O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 3

Capítulo 134: Espaço Negro

Meus olhos se fecharam lentamente, e a última coisa que vi foi minha magia atingindo aquela bruxa...

Tentei abrir os olhos, mas, por algum motivo, não conseguia.

— Eu... Morri...? — Perguntei-me ainda confuso, quando apenas então percebi minha própria voz. — Quê? Minha voz...

Apenas então tentei me mover. Estava tão exausto durante minha luta, que apenas manter meus olhos abertos era uma tarefa quase impossível.

Foi então que finalmente percebi que estava caído, deitado.

Me levantei com dificuldade. Ainda não compreendi direito o que estava acontecendo, e precisava lutar para me manter em pé, mesmo que me sentisse bem.

Porém, por algum motivo, ainda não conseguia abrir meus olhos.

Até que, ao olhar para baixo, vi meu próprio corpo.

— Meus olhos estavam abertos esse tempo todo?

Tentei novamente olhar ao redor, mas estava absolutamente escuro.

— Que lugar é esse? Onde está todo mundo? Não me diga que... Estão todos mortos...

Não podia ser... Não podia acreditar naquilo.

Comecei a correr ao redor sem nenhum destino, buscando qualquer vestígio ou pista do que havia acontecido... Qualquer coisa.

Mas... Essa maldita escuridão não acabava... Onde diabos era esse lugar?

Corri por alguns segundos apenas, mas, eventualmente, me ajoelhei enquanto respirava ofegantemente.

— Que porra... de lugar é esse? Por que... fiquei cansado tão rápido?

Precisei de muito tempo para me recuperar, talvez algumas horas... Ou talvez tenham sido alguns dias?

“Por que meus sentidos estão tão bagunçados?”

Corri novamente buscando algo, sempre me cansando imediatamente e precisando parar para recuperar meu fôlego.

Por quanto tempo fiz isso? Valia a pena continuar fazendo aquilo?

— Chega... Estou cansado demais para pensar...

Sem saber o que fazer, apenas desisti, deixei a gravidade ganhar e me deitei naquela escuridão infinita, olhando para cima com o corpo todo esticado.

Ou eu estava olhando para baixo? Tudo era escuro... Era impossível saber de que maneira eu havia deitado e qual direção eu estava olhando.

Na verdade, eu estava mesmo deitado?

Pensar nisso me deixa tonto... confuso... vou apenas encarar a escuridão.

Aos poucos, deixei de pensar até que todos os meus sentidos se acostumaram com aquele lugar.

Estranho... Qualquer um se assustaria naquela situação, envolto na escuridão, sozinho e perdido.

Porém me senti confortável naquele lugar... Estava frio, mas não o suficiente para eu tremer.

Curioso, apesar de não sentir tão frio, eu podia ver nuvens saindo de minha boca quando respirava.

Meus olhos começaram a se tornar pesados, e senti uma grande vontade de dormir.

A cada vez que eu piscava, mais desejava mantê-los fechados.

Até que, após fechar os olhos por muito tempo, os abri novamente, mas dessa vez em um lugar diferente.

Ou melhor, uma visão...

“Não... Por que estou vendo isso de novo?!”

De novo aquela maldita sala escura... Aquela mesa com aqueles devotos desgraçados... Por que eu tinha de ver aquilo novamente?

Isso é alguma punição? Eu nunca me juntaria a uma Seita, então por que aquela visão se repetia tantas vezes?

Eu tentei me concentrar para sair daquilo, tentei fechar meus olhos ou fazer qualquer coisa... Mas não conseguia escapar daquela maldição.

— O que faremos? — Minha voz saiu contra minha vontade como sempre acontecia naquela visão específica.

— Este ataque nos pegou desprevenidos, mas, felizmente, contornamos a situação. Estamos livres para fazermos o que quisermos. Focaremos em obter mais membros, expandir nossa influência, conseguir sacrifícios e aprimorar as passagens — disse aquele quem parecia ser o líder.

Não conseguia ver seus rostos... Estava muito escuro, e a visão era muito embaçada.

— Mas depois que tudo isso acabar não estaremos com problemas?

— Até lá já teremos recuperado nossas perdas. Sumiremos do mapa por enquanto, e quando retornarmos estaremos em nosso ápice novamente! Mesmo que encontrem alguns de nós eles não serão capazes de nos derrubar. É apenas uma questão de paciência para obtermos nossa glória!

— Exato, e ainda temos materiais para cumprir as ordens de nosso mestre. Como estamos em um local isolado, poderemos criar um grande exército a partir de já. Vamos nos apressar. — Um outro devoto se levantou, seguido de todos os outros.

Eu também me levantei, sendo o último na fila, enquanto todos nós percorremos por corredores apertados.

Durante todo o percurso, tentei de tudo para despertar daquilo, mas era quase como se eu fosse forçado a ver aquilo.

Eventualmente, chegamos no maldito salão do portal.

Os grandes anéis escuros e metálicos estavam prontos, com várias pedras de Conjuração encrustadas no metal, com algumas pessoas amarradas logo ao lado.

Era impossível saber exatamente quantas pedras havia ali, porém não restava dúvidas de que eram muitas.

Cada pedra continha uma alma, uma pessoa que fora enganada ou sacrificada para que aquele portal fosse feito.

Quantas pessoas aqueles bastardos mataram para criar um portal tão grande? Quantas famílias haviam destruído?

E pior... Quantas daquelas pedras eu mesmo preenchi?

Seria isso meu castigo? Ver que eu trairei a humanidade, e me punir ao me mostrar aquele mesmo homem sendo morto tantas vezes pelas minhas mãos?

O que eu fiz para merecer isso?

Eu sempre fiz tudo pelo bem da humanidade... Por que eu acabaria daquela maneira?

Eu nem sabia sobre a profecia... Eu estava destinado o tempo todo a me tornar um devoto? A trair a humanidade? A me revoltar contra Kura?

E o que eu fiz com Luna e os outros? Eu os... Não... Não quero pensar nisso...

O destino realmente é tão cruel ao ponto em que não podemos mudá-lo?

— Novato, você capturou aquele porco, portanto a responsabilidade é sua em sacrificá-lo. — Um homem másculo, careca e com barba se aproximou de mim.

— Com prazer, irmão. — Me aproximei contra minha vontade de um homem amarrado.

Não importava o quanto eu lutasse, a visão sempre decorria da mesma maneira.

Quando cheguei próximo o suficiente, o agarrei pelos cabelos e coloquei uma lâmina contra seu pescoço.

Estava tão desesperado com aquilo, que quase não percebi algo que me chamou a atenção: o olhar determinado da minha vítima.

Só então percebi que a visão possuía mais detalhes do que a outra vez.

Não pude deixar de me sentir enojado de mim mesmo... Eu estava sendo tão covarde ao sacrificá-lo, enquanto ele encarava a morte sem medo...

Eu mal tive tempo para pensar nisso, pois logo puxei a lâmina, cortando o seu pescoço e jogando-o no chão como um animal abatido.

Seu sangue sujou minhas mãos... Mesmo que fosse uma visão, senti meu estômago embrulhar.

“Por favor... Me tira desse pesadelo...”

 

***

 

O amanhecer revelou os danos terríveis causados na vila devido à luta da noite anterior.

Todas as casas foram ou totalmente destruídas, ou estavam danificadas demais para serem usadas.

Os soldados de Andrik focaram em construir abrigos improvisados, verificar se havia feridos e permanecer em prontidão na floresta para prevenir qualquer ataque futuro.

Enquanto isso, o capitão aguardava em uma tenda improvisada, quando Aegreon e Shiina entraram.

— Bom dia, senhor Aegreon. Sinta-se à vontade. — Andrik estava sentado diante de uma mesa contendo os mapas da floresta. — Suponho que já sabe sobre o que desejo discutir, certo?

Antes mesmo que o Pilar respondesse, Shiina usou magia de Ilusão para cobrir o local e, em seguida, sentou-se em uma cadeira sem dizer nada.

Aegreon permaneceu de pé e não respondeu, apenas encarou o capitão de volta.

Sentindo-se intimidado por aquilo, mas mantendo sua postura como um líder, Andrik insistiu: — Pode explicar por que você e aquele anjo estavam aqui, usando nomes falsos, com suas aparências modificadas por Ilusão, e sem ter nos avisado? O Conselho sabe que estão aqui?

— Estamos indo até o Astrum Lux, mas passaremos por Acrópolis no caminho. O Conselho não sabe que Luna está comigo, nem nossa localização ou o tamanho de nosso grupo, portanto você deveria manter isso em segredo.

— A menos que me dê um bom motivo, não poderei concordar com isso.

Aegreon olhou Andrik em silêncio por um breve momento, como se ponderando algo.

O capitão não podia deixar de se sentir nervoso toda vez que era encarado por aqueles olhos roxos. Era impossível saber o que se passava na mente do Pilar, e apenas sua mera presença já era capaz de deixá-lo consciente de suas palavras.

Apesar de sentir que estava cavando a própria cova ao questioná-lo dessa maneira, era seu dever descobrir o que Aegreon estava fazendo com o anjo.

Mesmo que a prioridade agora fosse a Seita de Baba Yaga, um anjo vivo seria um problema muito maior no futuro se não fosse lidado com cuidado.

Suas intenções era descobrir o motivo dele estar agindo contra o Conselho, mas sabia muito bem que, caso o Pilar quisesse, ele poderia muito bem matar todos ali para proteger seu segredo.

Finalmente, após um longo período de silêncio, Aegreon disse: — Koeus provavelmente é um membro de uma Seita infiltrado no Conselho.

Ao ouvir aquilo, Andrik precisou de alguns segundos para assimilar a informação.

— Isso... é uma acusação gravíssima... Pode me explicar melhor isso?

Durante a próxima hora, Aegreon explicou da melhor maneira que podia sobre sua teoria.

Quando terminou, o capitão ainda estava cético.

— Então Feng Ping está trabalhando com vocês... Por acaso pode provar isso tudo que me disse?

O Pilar permaneceu em silêncio, o que fez Andrik suspirar.

— Se não tiver como provar isso tudo, serei forçado a pedir ajuda ao Conselho. — O capitão apontou para as pedras de Alteração na mesa. — Não hesitarei em fazer isso. Preciso proteger meu reino e meu mundo, e o Conselho nos ajudará a acabar com a Seita, além de capturar o anjo. Sem contar que o Volátil também deve ser salvo.

Aegreon continuou em silêncio, porém assumiu uma postura de combate e aproximou a mão de sua foice.

— Então prefere matar a mim e a meu povo, pessoas inocentes, por isso? — Andrik encarou o Pilar de volta com determinação, pronto para aceitar sua morte e acreditando que estava certo. — Bem, neste caso, meu espírito te perseguirá pela eternidade, Aegreon...

— Espera aí, vocês dois. — Shiina finalmente quebrou seu silêncio. — Há uma maneira de provar nossa história, porém precisamos de um pouco de sorte...

— Como assim?

— Se Sariel sobreviver, ele poderá mostrar as memórias dele com Alteração.

— “Se sobreviver” ... — Andrik repetiu.

— Não vamos agir precipitadamente, tudo será resolvido quando Sariel acordar.

O capitão encarou os dois por um breve momento, quando relaxou e se recostou contra sua cadeira.

— Certo, esperarei mais um pouco.

Sem dizer uma palavra, Aegreon se virou e saiu.

 

***

 

Após a conversa com Andrik, Shiina se dirigiu até a moradia de Boris, a única que estava em um estado bom o suficiente para abrigar alguém.

Durante o caminho, passou por várias pessoas nas ruas, que montavam tendas ou procuravam seus pertences nos destroços de suas casas.

Assim que Shiina entrou na moradia de Boris, se deparou com Raymond sentado ao lado de Sariel, que ainda estava desacordado.

— Alguma novidade?

O guarda-costas balançou a cabeça negativamente.

— Está exatamente igual desde ontem... — Raymond manteve os olhos no viajante.

— Bem... Isso não é um sinal ruim, certo? Se a condição dele não piorou mesmo depois de tantas horas, então ele deve despertar eventualmente. — A assassina, percebendo a preocupação do guarda-costas, tentou animá-lo com algum otimismo.

Contudo Raymond não respondeu.

Desde o fim da batalha, ele esteve ao lado de Sariel o tempo todo para observar sua condição. O único momento que se afastou dele, foi quando saiu para proteger a casa do ataque das criaturas.

— Você... Já comeu algo? — Shiina, diante daquela situação, não sabia o que dizer. Durante toda sua vida trabalhou sozinha por ser uma assassina, apesar de interagir bastante com alguns de seus alvos quando necessário. Graças a isso, se tornou uma especialista na arte da sedução, mas, quando se tratava de dar apoio emocional, ficava totalmente perdida.

— Sim. — Raymond tentou mentir ao responder pronta e curtamente.

— Mentira... — Contudo, a assassina imediatamente pôde perceber a verdade. — Vou trazer algo para você, já volto.

Shiina saiu da casa, enquanto Raymond permaneceu na mesma posição.


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