Volume 1

Capítulo 21: Juntos para sempre

Um vapor saía pela janela aberta, de onde a luz do sol entrava, clareando aquele cômodo. A panela fervia numa fogueira alimentada por lenhas.

Cantarolando com os passarinhos, que pousavam na janela, estava Maria. Mexendo a cocha na panela para ali e aqui, ela preparava uma sopa.

Sopa e pão eram o alimento diário dos Miorianos, poucas vezes eles cozinhavam carne. Era algo raro, talvez num dia de festa o fizessem, isso quando tinham gados em quantidades.

Por seu solo ser frutífero, eles tinham a sorte de poderem fazer o plantio de alguns legumes ao pé de suas casas, ou ainda, árvores que dessem fruto, desde que os soldados não soubessem.

— Maria… — Ao ouvir a voz do seu irmão, ela virou-se; contemplando-o. Ele havia acabado de acordar, esticava o seu abraço enquanto bocejava.

— Acordou, irmão?

— Sim. — A barriga do Gabriel soltou um leve ronco. — E com fome.

— A sopa está quase pronta. Espere mais um pouco.

— Esse cheiro. Não me diga que... — Gabriel aproximou-se de sua irmã com um sorriso estampado em seu rosto, podendo contemplar a sopa num tom acastanhado.

— Sim, a sua sopa preferida — Maria sorriu.

— Sopa de feijão! — Os olhos de Gabriel se encheram de brilho. — Faz tanto tempo que você não cozinha ela.

— Isso porque é difícil de fazer e é necessário muito tempo, o que eu não tinha.

— Verdade — Gabriel sorriu. — Embora esse tempo seja, provavelmente, o último para mim. — Encurvou seu rosto, entristecido.

— Isso não é verdade — Maria contestou. — Nós ainda teremos muito tempo juntos. Eu não deixarei a guerra te tirar de mim. Não mesmo!

Gabriel sorriu, contemplando o rosto esperançoso de sua irmã.

— Você vai ficar bem sem mim.

— Por que? Por que precisa ser tão dramático?

— Estou sendo realista, Maria. Eu, Miomura, Thomas e muitos outros estamos condenados a perecer nessa guerra.

— Eu tenho orado.

— Lá vem você com isso de novo. Quando as suas orações foram atendidas? Me diz?

— Deus, O Criador, vai me ouvir. Só preciso insistir. Uma vez o papai contou que havia em uma certa cidade um juiz injusto, que não temia a Deus, nem respeitava homem algum.

— E havia uma mulher viúva que ia ter com ele continuamente, pedindo que lhe fizessem justiça — Gabriel continuou.

— E no fim, mesmo o juiz sendo injusto, atendeu e resolveu a causa da mulher — concluiu Maria.

— Sim, eu lembro. Mas aquilo é uma história, e eu até agora não entendo direito o que papai quis dizer com aquilo.

— Que se o juiz, sendo injusto, ouviu a mulher, imagina Deus, que é bom e criou tudo que existe — declarou Maria.

— Eu admiro sua fé, mas dada a situação, parece que Deus tapou os ouvidos diante do clamor do nosso povo.

— Não perca a sua fé, meu irmão. A justiça virá, tarde ou cedo, mas eu sei que virá.

Gabriel suspirou. Maria cria em um Deus invisível, que tudo criou, que foi a ela apresentada pelos seus pais quando ainda vivos, mas agora nos braços do Criador.

Essa crença era a única coisa a que ela se apegava, pois seu povo havia se esquecido Dele.

Depois de algum tempo, ouviram-se batidas na porta. Gabriel, que se encontrava na cozinha com a sua irmã, seguiu à sala onde ficava a porta principal de sua casa.

Ao abrir a porta, Gabriel se deparou com dois soldados. Seus olhos arregalaram, seu queixo caiu.

— Bom dia — cumprimentou Florento com um aceno em frente aos olhos arregalados de Gabriel.

Miomura retirou a máscara.

— Calma, Gabriel.

— Mas você é... — Gabriel levantou seu dedo enquanto tremelicava, buscando palavras para se expressar.  — Miomura!

— Eu não disse que voltaria?

— Seu idiota! — Gabriel cerrou suas sobrancelhas enquanto franzia os punhos.  — Você me roubou noites de preocupações!

Miomura recolocou a máscara.

— Guarde os seus sermões para depois, que tenho algo para te contar. 

Gabriel amenizou o desconforto, no fundo, seu coração havia sido tomado por uma paz, por seu amigo ter cumprido com sua promessa.

A casa estava bem arrumada, apesar de estar em condições precárias. No entanto, Florento e Miomura não deixavam de apreciar aquele cheiro aromático que vinha da cozinha.

— Que cheiro é esse? — indagou Florento, assentando-se em um dos banquinhos. — Confesso que nunca havia sentido algo assim em minha vida.

— Meu amigo, lhe apresento a sopa da Maria — Miomura sorriu.

— Quero provar! — Florento estava ansioso. — Posso?

— Espera. Espera — disse Gabriel — Eu preciso saber de tudo. Quem é ele? — Olhou para o Florento e rodeou seus corpos. — E por que estão com essas vestes?!

— Eu sou o Florento e estamos aqui para te recrutar. Agora posso provar a sopa? — respondeu Florento apressadamente.

— Recrutar?

— Foi o que ele disse — afirmou Miomura. — Estamos aqui para te recrutar para o treinamento que ocorrerá em Aclasia.

— O que?!

— Irmão, quem é? — indagou Maria, se aproximando da sala de estar. Quando entrou, avistou dois soldados, um deles era o Miomura. Seus olhos arregalaram, o espanto tomou conta de si. — Miomura?

Os olhos de Florento, assim como os de Miomura foram direcionados para àquela linda mulher que estava diante deles.

— Então essa é a deusa que preparava aquele manjar? — questionou Florento, olhando de baixo para cima àquela mulher em seu vestido castanho, com os seus longos cabelos negros, balançando de um lado para o outro.

Hã? — Maria arregalou os olhos, confusa. — Alguém me explica o que está acontecendo aqui.

— Sente-se, Maria, que eu irei explicar tudo — disse Miomura, seguido de Florento. — Por favor, deixe-me provar da sua sopa.

Maria ficou com medo do Florento, assentando-se ao lado do seu irmão, enquanto o olhava com desdém.

Outra batida tomou conta da porta, dessa vez Maria foi atender enquanto os olhos do Florento a seguiam. O que irritava Gabriel, de certa forma.

, Miomura, diz para esse rapaz manter os olhos longe da minha irmã — alertou Gabriel.

Miomura não sabia o que dizer, permanecendo quieto.

— Fique tranquilo, jovem — Florento sorriu. — Eu só tenho interesse na sopa que ela fez — assegurou-o.

Ao passo que Maria abria a porta, dando de cara com a Yara, que parecia estar afligida por algo.

Ah! Maria, que bom que te vejo! — falou, respirando profundamente. — Eu preciso falar com o Gabriel imediatamente!

— O que se passa?

— Eu preciso de água primeiro.

— Vamos, entre — respondeu Maria. Yara estava ao ponto de desmaiar. Maria segurou-a e fechou a porta com os pés. Os olhos de Miomura voltaram-se à porta, podendo contemplar sua irmã, que estava tão abatida que lhe custava olhar para frente.

— Yara! — Miomura bradou. Yara levantou seus olhos arregalados. Naquele instante, Yara magicamente recuperou-se e saltou para os braços do seu irmão.

— Irmão!

Yara apertou fortemente seu irmão, sufocando-o com os seus braços.

— Eu fiquei preocupada, mas você voltou! — sorriu, lágrimas caiam do seu rosto. — Você voltou!

— Eu promete, não promete?

— Nunca mais volte a se afastar de mim!

Ah, nunca.

Florento sorriu ao presenciar tal encontro, assim como Gabriel e Maria.

— Não entendi nada. Mas tudo está bem quando acaba bem, não é mesmo? — Maria sorriu.

— Não, ainda falta a sopa — disse Florento. — Para tudo acabar bem.

Yara desfez o abraço caloroso que havia dado ao seu irmão e começou a vaguear o seu olhar sobre ele, certamente estava diferente.

— Impressão minha ou você realmente tomou banho? — Yara riu.

— Yara! — Miomura ficou constrangido, tão avermelhado quanto um tomate. Maria riu, assim como os demais.

— Caramba, Miomura. Desse jeito, acho que é melhor viver em Aclasia — Florento escarneceu. Miomura lançou um olhar franzido.

Depois daquele encontro emocionante, Miomura e Yara sentaram-se junto à mesa. Maria foi à cozinha preparar os pratos para servir a sopa aos visitantes.

— Muito bem, agora quero que me conte tudo!

Enquanto Gabriel permanecia impaciente para saber de tudo que teria acontecido com o Miomura, Florento aguardava ansiosamente a sopa.

— Eu também quero saber! — Yara sorriu, olhando para seu irmão ao lado. — Ainda acho inacreditável. Você voltou mesmo!

Miomura sorriu, presunçoso.

— Eu sempre cumpro o que digo! — E olhou para Gabriel. — Bom, depois daquilo, eu… — Miomura foi contando tudo quanto havia acontecido em Aclasia, detalhe por detalhe. O seu primeiro encontro com o Florento e como o seu passado o teria salvo da espada afiada que o capitão Melquiore havia preparado para ele. Claro que a Nádia é que teve mais peso na decisão do Melquiore em poupar a sua vida, já que ela havia suplicado bastante e aplanado o ânimo do mesmo.

— Céus… — Yara ficou boquiaberta, diante de tudo o que ouvira da boca do seu irmão.

— Você teve bastante sorte — declarou Gabriel. — Muita sorte mesmo. — E apontou seu dedo a ele, com o cenho franzido. — Já considerou se a sorte acabar? Hã?

— Foi o que eu disse para ele. — Florento acenou com a cabeça três vezes.

— Dessa vez, eu não permitirei que ele se meta em mais nada perigoso — assegurou Yara.

— Tarde demais — disse Miomura. Ao passo que, neste momento, Maria chegava com os pratos à mesa, acionando o paladar gustativo de Florento. Seus olhos brilharam, finalmente provaria algo novo depois de muito tempo.

Oh! Não demore tanto, minha deusa! — Florento sorriu para Maria, enquanto ela terminava de pousar os pratos sobre a mesa, mas sorte era a dele que Gabriel não estava atento as suas palavras. Entretanto, Maria não gostava nada daquele olhar sobre ela.

— Como assim? — indagaram Gabriel e Yara. Aquelas palavras anteriormente proferidas por Miomura enunciavam mais perigo.

— Não me diga que você vai cometer uma loucura novamente! — Gabriel bateu o seu punho sobre a mesa. Apesar de calmo, o irritava saber que seu amigo falava disso calmamente, como se ele fosse um gato de sete vidas.

— Irmão, eu não vou permitir! Que se sacrifique.

— Não. Não. — Miomura balançou a cabeça em negação enquanto lançava um leve sorriso sobre eles. — Não é nada disso. Que ideia a vossa!

Florento rodeava o dedo no prato, sua donzela da sopa estava demorando bastante para chegar.

— É o que então? — indagou Gabriel, seguido de Yara, que olhava para o Florento com estranheza. — Pensando bem, o que ele faz aqui contigo mesmo? O rapaz…

Florento ergueu a cabeça, parando de rodear o prato. Maria havia finalmente chegado com uma panela feita de barro que deixava escapar um pouco de fumaça.

— Finalmente! — sorriu. Maria pousou a panela de barro sobre a mesa.

— Bom, foi como eu disse quando cheguei. Viemos para recrutá-lo para o treinamento que ocorrerá em Aclasia. O capitão Melquiore em sua dita benevolência — Miomura levantou dois dedos de cada uma de suas mãos e encurvou-os —, ordenou a mim e ao Florento que escolhêssemos nove pessoas do nosso povo para ele nos treinar.

— O que? — O queixo de Yara desceu em espanto. Gabriel ficou boquiaberto: — E isso é possível? Não acredito!

— Do que estão falando? — Maria encostou suas duas mãos a sua cintura.

— Por favor, faltam os talheres — disse Florento.

Hã?! — Maria questionou, pousando os seus olhos sobre o impaciente Florento. — O que é isso?

Apesar dos Miorianos e os Aclasianos falarem a mesma língua, o vocabulário dos Miorianos não era tão avançado assim. Eles só sabiam o básico para se comunicar, não precisavam de tamanha profundidade.

E para Maria, a palavra "talheres" era estranha demais.

— Os talheres… — Florento gesticulou as mãos aos pratos, Maria logo percebeu e sorriu: — Ah, colheres?

— Isso! Isso!

Ah, Maria, estamos falando sobre o recrutamento do seu irmão ao exército — disse Miomura, pousando seus olhos verdes sobre Maria.

— Ei, espere um pouco aí — disse Yara, roubando a atenção do seu irmão. — Explica isso direito. Recrutamento?

— Eu não estou entendendo mais nada — disse Gabriel, suspirando profundamente. — Eles vêm ao nosso vilarejo, fazem e desfazem e agora querem nos recrutar para a guerra?

— Não é bem assim — disse Florento, direcionando seus olhos castanhos ao Gabriel. — O capitão Melquiore, ele é diferente do seu irmão que é pura maldade. Por incrível que pareça, vocês tiveram bastante sorte do capitão Melquiore oferecer essa chance de pelo menos nove pessoas treinarem com ele.

— É, ele tem razão — afirmou Yara. — E creio que o rei não saiba disso, certo?

— Correto. O capitão Melquiore está arriscando seu pescoço, então não desperdicem essa oportunidade valiosa.

— Não acho uma boa ideia — entrometeu-se Maria. — Isso é muito arriscado. Pode dar um problema grande.

— Sim, minha irmã tem razão — concordou Gabriel. — Apesar de tentadora a oferta, é estranha demais.

— E sem contar que eles podem ser reconhecidos — concluiu Yara.

— Não se preocupem, o capitão pensou em tudo. Basta que se mantenha sigilo, o plano correrá bem — assegurou Florento. No entanto, suas palavras ainda incomodavam Maria. Algo não estava certo. Por que um capitão está disposto a ajudar os escravos que tem tratado com tanto desprezo?

— Ei, qual é a finalidade disso tudo? — Indagou Gabriel, uma pergunta semelhante a que sua irmã Maria pretendia fazer. — Por que esse capitão quer tanto nos ajudar?

Certamente, Miomura colocou-se em dúvida diante de tal questionamento. Yara também começou a refletir sobre isso e não via muito sentido.

— É algo que só o capitão sabe. Mas saibam que assim como eu, o capitão não quer que o seu povo pereça — disse Florento.

— É isso, pessoal. É uma oportunidade de ouro! — declarou Miomura com ânimo.

Certamente que sim, era uma oportunidade valiosa e não haveria mais caso se recusassem a aceitar. Gabriel finalmente convenceu-se e aceitou se juntar ao Miomura nos nove que iriam treinar em Aclasia, apesar da relutância de sua irmã, que com o passar do tempo acabou aceitando.

Yara facilmente concordou em deixar seu irmão ir junto do Gabriel.

Finalmente, depois de tudo resolvido, eles começaram a tomar a sopa que se esfriava lentamente. Florento, o que mais ansiava e aguardava aquele momento, lançou inúmeros elogios que deixaram Maria constrangida. Gabriel olhava Florento feio. Miomura e Yara riram-se ao contemplar seu semblante tomado por grande ciúme.

, ! A sopa estava estupenda! — Florento pousou o prato quase que limpo na mesa. — Nunca havia provado algo assim. — Seus lábios estavam oleosos.

— Fico feliz que tenha gostado — Maria sorriu, ainda com a sopa sobre o seu prato. Florento havia sido o primeiro a dar cabo da sopa antes de todo mundo, só não podia pedir mais porque havia acabado.

— É uma pena ter acabado — lamentou, passando a mão sobre os seus lábios oleosos. Miomura e os demais ainda tomavam sua sopa, tranquilos. Colher por colher, o que deixava Florento irritado em não poder saborear mais daquela deliciosa sopa.

— Toma — Maria puxou seu prato até o Florento. — Vejo que quer mais.

— Maria! — repreendeu Gabriel de cenho franzido, enquanto olhava para sua irmã toda gentil para com o Florento.

— É sério?! — Florento desceu seu queixo alguns centímetros a baixo, elevando suas sobrancelhas. — Mas e você…

— Finalmente acabei! — Miomura levantou os braços ao alto, arrotando. — Perdão.

— E os modos, Miomura? — questionou Yara, estreitando os olhos.

— Você nunca comeu algo assim, né? Então eu não me importo de te dar.

— Não. Não. — Florento puxou o prato de volta enquanto Gabriel murmurava ao vento. — Coma você, gentil menina.

Maria sorriu e tomou o prato de sopa para ela, voltando a degustá-la.

— Quanta modéstia — Miomura riu.

— Eu sou um cavalheiro — Florento sorriu.

Ao passo que o Gabriel ficava cada vez mais irritado com o Florento, enquanto tomava a sua sopa muito rápido. Graças a ele, sua porção de sopa havia sido reduzida. Seu amigo e sua irmã agora davam mais atenção a ele. Ele claramente estava enciumado.

— Yara, você deveria aprender a fazer esse tipo de sopa, sabia? — disse Miomura.

— No dia em que eu tiver interesse, quem sabe?

— Eu posso te ensinar, Yara — Maria sorriu. — É muito fácil!

— Se ela não quer, eu quero!

Gabriel partiu a colher de madeira ao contemplar aquele sorriso maroto patente no rosto de Florento.

Maria lançou um sorriso torto ao Florento. Yara riu junto do seu irmão. Gabriel levantou-se, com o seu prato, e dirigiu-se à cozinha com a cabeça encurvada ao chão.

— Ele tem problema — afirmou Florento.

— O meu irmão normalmente não é assim — disse Maria. — Não sei o que deu nele hoje. Normalmente, ele é sempre receptivo e gentil.

— É isso. Não se incomode, Florento. Gabriel deve estar todo confuso com toda essa informação.

Yara riu, reunindo os olhares dos demais sobre ela.

— É sério que vocês ainda não entenderam?

— O que???

— Gabriel está com ciúmes. — Yara trouxe atona os sentimentos que habitavam nas profundezas do coração do Gabriel. Seus amigos caíram em perplexo espanto ao ouvir isso.

— Sério? — indagou Maria, seguido de Miomura: — Se é pela Maria, nada a ver!

— Acho que é porque eu estou me dando bem com vocês dois — conclui Florento e Yara assentiu com a cabeça duas vezes: — Isso. Isso.

— Mas que ideia a dele. Não se preocupe, eu falo com ele. — Maria levantou-se do banquinho, todavia, Miomura esticou o seu braço, dizendo: — Não, deixa estar. Eu falo com ele.

— Você faria isso?

— Eu me entendo muito bem com aquele cabeça dura. Vou até lá. — Miomura levantou-se e foi ter com Gabriel a cozinha.

Ao passo que os demais que haviam ficado na sala, começaram a colocar a conversa em dia, falando sobre a cidade Aclasia. Como grande conhecedor, Florento as deixava espantadas com os ricos detalhes que ele contava sobre a cidade de Aclasia e o seu palácio.

— Incômodo? — indagou Miomura as portas da cozinha. Gabriel estava de costas na janela, apreciando as nuvens que passeavam pelo céu.

— Sim.

— Hum, sei.

— Por que você faz sempre o que dá na sua cabeça? É sério, eu já não te reconheço mais! — Gabriel voltou seu rosto ao Miomura. — O que aconteceu com aquele meu amigo?

— Eu continuo aqui, meu amigo.

— Não. Não. — Gabriel balançou a cabeça negativamente. — Infelizmente, não.

— Eu admito que tenho feito muitas coisas loucas, como afrontar os capitães e entrar na cidade e eu sinto muito por isso.

— Depois do burro morto é que se arrepende, não é? Seu idiota.

— Foi necessário.

— Você quase morreu e isso foi necessário? — Gabriel riu, colocando a mão sobre sua testa, decepcionado com seu amigo. — Ah, por favor…

— Eles nos condenaram à morte por guerra. E quando eu ouvi os capitães rindo do nosso sofrimento, me lembrei de tudo o que passamos, das chicotadas e, na dor, soltei tudo o que estava no coração — seu semblante foi ficando cada vez mais entristecido. — E saber que a vida de muitos conhecidos meus estava em perigo, me fez agir por impulso e acabei esquecendo da minha vida…

— E quem falou que você deveria virar o herói da história, hã? — Gabriel aproximou-se com um leve sorriso. — Nós somos amigos, entendeu? — Colocou a mão sobre o ombro dele. — Sua vida pode não significar nada para você, mas para nós ela é muito valiosa.

Miomura sorriu e deu um abraço em seu amigo.

— Juntos… para sempre?

— Na morte e na vida, juntos para sempre.



Comentários