O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 3

Capítulo 159: Acrópolis

Sariel almoçava em uma estalagem em uma pequena vila a caminho de Acrópolis.

No momento estava sozinho. O grupo havia decidido que seria melhor se ele fosse na frente sozinho, e Raymond e Shiina chegariam alguns dias depois.

Quanto a Aegreon e Luna, estavam se dirigindo para outro lugar, longe de Acrópolis, já que seria estupidez trazer um Anjo e um Pilar para um dos lugares mais bem protegidos do Conselho em uma missão de infiltração.

Sariel terminou de comer, pagou sua refeição e saiu.

Já estava relativamente perto de Acrópolis, portanto havia cada vez mais vilas conforme avançava.

As casas eram feitas de madeira, mas algumas já eram construídas em pedra, como era o padrão de Acrópolis.

Voltou o olhar para a estrada. Ainda não era possível ver seu destino, mas tinha alguma ideia do que esperar.

— Bem... Hora de prosseguir. — Como estava sem cavalo, visto que seu atual chamava muito atenção, continuou seu trajeto a pé.

 

***

 

No dia seguinte, por volta da mesma hora, Sariel prosseguia.

Naquele ponto não havia mais vilarejos, pois as construções continuavam para além da vista, demonstrando que já havia entrado na metrópole de Acrópolis.

Por falar nisso, seu objetivo estava levemente distante, mas visível.

Sariel já sabia, de certa forma, como aquele reino se parecia, porém nada do que ouviu — ou viu por livros — se comparava com a visão magnifica refletida nas írises prateadas de seus olhos.

No nível do chão, prédios monocromáticos se erguiam com algumas luzes para iluminar as ruas.

E o motivo de precisarem de iluminação, mesmo de dia, estava acima dos prédios, flutuando magicamente no ar.

Um enorme pedaço de terra pairava imóvel no ar, como uma grande ilha flutuante.

Em cima estava localizado todas as instalações e prédios de pesquisas, todas construídas em mármore e iluminadas por espelhos cuidadosamente posicionados pra refletir a luz do sol, e da lua durante a noite.

Torres tão altas erguiam-se até os céus e perfuravam as nuvens, sendo impossível ver o topo.

Havia uma nascente em um morro, cujo rio se dividia em quatro e suas águas caiam na parte inferior do reino, formando grandes cachoeiras que estavam sempre acompanhadas de belos arco-íris, mesmo durante a noite.

Como se não bastasse, na parte inferior da ilha flutuante, também havia prédios e torres que, ao invés de se erguerem para cima, erguiam-se para baixo, na direção do solo e de ponta-cabeça.

Uma visão digna de contos de fadas, algo que ninguém jamais esperaria ver no mundo real.

Era quase como encarar para a superfície de um lago, onde a parte superior do reino sendo espelhada para a parte inferior, que era a exata imagem invertida.

Isso era possível, pois havia um enorme deposito natural de pedras de Alteração no subsolo que, ainda por cima, era extremamente puro.

Devido a capacidade do elemento Alteração de levitar objetos, a grande concentração das pedras fez o solo desprender do chão e flutuar quilômetros de metros acima do chão, criando essa bela visão.

O fato de que aquilo era um fenômeno natural tornava tudo ainda mais especial, e até os dias atuais alguns pedaços de terra soltavam-se do chão e flutuavam, criando novas ilhas menores.

Sariel estava totalmente imóvel, no meio do caminho e atrapalhando o fluxo, enquanto encarava perplexo a visão magnífica diante de si.

Mesmo tendo conhecido Yggdrasil, que era uma visão igualmente magnífica, ter sua visão abençoada daquela maneira era uma experiencia única, algo que nunca teria novamente em sua vida.

— Incrível... — murmurou como se estivesse sem ar.

Algumas pessoas caminhavam ao redor de Sariel e o encaravam com breve irritação por um breve momento, porém esse olhar logo desaparecia ao notarem o quão maravilhado ele parecia.

— Um estrangeiro... Sempre reagem dessa maneira — comentou um idoso de maneira indiferente.

— Sinto inveja deles... desde que nasci vejo a mesma imagem todos os dias... queria saber como é ver isso pela primeira vez — lamentou uma jovem mulher.

Sariel teria permanecido assim por mais tempo, porém as pessoas trombando com ele acabaram despertando-o.

“Bem, acho que posso aproveitar a vista em movimento.” Começou a caminhar lentamente, buscando prolongar o máximo possível o sentimento de visitar aquele reino pela primeira vez.

 

***

 

Sariel agora caminhava pelas movimentadas ruas dos subúrbios de Acrópolis, a parte que permanecia no chão.

Diferente da ilha flutuante, os subúrbios eram como o exato oposto, a perfeita antítese.

O lugar era caótico, havia muitas pessoas transitando, oferecendo panfletos e chamando por clientes na entrada de estabelecimentos.

Lixo e moradores de rua eram uma visão comum, e só não havia crime devido a sempre presente Vigília, que patrulhava constantemente os subúrbios.

“Eu sabia sobre a segregação deste reino, mas isso...” Sariel olhou para cima. “É maior do que esperava.”

O viajante encarou a parte superior. A natureza convivia com o desenvolvimento humano, com plantas e árvores crescendo nos prédios invertidos, que eram brancos e limpos, passando uma impressão de pureza.

“É como o dia e a noite...” Voltou seu olhar para o subúrbio e continuou seu caminho.

O trajeto demorou mais do que esperava, já que havia muitas pessoas em seu caminho, porém quanto mais perto chegava, mais limpo e organizadas se tornavam as ruas, além do fluxo de pessoas reduzir.

As casas e construções também se tornaram mais sofisticadas, não restava dúvidas que chegara à área nobre, bem no centro do reino.

Após vintes minutos, alcançou seu destino: a Escola Preparatória de Acrópolis, uma das poucas construções feita em mármore do subúrbio.

Havia outras escolas em outros lugares, mas aquela era feita especialmente para indivíduos com potencial que desejavam se tornar pesquisadores e alunos da Universidade de Acrópolis e dedicar suas vidas para buscar melhorar o futuro da humanidade.

Uma larga escadaria levava até uma construção sustentada por inúmeros pilares de mármore, decorados por um belo trabalho em pedra de humanos pisando sobre o cadáver de Anjos e erguendo suas espadas, comemorando seu triunfo.

Ali era muitas vezes mais agradável, e até parecia fora do lugar considerando o caos dos subúrbios.

Era cerca de duas horas, mesmo assim havia várias pessoas das mais diferentes idades entrando e saindo da escola.

A grande maioria vestia túnicas pretas, estes eram os alunos, mas era possível encontrar alguns com túnicas marrons, os professores.

“Bem... é hora de colocar o plano em prática...” Sariel começou a subir as escadas, enquanto recebia alguns olhares julgadores.

Na entrada, percebeu uma placa que dizia “recepção” e a seguiu, um caminho que, ao julgar pelo menor fluxo de alunos, era distante das salas de aula.

Ao entrar, encontrou-se na recepção, uma sala que era bem grande considerando seu propósito, mas que fazia sentido já que pessoas do mundo tinham de passar por ali para se inscreverem para as provas de admissão.

Havia uma fila, e as pessoas vestiam-se da maneira mais arrumada e limpa possível para causarem uma boa impressão aos professores, mesmo antes de ingressarem e receberem sua túnica de estudante.

Sariel, como esteve na estrada por um tempo, recebeu alguns olhares julgadores.

— Perdão, aqui é o fim da fila? — perguntou a um homem jovem, que o encarou de uma maneira bem mal-educada.

— Como ousa dirigir palavra a mim vestindo trapos? Esse é um lugar sério. Sabes quem sou? — disse de uma maneira tão enraivecida como se Sariel o tivesse insultado.

— Ah, cheguei hoje aqui, portanto não tive tempo de...

— Não me interessa. Desculpe-se agora mesmo!

O homem parecia disposto a brigar com Sariel ali mesmo pelo crime de ter falado com ele.

— Chega, este rapaz apenas fez uma pergunta. — Um soldado da Vigília, vestindo armadura prateada, se aproximou e tentou acalmar a situação.

— O que?! Mas ele...

— Já disse chega.

O tom irredutível e assustador do Vigilante o fez se calar e virar o rosto com uma expressão descontente.

— Sinto muito, foi apenas um mal-entendido — disse Sariel.

— Não se preocupe, veio fazer a prova de admissão?

O viajante concordou com um aceno.

— Certo, espere nessa fila para ser atendido e siga as instruções que lhe passarem.

— Entendido, obrigado.

O Vigilante se afastou e Sariel aguardou na fila.

Como havia muitas pessoas na fila — demonstrando o quão famoso era aquele lugar —, foi preciso aguardar por quase vinte minutos até que fosse atendido.

— Boa tarde, como posso ajudá-lo? — perguntou a recepcionista, uma mulher por volta dos quarenta com um óculos quadrado e aparência séria.

— Gostaria de fazer a prova para ingressar na Universidade de Acrópolis.

— Perdão? — A mulher, que até agora havia atendido todos os estudantes de maneira neutra, não acreditou no que acabara de ouvir. — Senhor, tens ideia do quão difícil é apenas o teste para ingressar na Escola Preparatória de Acrópolis? E diz que deseja ingressar direto na universidade.

— Por acaso isso não é possível?

A mulher o encarou duramente por um longo momento, pensando que aquele homem diante de si estava se superestimando demais.

“Ah... mais um desses arrogantes... Bem, logo logo ele será posto em seu lugar.” Pegou algumas folhas de papel, além de uma caneta, e entregou ao viajante. — Preencha seus dados na sala à direita e, quando finalizado, entregue à recepcionista.

— Certo, obrigado. — Sariel se afastou com vários olhares acompanhando-o e fazendo chacota de sua decisão.

Atravessou uma abertura para uma outra sala, sentou-se no chão por estar lotado demais, e começou a ler o documento.

Logo na primeira parte, o nome, pensou por um bom momento o que faria.

“Devo usar informações falsas, ou meu nome real?”

Se usasse seu nome real, seria um grave problema para se manter escondido dos olhares do Conselho. Mesmo que nada de errado acontecesse e não fosse descoberto, o simples fato de que ingressaria na universidade e a deixaria sem deixar rastros em poucos dias já era motivação o suficiente para que investigassem seu passado.

Por outro lado, se a Universidade de Acrópolis possuísse alguma maneira de confirmar sua identidade rapidamente, então usar um nome falso levaria ao fracasso da missão antes mesmo de começar.

— Bem, há apenas um jeito... — Sariel começou a preencher seu nome como “Dante Leonhardt” do reino de Eribur, e o endereço, um orfanato chamado “Duas Irmãs”. — Sinto muito por ter de trazer dor de cabeça a vocês...

Com o problema principal resolvido, preencheu o formulário, pegou outra fila demorada, e o entregou para outra recepcionista.

— Obrigada, neste documento está as informações de sua sala e horário de início da prova. — Ela entregou outro papel. — Siga o corredor à esquerda e procure por sua sala.

Sariel aceitou o documento, agradeceu a recepcionista, e seguiu por um largo corredor.

Antes que pudesse se distanciar muito, porém, o homem que o insultou apareceu novamente diante dele.

— Hm, plebeu... Acha mesmo que vai passar o teste para entrar na universidade? Sem estudo prévio? Nem mesmo eu seria capaz disso.

O viajante apenas o lançou um breve olhar e concluiu que não valia a pena perder tempo com aquele indivíduo.

Tentou passar ao lado dele, mas ele se colocou em seu caminho.

— Escuta aqui seu pulha... Tens sorte que não posso fazer nada aqui contigo. — Sua expressão estava claramente irritada. — Mas minha família é poderosa, vou descobrir quem és e acabar com quem ama, a menos que se ajoelhe, peça perdão e beije meus pés.

Sariel, mais uma vez, desviou dele para seguir seu caminho.

— Seu! — O homem tentou agarrá-lo pelo pulso, porém o viajante desviou sem nem olhar. — Quê?! Desgraçado! — Tentou outras vezes, mas apenas resultou em falha.

O viajante se afastou, enquanto uma voz irritada continuava a disparar ofensas contra sua pessoa, enquanto os outros alunos riam daquela cena, deixando seu “agressor” ainda mais enfurecido.

Felizmente não teve mais problemas e chegou na sua sala que, por sinal, era o primeiro cômodo desde que entrara que havia uma porta.

Era um local grande, com longas mesas e bancos de mármore acolchoados, cada um enumerado e com um par de canetas, lápis e borracha.

Sentou-se em seu lugar e foi imediatamente encarado, o que fazia sentido, afinal, ele era o único que não vestia a túnica preta dos alunos.

Estava mais que claro que todos pensavam o mesmo: que estava se superestimando e sendo arrogante ao tentar ingressar na universidade antes mesmo de estudar na escola preparatória.

“Ainda bem que há provas de admissão todos os dias... Esse lugar realmente é cobiçado.” Passou os olhos brevemente por cada um dos alunos, tentando encontrar qualquer pessoa que pudesse valer a pena memorizar.

— Vai tentar entrar direto na universidade? É corajoso — cochichou um jovem próximo da idade do viajante, com cabelos negros e curtos, e olhos castanhos. — De onde você é?

— Eribur.

— Ah, entendo, vens de um reino próspero e avançado. — Ao contrário de todas as outras pessoas ali, ele foi o primeiro que não julgou Sariel. — Chamo-me Felix Paulus. Sou de Acropólis, mas vim de uma família humilde, assim como você.

— Prazer, sou Dante Leonhardt, órfão.

— Por acaso é sua primeira vez aqui? Está sozinho?

— Sim, deixei meu reino sozinho em busca de me tornar um pesquisador, cheguei hoje.

— Uau... Realmente és muito corajoso... — Felix estava genuinamente interessado e impressionado. — Não sei se eu conseguiria deixar minha casa, amigos e família como você... és determinado.

— Fico feliz que me vês desta maneira, és muito gentil. — Sariel esboçou um pequeno sorriso, retribuindo a cordialidade de Felix.

Ambos trocaram mais algumas palavras depois, mas eventualmente se silenciaram ao notar que a hora do início da prova estava perto.

Passados alguns minutos, as portas se fecharam automaticamente, não antes de alguns atrasados se espremerem para conseguir entrar.

Um professor, dessa vez vestindo uma túnica castanho-claro, caminhou lentamente até sua mesa.

A sala já estava silenciosa antes, mas agora o menor barulho ecoaria de tão quieto que se tornou.

— Bem-vindos à prova de admissão para a Universidade de Acropólis, ficarei encarregado de vocês hoje. — Lançou um olhar duro a todos. — Começarei explicando as regras.


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