser o que promete a doutrina.

Seria um pecado se eu dissesse que não acredito nisso?

Enquanto minha mãe se contorcia no leito da câmara de isolamento, definhando pelos estágios terminais da doença do ouro, eu ouvia os gemidos por trás da porta vedada. Ela sofria tanto. Ela não parava de sofrer.

Não pude entrar, nem a abraçar uma última vez, ou eu arriscaria ser infectado. O mero fato de eu estar presente no lugar para onde levavam pacientes desenganados já era imprudência.

Ela não resistiria àquela noite. Também não havia como trazê-la de volta, mesmo implorando para um deus. Reverter a condição do ouro certamente faria ela ressurgir como um cadáver, e não mais do que isso.

Eu era o futuro rei de Angerona, o príncipe Achilles. Eu nasci sob o propósito de ser o nobre herói que subiria a Torre dos Filósofos e salvaria a todos.

Desde que me conheço por gente, me foi ensinado que enquanto um homem fraco, eu continuaria a perder o que era importante para mim. E pelo bem de proteger a minha pessoa mais preciosa, eu me tornei forte.

 Fugiens I, “MATERIAE ACHILLES”

— Achilles, este pequeno se chama Patroclus. — Meu pai segurou o ombro de um jovenzinho de pele e cabelos marrons, empurrando-o na minha direção. — A partir de hoje, ele pertence a você.
— ... Pertence a mim? Esse menino?
— Ele recebeu esse nome para estar em suas mãos. Lembre-se dele a todo momento, e você será forte. O herói entre os heróis. Em tempo, vocês falarão a mesma língua, e serão como um só.

Mais tarde, ao retornarmos ao palácio, entendi o que papai quis dizer com “falar na mesma língua”. O mundo daquele garoto de olhinhos verdes era silencioso. Ele não tinha a audição, e não aprendeu a oralizar.

Embora sua leitura labial fosse excepcional, a única forma de comunicar algo era através de sinais com as mãos. Aos poucos, eu me habituei e passei a conversar com ele da mesma forma que conversava comigo.

Essa passou a ser a nossa língua. O nosso mundo silencioso.

Só de tê-lo comigo, os longos corredores do palácio pareciam menos vazios. Eu não precisava sentir tanta falta das pessoas que costumavam passar por eles.

Na companhia um do outro, nós líamos, jogávamos enigmas, treinávamos com a espada e cavalgávamos pelos campos preservados de Angerona. Era uma vastidão gramada, cercada por muralhas altíssimas.

De vez em quando, seu olhar triste se fixava nelas.

Tudo o que conhecíamos do mundo exterior era o que narravam os livros e pinturas da antiguidade: céus espelhados nos rios e o soprar dos ventos nas pradarias. Pequenos animais pelos bosques e pássaros cantando.

Um dia, viajaríamos afora, mas em nome de cumprir com a responsabilidade que nos foi dada. Nos fizemos valer por mil homens, e o continente inteiro viu o quão poderosos éramos diante dos maiores desafios.

— Achilles! Achilles! Achilles! — bradava a plateia, ao sairmos vitoriosos de uma batalha de bigas contra homens do dobro do nosso tamanho. Com um árduo treinamento, aprendemos a complementar o estilo de luta um do outro, e o fruto disso era nossa sinergia invencível.

Alegre, voltei-me para ele e o tomei pela mão. Quem dera um dia ele também pudesse escutar aquilo, e então saberia o quanto éramos especiais. Eu queria mostrá-lo que, unidos, éramos capazes de realizar qualquer feito.

Achilles, Achilles, Achilles. As aclamações exaltadas ecoavam em meus ouvidos. Esse era o nome que repercutia com o trote dos cavalos. Um nome só meu e de mais ninguém, como me era Patroclus.

O que eu poderia fazer, para dá-lo a audição? O que eu precisava conquistar, para que ele pudesse ouvir o meu nome?

Conforme pesquisei, descobri uma coisa que possibilitaria isso: a alquimia. No passado ela foi usada para coisas mirabolantes, mas na atualidade sua prática era estritamente proibida e considerada a pior das heresias.

Em mercados ilegais, os lugares por onde perambulavam traidores da humanidade, eram vendidos acervos de utensílios alquímicos. Estes não usavam necessariamente de alquimia, mas se aproveitavam dos princípios sobre o nosso organismo.

Um deles — um aparelho auditivo prototípico —, era dito prover a audição enquanto usado.

Por mais que a ideia me soasse tentadora, a descartei. Eu só tinha doze sóis, e isso mancharia meu título. De qualquer forma, contanto que nos olhos dele estivesse refletida apenas a minha imagem, nós ficaríamos bem.

Mas, houve vezes que fomos separados. Essas horas eram as piores. Eu era visitado por sábios do ministério que me faziam perguntas difíceis, como se quisessem avaliar alguma coisa na minha personalidade.

Eu os empurrava e os mandava embora. Já cheguei ao ponto de ameaça-los de morte caso não devolvessem Patroclus para mim. Certa vez, eu realmente estrangulei um deles, e só não o matei pois fui retido aos choros e gritos.

Permaneci trancafiado até voltar a agir como um príncipe.

Durante um jantar com os líderes da cidade vizinha, Quirinus, o assento ao meu lado era ocupado por um qualquer. O que a princípio era uma discussão sobre pactos econômicos terminou no romper do meu fingimento.

Eu puxei os panos da mesa e derrubei pratos e taças pelo chão. O anfitrião e as visitas me direcionavam olhares horrorizados, como se eu fosse algum tipo de animal selvagem.

Os animais, no entanto, eram eles. Eles fingiam que nada estava acontecendo. Para eles, não fazia diferença se Patroclus estava lá ou não, quando para mim... para mim--...!!

Aquela sensação, de novo.

Quando longe dele, eu sentia minha pele queimar e derreter em uma poça de cera. Era como se o Sol incinerasse cada partícula minha até eu não poder respirar um ar que não fosse o dele.

Mesmo em prantos e tentando destruir tudo ao meu redor, essa sensação desesperadora não passou, até-... até a semana depois, quando meu pai o trouxe de volta.

Por detrás dos mantos exuberantes, ele veio para o meu abraço. Só então eu me tranquilizei, abraçando seu corpo franzino sobre a cama e enchendo-o de beijinhos até dormirmos. Seu ombro terminou ensopado de lágrimas.

Por causa dele, eu era eu. E por causa de mim, ele era ele. Então por que todos queriam me maltratar, fazendo-nos passar tanto tempo separados? Eles estavam me torturando? Eles estavam torturando Patroclus?

Eu só queria que ele ficasse comigo para sempre. Eu não podia deixá-lo ir embora, não como a mamãe.

Ainda havia um sonho que precisávamos realizar, que era o de correr em nossos cavalos pelas colinas além das muralhas. Isto é, quando as terras fossem purificadas da ruína e da doença.

Daí, poderíamos viver em um lugar distante, como uma casinha simples no meio do nada, bem longe do castelo e da realeza. Eu dedicaria o resto da minha vida a cuidar dele e protegê-lo.

Quando fizemos dezoito sóis, fomos escolhidos como os líderes do exército de Angerona. Conquanto eu era o único membro da família real, Patroclus recebeu uma coroa de louros igual à minha, pois eu quis assim.

Além de nós, havia cerca de vinte jovens, todos igualmente dignos e determinados a servir-nos. Dizia-se que essa era uma das maiores frotas de heróis enviada por uma cidade, ficando atrás somente de Juno e Salacia.

Angerona não era tão desenvolvida quanto as outras duas, mas possuía um diferencial.

O governo do meu pai mantinha um pacto de longa data com Quirinus. Em troca de recursos e alimentos durante a escassez, os heróis de lá eram dados para nós e admitidos como cidadãos angeronianos legítimos.

Quarenta e oito vitórias. Quarenta e nove vitórias. Cinquenta.

Como um prêmio pela minha postura exemplar como campeão, foi construída uma estátua minha em tamanho real. Contudo, durante o festejo em que ela foi alocada, só Patroclus — a pessoa por quem eu mais esperava — não compareceu.

Ao término da celebração, o achei em nosso quarto resolvendo um jogo de tabuleiro sozinho. Eu o abracei, como sempre fazia, mas não pude deixar de questionar-me o porquê de ele não mostrar nenhum entusiasmo.

Eu o avisei várias vezes que esse era um grande dia.

À noite, senti um aperto sufocante no peito, e saí. Tomado por um impulso incompreensível, que parecia como um espírito se apossando do meu corpo, eu roubei um longo martelo de ferro do arsenal e quebrei a cabeça da estátua.

Aquela coisa imprestável, que não servia pra nada.

Quando amanheceu, eu contei ao papai que um dos empregados o fizera. Como esse empregado era um imigrante de Quirinus, foi fácil convencer a todos de que ele era um insurgente, condenando-o assim a um apedrejamento público.

Ele desonrou a minha imagem e não me deu o devido valor. Era natural que fosse punido. Uma multidão se reuniu, e de um ponto alto, onde ia ela terminando, eu ri. Senti-me tão estranho. Do que exatamente eu achava graça? 

Foi quando Patroclus perpassou os cidadãos e abraçou o homem, tomando as pedradas junto dele. Só aí assimilei a real gravidade dos meus atos.

Ele, tambem, nasceu em Quirinus. Ele teve uma vida antes de me conhecer, antes de ser vendido e naturalizado em Angerona. Todas as vezes em que o empregado era chamado de “aberração”, a ofensa recaía sobre ele.

O verdadeiro culpado disso tudo era eu. Eu quebrei a mim mesmo. Mantendo a máscara de um guerreiro que colocava a justiça acima de tudo, eu acusei falsamente um inocente, condenando Patroclus no processo.

Imediatamente, ordenei que parassem e fiz um discurso. O tumulto se dissipou, e apoiei meu parceiro em meu ombro. Ele estava todo machucado. O que eu soube do empregado foi que alguns cidadãos o resgataram em uma maca.

No caminho de volta, uma pedra rolou perto do meu pé.

Ela foi atirada por um menino de uns dez ou onze anos, vestindo farrapos. O vi várias vezes pedindo moedas no comércio.

— Aberração! — exclamou.

Ele não entendia o que estava fazendo. Apenas reproduzia o comportamento que observou. Algo nele se parecia comigo. No entanto, uma ordem minha detinha o mesmo valor que a do rei. E quem a violasse seria sujeito à punição.

No dia seguinte, noticiaram os panfletos que essa mesma criança foi encontrada nos esgotos, morta à espadadas. Como era época do carnaval das máscaras, a cidade estava em festa. Logo, ninguém deu muita atenção para o caso.

Eu cometi um crime irredimível, e não paguei por isso. Patroclus sabia. Ele sabia de tudo, e nada fez para me entregar. Mas eu não era burro para não reconhecer que um dia eu poderia ser abandonado por termos estilos distintos de pensamento.

O que esperaria por mim, daí em diante? Talvez eu desse cabo de mim mesmo. Para o monstro disfarçado que virei, esse era o final mais adequado. E mesmo me passando pela cabeça a ideia de levá-lo comigo, eu não teria coragem.

Um ano se passou, e ninguém descobriu nada.

A grande caravana de Angerona, completamente cortinada e movida a muitos cavalos, ficou pronta para partirmos. Meu pai não se despediu de mim, não que isso fosse problema. A presença de Patroclus me era o suficiente.

Finalmente veríamos o mundo exterior, o lugar que um dia faríamos do nosso lar.

Os portões se abriram, e ventos empoeirados bateram em meu rosto. Do lado de lá, não havia nada bonito. A partir de pequenas fendas nas cortinas que envolviam o transporte, protegendo-nos do miasma, eu tinha vislumbres de coisas horríveis.

Florestas murchas de ouro, pântanos fétidos e terras ressecadas com tempestades de areia. Pessoas e animais petrificados. Carretas naufragadas, com mais gente jogada pelos cantos.

Tendo nascido em outra cidade, Patroclus vira aquele horror no passado. Pela primeira vez, o vi abalado o suficiente para chorar, e tentei consolá-lo, sem sucesso. A angústia expressa em seu rosto também era minha.

Arcadia morreu. Era tudo feio e mórbido. A verdade é que a vida só perdurava dentro das muralhas.

Somente no recanto confortável dos aposentos do castelo havia “beleza”. Isto é, a beleza dele. Numa vida como essa, em que não éramos diferentes de gado, só tocá-lo e ser acariciado por seus dedos era bom, e nada mais.

Cedo deram-se as primeiras baixas. Alguns dos nossos desistiram e desceram da caravana para voltar a pé, mas obviamente nunca chegaram vivos. De vinte e dois heróis, restaram seis.

Eu não ligava. Não ligava para nenhum deles. Por mais que caísse um por um, o meu mais precioso ainda estava ali. Além disso, chegando ao Anfiteatro da Eterna Sabedoria, eu pretendia dá-lo um presente.

Era um aparelho auditivo. Mandei fabricarem uma versão personalizada em troca de uma grande quantia de dinheiro. Fora até enfeitado com joias. Prendendo-o na orelha esquerda, Patroclus poderia escutar à minha voz.

Esse tesouro secreto simbolizava minha adoração. Eu depositei ali tudo o que Patroclus significava para mim, e eu tinha esperanças de que esses sentimentos fossem recíprocos.

Por ele, eu não me importava em quebrar leis ou destinos. Seu valor ia além de todas as futilidades dessa vida, e eu tinha minha espada para derrubar qualquer um que se opusesse a mim.

Tudo o que eu precisava performar, ao menos aos olhos do nosso povo, era o herói que defendia a justiça. Essa era a máscara de ouro por trás da qual eu escondia o meu “eu” terrível.

“Devíamos parar com isso”, gesticulei com sinais, enquanto ele me dava um pouco de ração com condimento em uma colher.
“Parar com o quê?”
“Com a busca por Messias.”
“Por quê?”
“Eu não preciso disso. Esse mundo já está acabado. Tudo o que quero é ficar com você em nosso quarto enquanto ainda temos tempo.”

Ele pôs a colher e o pote sobre a mesa, e franziu o cenho.

“Você mentiu durante o juramento”, alertou, e eu assenti. “Isso será um escândalo. Se você não o alcançar, quem irá?”
“Não me importo quem”, respondi. “Patroclus é tudo para mim.”
“Não diga bobagens.”
“Eu falo sério. Você é tudo para mim. Eu só preciso de você comigo nesse mundo, Patroclus. Assim que chegarmos lá, vamos deixar o Messias para outro alguém. Me prometa isso. Não, na verdade, isso é uma ordem.”

Ele obedeceu, mas pareceu inquieto com alguma coisa até o fim da jornada.

Ao adentrarmos a torre, labirintos monstruosos nos assolavam, e a masmorra subindo em espiral não parecia ter fim. Animais grandes e perigosos, além de criaturas mecânicas armadas, que vitimaram dois dos nossos.

Patroclus, o mais inteligente e sábio entre nós, era quem nos guiava. Ele resolvia os desafios dos calabouços com facilidade. Graças a isso, desbravamos cerca de trinta andares em menos de duas semanas.

Tínhamos comida de sobra e leitos para dormir. Em maior número, eliminamos um grupo perdido com facilidade e saqueamos uma pilha de recursos, estocando para uma semana a mais.

Tudo ia bem, até que um paredão espesso se ergueu atrás de nós. Assim que me virei, vendo dois que não eram Patroclus, meus olhos se arregalaram.

Não sabíamos o que fazer. Tentamos procurá-lo, mas nos perdemos e voltamos para o início do quadragésimo andar inúmeras vezes.

Eu nunca me arrependi tanto por postergar o presente. Se eu o tivesse dado o aparelho antes, ele poderia nos ouvir chamando-o. Reunirmo-nos seria muito mais fácil. O que eu estava pensando que enfrentaríamos nesse inferno?

Meus companheiros me forçavam a desistir e prosseguir. Ao que parece, eles não se tocaram da nossa situação. Sem ele, nunca chegaríamos no topo, e eu não aceitaria nenhum deles tomando um lugar que deveria ser dele.

Amedrontados diante da minha cólera, eles fugiram antes que eu os caçasse.

Sozinho, andei em círculos, assolado pelo fogo ardendo em mim. Passei por cadáveres de heróis de outras terras, temendo achá-lo como um deles. Após um tempo, fiquei com tanta fome e sede que meus pensamentos se embaralharam.

Talvez eu não fosse considerado digno de verdade. É por isso que fui castigado pelo destino e separado de quem eu amava. ... Meus objetivos nunca seriam realizados. Querendo ou não querendo, eu nunca alcançaria Messias.

Eu era o ser humano mais hipócrita do mundo inteiro, e um assassino. Eu não podia nem ser considerado um ser humano. “Achilles” não passava de uma mentira contada para dar esperança a alguém.

Patroclus nunca quis ser um herói. Ele não gostava de lutar. Seu papel como desafiante era uma fachada. O motivo pelo qual o papai o comprou foi para que se tornasse uma peça capaz de me motivar, aliviando minha tristeza e solidão.

Eu só era o herói dos heróis com ele ao meu lado. Sem ele, eu não era nada, nem ninguém.

Ha... Hahaha... Como eu fui burro em não perceber. O meu desejo nunca foi livrar o mundo do Declínio, mas Patroclus. Era para torná-lo eterno.

Estar sozinho me fazia sofrer demais. Eu não era forte o suficiente para suportar a ideia de ficar para trás. Foi assim quando a minha mãe morreu. Eu não tinha mais ninguém que dissesse que me amava.

Então, eu precisava que ao menos ele durasse para sempre. Porque tirando ele e aquela máscara imaginária grudada à minha face, eu era completamente vazio. Oco. Uma casca sem nada dentro.

De súbito, veio até mim um feixe circular de luz.

Uma porta se abriu para um salão com mesas fartas em carnes e frutos. Eu desabei, colocando na boca qualquer coisa que parecesse comestível. Eu nem me lembrava que comida tinha gosto.

Dentre as plantas trepadeiras, a fonte com a estátua do Ícaro Messiânico e o monumento sagrado com os nomes dos heróis agraciados pelo Anfiteatro. Em segundo colocado, estava o nome dele.

Você chegou antes de mim. Como esperado, Patroclus. Você era um gênio. Sempre foi.

Essa era a minha chance de reencontrá-lo. Fu fui perdoado pelos meus pecados. Haha. Eu sobrevivi à Torre dos Filósofos. Eu não estava sonhando. Era real, mais real do que tudo o que senti nos últimos dias.

Ao dizer as palavras-chave e gravar meu nome, bateu uma ressoada:

— O comprometido é o vencedor do primeiro combate! Patroclus de Angerona está oficialmente desclassificado da Corte dos Heróis!

... Huh?

O nome de Patroclus foi apagado e o meu surgiu. Afaguei o rosto, na esperança de que isso fosse apenas alucinação, mas não era. Impossível. Quais as chances? Que tipo de coincidência cruel era essa?

Isso não podia estar acontecendo, não com ele. Não agora.

Fui em disparada para algum lugar, qualquer lugar onde ele pudesse estar. Subi as escadarias e puxei as maçanetas do templo, e num piscar de olhos, minha vestimenta se transformou em um uniforme branco e preto.

As grades da arena se ergueram. Por detrás das plumas carregadas pelo vento, estava ele, suas bochechas rígidas e geladas.

Eu ordenei que não lutássemos, e mesmo assim, você desafiou o comprometido e perdeu. ... Por quê? Por que descumpriu a promessa, Patroclus?

Foi porque revelei não precisar de Messias? Por isso você tomou o peso para si, comprometendo-se a vencer sem nem saber se eu chegaria vivo ou não? Era essa a sua forma de me fazer assumir a culpa?

Não. Isso estava longe de ser da sua natureza. Minha alma gêmea era dotada de um coração puro e gentil, incapaz de guardar remorso. Era alguém que se dispunha a assumir fardos só para que outro não precisasse fazê-lo.

Como uma lágrima dispersa, sua safira padparadscha — o símbolo da ressurreição em vida eterna — havia tombado. Novamente, o mundo arrancou mais alguém de mim.

Um lugar sujo desses não precisava de salvação. No que me diz respeito, Patroclus era a minha salvação. Ele era meu, e nada, nem ninguém, tinha o direito de tirar de mim o que me pertencia.

Hector de Vertumnus era como garoto de rua que atirou a pedra. Uma criança tola que se achava no direito de nos ultrajar, sem saber o quão caro pagaria por seu erro vil.

Era hora de colocá-lo no devido lugar. Se o Messias me daria a força que faltava, eu me revestiria das chamas escaldantes do Sol e banharia esta espada com sangue mais uma vez.

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EMBLEMA XXIX
Assim como a Salamandra vive no fogo, também vive a Pedra.

“Onde a Salamandra vive mais poderosa é no fogo ardente.
Ela não teme as armadilhas de Vulcano.
Da mesma forma, a Pedra não rejeita as chamas cruéis,
pois nascera no fogo permanente.
Àquele que é frio, o calor extingue e liberta.
Mas este é quente, e o calor ajuda-o.”

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