Volume 1

Capítulo 40: A irá de uma Guerreira

Com um olhar frio, uma mão na alça da espada, Helena removeu a espada do corpo do capitão de Aclasia. Estava toda banhada de sangue do mais vermelho carmesim. Helena sacudiu a espada de um lado para outro, buscando se livrar daquele sangue que percorria aquele metal prateado.

Sangue voou pelo vento, o resto que havia sobrado, Helena tratou de limpar nas partes limpas daquele homem agora inconsciente, ou talvez… morto. Helena não sabia dizer, na verdade, para ela não importava mais.

Seus pensamentos agora estavam focados na frota que havia mandado para a cidade de Aclasia. Aquelas palavras de Melquiore ainda pesavam sobre sua mente.

"Só posso dizer que toda aquela frota que você enviou para invadir o reino será completamente aniquilada. Tudo isso porque você não quis recuar."

Aliado a isso, ainda haviam outras palavras que Melquiore havia proferido que perturbavam a mente de Helena, como, por exemplo, a qualidade dos soldados na guerra.

— Não, Helena!

Ela balançou sua cabeça negativamente, mandando para longe aqueles pensamentos.

— Na guerra não há tempo para pensar. Preciso me apressar antes que o esquadrão do Léo se encontre com um desses soldados!

Dito isso, Helena começou a correr para a lateral direita. Seu alvo era aquela parte da muralha que havia sido destruída
pelo esquadrão do William.

No entanto, pedras haviam aparecido no seu caminho. Seis soldados que carregavam em suas mãos espadas coloridas por sangue carmesim, estreitavam seus olhos para Helena.

— E pensar que essa vaca foi capaz de matar o nosso capitão! — Este soldado cerrava os dentes enquanto a olhava com desdém.

— Matemos essa mulher, homens! — O outro levantou sua espada ao alto, encorajando seus companheiros, que começaram uma série de xingamentos.

— Venham… — Helena centralizou a espada verticalmente, cerrando suas sobrancelhas. — Aceitarei vossa vingança com todo respeito e dar-vos-ei uma morte dolorosa!

— Sua presunçosa!

Os soldados correram em direção à Helena, mas não tiveram um fim nada agradável. Gritos de dor ressoaram pelos ouvidos de Helena. Sangue saltou para as vestes daquela princesa que encarava aqueles corpos, caindo com uma extrema frieza.

— Mais alguém?!

Helena lançou um grito em direção a alguns dos outros soldados que a observavam de longe.

— Foi o que pensei.  — Helena balançou a cabeça ligeiramente enquanto corria para aqueles destroços que cercavam a muralha mais adiante. Seu coração disparava desesperadamente, suspiros ofegantes eram arremessados ao vento.


                                  (…)

                    Reino de Acácias

Na sala do trono, rainha Sophia andava às voltas naquele chão prateado. Seu semblante era tomado por uma profunda preocupação, enquanto alternava seus olhos entre o chão, a porta e a janela. Algumas das nuvens negras que os seus olhos podiam contemplar no curto momento em que olhava para aquela janela, devoravam as brancas.

Aquilo a preocupava ainda mais, pois ouvira de sua falecida tia que nuvens negras traziam maus presságios.

— Calma, Sophia… — disse a si mesma enquanto pressionava a mão no peito. — Vai dar tudo certo — suspirou profundamente, avançando em direção ao trono. — E mesmo assim, eu não consigo espantar essa ansiedade.

Sophia assentou-se no trono, observando um quadro que ilustrava a família real, pendurado naquela parede branca.

Por longos segundos, Sophia fitava aquele quadro, até as portas da sala do trono se abrirem, atraindo a atenção dos seus olhos para aquela cena.

— Irmã Sophia, dessa vez você passou dos limites!

Seu irmãozinho cerrava os punhos enquanto uma serva tentava segurá-lo com as mãos trêmulas.

— Eu juro, tentei impedi-lo! Mas… — A serva tremia de pavor, olhando para a rainha Sophia assentada em seu trono.

— Desculpa, rainha. — Um dos guardas, ao lado do seu companheiro, encurvou a cabeça.  — Sentimos muito, mas o jovem…

— Poupem-me das vossas explicações — Sophia interrompeu friamente. Os soldados e a serva arregalaram os olhos. — Já não tinha falado antes que precisavam anunciar quem quer que fosse, mesmo que seja família real?

— Perdão, rainha!

Os soldados e a serva aflita sequer ousavam olhar para rainha. Ao passo que seu irmão mais novo, baixinho e de cabelos dourados, a enfrentava com as sobrancelhas cerradas enquanto franzia seus punhos cada vez mais.

— Por quê? Por que mandou Helena para a guerra?!

— Retirem-se — ordenou Sophia. Os soldados e a serva, amedrontados com o tom frio de Sophia, deram meia volta e saíram da sala trono enquanto aqueles dois irmãos se enfrentavam friamente. A porta fechou.

— Diminua o tom quando for se referir à rainha de Acácias. Entendeu, príncipe Henrique?

— Quem se importa?! — Henrique aumentou mais um tom da voz. — Responda à minha pergunta!

— Não vou tolerar essa falta de educação! — Sophia bateu no braço do trono. — A próxima vez…

— Vai me mandar para a prisão?

— Basta, Henrique! — Sophia franziu o cenho, batendo novamente no braço do trono. — Já para o seu quarto! Conversaremos melhor quando estiver bem disposto.

— Por que… — Os traços de Henrique se contorciam cada vez mais, formando uma expressão triste. Seus punhos abriram, ele caiu de joelhos. — Por que tira a Helena de mim? Por que você a envolve em seus planos macabros?

Sophia mordeu seus lábios, estremecendo os punhos no braço do trono enquanto observava o irmão se lamentando no chão. Poucos aos poucos, o chão era preenchido pelas lágrimas daquele jovem sofrido.

— Por quê?!

— Henrique…

Antes que Sophia pudesse terminar sua fala, Henrique levantou-se do chão, dizendo:

— Eu não entendo o que Helena tanto admira em você. Tudo que você sabe fazer é ficar nesse seu maldito trono!

— Henrique… — Sophia mordeu seus lábios.

— Eu te odeio, rainha Sophia!

Sophia ficou boquiaberta com aquela declaração que seu irmão havia feito. Podiam discutir, por vezes, mas nunca havia ouvido antes tais palavras saírem de sua boca.

Os traços de Sophia logo se contorceram em um semblante triste enquanto observava seu irmão lhe dando costas, prosseguindo em direção ao portão. Bateu com força para que lhe abrissem. Os soldados abriram o portão, contemplando aquele jovem em profunda cólera.

-— Me perdoa por ser uma péssima irmã.

Com uma expressão triste, Sophia direcionou os olhos jade para o quadro da família, especificamente para um casal que se abraçava. Seus punhos cerraram.

— Eu só queria que vocês estivessem aqui…

                                (…)


Em contrapartida, Helena, que havia percorrido um longo até as muralhas destroçadas, suspirou ofegante. Ela ergueu o braço para limpar algumas gotas de suor que já começavam a tomar conta de seu rosto.

Logo subiu alguns pedregulhos presentes no chão, atravessando aquele enorme buraco que havia se formado. Ao adentrar na cidade, casas destruídas tomavam conta da sua visão. Seu grupo havia feito um grande estardalhaço naquele ponto.

"Sorte a dos habitantes que foram evacuados das proximidades da muralha"

Helena pensava, continuando a caminhar por aquele chão pavimentado por blocos. Por longos minutos, caminhou até que sentiu cheiro de sangue na próxima rua. Com a espada pronta, passos lentos e cuidadosos, Helena virou para a próxima rua. Seus olhos arregalaram ao contemplar corpos caídos no chão e outros nos telhados. O cheiro de sangue era tão forte que lhe causou náusea. Mesmo sendo guerreira, não era tão fácil se habituar àquilo.

— Eles passaram daqui… — Helena suspirou de alívio ao constatar que a maior parte dos corpos não eram dos seus soldados. Todavia, lamentou pelos que haviam caído, permanecendo ali um minuto em silêncio, em memorial aos seus bravos guerreiros.

Seus traços se contorciam em tristeza, observando seus rostos, estavam calmos. Agora descansavam em paz, livres daquele mundo de guerras. Suspirou pesadamente, continuando sua caminhada por aqueles escombros de corpos.

Sabia que algumas baixas na guerra eram normais, mas não queria ter perdido um sequer companheiro em batalha. Ela desejava uma utopia militar, o que era impossível de acontecer.

Notou ao andar que um pouco de sangue havia se apegado às suas sandálias, pois cada passo que desse, sangue era cravado no chão. Aquele cheiro de sangue perturbava suas narinas. Percebeu que, mesmo tendo ultrapassado aqueles corpos e virado algumas ruas, o cheiro ficava mais intenso.

— Parece que eles tiveram mais outras batalhas.

Com os passos lentos, coração disparado, Helena estava prestes a virar a rua. O sangue havia ficado tão forte, que por pouco não vomitava.

Um pé à frente, outro atrás, os olhos de Helena puderam contemplar inúmeros corpos jogados no chão. Um lago de sangue havia se formado ao redor deles.

Eram corpos dos seus companheiros… Todos, absolutamente todos, estavam mortos. Pôde identificar vários rostos conhecidos, um por um. E mais adiante, numa fonte, cinco pessoas que a observavam. No entanto, o que atraiu sua atenção foi aquilo…

— Não… — As pupilas de Helena dilataram ao contemplar uma mulher de longos cabelos brancos, segurando o ombro do Léo, enquanto tinha a espada cravada em seu abdômen. Os olhos do Léo agora estavam fechados, sangue gotejava pelo chão. — Não… Isso não pode ser verdade…

— Capitã Helena, não é? — A mulher de cabelos brancos lançou seus olhos azuis sobre Helena, que se contorcia em profundo desespero. — Antes de morrer, esse homem pediu-me que lhes transmitisse suas últimas palavras.

Aquelas palavras apenas entram por um ouvido e saíram por outro. Naquele momento, era como se os ouvidos de Helena tivessem parado de funcionar. O cristalino dos seus olhos verdes havia desaparecido. Uma nova tonalidade havia tomado conta dos seus olhos, o verde-escuro intenso.

Veias espreitam o braço que segurava sua espada. Seus lábios cerraram, suas sobrancelhas curvaram, lágrimas desceram dos seus olhos.

Helena ergueu sua espada, correndo abruptamente até àquela mulher, que segurava o corpo do seu precioso amigo.

— MALDITAAAA! — gritou, com a espada a poucos metros de perfurar a pele daquela mulher de cabelos brancos.  — DEVOLVE O LÉOOO!!!



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