O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 42: Ritual

Algumas horas se passaram e o grupo ainda cavalgava o mais rápido que podiam para o Vale Recluso. Já não era possível ver o reino de Krimisha, e dificilmente podia-se avistar algum animal vagando por aquele lugar desolado.

— Luna, use magia de Alteração novamente e veja se estão nos seguindo — disse Sariel.

— Certo.

Se concentrando, a princesa olhou ao redor por um bom tempo.

— Tem umas 10 pessoas cerca de um quilômetro e meio atrás de nós.

— Alguma delas tem o elemento Alteração?

— Não.

— Ótimo, me avise se deixarem de nos seguir — disse Sariel. — Agora, vamos discutir nosso plano de ação.

— O que vamos fazer? — perguntou Ashoka. — O povo pode se tornar hostil contra nós se tentarmos parar o ritual.

— Por isso faremos tudo de maneira sorrateira. É claro que teremos de interromper o ritual para que as pessoas não percam suas almas, mas faremos de uma maneira que não suspeitem de nós — explicou o viajante.

— Como faremos isso?

— Decidirei isso quando avaliarmos a situação lá, portanto vamos focar na parte mais importante disso tudo.

— Encontrar a Seita por trás disso — disse Aegreon.

— Exatamente, é impossível que um pequeno grupo tenha feito algo tão grande, então definitivamente há uma grande Seita agindo nas sombras, manipulando Sharaad e todo o reino.

— Mas como faremos isso? — perguntou Ashoka. — Os soldados protegerão as identidades dessas pessoas com a maior cautela.

— Felizmente temos os dois elementos necessários para isso: com Alteração identificamos aqueles que possuem o elemento Conjuração, e com Ilusão nos esgueiramos entre eles.

— E o que faremos após encontrar essa tal Seita?

— Destruiremos ela sem deixar ninguém escapar — disse Sariel com convicção.

Ao ouvir isso, o rei emérito se silenciou.

Após essa breve discussão, todos seguiram a viagem concentrados em seus objetivos, quando Luna percebeu algo.

— Aquelas pessoas pararam de nos seguir.

— Parece que estamos chegando perto então.

Mais algumas horas se passaram e o sol se pôs eventualmente. A lua começou a se erguer cada vez mais alta no céu, quando finalmente avistaram luzes na distância.

O relevo era ainda mais acidentado ali, e seria quase impossível trafegar a cavalo se não fosse pelas estradas.

Conforme se aproximavam, viram uma multidão formando uma grande fila em uma escadaria de centenas de degraus, onde no fim havia um grande templo esculpido dentro da rocha de um morro.

Na entrada do templo era possível ver vários guardas armados e atentos, além de alguns na metade da subida que revistavam o povo, mas o que mais chamava atenção era as pessoas que protegiam, os realizadores daquele ritual.

Todos vestiam roupas relativamente curtas, revelando os braços e pernas cheios de pinturas com tinta vermelha. O conteúdo das pinturas se assemelhava com letras, mas o idioma era totalmente desconhecido.

Alguns até possuíam cobras se enrolando em seus corpos, enquanto outros batucavam uma espécie de tambor de madeira em um ritmo lento e em tom grave, acompanhado de uma melodia ritualística de uma espécie de flauta.

Porém havia uma figura especial em meio a eles. Era um homem careca e velho, tão magro que era possível ver claramente seus ossos, e com uma longa barba branca e maltratada. Vestia apenas uma tanga e sentava-se de pernas cruzadas em uma espécie de altar quadrado feito de pedra escura, com tochas roxas iluminando cada ponta dele.

Em sua testa havia uma pedra circular roxa e brilhava quase como um terceiro olho, e a tinta que pintava seu corpo era totalmente escura.

Na sua esquerda e direita, havia grandes baús de madeira com centenas — talvez milhares — de pedras de Conjuração dentro.

As pessoas se aproximavam dele e se ajoelhavam com as palmas unidas como oração. Em resposta, o idoso também unia suas mãos e sussurrava palavras indiscerníveis à pessoa ajoelhada diante de si.

Depois, um homem ao lado dele — provavelmente um ajudante — se aproximava, apanhava uma das pedras e entregava nas mãos da pessoa, que segurava a pedra e rezava.

Passado alguns segundos, a pessoa abria os olhos com surpresa e lágrimas nos olhos, agradecendo o sábio por tê-la convertido e a Shiva por ter respondido à alguma pergunta que sempre a afligia.

— Luna — chamou Sariel.

— Há algumas pessoas com o elemento Alteração, mas não são muito fortes — respondeu ela rapidamente.

— Quão poderoso em comparação com Shiina?

— Shiina é muito mais poderosa, é como comparar um elefante com uma formiga.

— Shiina, preciso que você use magia de Ilusão no meu lugar para manter o disfarce de Aegreon — disse o viajante. — Também mascare minha aura.

— Certo. — A assassina se concentrou por um breve tempo, e o grupo percebeu uma suave luz rosa contornar o Pilar e Sariel.

Depois o viajante fechou os olhos e se manteve parado por alguns segundos. Ninguém percebeu naquela hora, mas Luna pôde ver claramente a cor rosa da aura dele mudando aos poucos para marrom.

“Então é assim que se parece quando ele muda de elemento...”

— Segurem-se firme — disse Sariel.

— O que pretende fazer? — perguntou Ashoka.

— Vou chacoalhar um pouco as coisas.

Após dizer isso, um tremor súbito apanhou todos de surpresa, fazendo com que se desequilibrassem e caíssem no chão, procurando qualquer objeto para se segurarem.

— TERREMOTO! SEGUREM-SE FIRME E EVITEM FICAR ABAIXO DE FORMAÇÕES ROCHOSAS! — gritaram os guardas.

Com a força do abalo, rochas se desprendiam do vale e caiam com força no chão, apesar de não parecer um terremoto muito forte.

Contudo, após uns segundos, o terremoto se tornou ainda mais forte e uma enorme fenda se abriu onde o sábio estava, e todas as pedras de Conjuração perto dele caíram no abismo. Os guardas e ajudantes tentaram o máximo que puderam para evitar que as pedras se perdessem, mas só conseguiram salvar algumas dezenas, ignorando o sábio que só sobreviveu graças ao próprio reflexo.

Depois disso o tremor reduziu aos poucos até cessar completamente.

Luna olhou para Sariel novamente e percebeu a cor de sua aura retornando à cor rosa.

— Isso dará algum tempo extra para estas pessoas, mas não é uma solução a longo prazo — disse o viajante. — Vejamos como irão agir e depois decidimos nosso plano.

Após o choque inicial, os guardas rapidamente assumiram o controle da situação e orientaram o povo a tomar cuidado e esperar, pois ainda era possível que outro terremoto ocorresse.

Enquanto esperavam, os guardas e os sábios discutiram em segredo sobre o que fariam. Como não ocorreu outro tremor, logo se decidiram e dispararam ordens.

— O ritual será adiado para amanhã de noite, portanto iremos providenciar a vocês um lugar para aguardarem e alimentos para comerem. Sigam o caminho à sua direita e encontrarão um acampamento construído especialmente para situações como essa.

Seguindo pelo caminho mostrado pelos guardas, o povo — e o grupo — atravessou uma passagem estreita e cercada por altas paredes de pedra em ambos os lados.

Como os guardas estavam focados em recuperar as pedras que haviam caído na fenda que se abriu, o grupo conseguiu passar facilmente despercebidos por eles, mesmo que fossem os únicos com cavalos ali.

A travessia durou cerca de meia hora, já que havia muitas pessoas se movimentando por um caminho estreito, além de que o acampamento era relativamente longe dali.

Finalmente a passagem estreita se abriu e revelou uma área circular do tamanho de um vilarejo com casas construídas em pedras marrom. As paredes da travessia ainda se erguiam bem alto ao redor daquele lugar, portanto não era possível saber o que havia ali perto.

— Por aqui! Escolham onde querem ficar organizadamente. — Os guardas guiavam o povo pacientemente, quando finalmente perceberam Ashoka e o grupo. — Ah, Vossa Majestade, não esperava sua presença aqui. Quem são eles?

— Ah, eles... estão aqui para ver Sharaad — disse o rei emérito nervosamente.

— Compreendo, de fato o conhecimento de Shiva é algo que muitos desejam — respondeu o guarda como se tivesse entendido algo completamente diferente que Ashoka disse. — Também se converterá, Majestade?

— Err... sim!

— Oh, isso alegrará muito sua esposa e filho — disse o guarda. — Porém devo me desculpar, não há nenhum aposento apropriado para Vossa Majestade.

— Não é necessário se desculpar, o que importa é que sirva de moradia temporária.

— És muito gentil. Por que não fica em uma das casas mais próximas? Assim será o primeiro a se converter amanhã — disse o guarda enquanto apontava para uma das casas mais próximas da passagem que vieram.

— Sim! Claro! Muito obrigado — agradeceu Ashoka enquanto caminhava para onde o guarda apontou.

Seguindo o rei emérito, o grupo se dirigiu em direção à pequena casa e deixaram os cavalos fora. Assim que entraram perceberam se tratar de uma pequena moradia com apenas 3 cômodos: a sala de entrada, o quarto e um banheiro.

Qualquer mobília ou decoração estava caída ou fora do lugar devido ao terremoto causado por Sariel, mas não havia nenhum dano aparente ali.

O quarto apenas podia comportar 3 pessoas, portanto parte deles teriam de dormir na sala.

Ou era isso que Ashoka achou que aconteceria, mas Sariel tinha outros planos.

— Luna...

— Estamos sendo observados constantemente.

— Então eles irão se certificar que não iremos sair... Provavelmente até checarão durante a noite se está tudo bem.

— Significa que não podemos sair, pois mesmo se sairmos com ilusão eles eventualmente entrarão aqui e perceberão que não estamos — disse Raymond. — O que faremos?

— Temos duas opções, eu ou Shiina ficamos aqui para manter uma ilusão o tempo todo e fazê-los acreditar que todos estão aqui, mas seria arriscado já que estaremos separados, o que é uma péssima ideia considerando que estamos lidando com uma grande Seita.

— E quanto a outra opção? — perguntou Shiina.

— Bem, posso usar a gema de Ilusão que Aegreon possui e criar uma ilusão automática que se manterá ativa mesmo com todos fora usando magia de Selagem — sugeriu o viajante. — Porém, se demorarmos muito é capaz da gema se esgotar completamente, o que seria desvantajoso no futuro.

— Espera, uma gema de Ilusão? — perguntou Raymond. — Como conseguiu isso?

— Yaxun me deu como agradecimento da ajuda que me devia anos atrás — disse Aegreon.

— O que prefere, Aegreon? — perguntou o viajante. — A gema é sua afinal de contas.

O Pilar encarou o viajante profundamente, quando enfim tirou debaixo de seu manto uma gema rosada grande — pouco maior que sua mão — e jogou para Sariel.

— Muito bem, o melhor lugar para deixar isso seria... — Sariel caminhou pela casa até parar bem de frente a uma parede. — Aqui. Bem no centro desta construção.

O local que havia se referido era entre a sala de estar e o quarto. O viajante se agachou e removeu um pedaço quadrado do chão e colocou a gema nesse buraco.

— Shiina, preciso que assuma a magia ao nosso redor agora.

— Certo. — A assassina ergueu a mão esquerda enquanto brilhava em uma luz rosa. Em seguida, essa luz se espalhou por todas as paredes, chão e teto do local.

Depois, Luna percebeu Sariel trocando seu elemento novamente.

Porém, ao invés de sua aura adquirir um tom marrom, ela se tornou prateada, assim como seus olhos que tinham uma cor prata encantadora que Luna nunca tinha visto antes, como se fossem duas luas presas em seus olhos.

Em seguida, letras prateadas surgiram nos braços do viajante e se dirigiram à suas mãos.

Aproximando-se da gema, as letras na mão do viajante flutuaram em direção do objeto como correntes buscando acorrentar e cobri-la completamente.

As letras formavam palavras estranhas para Raymond e Shiina, como “assidue”, “semper”, “incantio” e “alucinatio”, que se enrolaram ao redor de toda a gema.

Depois, a palavra “obiectum” seguida das letras “A” a “F” se repetiu várias vezes, também acompanhadas de palavras como “stabilis” e “somnum”.

Mas havia algo de especial na palavra “somnum”, pois as letras pareciam ser formadas de outras palavras, tão pequenas que era impossível lê-las.

Após dezenas de palavras prateadas cobrirem a gema, ela enfim apagou e retornou à sua cor original.

— Pronto, a ilusão está ativa — disse Sariel enquanto recolocava o pedaço do chão no lugar. — Vamos partir agora.

Apenas neste meio tempo em que ele escondeu a gema já foi o suficiente para que trocasse seu elemento para Ilusão.

Sem se demorar, o viajante se dirigiu para a porta de entrada sem temer que fossem vistos.

— Espera! — disse Ashoka. — Seremos vistos se sairmos pela frente.

— Estou mantendo uma área com uma ilusão que todos dentro dela ficam invisíveis para quem está fora — disse Sariel. — Deixe-me mostrar a área para lhe ajudar.

Ao dizer isso um círculo rosa de 5 metros de raio surgiu ao redor do viajante.

— Então basta que fiquemos dentro dessa linha estamos invisíveis? — perguntou o rei emérito.

— Exato, agora vamos.

Sem se demorarem, todos seguiram Sariel para fora da casa. Naquele ponto havia poucas pessoas chegando no acampamento, já que a magia de Selagem do viajante havia demorado para ser realizada, apesar de não parecer ter demorado tanto para Luna, que observou o processo sem tirar os olhos da gema em nenhum momento.

Graças à ilusão do viajante, foram capazes de caminhar tranquilamente em meio dos guardas e atravessaram a passagem estreita por onde vieram.


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