O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 33: Soberano do Gelo

A nevasca havia se tornado mais intensa do que nunca. Era absolutamente impossível para Indra ver qualquer coisa, e sentir seu oponente também não era uma opção.

Como se não bastasse seu oponente ser capaz de esconder suas intenções, a quantidade imensa de poder de Gelo tornava difícil sentir qualquer outra aura mágica ao redor.

O Pilar do Raio tentava, a todo custo, prever os movimentos do viajante, lançando relâmpagos poderosos em várias direções, errando miseravelmente.

— MOSTRE-SE, SEU COVARDE!

Contudo não obteve resposta.

O gelo, os dragões e as esferas de energia, atacavam incansavelmente.

Indra tentava se defender, quando achou ter ouvido o sibilar do vento sussurrar algo.

— ...co

— O quê?! — Olhou ao redor confuso, aquela voz não era de Sariel.

— Fraco...

— Inútil...

— Perdedor...

Naquele ponto, Indra não sabia se estava ouvindo coisas, mas o vento da nevasca parecia zombar dele, com vozes que definitivamente não conhecia.

— CALA A BOCA! — Sentindo raiva da nevasca, que zombava dele, tentou usar seus raios para enfraquecê-la, mas seus esforços eram inúteis, era como tentar socar a água do oceano na esperança de destruir a água.

— Como um fraco como você se tornou um Pilar?

— Você mancha a reputação do Conselho com sua falta de poder!

— Se acha tão especial por fazer parte dele, mas só se aproveita de sua fama para ser venerado pelo público!

— CALA A BOCA! — Disparou inúmeros relâmpagos ao redor. — EU NÃO SOU ASSIM.

— Mente a si mesmo numa tentativa de não encarar a verdade...

— ... mas no fundo sabe que és apenas um lixo!

— CHEGA!

Usando suas últimas forças, Indra atraiu todos os relâmpagos que pôde novamente em sua espada e lançou um corte giratório, conseguindo, com certo sucesso, abrir um pouco a nevasca e observar ao redor.

Foi quando ouviu um som alto e agudo, fazendo-o olhar para trás.

Então percebeu Sariel a alguns metros de distância e rodeado por uma imensa quantidade de energia azul, a mais pura forma do Gelo.

Ele mantinha seu braço direito levantado, com a glaive flutuando a alguns centímetros acima de sua mão.

Contudo havia algo de errado com sua arma, pois estava totalmente ofuscada por uma luz azul cegante, tornando impossível ver sua forma real.

Ao perceber que Indra o viu, Sariel sorriu.

Em seguida, todo o elemento Gelo ao redor começou a ser sugado até a glaive de Sariel, seja a neve no chão, no ar, nas árvores... tudo foi condensado na arma, reduzindo até o poder da nevasca e tornando possível ver melhor os arredores.

Como um imã, tudo pertencente ao Gelo cobriu a glaive e girou ao redor dela, adquirindo um formato de elipse. A arma foi coberta totalmente em uma magia poderosa, cujo som era como o de milhares de tornados presos em um único objeto, e o frio que emanava dali, parecia congelar até mesmo o ar.

Apesar da habilidade de Sariel de suprimir seus sentimentos, Indra foi capaz de perceber claramente que aquela magia era dezenas de vezes mais poderosa do que sua magia de Raio que acabara de usar.

Sentindo urgência, o Pilar do Raio tentou correr na direção do viajante para interrompê-lo.

Porém já era tarde. Apesar de aquela ser uma magia que levava tempo, Sariel já havia começado ela muito antes de Indra o ter percebido.

Em apenas alguns segundos, toda a neve que cobria a floresta foi atraída para a glaive. Na verdade, a magia havia usado tanto de gelo do ambiente, que foi possível ver a cor original do chão e da floresta, que estava em ruinas devido à batalha.

Então, a magia estava completa.

Até mesmo o frio havia sido sugado para a glaive.

Os olhos de Indra se arregalaram em terror, e sentiu seu corpo congelar ao notar aquilo que estava iminente.

Em uma vã tentativa de se proteger, colocou a espada na sua frente com alguns relâmpagos a fortalecendo.

Mas era tarde demais.

O viajante arremessou a glaive na direção do Pilar do Raio, que se moveu mais rápido do que qualquer coisa que ele viu em sua vida. Bastou um microssegundo para a arma alcançá-lo e perfurá-lo.

A arma atravessou seu estômago com facilidade, porém não sentiu dor, sua carne foi instantaneamente congelada no momento que foi tocada, entorpecendo seus sentidos.

Porém não acabou por aí.

Com a força do arremesso, Indra foi empurrado por quilômetros de distância junto da arma.

Em apenas alguns segundos, foi levado de sua posição inicial até uma pequena montanha, cujo tamanho era similar com a Montanha de Fogo.

E foi ali que a magia explodiu violentamente.

Indra achava que sua magia era poderosa, mas o que presenciou — e sentiu — foi algo que nunca havia vivenciado antes.

Uma grande esfera de luz azul engoliu totalmente a montanha, e ainda se espalhou por alguns quilômetros, destruindo tudo ao redor.

Aquela magia seria poderosa o suficiente para destruir todo o reino da Montanha de Fogo e ainda varrer parte da floresta do mapa.

Enquanto a explosão ainda se espalhava, uma onda de choque varreu tudo ao redor, acompanhado de um frio tão intenso, que qualquer ser vivo em um raio de dez quilômetros de distância seria instantaneamente morto e congelado.

A nevasca retornou mais poderosa como nunca, com ventos capazes de pulverizar até mesmo rocha.

Então, finalmente, a explosão acabou.

Não restou nada além de uma cratera de cinco quilômetros de diâmetro, com seu interior totalmente branco, congelado e estático.

E no centro da explosão, jazia uma figura caída, deitada e, por muito pouco, viva.

A glaive de Sariel permanecia atravessada no estomago de Indra, porém ele não sentia nada, o frio havia congelado totalmente seu corpo, poupando-lhe da dor.

Suas roupas estavam rasgadas, e seu capacete havia se quebrado, revelando seu rosto.

Seus cabelos eram escuros e tocavam seus ombros, e suas grossas sobrancelhas reforçavam suas feições faciais sérias. Seus olhos eram violetas e enérgicos, e não possuía nenhuma barba.

Um cansaço súbito e uma sonolência profunda se abateu sobre ele, fazendo suas pálpebras pesarem toneladas.

Manter os olhos abertos nunca foi uma tarefa tão difícil quanto agora.

Tentava mover seu corpo, mas nada respondia. Tinha que se concentrar até mesmo para respirar, que era uma tarefa extremamente difícil.

Ele estava acabado, sabia muito bem disso.

Aquela batalha fez Indra perceber que Sariel era mais poderoso que o Pilar do Gelo e por uma grande diferença. 

Não... Na verdade, o poder dele até rivalizava com o de Feng Ping.

A cada respirada, seus pulmões doíam como o inferno, como se estivesse constantemente sendo perfurada por milhares de minúsculas agulhas.

Era apenas uma questão de tempo até que o viajante aparecesse para finalizá-lo.

Aquilo o fez se sentir extremamente frustrado, levando-o a beira das lágrimas.

Havia falhado o trabalho que lhe foi dado, e nem mesmo chegou perto de derrotar seu oponente.

Neste momento, Indra se lembrou de sua infância em Krimisha. Desde muito cedo foi respeitado por sua habilidade impressionante em batalhas e seu grande poder mágico.

Ele sempre foi o garoto talentoso que conseguia tudo o que queria e era admirado por todas as garotas, causando inveja aos outros garotos que não podiam fazer nada, já que não conseguiam derrotá-lo mesmo em um grupo.

Foi por este motivo que, ainda na adolescência, foi chamado para ajudar na guerra que assolava a humanidade a anos, conseguindo inúmeras vitórias e subindo vários ranks nos exércitos de Krimisha.

Um dia, contudo, todos seus companheiros foram derrotados em um ataque. Ele foi o único sobrevivente e lutou contra centenas de anjos ao mesmo tempo, causando um espetáculo de relâmpagos no céu.

Graças a isso, Ardos e Feng Ping chegaram bem a tempo de ajudá-lo.

A maneira como ambos foram capazes de lidar com aquilo com tamanha facilidade fez Indra admirá-los e desejar se tornar forte como eles.

E ele viu em Feng Ping um rival a ser superado, visto que ambos tinham uma idade parecida.

Nas batalhas seguintes, seu ódio pelos Anjos o tornou ainda mais forte, sendo capaz de derrotar centenas deles sozinho, salvando seus companheiros que sempre o agradeciam com enormes sorrisos.

Não demorou muito para que reencontrasse Ardos, onde foi chamado para lutar ao lado dele e de outras pessoas no mesmo nível de poder.

Graças à liderança de Ardos, a humanidade foi capaz de se reerguer e derrotar os anjos.

Nesse meio tempo, enquanto a guerra ainda acontecia, a rivalidade entre Feng Ping e Indra começou, com o Pilar do Raio sempre perdendo.

Apesar dessa rivalidade, o Pilar do Vento nunca agiu com desprezo para ele. Na verdade, ele parecia feliz em tentar ensiná-lo.

Mas tudo mudou subitamente, quando os anjos atacaram o reino onde Feng Ping vivia e mataram seu tutor e figura paterna.

Ao lembrar disso tudo, Indra finalmente percebeu algo.

Feng Ping não o desprezava, apenas ainda estava lidando com a morte de seu tutor, fazendo-o se tornar uma pessoa fechada.

— Porque... só fui perceber isso agora? — Sentiu-se profundamente arrependido por só ter entendido os sentimentos de seu companheiro na beira da morte.

O Pilar do Raio permaneceu deitado enquanto seus próprios sentimentos o devoravam lentamente.

— Te encontrei...

Indra tentou levantar a cabeça e olhar para o dono dessa voz, mas nem mesmo isso era capaz de fazer. Desistindo disso, ele simplesmente esperou, já sabia muito bem quem era.

— Está mais calmo agora, huh? Esfriou a cabeça? — Sariel apareceu no seu campo de visão, esboçando um sorriso jocoso ao fazer aquela piada.

— Anda logo e me mata. Se demorar muito, recuperarei minhas forças.

Haha! Acha mesmo que não percebi o que está tentando fazer?

Ao ouvir isso, uma expressão de dúvida se formou no rosto de Indra.

— O que quer dizer?

— Você foi enviado para investigar a situação na Montanha de Fogo, provavelmente uma suposição de que estaria ligado com Aegreon raptando o anjo. Seguindo os rastros do necromante e da floresta congelada, chegou até nós.

— E daí?

— Vocês do Conselho são proibidos de se matarem, portanto, se for encontrado morto, o Conselho irá supor que ou Aegreon os traiu, ou outra pessoa tão poderosa quanto um Pilar está envolvido nisso. As duas opções levarão o Conselho a nos investigar com todas as forças.

Ao ouvir isso, Indra sorriu.

— Sim, é isso mesmo. Se me matar, colocarão ainda mais esforços para pará-los. E se me deixar viver, me recuperarei e serei um obstáculo que você poderia ter eliminado. Posso ter perdido, mas o Conselho ainda ganhou...

— Tem certeza disso?

— Absoluta. Você perdeu! Pode me matar, pois meu trabalho como parte do Conselho foi concluído. Minha morte salvará a humanidade!

Foi então que um sorriso surgiu no rosto de Sariel.

— Está se esquecendo de um detalhe muito importante... Eu poderia muito bem alterar suas memórias e fazê-lo se esquecer disso.

Há! Vai fazer isso como? — riu Indra. — Eu sou um Pilar, e seu elemento principal nem é Alteração! Se fosse como Koeus, o Pilar da Alteração, seria capaz disso. Admita que você perdeu!

Ao ouvir isso, Sariel simplesmente riu. Não era uma risada de desespero ou uma risada eufórica, e sim, uma risada suave e contida, de alguém que ouviu algo errôneo sendo dito, e ele conhecia a resposta.

Sem entender aquela reação, Indra tentou olhar o rosto do viajante, quando viu em seus olhos algo que o fez reviver um sentimento que havia se esquecido desde criança.

Medo...

— Vo-Você... é u-um Volátil? — Sentiu seu coração congelar.

— Surpresa! — Sariel imitou um pai revelando um grande presente de aniversário à sua filha. — Pena que vai se esquecer de tudo isso... — Aproximou lentamente sua mão, que brilhava em um tom marrom.

— Es-espera! Se apagar minhas memórias, o Conselho suspeitará! — Indra tentou persuádi-lo.

— É por isso que irei alterá-las um pouco. Farei você acreditar que lutou contra a Seita de Elgor e perdeu seu braço no processo, assim como sua arma.

— Meu braço?! — Indra tentou, a todo custo, se mover, mas era completamente inútil.

— Sim meu caro... — Sariel agarrou o braço direito de Indra, que ainda segurava sua espada longa. — Seu braço...

E, com um puxão forte, o viajante arrancou o braço do Pilar do Raio, fazendo-o grunhir de dor.

Felizmente, ou infelizmente, seus sentidos ainda estavam entorpecidos, portanto não sofreu tanto.

— Urgh! O que pretende fazer com minha arma?

— Ora, nem gritou, como esperado do Conselho. Quanto à sua pergunta, darei a um amigo importante. Agora, deixe-me fechar esse ferimento. — O viajante usou magia de Proteção para curar o ferimento no braço dele, mas apenas no braço. — Bem, hora de conhecer os segredos do Conselho! — Se aproximou e tocou a testa dele.

— NÃÃÃO! — gritou Indra, tentando resistir futilmente à magia de Sariel.

“Não posso deixar! Tenho que avisar o Conselho sobre este homem!”

Porém sua mente foi logo invadida sem o menor esforço. Ele tentou embaralhar suas memórias para dificultar o processo, mas parecia que o viajante sabia muito bem o que procurar.

Após algum tempo, Sariel se afastou dele

Hmm, então Aegreon realmente não está trabalhando para o Conselho... — Após dizer isso, ele ficou pensativo por um tempo. — Bem, hora de mudar suas memórias.

— NÃÃO! — gritou Indra novamente, sentindo sua mente ser invadida e suas memórias transformando-se aos poucos. — ARDOS, FENG PING, ME SALVEM!

Indra tentou resistir como pôde. Não podia deixar ele descobrir mais sobre o Conselho, não podia perder a informação que adquiriu sobre ele, e não queria que suas memórias com Feng Ping fossem alteradas, justamente agora que percebeu os motivos por trás das ações dele.

Mas... era inútil. Ninguém viria para ajudá-lo, e aquele homem escaparia ileso.


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