O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 63: De Volta à Superfície

Sariel e Luna terminaram de subir as escadas e finalmente se reencontraram com Shiina, Raymond e Aegreon após algumas horas.

Raymond e Shiina perceberam imediatamente que as roupas dos dois estavam danificadas.

— Pelo jeito que estão — começou Raymond —, e os tremores que sentimos mais cedo, devem ter lutado contra algo poderoso.

— Bem... — Luna tomou a iniciativa para explicar o que ocorreu. — Tinha uma dessas criaturas de fogo bem grande, e quando a matamos, as sombras surgiram e possuíram o corpo dela, deixando-a ainda mais forte. E quanto a vocês?

— Não encontramos nada interessante lá em cima — disse Shiina. — Exceto que esse lugar parece realmente um reino para pessoas morarem, diferente do que os santuários de anjos normalmente são.

— Encontraram algo mais? — perguntou Aegreon, percebendo que o viajante estava estranhamente quieto.

— Bem... Encontramos um dragão... — respondeu a princesa, lançando um olhar furtivo para Sariel, sem obter uma reação.

— Um dragão?! Aqui?! — surpreendeu-se Raymond. — Estava vivo?

— Sim — disse Luna, tentando evitar dizer muito.

— Conversaram com ele? — perguntou Shiina.

— Sim, mas é melhor falarmos sobre isso enquanto vamos embora — disse Luna. — Encontramos mapas desse lugar onde o dragão estava.

— Assim que buscarmos nossos cavalos poderão dizer o que sabem — disse Aegreon. — E digam tudo o que aconteceu.

— Ah, é verdade, nossos cavalos estão lá em cima...

Shiina e Raymond subiram novamente pelo elevador, deixando Aegreon, Sariel e Luna para trás.

O Pilar encarou desconfiadamente o viajante o tempo todo, que nem percebeu já que estava de costas para ele.

Já Luna, não sabia o que fazer, já que desejava tentar consolar o viajante, mas não podia fazer isso com Aegreon ali.

Eventualmente, o guarda-costas e a assassina retornaram com seus cavalos e Su-en.

— Vamos?

Seguindo o caminho, Luna sozinha contou tudo que aconteceu, mas ocultando qualquer detalhe sobre a profecia.

Shiina e Raymond também contaram o que fizeram, o que pareceu pouco animador em comparação com a experiencia de encontrar um dragão.

— Então esse lugar realmente é como um reino, mas por quê? — perguntou a princesa.

— Talvez planejassem usar este lugar como um posto avançado — supôs Raymond.

— Aliás, Aegreon, como encontrou a chave do elevador? — perguntou a assassina. — Deve ter encontrado alguma informação deste lugar.

— Não encontrei nada. Os anjos limparam este lugar antes de saírem — respondeu o Pilar.

O grupo seguiu pelo caminho enquanto conversavam. Como sempre, Aegreon apenas falava quando dirigiam palavra a ele, contudo, dessa vez, Sariel estava estranhamente quieto.

O silêncio do viajante obviamente foi percebido por seus companheiros, mas Shiina e Raymond acreditaram que ele apenas estava pensativo sobre o que descobriu do dragão.

O único que parecia desconfiado disso era Aegreon, entretanto não fez e nem disse nada.

Após algumas horas, o grupo decidiu parar para descansar e prosseguir no dia seguinte.

Conforme comiam, Luna observava Sariel — que possuía uma expressão desanimada — o tempo todo. Apesar de querer muito falar com ele, era impossível com todos juntos ali.

Eventualmente, todos foram dormir, e a princesa adentrou seu subconsciente ansiosa esperando que o viajante apareceria ali como sempre fizera.

Entretanto, foi parar em mais um sonho com a esposa de Geoffrey, Elise.

— Isso de novo...

Luna estava sem vontade de praticar aquela noite, portanto apenas se sentou em uma pedra enquanto observava Elise cuidando dela.

O lugar era o mesmo, uma caverna escura.

O tempo passou devagar conforme a princesa observava o rosto gentil de Elise, ponderando o porquê de ela estar cuidando dela e o que aconteceu no dia de sua morte.

A rainha dizia várias coisas com a pequena Luna, até que ela assumiu uma expressão séria e disse algo que deixou a princesa espantada.

— Mesmo para um recém-nascido... possui muito poder mágico — disse com a voz contemplativa. — A Vigília te encontrará se eu não fizer nada... Portanto selarei seu poder mágico.

Elise colocou a pequena Luna no berço, enquanto palavras prateadas surgiam ao redor de toda a pele da rainha, como tatuagens ritualísticas.

A roupa que vestia, um vestido longo de uma peça vermelhos com detalhes em dourado, apenas adicionava a sensação de poder da rainha.

— Não se preocupe, irei retirar as restrições aos poucos conforme cresce e lhe ensinarei a usar magia...

Elise agora não possuía mais a imagem de uma rainha bondosa e impotente, e sim de uma bruxa poderosa que estava prestes a realizar alguma feitiçaria.

Seus cabelos dourados — parcialmente brancos devido à idade — balançavam com o poder que exalava.

Contudo, seus olhos verdes possuíam a mesma gentileza de sempre.

— Me desculpe, minha pequena... — disse com pena. — Isso irá doer um pouco...

A rainha colocou as mãos no rosto da Luna do sonho, fazendo inúmeras palavras prateadas cobrir seu pequeno corpo e até entrando pela boca, nariz, olhos e orelha.

A pequena Luna começou a se debater imediatamente e a chorar bem alto, mas a Elise continuou com a magia apesar dos protestos.

A Luna de agora não sabia muito do elemento Selagem, mas, aparentemente, ter seu poder mágico selado enquanto ainda criança provavelmente era bem doloroso.

Ambas permaneceram na mesma posição conforme dezenas — talvez centenas — de palavras cobriam o corpo da pequena Luna, até que, eventualmente, Elise se afastou com o rosto soando.

A rainha usou a manga de seu vestido para enxugar o suor, e se afastou alguns passos, enquanto os choros da pequena Luna começaram a diminuir até cessar completamente.

— Bem... essa foi a primeira seção... — disse com a voz levemente ofegante. — Virei outros dias para continuar o processo.

Elise se aproximou novamente da pequena Luna e deu um beijo na testa dela.

— Durma bem, minha querida...

A pequena Luna — apesar do que acabara de acontecer — sorriu e tentou abraçar Elise com seus bracinhos, tirando um sorriso da rainha.

— Não se preocupe, estarei sempre aqui para te proteger — disse com convicção. — Eu prometo!

Elise se virou e começou a deixar o local.

— Não... — Luna se levantou rapidamente e tentou agarrar a rainha. — Não pode voltar aqui! Vão te matar!

Porém, sua mão atravessou Elise como se fosse uma ilusão.

— Espera!

A princesa tentou alterar o sonho para que ela não saísse, mas era inútil, aquilo era um sonho — uma memória —, e não o passado em si.

E é claro, não se pode mudar o passado.

A rainha deixou a caverna e o sonho de Luna.

A princesa permaneceu em pé enquanto processava aquela informação, até que se deu conta de que descobriu uma informação extremamente útil.

— Foi... Elise quem me selou! — disse em voz alta, como se fosse para confirmar o que ouvira.

— Mas... Raymond disse que Elise tinha pouco poder mágico... — disse pensativamente. — Será que ela escondeu isso de todos? Até de meu pai?

A mente de Luna entrou em um turbilhão de teorias conforme ponderava o que descobrira.

— Preciso falar sobre isso com Sariel! — disse animadamente. — Ele com certe... — Neste momento, se lembrou do choque que o viajante acabara de pensar.

— Antes... preciso ajudar ele a passar por esse trauma... — disse preocupada.

Pelo que parecia, ela não poderia falar sobre isso tão cedo.

Enquanto isso, na consciência de Sariel...

O viajante estava de pé em sua biblioteca, mas algo estava diferente.

As luzes estavam apagadas, dando o aspecto de um lugar abandonado e assombrado.

Uma grande pilha de livros contendo as informações que descobrira pairava diante de si, esperando para serem organizadas.

Entretanto, no momento que Sariel tocava um livro, imediatamente o soltava com a mão tremendo.

Estava em um transe constante, em uma mistura de querer sair dali e queimar aqueles livros, e ainda permanecer ali e tentar arrumar os livros — arrumar sua mente.

Entretanto, dessa vez não era capaz de fazer isso sozinho...

Enquanto observava aquilo, uma dor forte e aguda atingiu sua cabeça, e toda a biblioteca pareceu derreter como tinta.

Sua consciência vacilou, e imagens e vozes que não conhecia soaram em sua mente.

O viajante olhou para as próprias mãos, e elas pareciam estar derretendo igual todo o ambiente, até que, eventualmente, suas mãos começaram a voltar ao normal.

Porém, ele percebeu algo estranho.

Suas mãos repousavam em cima de uma mesa escura.

Mãos que não eram suas mãos.

Estava em uma espécie de salão subterrâneo, sentado em uma mesa circular escura e iluminada fracamente apenas por tochas roxas presas na rocha.

Cerca de 10 pessoas estavam sentadas naquela mesa, todos vestindo mantos escuros e compridos que as Seitas costumam vestir, e o viajante se via usando um destes mantos.

— A reunião acabou, vamos para a sala do portal — disse um homem com voz rasgada e carregada de malícia.

Todas as outras pessoas se levantaram ao mesmo tempo e seguiram este homem.

Sariel viu-se caminhando por um estreito corredor escuro, e percebeu que não era capaz de controlar sua visão. Não era capaz de olhar para qualquer lado, apenas na mesma direção que aquela pessoa olhava.

“Isso... não é um sonho nem uma memória minha... Sequestraram minha mente?”, perguntou-se.

“Não... Sinto como se ainda fosse meu subconsciente... O que está acontecendo?”

Eventualmente, chegaram em uma grande área circular, e pelo teto de pedra era um local subterrâneo. Não era possível saber onde estava, até porque o viajante tinha certeza de que nunca esteve ali.

Conforme as pessoas na frente de Sariel saíram de sua linha de visão, foi capaz de ver algo que lhe fez lembrar de Krimisha.

Dois largos objetos com forma de anel estavam colocados um em cima do outro. Eram feitos de algum metal preto, e várias pedras de Conjuração estavam encrustadas no metal e contornavam esse anel.

Não havia dúvidas, era um portal para trazer seres de outros mundos, e aquele era maior do que qualquer um que o viajante já viu. Felizmente aquele não estava ativo... ainda...

Sariel se aproximou do portal onde havia um homem adulto com as mãos amarradas atrás das costas e com uma venda.

O homem chorava como uma criança e implorava por piedade, gritando o nome de Ardos na esperança de que ele o salvasse.

“NÃO! PARE COM ISSO!”, gritou internamente.

Contudo, Sariel se aproximou deste homem e forçou a cabeça dele contra uma pedra de Conjuração que estava no portal.

— POR FAVOR! EU TENHO FILHOS! PARE!

O homem estava totalmente desesperado, mas o viajante se percebeu pegando uma faca e levando ao pescoço do homem.

“PARE! ISSO NÃO SOU EU”, Sariel tentava de todo jeito impedir aquilo.

Entretanto, dessa vez, o viajante não estava no controle.

A faca se aproximou lentamente e tocou o pescoço do homem, fazendo um pequeno corte e derramando sangue na pedra roxa, preparando-se para o puxão final que tiraria sua vida.

“Isso não é real! É apenas... apenas um tormento! Um pesadelo!”, Sariel tentava se convencer.

Mas... ele não estava no controle.

Suas mãos não eram suas mãos.

 

***

 

Era pouco mais de meio-dia quando o grupo finalmente deixou as cavernas da Cordilheira Belvuch, sendo recebidos com um frio forte o suficiente para que nuvens se formassem conforme se respirava.

O terreno não era tão acidentado, e uma floresta de pinheiros se estendia pelo pé da cordilheira.

Como já havia se passado um bom tempo, algumas coisas com o grupo começaram a mudar.

Todos perceberam o comportamento introvertido de Sariel, e perguntaram várias vezes se havia algo de errado, e ele sempre respondeu com poucas palavras e de maneira evasiva.

Teriam acreditado se fosse apenas no primeiro dia após o encontro com o dragão, mas isso já estava durando demais, e era estranho não o ver fazendo piadas e provocando seus companheiros.

O grupo seguiu por algum tempo em meio aos pinheiros, até que encontraram uma área aberta e descansaram.

Quando estavam prestes a partir, perceberam Sariel parado no acampamento e segurando uma pedra verde brilhante.

— Sariel... — disse a princesa conforme se aproximava. — Está... tudo bem?

Entretanto, ele não respondeu.

Aegreon, Shiina e Raymond observavam tudo de longe com curiosidade.

Um silêncio tomou conta dos dois, e Luna estava prestes a falar algo novamente, quando uma energia roxa surgiu da palma de Sariel e começou a cobrir a pedra de Natureza.

O poder da Conjuração consumiu a pedra, transformando sua cor verde para roxo lentamente, até que a pedra começou a derreter na palma do viajante e atravessou sua pele.

Sariel absorveu totalmente a pedra, sem deixar nada para trás.

E então, aproximou as duas mãos no formato de uma esfera.

Entre suas duas palmas, uma pequena esfera de energia roxa surgiu e começou a crescer lentamente.

O viajante estendeu a mão com a esfera crescendo cada vez mais, até alcançar o tamanho de um melão e, com um impulso fraco, fez a esfera flutuar no ar.

A esfera continuou a crescer conforme, adquirindo o tamanho de um lobo, para um elefante e ainda aumentando sem sinal de parar.

A esfera então começou a se deformar, transformando-se em uma silhueta robusta e comprida, e traços de energia verde começaram a colorir e substituir o roxo da Conjuração.

Após algum tempo, a cor mudou completamente para verde e essa forma cresceu algumas dezenas de metros, até que a energia verde se transformou em algo físico e palpável, revelando o corpo daquela criatura conjurada.

Grandes asas surgiram em um corpo longo e sustentado por 4 patas. Seu relho era comprido, sua cabeça era longa e seus olhos verdes como esmeralda. Suas escamas pareciam madeira de árvore, coberta de musgos e vinhas mais longas do que deveriam, e seu rosto possuía uma barba verde e bagunçada.

Depois de mais de um século preso no subterrâneo, Feykron finalmente estava livre.


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