Volume 1
Capítulo 8: Uma Viagem a Dois
[Vilarejo de Arduran, 19 de Maio de 812 da Era Mágica]
Após nos prepararmos e organizarmos tudo o que precisaria ser levado, eu e Miyuki começamos nossa caminhada pela vila, indo em direção ao seu portal de entrada que estava completamente enfeitado por conta das festividades que estavam para acontecer nos próximos dias.
Enquanto andávamos pelas ruas do vilarejo, as pessoas que ali trabalhavam ou faziam suas atividades diárias, paravam de forma imediata para nos cumprimentar e desejar uma boa viagem. Eu mal podia crer que aquela era a mesma vila em que fiquei nesses últimos anos. Tudo estava muito diferente e chegava até mesmo ser assustador perceber o quanto "uma única fruta podre pode estragar as demais saudáveis ao seu redor no recipiente".
Fui presenteado com uma espada nova pelo ferreiro da vila, que a confeccionou especialmente para mim com os melhores metais que tinha em suas mãos. Era uma espada longa que continha sua empunhadura em couro negro. A guarda mão era ornamentada em um formato clássico cruzado, porém seguindo um desing prismal. Sua extensão era toda polida para um prateado brilhante, enquanto seu pomo seguia o mesmo estilo de design prismal da guarda, mas contendo um adicional, pois havia um cristal de mana virgem incrustado em sua base, que logo se encheu de energia mágica púrpura assim como aconteceu com a antiga espada do meu pai. Sua lâmina de dois gumes começava afunilada, crescendo juntamente a sua sangria e terminando em uma perfeita ponta afiada pronta para uma estocada mortal nos oponentes que ousarem enfrentá-la. Além dela ganhei outras ferramentas úteis que usarei em minha viagem para poder sobreviver junto a Miyuki.
Enquanto que outros moradores nos presentearam com muitos suprimentos e comidas, sem falar que também recebemos roupas novas e mais apropriadas para o clima que iríamos enfrentar enquanto estivéssemos em terras nórdicas.
Ainda não havia acreditado que finalmente tinha encontrado alguém do meu passado, e que estava ao meu lado enquanto caminhávamos. Seu sorriso cativante e sua simpatia no trato em lidar com as pessoas continuavam os mesmos, e confesso até estar um tanto sem jeito em falar mais com ela. Começo a perceber que sou péssimo em puxar assunto ou iniciar uma conversa decente, e recentemente comecei a desenvolver um tipo de receio que me impede de conversar com garotas. Eu me transformo em outra pessoa, fico com vergonha e acabo tropeçando nas palavras. A verdade é que já estou vivendo a tanto tempo sozinho, enquanto sofria calado, que desenvolvi uma espécie de bloqueio pessoal.
Eu não via Miyuki há muito tempo, não queria forçar uma intimidade, por mais que ela se mostrasse extremamente afeiçoada a mim.
Ela estava vestindo suas novas roupas. Botas escuras de inverno que subiam até seus joelhos, calça de couro aveludado em seu interior, ao qual desenhava perfeitamente sua silhueta, presas a um cinto de fivela prateada. Blusa branca com a barra presa dentro de sua calça. Um manto cinza claro, feito de pele de lobo, estava sobre seu corpo estendendo-se até um pouco abaixo de seus joelhos, mas o capuz contornado por plumas não estava sobre sua cabeça. Sua Katana continuava bem presa em sua cintura como sempre esteve. As luvas permaneciam por baixo das mangas do seu manto, enquanto que a alça de sua bolsa estava atravessada sob seu busto. Carregava presa em suas costas uma grande mochila feita com pele de animais. A parte de trás dos seus cabelos negros estava bem presa a um pequeno rabo de cavalo deixando apenas sua franja livre e suas mechas a frente das orelhas.
— Essas roupas caíram muito bem em você! Acha que vai conseguir aguentar o clima frio daqui até chegarmos ao destino? — Vi seu rosto corar ligeiramente assim que ouviu tais palavras. E logo uma sensação estranha embrulhou minha barriga.
— Está bem quentinho sim. — Ela então olhou para o céu de forma a tentar esconder suas bochechas vermelhas. — Você fica reparando nessas coisas?
— Ah... Que coisas? — Eu realmente não tinha entendido sobre o que ela estava falando. Talvez só estivesse muito nervoso e não tenha percebido que era algo óbvio.
— Ora, ora, ora!!! Olha como vocês dois estão bonitos! — Rosery se aproximou assim que passamos pelo pátio central da vila. — Nunca pensei que esse dia chegaria, enfim você fez o que eu te disse Magnus....
— É... Talvez eu realmente já estivesse de saco cheio! Tanto quanto o povo daqui estava também. — Olhei para ela que se aproximou de mim colocando a mão em meus ombros. — Eu estava cego para não ter percebido antes que não era o único.
— De fato. Deixe-me olhar você meu querido! Olha como está bonito! — Rosery me olhou atentamente com uma expressão emocionada em seu rosto. — As novas roupas que te deram são realmente muito mais bonitas e funcionais do que as que estava usando anteriormente.
Minhas grevas negras agora eram boas e úteis ao clima invernal, enquanto que minha calça era de um tecido negro reforçado sem deixar de ser aveludada internamente. O cinto ainda era o mesmo, porém agora continha aparatos que estavam bem presos a minha perna me permitindo não só prender minha nova espada na cintura como também outros utensílios como facas e bolsas táticas pequenas nas coxas. Uma adaga estava presa do lado de trás da minha cintura, enquanto meu novo Tomahawk ficava do lado contrário da minha espada.
Havia algumas placas de metais sobre meu corpo, encontrando-as nas manoplas sobre minhas mãos, nas grevas sob meus pés e um protetor peitoral esquerdo preso a fivelas no contorno de meu busto.
Minha nova blusa de cor cinza era trançada com gola aberta e estava presa dentro da minha calça. Por cima de todo o conjunto vestia um novo casaco preto invernal, que me foi dado, que se estendia até um pouco abaixo da minha cintura, e sua gola alta era envolta com uma plumagem cheia que recaía um pouco sobre minhas costas. Suas mangas estavam por baixo das manoplas e em meus ombros havia ombreiras metálicas, presas a cintos que fechavam no formato de "Y", interligadas ao protetor peitoral por uma fivela feita com o brasão da minha família em meu peito.
— Nem parece que sou o mesmo garoto que chegou aqui há tempos atrás! Ao qual você acolheu. Eu não tinha mais nada naquela época, sou grato aos deuses por você estar aqui comigo Rosery. — Peguei em suas mãos olhando em seus olhos. — És a mãe que cuidou de mim, e com toda certeza voltarei aqui para te ver quando tudo se encerrar.
— Oh Magnus... Eu cuidarei de tudo aqui, e o receberei de volta como um rei que há de se tornar. Mas... Com o coração de uma mãe orgulhosa por suas conquistas. — As lágrimas em seu rosto tornaram a cair em meio aquele sorriso. — Você é o filho que eu nunca pude ter.
— Eu agradeço por tudo. — Me aproximei de Rosery pegando em suas bochechas de forma gentil, em seguida beijei sua testa, enquanto ela me envolvia em um forte abraço.
— Quanto a você minha querida... — Rosery se desvencilhou de mim e ficou frente a frente com Miyuki. — Continue cuidando dele por mim. Ele é o tipo de pessoa que atraí encrenca para si mesmo como ninguém!
— Ah disso eu sei muito bem! — Entre gargalhadas Miyuki e Rosery riram enquanto eu só pude assistir deixando um pequeno sorriso crescer em meus lábios. — Eu fui escolhida pelo pai dele para esse propósito e assim permanecerei até meus últimos momentos nesse mundo. O Mestre Magnus é muito importante para mim.
— Ah eu sei bem que é... Eu sei... A gente conversou bastante. — Elas continuaram a rir, e sinceramente, já nem sabia mais do que estavam falando. — Vou ficar mais tranquila com você ao lado dele.
Ambas se abraçaram e logo após se afastaram. Rosery fez um gesto com a mão enquanto assobiava. Em questão de segundos a vila toda estava reunida próxima a nós, as pessoas gritavam palavras de boa sorte e agradecimentos.
— VIDA LONGA AO REI MAGNUS!!! — Gritou um garotinho que estava sobre os ombros de seu pai.
— VIVA!!!! — Todos haviam gritado em uníssono, e foi possível ouvir em alto e bom som.
— E é bom que me traga netos quando voltar! — Minha orelha foi puxada por Rosery.
— Pera!!! Ai, ai, ai!!! Como assim!? Ai, ai, ai!!! — A vila inteira começou a rir com aquela cena vexatória. Mas não posso negar que eu estava me divertindo tanto quanto todos.
Eu e Miyuki agradecemos a todos. Cada um ao seu modo, de acordo com nossas culturas natais materna. Eu coloquei meu punho fechado sobre meu peito assentindo com a cabeça, enquanto que Miyuki se curvou com as mãos juntas na frente de seu corpo rapidamente se levantando em seguida. Acenamos enquanto todos se despediam e colocamo-nos a caminhar para estrada adentro.
[...]
[Floresta de Pinheiros da Região de Arduran, 20 de Maio de 812 da Era Mágica]
O dia estava amanhecendo, era possível ver o nascer do sol enquanto mantinha a guarda do local onde decidimos descansar. No primeiro dia de caminhada não tínhamos conversado quase nada, era como se estivéssemos falando apenas o necessário. Disse a ela que poderia ir descansar porque eu passaria a noite guardando nossa localização. Miyuki até tentou protestar, mas insisti dizendo a ela que eu poderia descansar depois. Ela logo caiu no sono, enquanto isso aproveitei aquela noite para pensar em muitas coisas diante da fogueira e sob céu estrelado.
Havia muitas dúvidas em minha mente. "Qual seria a real intenção dos Rebeldes Leoninos?" Ou "O que o Imperador Algardiano está escondendo de todos, sobre seus conhecimentos diante ao continente de Thâmitris?". Do jeito que aquele homem é ganancioso e egocêntrico, eu duvido muito que apenas conquistar o continente por inteiro seja seu único objetivo. Ele deve saber de mais alguma coisa, e com toda a certeza essa campanha militar tem muito mais motivos escondidos que os envolvidos não estão dispostos a negociar.
Se Algardia realmente estiver trabalhando e se aliando aos demônios para conquistar seus objetivos, isso só reforçaria minhas suspeitas de que não é do continente em si que estamos falando, mas de algo muito maior, que poderia levar o poder absoluto de uma "Era de Caos" que se instauraria por toda a Thâmitris. Isso justificaria as ações do Imperador Joaquim D'Algardia, já que tinha total noção e conhecimento de que os demais Reinos não concordariam com suas ações, e consequentemente, iriam ameaçar uma possível aliança com o antigo Reino de Algardia.
"Ou seja... Então esse desgraçado armou tudo por baixo dos panos e atacou todos de surpresa para evitar qualquer possível resistência dos reinos vizinhos ao seu plano".
Talvez os Rebeldes Leoninos já tenham conhecimento sobre tais planos, e para isso, eu terei que contacta-los pessoalmente a fim de obter informações que serão essenciais para meus planejamentos daqui para frente. Não posso confiar cem por cento nesses rebeldes, não sei quais são suas reais intenções e muito menos que tipo de pessoas que vou encontrar. Mas ainda assim, se juntar a eles e a todos os demais que serão ameaçados daqui para frente é a melhor forma de garantir uma força ofensiva resistente e avassaladora, a fim de criar medo no Imperador.
Sinceramente não sei como vou conseguir poder suficiente para enfrentar um traidor da Ordem Sacro Mágica. Se tudo o que estiver na carta for verdade vou precisar agir de forma sorrateira para que não seja pego e muito menos levante muitas suspeitas. O único lugar que tenho plena certeza que poderei encontrar alguma força suficiente para deixar as coisas equilibradas se localiza no coração do continente de Thâmitris. Para isso eu terei que ir ao Reino Élfico, pois é lá que se encontra a Árvore Sagrada da Vida.
— O Reino Élfico hã.... Quem diria que um dia iria precisar incomodar os guardiões sagrados. — Falei comigo mesmo enquanto mexia na fogueira.
— Eu irei com você. — Miyuki havia acordado, e logo se virou para mim, ainda usando seu manto como cobertor. — Não importa aonde quer que você vá... Não quero correr o risco de perdê-lo novamente.
— Será uma jornada perigosa daqui pra frente. Não acho que você deva... — Fui interrompido por Miyuki que começou a falar.
— Mestre Magnus, há exatos dois anos, eu acatei suas ordens para proteger o povo de Eldoria, mas perdi as pessoas que mais amava nesse mundo. Mantendo comigo uma dor inimaginável por não estar lá para pelo menos fazer alguma coisa! — Ela então se sentou ao chão deixando seu manto sobre as pernas. Juntou suas mãos e olhou profundamente em meus olhos. — Você pode até me retirar o cargo de sua serva real, mas não pense você que irá se livrar de mim tão facilmente. Serei obediente e o servirei como o Rei que nasceu para ser... Sempre acreditei no seu potencial e em seu coração, mas quando chegar o dia em que teremos que lutar por aquilo que é importante... Se ordenar minha retirada, eu mesma abdicarei de meu título e lutarei ao seu lado de forma independente.
Eu conseguia entender o coração e os sentimentos de Miyuki, ela não estava sendo boba e nem birrenta, ela só estava preocupada e com medo. Não poderia simplesmente dizer "não" a ela, só pelo que havia acabado de ouvir, e também não poderia dizer que estava errada em sua forma de pensar. Aquela era sua prova de lealdade e amor pela nossa bandeira, ou pelo menos... Era o que parecia ser em minha interpretação pessoal.
— Certo! Não vou chamar sua atenção por isso... Realmente... Você está certa no que diz, e se esse for seu desejo... — Sorri para ela calmante com o canto da boca enquanto colocava as mãos sobre minhas pernas. — Não a impedirei mais de fazer o que achar ser o correto.
— Obrigada Mestre Magnus! — Ela sorriu para mim, já sendo iluminada aos poucos pelos raios solares da manhã que estavam chegando ao seu ápice do nascer.
— Vamos erguer acampamento e continuar nosso caminho. — Me levantei devagar estendendo minha mão a ela. — Antes de começarmos qualquer grande jornada, gostaria de tomar um bom banho e descansar nas terras em que cuidou de nosso povo.
— Prontamente senhor! — Miyuki pegou em minha mão e logo se levantou. — Espera... Você não vai descansar também?
— Eu descanso na próxima parada — Ela havia percebido que tinha a deixado dormir aquela noite toda.
Erguemos acampamento, nos organizamos e fizermos o que tinha que ser feito para continuarmos o caminho. Assim que nos aprontamos, apaguei o fogo e continuamos a caminhada.
— Mestre Magnus! — Miyuki me chamou atenção.
— Sim? — A respondi esperando suas palavras.
— Você poderia me contar o que aconteceu após eu ter ido embora naquele dia? Eu gostaria de ouvir. — Eu sabia que ela queria saber, mas ao mesmo tempo sabia que ela também se sentiria mais culpada por não estar lá naquele momento.
— Muito bem... — Respirei profundamente enquanto caminhávamos. — Eu vou lhe contar, mas não quero que se sinta culpada por nada. Quero que coloque em sua mente que nós vamos dar um jeito nisso... E eu com certeza irei vingar aqueles que se foram de forma tão injusta.
Caminhamos por algumas horas, e durante todo o percurso eu lhe dei detalhes sobre o ocorrido. Miyuki ouviu tudo atentamente e ficou horrorizada com o destino pelo qual todos haviam passado. Seja meu pai morto, minha mãe e Elize capturadas e até mesmo desaparecimento de Max. Obviamente que Miyuki ficou extremamente emotiva, e chegou a derramar algumas lágrimas durante uma parte do percurso. Acabou que uma pausa se fez necessária para que eu a confortasse, mas logo continuamos o caminho que estávamos seguindo.
A viagem duraria 3 dias de caminhada, contando a partir do momento em que saímos do Vilarejo de Arduran, e esse era o segundo dia. Aproveitava as pausas para fazer fogo e caçar alguma coisa para comermos, enquanto Miyuki não só cuidava dos nossos pertences como cuidava também da organização de tudo o que utilizaria para preparar a comida.
Nossa relação foi gradualmente se estreitando aos poucos, entre conversas, brincadeira e revivendo momentos bons no Reino Caído de Eldoria. Até mesmo para mim foi um grande alívio poder colocar todos esses sentimentos para fora, pois havia se tornado uma forma de sorrir com algo que perdi, e não tinha como compartilhar com ninguém nesses anos que se passaram.
Finalmente conseguimos atravessar as fronteiras nórdicas, e o clima gradualmente foi ficando cada vez mais próximo da real primavera em que estávamos. O frio ficou ameno, o sol era mais visível entre nuvens e a paisagem já não estava mais coberta pela neve. O gramado verde intenso junto ao enorme campo de flores cresceu a nossa frente. Sair de um clima gelado e mórbido me fez perceber o quanto eu havia me isolado de tudo e todos, e que o mundo não havia parado só porque desgraças aconteceram em minha vida. Aquele ainda era o mundo que meus pais me ensinaram a amar, e por esse motivo eu tinha ainda mais força de vontade em fazer o que tinha que ser feito.
— Uau... Que lindo!!! — Miyuki saiu correndo rindo a minha frente logo se enfiando em meio ao incrível campo de flores. — Venha Mestre Magnus!!!
— Calma aí!!! — Me permiti rir um pouco, e foi gargalhando que corri até Miyuki.
Perdemos algum tempo naquele local, havia uma infinidade de tipos diferentes de flores, e como queria guardar aquele momento em meu coração, comecei a observar o campo com mais atenção, até que acabei por encontrar uma flor de espécie única e rara em toda a região de Thâmitris. Seu nome era Rosa Arcuris, e se tratava de uma flor que continha três cores gradientes em um degradê, da base de seu broto até as últimas pétalas maiores. As cores eram amarelo, azul ciano e roxo púrpura, e a sua raridade se dá por conta de que ela nasce apenas uma vez ao ano durante a primavera, além de trazer várias lendas e mitos sobre seu incrível poder de carregar consigo prosperidade para as pessoas.
— Ei! Miyuki! — Me aproximei e então mostrei a ela a rosa.
— Uma Rosa Arcuris!!! Isso é uma raridade!!! — Ela colocou as mãos sobre a boca.
— Assim como você... — Sem fazer muito alarde, apenas coloquei a rosa em seu cabelo. Mas assim que olhei para ela, Miyuki estava completamente vermelha, parecendo um pimentão.
— O-obrigada... M-mestre M-m-magnus. — Suas bochechas estavam tão vermelhas que pareciam queimadas. Ela então se virou rapidamente e começou a desconversar. — Ah... E-está ficando q-quente aqui né? Acho que usar essas roupas de inverno daqui pra frente vai ser meio loucura...? Ah!!! Acabei de lembrar!!! Estamos próximos a um vilarejo que podemos passar essa noite!!! Vamos para lá!!!
— Ótimo! Vamos indo, logo o cair da noite chegará! — Achando suas reações engraçadas, coloquei as mãos na cintura.
— Certo! — Miyuki sorriu para mim em meio as flores, o que deixou aquela paisagem realmente muito bonita.
Com o por do sol chegando, logo avistamos o vilarejo que Miyuki havia comentado, os camponeses estavam recolhendo alguns de seus utensílios antes do anoitecer, mas assim que viram nos aproximando no horizonte, acenaram de forma gentil para nós. Percebi que Miyuki já era uma conhecida deles, pois vinha constantemente para esses lados a minha procura, ou a procura de outros sobreviventes.
O vilarejo como um todo nos recebeu muito bem, e logo nos cederam uma residência para passar a noite. O problema é que devem ter pensado que éramos um casal, e quando percebemos que só havia uma cama, já era tarde de mais.
— Ah... Miyuki? Você não disse a eles que... — Fui interrompido por ela mais uma vez.
— Eu esqueci!!!! — Ela novamente havia se tornado um pimentão. Ela baixou sua cabeça colocando as mãos sobre seu rosto vermelho. — Perdão Mestre Magnus....
— Está tudo bem! Eu posso dormir no chão. — Tentei ser o mais gentil ao tentar acalmá-la, mas assim que Miyuki ouviu aquelas palavras rapidamente se pôs a retirar meu casaco.
— Mas de jeito nenhum!!! Nós vamos descansar de forma digna! Amanhã é nosso último dia de viagem, então trate de descansar muito bem e... — Seus olhos se encontraram com os meus no momento em que ela terminou de retirar meu casaco. — E... Eu... N-não me importarei de me deitar... C-com você...
Aquela afirmação havia me deixado sem palavras, eu não sabia dizer em qual sentido ela estava me falando aquelas coisas. Não queria tomar nenhuma decisão precipitada, mas não posso negar que tais palavras tinham mexido com minha intensidade pessoal sobre tal assunto. Já fazia um tempo que não tocava em um corpo feminino, e a respiração de Miyuki tão próxima a minha estava me deixando inquieto.
— D-desculpa! Eu estou dizendo coisas estranhas! Digo! Eu estou com saudades da sua presença! Então dormir ao seu lado não me... — Dando ouvidos aos meus desejos, e movido pela emoção, eu a interrompi colocando minha mão gentilmente sobre sua bochecha, a beijando calmamente. O beijo se intensificou durante o ato, enquanto podia senti-la ficar rígida com o susto, e então relaxar se entregando gradativamente. Após nos separarmos, um suspiro vindo dela foi possível ser ouvido e então os nossos olhos voltaram a se encontrar novamente. — Mestre... Magnus...
— Perdoe meu egoísmo, é que já faz um tempo que não tenho qualquer contato desses. Foi um erro meu. — Tentei me afastar recobrando o controle dos meus instintos mais profundos. Mas surpreendendo todas as minhas expectativas e quebrando toda minha linha de defesa, Miyuki agiu me agarrando pelas golas da minha blusa me jogando na cama.
— Eu que peço perdão... Estou a anos te servindo e nunca pude ser honesta quanto aos meus desejos e sentimentos. Não vou simplesmente deixar que essa oportunidade passe. — Ela subiu em cima de mim retirando sua blusa, sentando-se sobre a minha cintura. — Vamos manter isso em segredo Jovem Mestre. Eu também estava sedenta por algo assim, mas não queria que fosse com ninguém além de você. Esse vai ser o nosso segredinho.
— Você tem certeza disso? — Olhei para ela quase não me contendo diante daqueles olhos sedutores.
— Eu nunca negaria você. Só vou pedir para que seja gentil comigo. — Ela se aproximou do meu ouvido sussurrando em seguida. — Essa é minha primeira vez...
[...]
[Vilarejo do Campo Florido, 21 de Maio de 812 da Era Mágica]
Acordar sem roupas ao lado de outra pessoa era uma experiência um tanto diferente e complexa para mim. Muitas preocupações estavam em minha cabeça, principalmente sobre meu desempenho na noite passada. Fico me perguntando se toda primeira vez de um homem é dessa forma, mas acredito que tudo se baseia em experiência de vida.
Miyuki estava dormindo ao meu lado, e a observando dessa forma, aparentava ser ainda mais fofa e gentil do que sempre havia sido. Não sei dizer o quão correto ou errado essa decisão nossa havia sido, mas como foi algo consentido pelos dois, não houve qualquer crime nisso.
Obviamente que ainda estou muito surpreso pelo que aconteceu, mas não posso negar que todo o sentimento de perigo somado ao prazer do ato, trouxe um sentimento de adrenalina e tanto para ambos.
— Mestre Magnus... — Miyuki abriu os olhos lentamente, e então se virou para mim corando suas bochechas. — Você dormiu bem...?
— Sim. Melhor impossível... — Aproveitei para fazer carinho em seus cabelos, até que ela começou a esconder seu rosto aos poucos embaixo das cobertas. Aquela sim era a Miyuki que eu conhecia.
— Eu poderia beijar você uma última vez antes da gente se levantar? — Ela me pediu, e eu assenti com a cabeça, beijando-a calorosamente.
Após nos levantarmos e ficarmos prontos para mais um dia de viagem, saímos daquela casa, e acabamos nos deparando com uma cena bem incomum. Todo o vilarejo estava extremamente quieto e vazio, não havia uma alma viva andando por ali.
— Isso é estranho. Esse vilarejo é muito animado... — Miyuki concluiu meu pensamento, e então realmente algo não estava como nos conformes por ali.
— ESPEREM!!! NÃO É NECESSÁRIO ISSO!!! — Ouvimos um grito desesperado vir do lado oposto de onde viemos no dia anterior, e após nos entreolharmos, começamos a correr em direção a pessoa que havia dito tais palavras.
Assim que chegamos ao local, vimos uma cena absurda, ao qual logo me ferveu o sangue, fazendo com que tivesse vários flashs de lembranças sobre o dia em que meu lar havia sido invadido.
Miyuki logo colocou as mãos sobre a sua boca espantada, pois havia um pequeno grupo de soldados com os brasões do Império Algardiano rendendo os homens do vilarejo, usavam crianças como reféns e deixavam as mulheres seminuas estendidas nas árvores. Aquele sorriso cruel estampado no rosto do líder era o mesmo sorriso que Rujir Camavord, o antigo campeão derrotado por mim naquele fatídico dia, tinha em seu rosto.
— O que vamos fazer Mestre Magnus? — Miyuki olhou para mim que já estava com a mão sobre o pomo de minha espada.
— Nós vamos matá-los... — Franzindo o cenho e cerrando meu olhar, comecei a andar em direção aos cavaleiros malfeitores. — Vou mostrar a Joaquim D'Algardia que Eldoria ainda vive.