O Retorno da Gula Coreana

Tradução: Teverrr

Revisão: Melo


Volume 1

Capítulo 41: Eu Me Chamo...

Mesmo que semicerrasse os olhos, ativasse e desativasse a habilidade, a visão que tinha continuava a mesma. O contrato de Kim Hannah emanava um brilho dourado, enquanto que aquele oferecido pela Sinyoung continuava sem cor alguma.

“Por que caralhos esse negócio tá todo dourado…?”

Pelo menos tinha aprendido que o “Mandamento Dourado” se aplicava tanto para objetos, quanto para pessoas. De qualquer forma, não tinha certeza do que fazer. Um documento lhe fornecia informações demais, deixando-o confuso, e, ao mesmo tempo, o outro não era claro o suficiente para que pudesse decidir.

— Vou assinar esse aqui. — Depois de pensar muito, escolheu aquele que a agente o ofereceu.

Hã? — O rosto de Shin Hansung demonstrava o quão surpreso estava.

Ahh! — Ao mesmo tempo, Yun Seora foi pega de surpresa e soltou um suspiro que transparecia nervosismo.

— Você pode explicar? — perguntou o jovem de cabelo encaracolado.

Ao contrário do que Seol esperava, Kim Hannah não impediu a pergunta. Ao contrário, ela apenas abaixou a cabeça tentando disfarçar o choque que sentia no momento. Porém, era claro que estava atuando.

— Não gostou dos termos oferecidos?

— Não, não é isso. É que os termos são tão bons que parecem um fardo muito pesado para que eu consiga carregar.

— Pode ser sincero. Se houver alguma cláusula que te desagrade…

— De forma alguma. Sou muito grato por terem me avaliado tão bem. Mas… — À medida que falava, sentia as bochechas ficando vermelhas. Então, decidiu olhar para a outra negociadora. Após conseguir confirmar que os lábios dela estavam se esforçando para não formarem um sorriso, continuou: — Tenho razões pessoais para não assinar esse contrato. Me sinto muito arrependido por recusar uma oferta tão incrível. Sem contar que eu também devo me desculpar com você.

Shin Hansung percebeu que o cliente estava tentando deixar a explicação o mais vaga possível e que aquele tom de voz era irredutível. No entanto, não podia recuar com tanta facilidade. Com determinação, curvou-se na direção do Marca de Ouro.

— Por favor, me escute. Seria uma mentira se não considerássemos o seu potencial futuro, mas, além disso, somos muito gratos pelo que você fez por nós. — Após uma pausa esperando uma resposta que não veio, prosseguiu a falar. — Sinyoung é uma organização que premia aqueles que merecem. Não esqueceremos o auxílio prestado para com a jovem senhorita, filha do Presidente. Na verdade, vários da organização já possuem uma visão positiva de você e eu me incluo nisso.

Com toda a sua capacidade de oratória, o jovem de cabelo encaracolado parecia ainda estar tentando convencê-lo a mudar de ideia. Porém, Kim Hannah já havia colocado a mão em um dos contratos.

“Será que isso não significa que tem gente lá dentro que não me quer também?”

Tinha acabado de descobrir que a relação entre Yun Seora e a farmacêutica era bem complicada. Por fim, sentiu um toque que logo envolveu todo o seu braço direito.

— Por favor, venha com a gente… — Uma voz suplicante o atingiu. O olhar de Yun Seora que tentava penetrar na sua alma estava repleto de emoções e ansiedade. — E-eu vou fazer o meu melhor…

“O seu melhor em quê…?”

O que ela queria dizer com aquilo? Sentiu vontade de rir, mas logo se segurou.

“Isso é um dilema sem sentido, né?”

Não tinha baseado a decisão nos Nove Olhos. Não contou nem com as emoções e nem com a lógica. Havia uma razão que não podia dizer em voz alta para aquela decisão.

“Gula.”

“Aproxime-se, minha criança…”

As vagas lembranças do sonho. Naquele momento, já tinha se esquecido da maioria, mas os últimos momentos ainda permaneciam vívidos. O homem que acreditava ser ele mesmo fez um pedido, mas ele foi negado. Porém, em troca, recebeu “emoções” na forma de um sonho. Estava curioso. Queria saber como o pedido do seu eu da visão tinha sido atendido. Porém, aquilo não era tudo. Também levou em consideração os avisos de Kim Hannah e a afirmação de que o carimbo dourado pertencia ao Templo da Gula.

Além disso, havia um indescritível medo que sentia ao pensar em assinar o contrato proposto pela Sinyoung. Caso o fizesse, teria uma vida não muito diferente daquela que viu através do sonho. Com toda a certeza não queria ser abusado como um escravo. Assim, mesmo que o caminho a seguir fosse muito mais difícil, gostaria de ser livre. Precisava apenas balançar a cabeça e dizer não.

— N-nós podemos te tratar muito bem… — A voz de Yun Seora parecia ainda mais triste.

— Que tal… — Após dar um longo suspiro e quebrar o silêncio, Kim Hannah decidiu falar. — Darmos um tempo? — sugeriu, assim que o Marca de Ouro estava prestes a pegar a caneta.

— Tempo?

— Sim. Nós vamos precisar de um tempo pra ajustar o contrato, e você vai precisar de um tempo pra pensar nas coisas. E pra voltar pra casa.

Estava prestes a assinar a linha pontilhada, mas a pequena menção à palavra “casa” o fez travar.

“Casa.”

Percebeu que já tinham se passado três meses. O que tinha acontecido na Terra? A sua família? E Yoo Seonhwa? Será que eles estavam preocupados por ele ter desaparecido sem falar nada?

— Concordo. Não é uma má ideia te darmos tempo para pensar nas coisas — disse Shin Hansung.

Seol aceitou a sugestão, fazendo com que a agente se levantasse e guardasse os contratos.

— Seol e eu vamos para o templo, mas e vocês dois?

— Eu levarei a senhorita Yun de volta para o QG da empresa. Afinal de contas, o Presidente a espera lá. Iremos nos separar na cidade de Scheherazade. — No momento em que o jovem do cabelo encaracolado se levantou, o Marca de Ouro também o fez. Não tinha ideia do que era esse templo e essa cidade de Scheherazade, mas sabia que devia voltar para casa.

Olhou em volta e percebeu que as conversas de negócios ainda estavam acontecendo. Não conseguiu ver Shin Sang-Ah, mas Hyun Sangmin parecia estar no meio de uma conversa bem importante, já que balançava os braços para tentar mostrar a validade dos argumentos que dizia.

Yi Seol-Ah também estava no meio de uma negociação com um homem desconhecido. No momento em que o olhar dela se encontrou com o de Seol, a jovem fez menção de se levantar, mas ele acenou de volta indicando que não precisava, pois não queria interrompê-la. Ela deve ter entendido as suas intenções, então logo se sentou novamente com um sorriso no rosto.

— Quer esperar por eles?

— Não precisa.

Não é que não queria estar próximo deles de novo, mas o caminho de cada um estava sendo traçado naquele momento e ele não se sentia confortável em fazer qualquer tipo de intervenção quando não fosse necessário.

“Tenho certeza que nos veremos de novo.”

Contato que sobrevivessem, com certeza iriam se encontrar mais uma vez.

Olhou para a Zona Neutra pela última vez antes de se virar.

 

***

 

Como havia escutado que o meio de transporte era uma carruagem, pensou que encontraria um pedaço de madeira com rodas sendo puxado por um bando de cavalos. Nada muito sofisticado. No entanto, teve uma grande surpresa depois de vê-la.

A carruagem, mais parecida com um artigo de luxo, era totalmente coberta. No interior, ela era coberta por veludo e couro. Porém, o que mais o chamou a atenção eram os animais que a conduziam. A aparência era similar com a de um cavalo, mas as orelhas pontudas e tronco sobressaltado mais lembrava um camelo.

Shin Hansung forçou as duas pessoas próximas ao banco do motorista a beberem uma certa substância, enquanto Kim Hannah subia.

— O que vocês dois estão fazendo? Venham logo.

Seol e Yun Seora trocaram olhares e subiram. Os bancos no interior ficavam um de frente para o outro. Logo, Kim Hannah ficou virada para o Marca de Ouro, enquanto Yun Seora decidiu sentar-se à direita do jovem. Em seguida, a agente fechou a porta, fazendo com que a carruagem balançasse um pouco, indicando que estava se preparando para começar a andar. Quando ganharam certa velocidade, a negociadora decidiu falar.

— Precisaremos de 40 minutos para chegarmos ao nosso destino. Viajaremos por Zahrah.

— Zahrah?

— É só o nome de uma estrada que vai pra Scheherazade. Relaxa! Não tem notícias de monstros ou outras raças atacando viajantes que passam por Zahrah há mais ou menos um ano.

Clack, clack.

A carruagem tinha acabado de passar por um trecho esburacado, mas Seol não ligou muito, já que ficou entretido pelos companheiros durante a viagem.

Kim Hannah pediu para que ele a contasse o local na Terra que queria ser teletransportado de volta assim que chegassem ao destino e logo prosseguiu lhe explicando mais algumas coisas, assim como as coisas que deveria fazer ao chegarem e a maneira de voltar para a Terra.

Várias coisas chamaram a sua atenção no meio das explicações que recebeu. Uma delas foi a informação de que o tempo passava de forma diferente em uma proporção de 3:1. Portanto, os três meses que passou na Zona Neutra equivaliam a um mês na Terra.

Além disso, a agente lhe explicou sobre coisas que poderia levar da Terra para o Paraíso. E, como estava ciente da presença dos outros dois, fez questão de mencionar as vantagens do contrato da Sinyoung de vez em quando. Toda vez que ela falava desses benefícios, Yun Seora o encarava com um olhar de súplica e tentava encorajá-lo a tomar uma decisão com a sua doce voz. Chegou até a sentir-se um pouco pressionado com aquela abordagem.

— Parece que estamos quase chegando — disse Kim Hannah ao espiar o lado de fora.

Seol também decidiu ver um pouco da estrada, o que o deixou totalmente boquiaberto. Estavam se aproximando de um enorme forte amarronzado que, com todo o seu esplendor, refletia a luz do sol. Após ver a expressão do cliente, um sorriso formou-se no rosto da agente.

— Bem-vindo à Scheherazade.

 

***

 

A carruagem diminuiu a velocidade e continuou a se mover por cerca de cinco minutos após passarem a muralha. Quando parou, ouviram leves batidas na porta e uma voz lhes disse que haviam chegado.

— Vamos descer aqui. — A negociadora fez um sinal com os olhos e foi a primeira a desembarcar.

Estava prestes a segui-la, mas logo percebeu o motivo daquele olhar. Yun Seora ainda o segurava pelos braços.

— Tenho que ir agora. Muito obrigado pelos últimos três meses. Eu me diverti bastante.

Como ela poderia bloqueá-lo, já que ele estava tentando ir para casa? Quando, com cuidado, começou a querer se levantar, não sentiu resistência alguma. Porém, isso foi válido apenas até que a sua cintura saísse do banco. Quando o braço direito estava prestes a sair do alcance de Yun Seora, ela o agarrou com mais força.

— É…

— S-senhorita Yun Seora?

— E-eu gostaria de te ver de novo. — Diferente de antes, agora ela expressou em voz alta o desejo que tinha.

Na primeira vez que a encontrou, os olhos daquela mulher estavam distantes e frios, mas agora encontravam-se profundos e cheios de emoção, fazendo com que Seol se sentisse perdido.

— Sim, eu também quero te ver de novo.

Então, ela o soltou, apesar de nunca ter parado de olhá-lo até que o Marca de Ouro fechasse a porta.

“Parece que eu acabei de abandonar uma criança…”

A carruagem voltou a se mover. Ao se virar para Scheherazade, pôde ver a cidade mais próspera pertencente ao território da humanidade. Kim Hannah acenava em sua direção do topo de uma escadaria feita de pedra. Atrás dela, conseguiu ver uma espiral tão alta que parecia capaz de perfurar o céu.

Enquanto caminhava, percebeu que a espiral — ou torre— parecia ser feita de um estranho material que emitia um pálido tom esbranquiçado.

— Este é o Templo da Luxúria. De todos os sete deuses, ela é a responsável pelas habilidades de cura usadas pelos Sacerdotes.

Ao ouvir aquilo, Seol viu várias pessoas entrando e saindo de uma entrada erguida por enormes pilares de sustentação. A maioria usava o mesmo robe branco que Maria vestiu quando se preparou para a Cerimônia.

— Só por curiosidade, a Maria ainda tá aqui?

— Acho que ela já saiu. Bem, a sua recuperação já terminou e ela não pode voltar para a Zona Neutra mesmo. 

— Entendi. Pra onde foi?

— Pro sul. — Kim Hannah adentrou o templo. No interior, pôde ver dois imensos corredores em ambos os lados e, na frente, um auditório pouco iluminado, no qual uma mulher estava sentada.

— O que os trazem aqui? — A mulher levantou o olhar cansado e encarou a agente.

— Viemos usar o portal — disse, apresentando um pedaço de papel.

— Um nível 1 que está retornando para a Área 1. Ah, é a primeira vez que ele faz uso deste serviço?

— Ele saiu da Zona Neutra hoje.

Aaah, é verdade. Hoje é o dia. Então devemos estabelecer um novo ponto de retorno. Por aqui! — A mulher leu o papel com os olhos semicerrados antes de levantar a mão. Um homem asiático com o cabelo preto saiu de algum lugar e logo foi na direção em que foi chamado.

— Você é da Área 1, certo? — perguntou ao homem, mostrando-lhe o pedaço de papel. 

— Sim..

— Então ajude-me a calcular as coordenadas.

— Vejamos. Área 1, Seoul, distrito de Seodaemun, subúrbio de Hongeun. Ah, isso não deve ser tão difícil. — O asiático sorriu ao ler o papel. — Sei de um lugar no subúrbio de Eungam.

— Estarei contando com você, então. Além disso… — A mulher encarou Seol antes de continuar a falar. — Você estava mesmo planejando voltar para a Terra desse jeito?

— Gostaríamos de utilizar o serviço de armazenamento — respondeu Kim Hannah, como se seguisse um protocolo.

— Como você é um nível 1, será de graça. Por aqui. Por favor, use a sala número 8. Já sabe como funciona, certo?

— Já expliquei pra ele.

— Parece que você é uma guia excepcional. — A mulher ofereceu uma chave com uma placa com um olhar de alívio.

Seol pegou aquele item e caminhou em direção ao caminho na direita. O interior se dividia ainda mais em vários andares com paredes brilhando, parecendo um âmbar. Além disso, à medida que caminhava, também pôde ver várias portas com mais de dois metros de altura. Por fim, encontrou uma com um “8” prateado e a abriu.

Poucos itens do Paraíso Perdido podiam ser levados para a Terra, significando que devia guardá-los antes de sair. Templos pareciam ser os locais mais seguros para isso. Apesar da enorme taxa que exigiam para o armazenamento, as suas coisas estariam protegidas por poder divino.

No entanto, apenas poderia usufruir desses serviços de graça enquanto estivesse no nível 1 ou 2. No momento em que chegasse ao nível 3, teria que usar “pontos de conquista” caso quisesse utilizar os portais e o serviço de armazenamento.

Apoiou as duas lanças que tinha contra a parede e tirou a armadura. Ainda tinha as roupas que vestia na Terra, mas estavam muito gastas. Para o seu alívio, Kim Hannah havia levado vestimentas para que ele pudesse utilizar.

“Esqueci de agradecê-la.”

Terminou de se vestir e decidiu checar os itens que tinha uma última vez. Teria de deixar para trás os Elixires e o Estigma Divino. Estava um pouco preocupado em tais itens serem roubados, mas como um deus protegia aquele templo, pensou que devia acreditar na segurança do local.

Terminou de organizar os seus itens e saiu da sala, fazendo questão de trancá-la bem. O “8” prateado na porta mudou e cor para um dourado. Daquele momento em diante, apenas Seol seria capaz de abri-la. Mesmo que outra pessoa pegasse aquela chave, ela ainda não conseguiria ter acesso à sala.

Ao caminhar pelo corredor, começou a pensar. Não podia acreditar que estava voltando para a Terra com tanta facilidade. Por quê? No sonho “ele” não podia voltar, mesmo depois de muito tempo após sair da Zona Neutra. A versão do sonho de si mesmo sentiu muita falta de casa durante o seu período inicial ali. Será que aquela era outra diferença entre um Contratado e um Convidado?

Sentiu um pouco de arrependimento. Apesar de não ter muita dificuldade em deixar os itens que conseguiu na Zona Neutra para trás, não conseguia parar de pensar nos amigos.

“O que será que eles estão fazendo?”

Já assinaram os contratos? Acho que eles querem voltar para casa também. Será que deveria tê-los esperado para voltarem juntos? Poderia, ao menos, ter se despedido. Apenas os encarou uma última vez, pois não queria atrapalhá-los, mas agora estava arrependido.

Ao retornar à recepção, o homem asiático não estava mais lá. Apenas Kim Hannah e a recepcionista encontravam-se no mesmo local.

— Me mostre o dorso da sua mão, por favor. — Ao estendê-la, a mulher colocou um outro papel com um diagrama complexo desenhado na sua mão e o pressionou um pouco. — Com isso, as suas coordenadas de retorno foram definidas. A partir de agora, toda vez que usar o portal, sempre irá para o endereço que você nos deu. Caso queira mudar de casa, precisará nos alertar com antecedência. Ou poderemos causar um caos desnecessário na Terra.

— Entendi — respondeu, devolvendo a chave. A agente já tinha explicado que precisaria entregá-la de volta sempre que acabasse de guardar os itens.

Ao lhe dar um passe com o número “8” escrito, a senhora arregalou um pouco os olhos.

— Hmmm, tenho certeza de que já ouviu as explicações, mas mesmo assim, não se esqueça de cuidar muito bem deste passe. Além disso, você sabe que, depois de pegar de volta os itens guardados, deve sempre verificar a cor do número na porta, correto?

Sim. De dourado para prateado.

Exato. Caso a coloração permaneça dourada, significa que você deixou algo para trás. A menos que queira estender o período de armazenamento, as coisas podem ficar bem complicadas pra nós dois. Então, por favor, sempre cheque com cuidado.  — A recepcionista parecia ressentida sobre alguma coisa.

Ao terminar de falar, ela fez uma pausa, certificando-se que o novato havia entendido tudo e logo depois lhe deu mais dois pedaços de papel.

— Um destes é usado para quando você quiser retornar ao Paraíso. Acredito que já tenha feito missões na Zona Neutra, então presumo que saiba como funciona. No momento em que rasgá-lo ao meio, um portal irá se abrir. Pessoas que não possuem Marcas não poderão vê-lo ou sentir a presença que ele emana, mas recomendo que ache um lugar calmo quando for usar.

— E esse outro…?

— É uma lista de itens que pode trazer da Terra. É a sua primeira vez, então a leia com cuidado.

Enfiou ambos os papéis no bolso.

— Prontinho! Terminado! Agora você só precisa assinar bem aqui… — A senhora puxou um outro documento da bolsa. Era um acordo de sigilo que o proibia de revelar qualquer coisa relacionada ao Paraíso Perdido para outra pessoa na Terra.

Como era algo muito importante, aquele contrato possuía poderes divinos. Portanto, no momento em que assinasse, os poderes dos deuses garantiriam que as condições fossem cumpridas, independente das circunstâncias. Eles haviam feito um esforço muito grande para conseguirem manter aquilo tudo em segredo.

Até que sabia bastante devido ao sonho, mas Kim Hannah o explicou ainda mais enquanto ficaram na carruagem, então Seol assinou aquele termo sem grandes problemas. Na verdade, algumas coisas o irritavam um pouco, mas como todo esse processo precisava ser feito para que pudesse usar o portal pela primeira vez, achou melhor continuar em silêncio.

— Muito bem. Por favor, dirija-se para o auditório atrás de mim e use o portal de lá.

Finalmente, poderia sair.

— Você fez tudo mais rápido do que eu pensei que iria.

— Nem tinha nada tão difícil aqui.

— Tá bom, então. Bora. — Kim Hannah deu um passo à frente primeiro.

Antes que entrasse no auditório, o Marca de Ouro deu um último olhar para trás e suspirou. Porém, antes que pudesse continuar andando…

Passo, passo, passo, passo.

O som de passos ecoou e…

— Esperaaa! — gritou uma voz familiar.

Seol ficou surpreso. A agente também não entendeu como aquilo podia estar acontecendo.

— Por que ela tá aqui…? — Tinham a visto sair com a carruagem há pouco tempo atrás.

A mulher que se apoiava com os braços contra uma pilastra era Yun Seora, que parecia aliviada ao perceber que Seol ainda não tinha partido. Ela controlou a respiração, engoliu em seco e perguntou: — O seu nome!

— Como assim?

— Por favor, me diga o seu nome!

— Seo… — Ficou ainda mais confuso. Não conseguia responder muito bem devido ao choque de vê-la ali. — Seol...

— Mas esse não é o seu sobrenome?

Estava prestes a dizer que o seu nome era Seol.

— C-como você… — O coração estava disparado e ele começou a ficar corado.

— Quando você chegou no segundo andar do Tutorial teve um alerta. Eu escutei o seu nome, mas esqueci. O alerta disse “senhor Seol alguma coisa chegou ao segundo andar.”

Ah.

— Eu achei estranho. O seu nome tem três palavras, mas mesmo assim você fica se chamando de “Seol” o tempo todo…

— É-é que…

Ela tinha acertado bem na mosca, fazendo com que o Marca de Ouro começasse a gaguejar.

— Seu nome. Por favor, você pode me contar o seu nome completo?

Fechou os olhos. Por algum motivo, imaginou os dias que passou na Zona Neutra. Nas manhãs, tomava café da manhã com Yi Seol-Ah, Yi Sungjin e Yun Seora. Depois, encontrava-se com os companheiros no primeiro andar e eles discutiam o cronograma do dia e táticas de batalha para que conseguissem fazer o melhor que podiam nas missões. Após completá-las, iam para a praça principal e conversavam enquanto bebiam algo.

Algumas vezes encontrava Shin Sang-Ah e Hyun Sangmin e perguntava como eles estavam. Por último, voltava para o dormitório, fazia algumas tarefas domésticas com os amigos, já que moravam juntos e dormia.

Não importa quantas vezes se lembrasse de tudo aquilo, eram sempre boas memórias.

Quando abria os olhos, encontrava Yun Seora próximo de si.

— E-eu me chamo… — A garganta ficou seca. Se o coração batesse mais forte, era capaz de sair do peito.

Fazia três, talvez quatro anos desde a última vez que revelou o seu nome completo. Depois de um tempo, a sensação de vertigem que o atingiu desde aquela pergunta passou, fazendo com que ele respirasse fundo para se acalmar de novo.

— Eu me chamo… — Finalmente… — Jihu. — Seol agora era Seol Jihu. — Eu me chamo Seol Jihu. —  Olhou para Yun Seora e, com dificuldade, deu um sorriso.

 

***

 

— Tinha alguma razão para você ter hesitado em contar o seu nome completo? — perguntou Kim Hannah. — Pensando bem, agora eu também fico curiosa. Por que você sempre me disse que o seu nome era Seol? Quero dizer, esse é o seu sobrenome, certo?

— Eu fui Seol… — Hesitante, começou a responder depois de um tempo.

Hm?

— Pelos últimos 3 ou 4 anos, eu fui Seol.

A expressão da agente mostrava o quão confusa ela estava. Claro, não tinha como ela saber. Afinal, era uma história da época em que ele ainda era viciado em apostas.

A sua família o deserdou.

O título que tinha, aos poucos, foi mudando de “filho”, para “idiota”, depois para “bastardo” e, por último, para “mentiroso desgraçado”. No fim das contas, não se importava mais em ser chamado pelo próprio nome, já que não era nem mais chamado de ser humano.

Além disso, também tornou-se mais distante do amor de sua vida até o ponto no qual ela passou a chamá-lo de “filho da puta”. Assim, antes mesmo que pudesse perceber, ninguém se referia mais a ele pelo nome. Logo, também parou de contá-lo aos outros.

No cassino, as pessoas o chamavam de senhor Seol, Seol Hyung, etc. Então, começou a aceitar Seol como nome.

— Entendi. Então por que decidiu contar o seu nome todo então?

— Não sei. — Ao ouvir aquilo, Seol Jihu parou de andar. Olhou para o teto, incapaz de pensar em uma explicação, mesmo que tentasse. — Não sei. É só que…

— Sim?

— É só que agora eu… Não, não posso ter certeza disso ainda, mas… — Seol Jihu abaixou o olhar. — Eu pensei que se for a senhorita Yun Seora… — Deu um sorriso irônico. — Eu devo conseguir contar o meu nome sem sentir vergonha. 



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