O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 32: Relâmpago Rebelde

Enquanto isso, a batalha entre Sariel e Indra prosseguia.

Cada golpe trocado deixava uma marca no chão devido ao poder absoluto de ambos. Seria apenas uma questão de tempo até que aquela floresta fosse devastada.

Apenas a força da nevasca do viajante era o suficiente para derrubar as árvores, e mesmo Raymond e Shiina tinham de tomar cuidado para não serem empurrados.

Apenas Luna escapava completamente ilesa de tudo. Não sentia frio nenhum, e o vento era como uma brisa. Apesar de todo aquele caos, era como um dia agradável de primavera para a princesa.

— Por que o elemento principal dele é Gelo? —  Aegreon estava visivelmente confuso. — Era para ser Ilusão...

— Não sei por que, — Shiina precisava gritar devido ao barulho do vento — mas ele deve ter feito de propósito para te enganar!

— Então ele não é do Conselho?! — gritou Raymond.

— Não... Conheço o Pilar do Gelo, e não é ele.

Mas então, se Sariel não era do Conselho, e estava até lutando contra um Pilar, então quem diabos era ele? O que ele queria?

Essas perguntas repetiam-se na mente deles, enquanto a fúria do viajante e o Pilar do Raio varria tudo no caminho.

A espada de Indra estava completamente coberta em relâmpagos, tornando impossível ver a lâmina, e os raios estendiam o comprimento da arma, tornando-a duas vezes maior.

Uma esfera de relâmpagos de três metros o rodeava, como uma esfera de plasma, protegendo-o de algumas das magias do viajante e lançando raios incessantemente na direção de seu oponente.

Contudo errava a maioria dos golpes. Sariel era tão imprevisível quanto Feng Ping. Ler seus movimentos e prever seus ataques era impossível, e até mesmo sua magia era difícil de detectar.

Tal agressividade e poder destrutivo deveria ser impossível sem haver um pingo de intenção assassina por trás, mas Sariel, de alguma maneira, era capaz de usar magias mortais sem nenhum sentimento.

O que antes era apenas um duelo havia agora se tornado em uma guerra de poder, onde ambos os lados lançavam magias poderosas que, quando se chocavam, criavam grandes explosões.

Ambos usavam a mais pura forma de suas magias. O gelo de Sariel se condensava em esferas de energia azul instáveis e voavam com uma trajetória irregular e difícil de ser prevista, enquanto os raios de Indra destruíam árvores e sua lâmina cortava tudo ao alcance.

Sons de explosões abafados pela nevasca e pelos relâmpagos se repetiam dezenas de vezes por segundo, e mesmo assim, o viajante sempre encontrava uma brecha na defesa de Indra e o feria.

Indra era constantemente cortado, perfurado, e explodido pelas habilidades de Sariel. Se não fosse por sua resistência física sobre-humana, já teria sido derrotado.

— Por quê?! — O grito frustrado que dera parecia ter vindo diretamente de sua máscara demoníaca. — Por que é capaz de fazer isso?

O Pilar do Raio disparou na direção do viajante e balançou sua lâmina, mas seu ataque foi bloqueado com facilidade com a glaive.

— Parece que não aprendeu nada com Feng Ping, huh? — provocou o viajante com um tom jocoso e um sorriso confiante. — Perderá esta batalha por não refletir nos próprios erros.

— CALA A BOCA!

Indra transferiu uma quantidade absurda de poder para sua espada e cortou horizontalmente.

Uma lâmina de eletricidade com dezenas de metros de comprimento cortou tudo em uma grande área, atravessando inúmeras árvores e rochas como se fossem manteiga.

E é claro, Sariel condensou seu gelo em sua glaive e parou o golpe.

Logo que as duas armas entraram em contato, uma poderosa explosão destruindo tudo que estava a algumas dezenas de metros na proximidade.

Dessa vez, o viajante não havia saído ileso, mas isso não importava, sua magia de proteção o curou logo em seguida.

Ouch! Devo dizer que isso doeu um pouco. — Limpou a poeira de suas roupas e sorriu.

Aquilo apenas fez o Pilar do Raio ainda mais irado. Aquele sorriso desdenhoso e aquela falta de sentimentos em uma batalha como aquela o fez lembrar cada vez mais do Pilar do Vento e de como ele o desprezara. Aquele maldito se achava tão superior a ele que nem aceitava mais lutar contra ele.

Segurando sua arma com força, Indra avançou contra Sariel ao mesmo tempo que se lembrava de um combate que tivera anos tempo atrás.

 

***

 

Indra caminhava confiantemente pelas ruas do Éden. Por todo lado era possível ouvir sons de marteladas e ordens sendo gritadas.

Todo o reino estava agitado devido, pois os Anjos finalmente foram expulsos e as reformas se iniciaram.

O Pilar do Raio caminhou pelas ruas esburacadas e lotadas de escombros devido à guerra.

Inúmeras construções que antes se erguiam altas, agora estavam parcialmente ou totalmente destruídas.

Indra subia a pequena colina onde estava localizado o Astrum Lux, o portal que trouxe os Anjos àquele mundo.

Seu formato era de um grande arco, com cem metros de diâmetro, e era todo branco. O material não era mármore ou prata, e sim, algum tipo de material totalmente desconhecido e poderoso que era absolutamente indestrutível.

O Conselho tentou várias vezes destruir o portal para impedir os reforços dos Anjos, mas nem mesmo um arranhão foi marcado na superfície desse material.

Era uma medida desesperada, pois dava pena de ter de destruir algo tão belo, mas, infelizmente, foram incapazes de danificá-lo.

O portal parecia feito literalmente de luz, com altas estatuas humanas protegendo a passagem e centenas de pequenos itens similares aos broches que os Anjos usavam ao longo de toda a circunferência do arco, apesar de haver alguns buracos onde parecia que faltava algo para ser inserido.

O portal estava desativado, mas isso não significava que era motivo de relaxar, pois ninguém sabia exatamente como o portal funcionava. Ele simplesmente se abriu um dia e fechou no momento que os Anjos deixaram o mundo humano, portanto não se sabia se os eles o ativavam ou se havia outro fator. Por isso, inúmeros membros da Vigília estavam de guarda no local.

Todos vestiam uma armadura prateada com um manto com um desenho de uma mão masculina alcançando e tocando por muito pouco uma mão feminina. Este era o símbolo adotado pela humanidade, onde a mão masculina representava os humanos, e a feminina, a Deusa Kura.

Chegando mais perto do portal, percebeu um grupo da Vigília reunido ao redor de duas figuras. Uma delas era Clementius, o Pilar da Proteção e braço direito de Ardos, enquanto a outra era Feng Ping, o Pilar do Vento.

Clementius tinha uma postura majestosa e confiante, digna do conselheiro de Ardos, apesar de sua expressão gentil e acolhedora. Seus cabelos eram longos e loiros, e seus olhos eram azuis e gentis. Suas roupas eram douradas e tão belas quanto sua aparência, como se Kura tivesse pegado um pedaço do sol e costurado uma roupa especialmente para ele.

Já Feng Ping, tinha longos e lisos cabelos cinza, com olhos escuros e puxados, e portava uma expressão calma. Vestia um quimono preto com detalhes brancos, similares ao soprar do vento, e segurava uma lança comprida com três e meio de comprimento. Sua aparência exalava calma e controle, dádivas que herdara de seu mestre.

— Tentamos retirar os broches, mas eles não saem — disse um dos guardas.

— Além disso, há quatro espaços vazios, se algu...

— Te encontrei! — Indra basicamente gritou assim que avistou Feng Ping, interrompendo a conversa. — Vamos duelar! — Apontou o dedo a ele, demonstrando que não aceitaria um “não” como resposta.

Ao ouvir aquilo, o Pilar do Vento suspirou e disse calmamente: — Não é hora para isso, Indra.

— Tens fugido de mim desde que se juntou à guerra, mas não aceitarei mais desculpas! Te seguirei até as Montanhas Prateadas se necessário.

Mais uma vez, Feng Ping suspirou.

— Está bem... vamos para o oeste, onde há um campo arrasado pelas batalhas.

— Eu os acompanharei para ter certeza de que não farão nada absurdo — disse Clementius com uma voz suave. — Caso o portal se ative, acione a magia e retornaremos o mais próximo possível — explicou para os guardas da Vigília.

— Sim senhor!

Com isso, os três deixaram a capital arrasada do Éden e se dirigiram ao oeste, onde havia um campo deserto e sem vida, resultado de inúmeras batalhas travadas ali.

Conforme caminhavam, eram sempre cumprimentados e reverenciados pelos civis, que paravam todas as suas tarefas para demonstrar seu respeito e gratidão ao Conselho.

Assim que chegaram no lugar planejado, Indra e Feng Ping se distanciaram.

— Pode começar — disse o Pilar do Vento.

Assim que ouviu isso, o Pilar do Raio partiu com toda sua velocidade na direção dele e com dezenas de relâmpagos cobrindo seu corpo. Até um segundo atrás, o céu estava totalmente limpo, mas se escureceu no momento que ele iniciou sua investida.

O Pilar do Vento respondeu imediatamente, criando um enorme tornado que o engoliu, evitando a aproximação de seu oponente.

Dragões no formato de serpentes feitos de vento se formaram e atacaram o Pilar do Raio, que respondeu da mesma maneira, criando águias elétricas para batalhar contra os dragões.

Uma batalha aérea se iniciou, onde cada lado protegia seu invocador e tentava atacar seu oponente, resultando em fortes explosões no ar.

No chão, os dois Pilares duelavam e disparavam magia um contra o outro. Dezenas de magias com o poder de destruir um vilarejo colidiam, destruindo ainda mais a paisagem já desolada.

Para pessoas comuns, parecia que ambos estavam furiosamente tentando matar um ao outro, mas Clementius observava a batalha com calma, demonstrando que era apenas um duelo amigável.

Até o momento, tudo parecia “normal” quando se tratava daqueles dois, mas havia algo de diferente: Indra conseguia sentir, pela primeira vez, os ataques de Feng Ping. Finalmente, sentia a agressividade e fúria nos ataques de seu rival.

Animado por finalmente perceber que havia alcançado seu rival, ele aumentou sua velocidade e tentou a todo custo atingir o Pilar do Vento, conseguindo alguns cortes superficiais na pele dele.

— EU FINALMENTE POSSO SENTIR VOCÊ! HAHAHAHA! — Uma alegria eufórica tomou conta dele, convencido de que havia evoluído.

Animado, Indra preparou seu ataque mais poderoso. Apontando sua espada para o céu, centenas de relâmpagos se condensaram em sua espada longa, aumentando seu tamanho para várias dezenas de metros.

Os céus brilharam por quilômetros em um espetáculo de luzes, prova do poder absoluto de Indra, digno de sua posição no Conselho.

Em seguida, cortou horizontalmente na direção de Feng Ping.

Era claro que aquele golpe não mataria o Pilar do Vento, pois ele seria capaz de se defender, apesar de sair com alguns ferimentos consideráveis.

Entretanto algo de estranho aconteceu. Feng Ping simplesmente desfez todas as usas magias e permaneceu parado, olhando para as próprias mãos com olhos espantados.

Indra achou que aquilo era uma manobra para enganá-lo, já que Feng Ping não teve tempo de conjurar uma magia de mesmo nível, por isso ele prosseguiu com seu ataque.

Contudo percebeu tarde demais que aquilo não era atuação.

O Pilar do Vento não se moveu, completamente ignorante do perigo iminente, e a magia estava prestes a atingi-lo.

Ele teria morrido se não fosse por Clementius, que se colocou na frente de Feng Ping e criou um poderoso escudo dourado, bloqueando completamente a magia de Indra.

Sem entender o que havia acontecido, o Pilar do Raio gritou indignado: — O que está fazendo?! Quer morrer?

Entretanto, o Pilar do Vento ignorou as palavras do parceiro, se virou e para a direção oposta do Éden.

— Ei! Estou falando com você! — Indra se enfureceu com o descaso de Feng Ping.

O Pilar do Vento sempre o tratou de maneira indiferente, mas nunca o ignorou como fazia agora.

— Não quero lutar... — A voz de Feng Ping demonstrava irritação. — Me deixe em paz.

Furioso, Indra avançou contra Feng Ping pelas costas e atacou com uma estocada. O Pilar do Vento não reagiu, e teria sido atingido se o Pilar da Proteção não tivesse agido e bloqueado o golpe.

— Chega, Indra. Feng Ping não deseja lutar.

— Só porque eu aprendi a sentir seus golpes vai me ignorar é? — gritou irritado. — Está com medo de perder?

No entanto o Pilar do Vento apenas o ignorou e seguiu seu caminho.

— Só aceitava minhas batalhas porque gostava de me menosprezar e se sentir melhor que eu né! Volte aqui e vamos acabar com isso!

Porém Feng Ping, sem nem mesmo olhar para ele, disse: — Não fale mais comigo.

Aquilo enfureceu profundamente Indra. Todos no Conselho se tratavam respeitosamente, mas Feng Ping era o único que o desprezava.

— Se acha muito só porque é o segundo mais forte do Conselho!

Percebendo a fúria do Pilar do Raio, o Pilar da Proteção agarrou seu braço firme, mas gentilmente, e disse calmamente: — Basta, Indra. Feng Ping está indisposto.

— Isso é desculpa então ser um esnobe de merda?!

— Por favor, Indra. Ninguém o força a fazer nada, respeite a vontade de seu colega.

Percebendo que aquela batalha havia encerrado, Indra se soltou de Clementius e seguiu o caminho oposto que Feng Ping seguia, indo até o Éden.

Depois daquele dia, o Pilar do Vento retornou às Montanhas Prateadas e nunca mais saiu dali.

Um dia, Indra visitou Feng Ping e tentou conversar com ele, mas não bastasse a maneira grosseira como foi recebido, também fora desprezado.

— Você trilha o caminho de Shura. Não desejo contato com ninguém de seu tipo. — O olhar do Pilar do Vento o fuzilou.

— Eu?! Um Shura?! Depois de tudo que fiz no Conselho?! — gritou Indra, se segurando para não fazer nada estúpido.

— Você disfarça boas ações com sua sede de sangue e batalhas igual a Aegreon! Agora, deixe minha casa ou proíbo sua entrada neste reino.

Ao ouvir aquelas palavras, Indra cerrou os punhos com tamanha força que parecia ser capaz de quebrar sua mão. Ser insultado e chamado de Shura era algo que jamais toleraria, ainda mais de um esnobe como Feng Ping.

— Melhor isso do que ser um inútil que passa todos os seus dias fazendo nada!

— Já lhe mandei ir embora.

O Pilar do Raio se levantou abruptamente e o encarou por um momento, quando decidiu não perder mais tempo e se virou, partindo daquele lugar e nunca mais retornando desde então.

 

***

 

Indra tentava de todo jeito ferir Sariel, mas tudo resultava em falhas ou ferimentos superficiais. O rosto desdenhoso e a falta de emoções de seu oponente o fazia odiá-lo com mais força do que Feng Ping, que sempre mantinha uma expressão neutra, seja no dia a dia ou em uma luta.

Impaciente com aquilo, Indra decidiu acabar com aquela luta ali mesmo, sem se importar se mataria Aegreon, seu companheiro, algo proibido pelo Conselho visto o quão valiosos são os Pilares para a humanidade.

Ambos já haviam se afastado tanto do ponto inicial que agora lutavam em cima de um lago congelado, relativamente perto de alguns morros.

Apontando sua espada para o céu, ordenando que os relâmpagos o fortalecessem, milhares de raios se condessaram na lâmina e brilharam, emitindo uma luz branca ofuscante.

A força dos raios era tanta, que antes mesmo da magia ser liberada já destruía qualquer coisa ao redor, rasgando a terra e transformando em pó qualquer vegetação.

O som de tantos relâmpagos concentrados era ensurdecedor, um barulho indescritível e assustador, como o rugido de um gigante esfomeado.

Estava quase de noite, mesmo assim, reinos e vilarejos a quilômetros de distância viram o céu se iluminar intensamente, como se um segundo sol houvesse se formado acima das nuvens de Vilon.

Sariel percebeu aquilo e tentou lançar todas suas magias para parar Indra, e ele, apesar de estar controlando uma magia tão complexa, ainda era capaz de comandar os raios para bloquear alguns ataques.

Claro, ele ainda foi ferido, mas não o suficiente para ter seu ataque cancelado.

E, apesar da quantidade colossal de poder, foi capaz de completar sua magia em apenas alguns segundos, tudo graças à natureza do elemento Raio de ser capaz de acumular magia rapidamente.

Falhando em parar a magia de Indra, Sariel tentou preparar um bloqueio, mas era tarde demais.

O Pilar do Raio, em um movimento único, desferiu um corte de cima para baixo, mesmo com Sariel a alguns metros de distância dele.

O viajante tentou fugir, se proteger, mas desviar daqueles raios em específico não era uma tarefa fácil.

Sendo incapaz de fazer qualquer coisa, Sariel viu a espada de relâmpagos descer em sua direção.

Então, uma larga coluna de energia violeta destruiu tudo em uma linha de quilômetros de comprimento, e sua altura chegando quase até as nuvens.

A magia durou alguns segundos, com o brilho dos milhares de relâmpagos iluminando toda a região.

Então, quando os raios de dissiparam, tudo que restou foi uma imensa vala, se estendendo até além da vista.

A neve diminuiu de intensidade, e Indra, satisfeito com sua vitória, sorriu.

Mas não por muito tempo.

— Essa magia de fato é poderosa... — disse uma voz atrás dele.

Assustado, o Pilar do Raio se virou e viu o viajante, com suas roupas parcialmente rasgadas e queimadas, além de várias queimaduras em sua pele, que não tardaram a se curar sem deixar nenhuma marca.

— O... quê?! Como?! Isso teria matado até mesmo Feng Ping.

— Se fosse mais forte teria conseguido, mas devo dizer que estou desapontado com seu poder. Feng Ping é tão poderoso que o superestimei... ou talvez você seja apenas fraco. — Então, a nevasca se tornou mais forte que nunca, tornando tudo a um palmo de distância invisível.

— CALA A BOCA! EU VOU TE MATAR! — Indra conjurou seus raios novamente.

Porém, como havia usado muito magia no seu golpe supremo, estava cansando e lento.

Além disso, como a visibilidade era basicamente zero, apenas lançava ataques desajeitados no ar, desperdiçando sua força.

— Agora... — A voz de Sariel parecia vir de todos os lados. — É hora de mostrar minha técnica suprema!


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