O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 3

Capítulo 136: Espaço Branco

As cinco bruxas estavam reunidas ao redor de um grande pedaço de gelo, com Luna ainda presa no interior.

Graças à princesa, os planos das irmãs foram adiados, já que tiveram de ser retiradas de dentro do bloco congelado pelos outros devotos.

Já fazia várias horas desde que se soltaram, mas a princesa permanecia intocada.

No momento, as irmãs, com ajuda da Seita, tentavam atravessar a grossa camada congelada e alcançar Luna, mas era quase tão resistente quanto um escudo feito de Proteção.

Mokosh golpeou o bloco com seus galhos, arrancando apenas uma lasca.

— Que merda! Essa porra é um caralho de quebrar!

— Relaaaxe, irmã. Nós temos tempo...

— Não exatamente — retrucou Sonya. — O Pilar da Conjuração estava presente, ele provavelmente chamará o Conselho. Precisamos tirar ela daí e sacrificá-la o quanto antes. E ainda tem o Volátil.

— O Volátil... morrerá... — Devana se aproximou e tocou o bloco que, apesar de resistente, tinha apenas alguns centímetros de espessura. — E mesmo se viver... Não vai recuperar sua magia a tempo...

— Mesmo assim, não podemos nos descuidar.

— Relaxa, mana! — Radica, enquanto esfregava suas mãos e encarava Luna, se aproximou de Sonya. — Em no máximo dois dias, conseguiremos quebrar esse gelo, então vamos entregar a alma do Anjo à nossa mestra! Nós seremos a primeira Seita dentre os sete Deuses da Escuridão a conseguir isso!

— Verdade... Mal posso esperar para... comê-la... — Devana encarou com cobiça a princesa, que estava com os olhos fechados, quase como uma fada adormecida em um invólucro mágico.

Nesse ponto, todas as irmãs compartilhavam essa vontade de consumir cada pedaço daquele ser inocente e ignorante do perigo que corria.

Pele, sangue, ossos, carne, órgãos... Nada seria poupado, nem mesmo sua alma.

— O sangue dela deve fazer tão bem para pele... Vou lavar meu rosto todas as manhãs! Vou virar uma diva! — Radica colou seu rosto no gelo, encarando aquele rosto tão belo quanto uma Deusa.

— Quero os cabelos... — Devana disse assim que percebeu que decidiriam agora como dividiriam as partes da princesa. — Cabelos brancos de Anjo...

— Os órgãos são meus então! E nem por um caralho pense em pegar os olhos dela escondidos dessa vez, Sonya! — Mokosh encarou a irmã, que estava sentada em um tronco retorcido.

— Queeê?... Mas os olhos são tão suculentos e satisfatórios de morder... É tão bom quando estouram dentro da boca...

— Sem essa! Já falei que são meus!

— Que chaaato... Então vou ficar com a pele dela. Vou fazer uma roupa maravilhosa.

— Os ossos são meus então. — Sonya esboçou um sorriso com dentes amarelos e podres. — Vão fazer parte da minha coleção. Hehe.

 

***

 

Eu me encontrei em um lugar totalmente branco, sem formas ou profundidade.

A última coisa que vi antes de perder a consciência foi as bruxas congelando junto comigo, minha tentativa desesperada de conseguir algum tempo para Sariel.

Será que consegui? Será que Sariel está vivo? E quanto aos outros?

Quanto tempo se passou? Era difícil dizer.

Estava deitada naquele chão branco infinito. Tentei andar à procura de alguma coisa, mas era tudo igual.

Olhar ao redor era estranho. Como tudo era do exato mesmo tom de branco, não era possível distinguir formas, profundidade, altura ou largura. Quase sentia vertigem.

— Quanto tempo mais vou ficar aqui? Será que isso aconteceu porque me congelei?

Ergui minha mão direita na altura do meu rosto e fiquei observando-a, como se fosse a primeira vez que percebi sua existência.

Encarei minha palma por muito tempo, quando por fim me cansei e a virei para olhar o outro lado.

Era a única coisa que podia fazer para evitar pensar no que poderia estar acontecendo lá fora...

Enquanto observava minha mão, a imagem de Sariel surgiu em minha mente contra minha vontade.

— As mãos deles não são tão grandes, mas ainda assim são bem maiores que a minha...

Lembrei-me do momento que peguei sua mão antes... O calor dela ainda estava marcado em mim.

— Se eu pudesse... pegá-la novamente... Se pudéssemos...

Não importava o quanto eu tentasse evitar pensar nisso, a imagem dele caído no chão me assombrava.

— Por favor... Kura... Deixe Sariel viver...

Por algum motivo, minha visão se tornou embaçada, até que percebi meu rosto molhado.

Estava chorando de novo...

— Por acaso é só isso que consigo fazer? Chorar?

Usei minha mão para tapar meu rosto... Estava envergonhada por ser tão impotente...

— Ele me salvou tantas vezes, e não fui capaz de salvá-lo uma única vez...

Não sei por quanto tempo chorei. Não sei se foram apenas alguns minutos, ou dias, mas, eventualmente, as lágrimas cessaram.

Não queria abrir meus olhos de novo, contudo senti algo estranho e decidi abri-los.

“O que?” Tentei dizer, mas não ouvi os sons de minhas próprias palavras.

Estava em algum tipo de floresta boreal, em algum lugar que nunca vi.

Havia muita neblina, e pude notar que ela não era natural, possuía traços de Ilusão.

“Espera um pouco, essa visão... É do ar?”

Enfim percebi que estava voando. Não podia olhar para trás, eu não tinha controle naquela visão, mas pude sentir um movimento estranho nas minhas costas, talvez sejam... minhas asas?

Logo diante de mim, havia uma enorme área com uma neblina tão densa que parecia quase física.

— Vamos... Onde está o sinal? — disse minha voz contra minha vontade. Pude perceber que estava nervosa, pronta para batalha.

Permaneci no céu por algum tempo quando, por fim, a neblina mais densa começou a se desfazer.

— “Agora!” — Uma voz masculina soou dentro da minha mente.

Sem pestanejar, voei com toda a velocidade na área diante de mim.

Ainda havia um pouco de neblina, mas, quando adentrei o local, pude perceber o motivo daquela Ilusão.

Havia uma enorme Seita, do tamanho de um pequeno reino, com milhares de devotos e o maior portal que já vi em minha vida.

Um grande anel negro estava no chão, com várias pedras de Conjuração acesas ao redor, e o segundo anel já flutuava no céu.

Não sabia dizer seu tamanho exatamente, mas o diâmetro deveria ser próximo de cem metros.

— Ainda não foi aberto... Graças à Kura. — Minha voz demonstrou algum alívio.

Pude perceber que estava acontecendo alguma comoção próximo do portal.

— Ali! — Como um raio, voei até onde havia dois homens, um vestindo o manto negro comum das Seitas, e outro vestindo farrapos.

Os outros devotos tentavam matá-los, mas cheguei a tempo de afastá-los e protegê-los.

— Vocês estão bem?

— Sim, obrigado. — O homem vestindo farrapos me agradeceu.

— Melhor agora. — O outro esboçou um sorriso um tanto quanto bobo, mas adorável.

— Agora não é hora para isso. — Pude perceber um claro afeto em minha voz.

O devoto abaixou seu capuz, seu corpo começou a brilhar em rosa, depois o brilho sumiu e desfez uma Ilusão.

Quando sua aparência verdadeira foi revelada, quase senti meu coração saltar.

“Sariel?!”

Era ele, não havia dúvidas.

Ele estava vivo, diante de mim.

“Espera, isso é uma visão do futuro... Então você vai viver?” Tentei perguntar, mas minha voz não saiu.

— Onde está Aegreon e os outros?

— A caminho. Até lá, teremos que lidar com isso. — Percebi nós três assumindo uma postura de batalha.

Em um instante, uma nevasca poderosa se formou e começou a castigar os devotos. Apenas a força dos ventos já era suficiente para causar grandes danos.

Me vi voando novamente. Ao redor de mim, inúmeras luzes azuis se formaram, eram tantas que sobrepujavam a claridade do sol.

O que aconteceu em seguida, me deixou... sem palavras.

Talvez uma centena de esferas azuis atingiram simultaneamente os devotos. Era tanto poder, e estava fazendo isso com tanta facilidade.

“Eu vou... ficar forte assim? Esse é o poder de um anjo?” A visão das incontáveis explosões me deixou atônita, me fazendo perguntar o quão poderoso Ardos seria.

A luta prosseguiu por algum tempo, e eu, sozinha, fui capaz de proteger Sariel e aquela pessoa desconhecida.

Eventualmente, assim como começou, a visão terminou subitamente, e percebi que estava de volta naquele lugar infinitamente branco.

— Sariel está... Vivo! — Minha voz mal saiu devido a alegria que estava sentindo.

Apesar dos acontecimentos naquela visão, apenas aquela informação importava.

— Mas, se ele está vivo, então por que ainda não me buscou?

Minha mente estava a mil e, como consequência disso, decidi tentar encontrar uma maneira de sair daquele lugar.

— Preciso acordar!

Olhei a redor à procura de algo diferente quando, bem distante, percebi um objeto preto.

Corri até essa coisa com esperanças de que seria minha saída daquele lugar, porém me esbarrei em várias coisas no caminho.

— O que? — Estava confusa sobre isso. Antes da visão começar, aquele lugar era vazio, mas dessa vez parecia ter objetos invisíveis no caminho.

Apesar disso, continuei avançando, até que percebi o que era aquele objeto preto.

— O livro negro... — Quando cheguei perto o suficiente, abri o livro e comecei a investigá-lo.

Não havia nada de novo no começo ou no meio, apenas no fim.

Havia páginas novas com imagens da visão do futuro que tive agora mesmo.

Folheei cada uma lentamente, quando cheguei na penúltima página do livro.

Era a visão de Sariel me... matando...

Era difícil ver ao redor, mas, agora que eu tinha mais contexto sobre a situação, percebi uma luz roxa brilhando à minha direita. Poderia ser a luz do portal? Falhei em parar a Seita?

E pior que isso, por que Sariel estava me matando? Não fazia sentindo considerando o que havia acontecido antes.

— Talvez seja uma Ilusão... Eu não soube que era Sariel até ele desfazer a magia dele. — Era a única coisa que poderia pensar, não havia outra resposta.

Olhei a última página, mas ainda estava escura.

— Esse livro... por que está aqui?

Aquele livro era algo que existia no meu subconsciente apenas, então por quê?

— Espera... meu subconsciente? — Quando pensei naquilo, finalmente comecei a ligar os pontos.

Eu havia me congelado, estava desacordada.

— Então esse lugar só poderia ser... — Me concentrei e mentalizei o lugar que eu mesmo criei na minha mente, e aquele espaço branco se revelou ser justamente o que eu havia imaginado.

Ilhas flutuantes com rios e cachoeiras, montanhas na distância, inúmeros animais e árvores que serviam de estantes de livros para minhas memórias.

Esse tempo todo, eu estava no meu subconsciente.

— Espera, se estou aqui, então eu posso...

Me concentrei novamente, mas dessa vez não para alterar algo lá dentro, e sim, para criar uma ponte para outro lugar.

Apareci diante de um grande arco de pedra natural e, após alguns segundos, uma fenda espacial se formou dentro dele, com tantas cores que jamais imaginava existir.

— Deu certo! Ele está vivo! — Sem pensar duas vezes, corri para dentro.

Me vi em um túnel arco-íris, viajando tão rápido que o espaço ao redor parecia distorcer.

Após um breve momento, todas as cores se juntaram e me vi, mais uma vez, em um espaço branco.

“Falhou?”

Eu parecia estar de volta no meu subconsciente, mas por que eu sentia como se aquilo fosse diferente?

— Luna? — Uma voz familiar perguntou atrás de mim, fazendo meu coração pular uma batida.

Me virei imediatamente, e o que vi me trouxe um alívio que nunca senti antes.

— Sariel! — Sem pensar duas vezes, corri em sua direção e o abracei. — Ainda bem...


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