O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 64: Liberdade

Raymond, Shiina e, principalmente, Luna observavam tudo com admiração e os olhos brilhando.

Era a primeira vez que viam uma conjuração acontecendo e não sentir perigo.

A visão daquela esfera roxa crescer e aos poucos assumir a forma do dragão conforme sua energia se tornava verde era como presenciar a criação da vida.

Após a conjuração ter acabado, Feykron abriu os olhos lentamente, sentindo um leve incomodo devido à luz do sol.

O dragão se sentiu confuso, pois até alguns segundos atrás estava preso no subterrâneo, quando um sentimento estranho — um chamado — cresceu intensamente, e depois olhou para as próprias patas, percebendo seu corpo se tornar roxo.

Percebendo que a magia estava esperando por sua permissão para ser conjurado, o dragão simplesmente aceitou em seu coração e a conjuração se iniciou.

Depois, sentiu seu corpo reduzir a um tamanho menor que uma formiga e se viu em uma esfera roxa. Era como se toda a realidade havia sido transformada naquela sala de energia de Conjuração.

Quando tentou olhar para o próprio corpo, viu apenas um amontoado de energia roxa que facilmente se mesclava com o ambiente, como se sua forma corpórea tivesse se desfeito, mas sua consciência se manteve.

Apesar da experiencia única e desconhecida, não sentiu medo, nem dor. Sabia que aquela energia roxa era Conjuração, mas ela era confortável e bondosa, o completo oposto da base — do cerne — deste elemento.

No segundo seguinte, a cor da esfera em que se encontrava se tornou verde e brilhou intensamente, fazendo-o fechar os olhos.

Feykron manteve os olhos fechados por mais um tempo, quando sentiu algo diferente: O calor do sol batendo em sua pele e o vento balançando sua barba verde.

Quando abriu os olhos, deparou-se com um cenário que há séculos não via: árvores... terra... natureza!

Sem acreditar no que via, o dragão levantou a cabeça e olhou diretamente para o sol.

Lágrimas de emoção escaparam de seus olhos. Quanto tempo fazia desde a última vez que viu o sol?

Feykron permaneceu na mesma posição — com a cabeça erguida para o sol e com os olhos lacrimejando — enquanto sentia o calor da estrela, o carinho do vento, o frio suave das montanhas e o cheiro da floresta.

Finalmente, o dragão virou o rosto para Sariel e se levantou, abrindo suas grandes asas e esticando o corpo adequadamente, fazendo alguns de seus ossos estalarem e um som alto de madeira rangendo.

Feykron se aproximou do viajante e da princesa com uma aparência majestosa, apesar de bondosa e cheia de gratidão. Era como se sua postura havia mudado completamente apenas por estar exposto por alguns segundos ao sol.

O dragão abaixou sua cabeça e, com uma voz carregada de emoção e trêmula, disse: — Sariel... Apesar de eu saber tanto a língua dos anjos quanto dos dragões, não consigo encontrar palavras que transmitam toda a gratidão que sinto por ti...

O viajante aproximou sua mão hesitantemente e tocou o dragão.

— Não é preciso me agradecer... — disse com dificuldade. — Não me perdoaria se lhe deixasse preso...

Feykron olhou no fundo dos olhos de Sariel e percebeu que estava atormentado, sem ainda ter superado sobre a profecia dele.

— Sariel, não deixe que a profecia lhe abale — disse. — Tenho certeza de que fará o bem ao mundo... Já está fazendo, na verdade. Se realmente desejasse pelo extermínio de tudo, não teria me libertado.

O viajante permaneceu em silêncio e desviou seu olhar do dragão.

Enquanto isso acontecia, Aegreon, Raymond e Shiina se aproximaram.

— Um dragão... — disse Shiina de maneira ofegante e sem tirar os olhos da criatura. — Uau...

Raymond estava ainda mais impressionado e nem conseguia falar.

Apenas o Pilar parecia pouco surpreso com a situação.

Feykron percebeu os dois e os cumprimentou com um pequeno aceno de cabeça. Não adiantaria trocar palavras, já que eles não entendiam a língua angelical, quanto menos a língua dracônica.

O dragão então virou o rosto e olhou para Luna.

— Luna... sei que Sariel, no momento, é muito forte. Contudo, és a única que pode ajudá-lo a superar suas inseguranças — disse com preocupação. — Vigie-o, por favor.

A princesa balançou a cabeça afirmativamente e disse: — Não se preocupe, não abandonarei Sariel!

Ao ouvir isso, o dragão sorriu suavemente, enquanto se levantava e balançava as asas preparando-se para voar.

— Bem, está na hora de eu ir — disse com um tom melancólico.

— O que pretende fazer agora? — perguntou o viajante.

— Procurarei por outros dragões que talvez tenham ficado para trás e descobrir a verdade sobre os anjos — respondeu o dragão. — Agora, adeus!

— Adeus! — disseram Sariel e Luna.

O dragão balançou suas fortes asas que, apesar da falta de exercício, estavam tão fortes que pareciam capazes de criar um furacão. O vento criado por elas balançou as árvores, fazendo-as contorcerem e quase quebrarem.

Após correr alguns metros, o dragão levantou voo e finalmente se libertando da terra.

Entretanto, não foi embora assim que deixou o chão. Feykron deu algumas voltas ao redor do grupo, aproximando-se da montanha e até dando um rasante em um lago fazendo suas garras tocarem a superfície da água.

Após voar por um tempo, o dragão retornou para onde o grupo estava e permaneceu parado no ar, sentindo-se compelido a dizer uma última coisa.

— Sariel! Sua Conjuração não é maligna como das outras pessoas! — disse com a voz levemente alta. Não era necessário elevar sua voz já que era bem grave, distinta e superior ao som do vento que suas asas causavam, mas quis ter certeza de que suas palavras seriam compreendidas. — Sinto bondade nelas! Portanto tenho certeza de que trará felicidade para todos! Inclusive Kura!

O viajante olhava o dragão conforme a luz do sol o contornava e um pequeno sorriso melancólico escapou de seu rosto.

— Obrigado... — agradeceu alto o suficiente para que Feykron ouvisse. — E tome cuidado!

— Digo o mesmo a ti, amigo! — disse o dragão enquanto voava novamente e se afastava dos dois, subindo até o topo da Cordilheira Belvuch até sumir nas nuvens.

O grupo permaneceu parado por um bom tempo observando o topo da cordilheira, mesmo após Feykron não estar mais visível.

— Que pena... — lamuriou Shiina. — Nunca quis aprender a língua dos anjos, e agora me arrependo intensamente de não saber e não poder falar com ele...

— De fato... — concordou Raymond. — Sinto como se não tivesse sido respeitoso com ele...

— Agora não é tempo para isso — disse Aegreon, cortando o clima de despedida. — Devemos continuar, e o Conselho pode acabar descobrindo sobre esse dragão.

Sem dizer mais nada, o Pilar montou seu cavalo e seguiu a estrada.

Tsc! Às vezes você é um estraga prazeres, sabia? — reclamou Shiina, também montando seu cavalo e seguindo Aegreon.

Raymond também o acompanhou.

Apenas Sariel e Luna permaneceram no mesmo lugar.

O viajante olhava para a cordilheira com inúmeras dúvidas inundando sua mente. Mesmo que Feykron tivesse dito aquilo, era impossível não pensar no pior cenário.

Não... Mesmo todos os “obrigado” que ouviu das pessoas que salvou não eram o suficiente para tirar essa insegurança... Nada seria capaz de remover completamente o peso de carregar o destino de todos os filhos de Kura com as próprias mãos.

Sariel fechou as mãos com um punho e apertou conforme pensava no futuro, quando uma mão suave o tocou e uma voz gentil e preocupada o despertou.

— Sariel... temos que ir...

Era Luna, com um olhar preocupado.

Qualquer cidadão de Fordurn que a visse não enxergaria um ser de uma raça assassina que apenas deseja o extermínio da raça humana, e pediria perdão até o fim de sua vida por tudo que disse e pensou dela.

Aquilo não era um monstro... era como a filha da própria Deusa em pessoa.

— Sim... — respondeu Sariel, sentindo-se levemente culpado por fazer Luna se preocupar com ele. — Vamos.

Os dois montaram seu cavalo com a princesa sempre desejando dizer algo para animar o viajante, mas sem sabe o que.

O grupo então seguiu sua viagem para as Montanhas Prateadas, conforme o frio se tornava mais intenso e a paisagem cada vez mais branca.

 

***

 

O ambiente todo já estava frio o suficiente para que fosse necessário se agasalhar para não morrer no frio, e a estrada estava coberta de neve.

Uma nevasca não muito forte dificultava a visão, mas não era um grande problema para Aegreon.

Antigamente, haveria pedras de Fogo ao lado das estradas para que o calor dela impedisse a neve de ocultar o caminho, mas sempre eram roubadas e, provavelmente, vendidas.

Dois dias se passaram desde que Feykron fora liberto, e nada havia mudado com Sariel, que continuava calado e melancólico.

Sua aparência era de alguém que não dormia, com algumas olheiras se formando, apesar de ele claramente ter dormido.

A verdade era que mesmo seus sonhos não permitiam que descansasse. Sempre se via naquela sala de alguma Seita e seus sonhos sempre acabavam no momento que estava prestes a cortar a garganta daquele homem desconhecido.

No momento, o grupo havia parado para comer e estavam amontoados próximos de uma fogueira. Todos, exceto Sariel e Luna que estavam recostados em uma árvore.

Por ser totalmente imune ao gelo, o viajante não precisava do fogo, portanto não era necessário estar junto deles.

E Luna, é claro, estava ao seu lado, sempre tentando conversar ou fazê-lo experimentar algo.

Shiina lançava olhares de curiosidade para trás.

— Ei, o que aconteceu com ele? — perguntou. — Está calado desde que encontraram aquele dragão.

— Devem ter encontrado alguma informação importante que estão escondendo — disse Aegreon.

— Suspeita demais dele — respondeu Raymond. — Deve estar apenas preocupado com o caminho à frente.

— Humph — resmungou o Pilar. — Se deixam enganar por ele muito facilmente.

— E o que estamos indo fazer em Shiroi Tate? — perguntou a assassina. — Sabe que não gosto de lá.

— Shiroi Tate? — perguntou o guarda-costas.

— Ah, é como chamamos as Montanhas Prateadas em nosso idioma — respondeu Shiina. — Se fosse traduzir exatamente, então na língua geral seria “Escudos Brancos”, mas decidiram dar outro nome sem perguntar a nós.

— Entendo, neste caso passarei a chamar seu reino do jeito certo — disse Raymond.

Shiina sorriu, deu um tapinha no ombro de Raymond, e disse: — Chame da maneira que quiser, eu não ligo.

A assassina voltou olhar para o Pilar e repetiu sua pergunta.

— ...Preciso ver a situação sobre Shiva. A Seita dele deve ter se aproveitado que Sariel matou Feng Ping.

— Acha mesmo que Sariel matou o Pilar do Vento? — pergunto Raymond. — Tenho certeza de que ele estava apenas blefando para irritá-lo.

 — O braço do cadáver de Indra que ele lhe entregou era um blefe? — perguntou Aegreon.

— Bem... é verdade... — admitiu Raymond. Por mais que os objetivos de Indra fossem contra os deles, Sariel ter assassinado um Pilar era um fato, e perder alguém do Conselho era um golpe terrível para a humanidade.

Entretanto, porque ele matou Feng Ping então? Isso teria acontecido antes de ele ter chegado em Fordurn, portanto a única explicação era de que ele planejava eliminar um possível futuro obstáculo.

No entanto, será que seria apenas isso mesmo?

Além disso, esse foi o segundo Pilar morto desde que a jornada se iniciou.

"Isso está certo? Os Pilares protegem a humanidade, e dois já morreram... neste ritmo, mais deles morrerão...", pensou Raymond com um leve sentimento de culpa.

Claro, o que desejavam fazer com Luna era totalmente injusto, portanto a ajudaria da melhor maneira possível.

"Mas... Isso realmente a maneira correta de lidar com as coisas sempre que encontrarmos o Conselho? Seremos forçados a matar aqueles que protegem a humanidade?"

Raymond balançou a cabeça negativamente, forçando-se a deixar de pensar naquilo.

Se começasse a se sentir culpado do que estava fazendo, então sua devoção em proteger Luna enfraqueceria.

O tempo passou devagar conforme a nevasca se intensificava gradativamente, e a estrada estava totalmente deserta.

Desde que deixaram a Cordilheira Belvuch não encontraram uma única pessoa, afinal, o clima das Montanhas Prateadas era rigoroso, e montar negócios lá dificilmente seria lucrativo.

O fogo da fogueira morreu aos poucos, até apenas cinzas sobrarem.

Os preparativos para seguir a viagem logo começaram, quando Aegreon ouviu — em meio ao forte som do vento — passos na neve de uma única pessoa vindo pelo caminho que estavam indo.

Com um único sinal, todos entraram em alerta e sacaram suas armas.

Sariel sacou sua glaive e estreitou os olhos para ver quem se aproximava, ao mesmo tempo que usava magia de Alteração para medir o poder mágico da pessoa.

Foi então, que os olhos do viajante se arregalaram e ele deixou derrubar sua arma no chão.

— Sariel, qual o problema? — perguntou Luna preocupada.

Porém, a viajante nada disse, e permanecia com uma expressão assustada no rosto.

A princesa, curiosa, fez o mesmo que o viajante e sondou o poder mágico do estranho, percebendo uma aura poderosíssima de vento se aproximando. A aura de alguém tão poderoso quanto um Pilar.

— To-Tomem cuidado!

Todos ficaram tensos enquanto aguardavam pela pessoa misteriosa se aproximar, até que uma figura finalmente pode ser vista na nevasca.

Assim que viu aquela figura, um olhar de surpresa surgiu no rosto de Aegreon, sem acreditar que aquilo que via era realmente possível.

— Você... está vivo!?

A figura nada disse, apenas se aproximou calmamente, finalmente revelando sua aparência.

Possuía longos e lisos cabelos cinza, com olhos escuros e puxados e uma expressão calma. Vestia um quimono preto com detalhes brancos, similares ao soprar do vento, e um manto também da cor preta, além de um chapéu de palha grande que quase escondia seu rosto.

Uma lança comprida flutuava logo ao seu lado, acompanhando seu andar calmo, composto, confiante e exalando uma sabedoria madura.

Feng Ping, o Pilar do Vento, se aproximava do grupo com uma expressão neutra, sozinho e fora de sua casa...


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