O Primeiro Serafim Brasileira

Autor(a): Anosk


Volume 1

Capítulo 2: Solitária Princesa de Prata [2]

Luna entrou em seu quarto e sentou-se enquanto aguardava que as criadas a vestissem.

Devido ao acontecimento mais cedo, nem percebeu que havia apenas uma pessoa hoje. Normalmente, teria visto e a cumprimentado, mas, nesse momento, queria evitar o contato com qualquer pessoa.

Enquanto aguardava, inúmeros pensamentos invadiram sua mente. Sabia muito bem sobre a situação atual de Fordurn e do ultimato de Ardos, por isso tentou inúmeras vezes convencer seu pai a deixá-la se entregar, mas ele se recusava e admitiu que, se fosse preciso, travaria uma guerra para protegê-la.

— Aqui estão suas roupas de hoje, Alteza.

A voz da criada a despertou Luna de seus pensamentos. Ela olhou para a roupa escolhida e foi surpreendida com um conjunto para viagens longas, semelhante a uma túnica. O conjunto todo era discreto e a cor predominante era marrom, totalmente diferente do branco que geralmente usava.

— Uma roupa para viagem? Mas eu não posso sair do palácio.

— Sinto muito, Alteza... Eu queria que as coisas fossem diferentes, pois sei como você é uma boa pessoa, mas não temos escolha — disse a criada com uma voz pesarosa.

— O que...

— Ei! Ela já terminou de se vestir? — perguntou uma voz masculina do outro lado da porta.

— Ainda não — respondeu a criada.

— Ande logo! Em breve Raymond retornará, não podemos falhar agora.

— Alteza, por favor, seja rápida!

— Tudo bem...

Luna então despiu seu belo vestido branco e vestiu a roupa que a criada havia selecionado. Em seguida, removeu o broche que estava em sua roupa anterior e colocou em sua túnica, perto da região do coração.

Esse broche era feito de prata, tinha um dragão que formava um círculo e comia a própria cauda, e havia uma pedra azul brilhante no formato da lua no centro.

Este broche era extremamente importante para ela, pois, de acordo com seu pai, era a única herança de sua família biológica, portanto ela sempre o mantinha consigo.

Após se vestir, a princesa saiu do quarto e viu três homens esperando. Dois eram guardas que já tinha visto uma ou duas vezes, e o outro era um dos conselheiros de seu pai. Seu nome era Adrian, era careca e sempre foi a favor de entregá-la a Ardos, contudo seu pai sempre descartou seus conselhos.

No entanto ele nunca a tratou como aberração, na verdade era gentil e se importava com ela, entretanto jamais aceitaria que o povo fosse sacrificado apenas para protegê-la.

— Alteza... — começou o conselheiro com pesar.

— Está tudo bem, Adrian. Eu o compreendo. — Não era preciso explicar nada, ela já havia entendido o que estava acontecendo.

— Eu... sinto muito. Nós tentamos dialogar com Ardos, mas ele insistiu por este caminho. Estamos sem alternativas, e a Vigília é invencível... Eu realmente queria que houvesse outro jeito... — Ele era incapaz de olhar nos olhos dela e hesitava bastante enquanto falava.

— Não se desculpe. Eu já insisti muito para que meu pai atendesse as demandas de Ardos, mas você o conhece. Pelo menos, isso me dará a chance de salvar Fordurn.

Conforme dizia isso, seu olhar, que sempre era triste, se tornou ainda mais doloroso e solitário. Luna já havia se decidido há muito tempo, e agora chegou a hora de aceitar seu destino e abraçar sua morte.

Sua vida estava condenada no momento que nasceu, portanto ela seria morta mesmo se ficasse no palácio, seja pelos próprios guardas ou pela Vigília.

Se pelo menos ela não tivesse nascido um anjo... Ela poderia ter vivido tranquilamente, sem ter de preocupar seu pai e envolver tantos inocentes.

Enquanto isso, o conselheiro permaneceu em silêncio após ouvir as corajosas palavras da princesa. Ele tentou dizer algo mais, no entanto tudo que conseguiu fazer foi gaguejar palavras indiscerníveis.

Como não conseguiu dizer nada, apenas se virou e disse: — É melhor nos apressarmos, vamos!

Adrian avançou na frente com Luna logo ao lado e os dois guardas atrás. Os quatro seguiram o caminho pelo antigo calabouço do palácio que atualmente estava abandonado com pó acumulando e teias de aranhas se formando, por isso era pouco usado pelos empregados do castelo.

— Ainda bem que aquela magia de Ilusão durou tempo o suficiente para enganar Raymond — comentou um dos guardas. — Não sabia que você podia usar magia.

— Não posso, tenho pouquíssimo poder mágico. Só consigo manter aquela ilusão corporal por um minuto — respondeu o outro guarda.

— Silêncio! Há alguém vindo — sussurrou o conselheiro.

Os quatro se encolheram rapidamente atrás de uma grande estátua posicionada na parede do corredor. Logo após se esconderem, duas vozes masculinas se aproximaram deles vindo de uma bifurcação à direita de onde o estavam.

Os dois guardas passaram no corredor logo à frente do grupo e seguiram reto para a esquerda. Os passos diminuíram conforme se afastavam até que sumiram completamente.

— Eles foram embora, vamos! 

— Cer...

— Senhor Adrian? — disse uma voz feminina atrás.

Os quatro se viraram rapidamente ao ouvir esta voz, e os guardas quase sacaram suas espadas com a surpresa.

No fim, se depararam com uma mulher por volta dos 50 anos e cabelos castanhos presos em um coque, uma das empregadas responsáveis por cuidar de Luna.

— A-Alguma coisa de errado? — Ela se assustou com a reação do conselheiro e dos guardas.

— Ah! So-Sophia! O que está fazendo aqui? — Adrian falhava miseravelmente em esconder seu nervosismo.

— Eu estava indo para a lavanderia, este caminho é mais rápido. O que Vossa Alteza faz aqui? — questionou ao perceber a princesa.

— Estávamos... estávamos indo para lá também!

— Mas por quê?

— É que... Sua Alteza queria usar um certo vestido, mas disseram que estava na lavanderia! Por isso vamos lá para ver se já está pronto!

— Ah, certo... mas por que Raymond não está aqui? Ele não deveria ficar 24 horas por dia próximo de Vossa Alteza? — Sophia não estava acreditando na história. A voz de Adrian soava extremamente falsa e ela estava visivelmente desconfiada.

— Sobre isso... — O conselheiro tentou encontrar alguma desculpa, contudo apenas conseguiu ficar em silêncio.

Os guardas ficaram incomodados com a situação, olharam para Sophia de maneira hostil e as mãos quase desembainhando suas espadas. Muitos sabiam o quanto Sophia gostava da princesa, por isso eles estavam prontos para silenciá-la antes que fizesse algum escândalo.

— Raymond precisou ajudar a conter o povo nas muralhas. Mais cedo, um civil acabou invadindo o palácio, por isso meu pai o enviou para lá — explicou Luna.

— Mas Vossa Alteza não deveria esperar que Raymond retornasse antes de se arriscar pelo palácio?

— Está tudo bem, estou com Adrian afinal.

— Mas ainda assim é perigoso! E se encontrarem alguém que apoia Ardos? Não perderiam a chance de fazer algo agora.

— Tem razão... neste caso, posso incomodá-la para que verifique se meu vestido está pronto enquanto volto para meu quarto? É aquele com as costas abertas e flores desenhadas em prata.

— Ah, tudo bem! Retornarei ao seu quarto o mais rápido possível! Com licença. — Sophia passou pelo grupo dobrando o caminho à esquerda. A princesa raramente pedia algo a ela, por isso ela se sentia feliz em cumprir com o pedido.

— Ela se foi... vamos indo antes que ela volte! — disse Adrian.

Os quatro seguiram rapidamente seu caminho e logo chegaram no lado de fora do palácio.

Já era possível ouvir os gritos e protestos do povo, além das vozes dos guardas gritando ordens enquanto ainda tentavam conter a agitação, o que fez Luna sentir uma leve tontura novamente, mas combateu isso focando-se no objetivo.

Apenas restava passar pelos muros e Luna finalmente iria deixar o palácio pela primeira vez em sua vida.

Ela possuía sentimentos confusos e controversos quanto a deixar o palácio. Todos os 20 anos de sua vida se resumiram àquele lugar, pois seu pai se certificava de que ela teria nenhum contato com as pessoas para que não descobrissem sobre ela.

Apenas quando fez cinco anos que ela ganhou a liberdade de visitar os jardins do castelo, no entanto ela nunca, em sua vida, deixou o palácio, então tudo que sabia sobre o mundo exterior foi por meio de livros e histórias contadas por Geoffrey ou Sophia.

Por isso, apesar de se sentir triste por estar caminhando em direção de sua morte, ela também se sentia levemente animada de poder ver o mundo de fora antes de morrer, além de um alívio por finalmente estar acabando com aquela confusão.

— Estamos quase lá, agora é só subir a escadaria e pular o muro ao sul. Depois, desceremos o rio para o reino Lorelia, pedimos escolta e vamos ao posto da Vigília mais próximo.

— Ainda bem que o povo está chamando a atenção de todos os guardas no portão ao norte, caso contrário nossa fuga não teria sido tão fácil — comentou um dos guardas.

— Ainda não acabou, foco no objetivo.

O grupo continuou se esgueirando e se escondendo em qualquer objeto que encontravam, logo chegando perto o suficiente para avistar as escadas que levava ao topo.

Ao chegarem perto da muralha, avistaram uma figura estranha bloqueando as escadarias. Parecia ser um homem, entretanto não era possível ver claramente seu rosto e corpo, pois ele vestia um comprido manto preto com capuz, portanto só podia-se notar que este homem era bem alto, tinha pele escura e seus olhos eram roxos.

Ao verem esta figura, os guardas que estavam acompanhando-os imediatamente se colocaram na frente de Luna e Adrian com suas espadas empunhadas.

— Quem é você? — perguntou o conselheiro.

— Estava esperando — disse o estranho com uma voz grave e intimidante. — Entreguem-na e permitirei que vivam.

— Perguntei quem é você! A quem você serve e o que quer com Sua Alteza? Responda, caso contrário estes guardas terão de usar a força!

O homem ignorou a pergunta e começou a caminhar lentamente em direção dos quatro. Seu olhar era frio e ameaçador, sua postura era imponente, e seus passos eram firmes e fortes.

— Ra-Rápido! Matem-no! — ordenou Adrian.

Os guardas moveram-se rapidamente. Luna apenas piscou e ambos já estavam desferindo o primeiro golpe com suas espadas. O estranho desviou do golpe de um deles na sua esquerda, e agarrou a espada do outro com suas mãos.

— O quê!?

O primeiro guarda tentou perfurar seu oponente pelas costas com a espada, no entanto o homem o chutou com uma velocidade desumana, e sem tirar os olhos do outro que tentava soltar a espada das mãos dele.

Em seguida, o pegou pelo pescoço, pressionou contra o muro do palácio e levantou o punho.

— Última chance.

Após se levantar, o guarda que havia sido chutado tentou atacá-lo novamente.

Contudo, antes que pudesse acertá-lo, o estranho desferiu um soco no guarda encurralado.

— Espere! — O grito da princesa foi abafado por um estrondo tão alto, que era como se um raio tivesse caído ao seu lado.

Pedaços de concreto do tamanho de barracas de feira voaram em direção às casas próximas.

O impacto criou um tremor tão intenso que a princesa pensou estar no meio de um terremoto, e quase se desequilibrou.

Uma novem de poeira envolveu todos, bloqueando a luz do sol e reduzindo a visibilidade.

Luna ficou sem reação. Ela havia lido inúmeras histórias sobre guerreiros com força e velocidade sobre-humanas, entretanto sempre achou estas histórias forçadas e que até mesmo a fama do Conselho era exagerada.

Porém, agora mesmo, ela presenciou um estranho destruindo uma fortificação apenas com sua força física. Neste momento, a única coisa que se passava em sua mente era se tudo isso era apenas um sonho.

Fez-se um silêncio mortal que pareceu durar uma eternidade, apenas o som de sua respiração podia ser ouvido.

A poeira baixou aos poucos até que se pode ver novamente o homem misterioso.

Para a surpresa de todos, o guarda estava vivo, porém ainda agarrado e com uma expressão de puro terror. Era como se a morte em pessoa estivesse segurando-o e olhando no fundo da alma dele, pronto para ceifar a vida dele a qualquer momento.

O destino dele estava nas mãos daquele monstro que fez questão de brincar com sua vida, mostrando o poder desumano dele e errando o golpe de propósito.

Adrian estava paralisado, enquanto Luna era a única que permanecia calma, ou era o que parecia, pois toda essa situação era tão fora da realidade que era como se tivesse se esquecido de sentir qualquer emoção além de surpresa.

O silêncio prosseguiu por mais alguns longos segundos, até que o homem soltou o guarda, que caiu de joelhos no chão devido ao ato súbito. Ele tentou se levantar, mas as pernas não respondiam devido ao medo.

— Dez...

— O qu-quê?

— Nove...

Ao ouvir isso, ambos os guardas não ousaram permanecer ali para descobrir o que aconteceria caso esta contagem chegasse a zero. Adrian e os guardas correram o mais rápido que jamais fizeram em toda a vida, deixando Luna para trás, que ainda não sabia como reagir.

— SOCORRO! — gritavam com puro pavor nas vozes enquanto fugiam em disparada.

Os gritos foram diminuindo conforme se afastavam até que cessaram completamente.

O homem então olhou para a princesa e disse: — Vamos embora.

— O... O quê? — disse baixinho, como fizesse essa pergunta a si mesma.

— Em breve os guardas e o povo estarão aqui. É melhor aproveitar esta oportunidade para ir embora antes que nos vejam.

— Você está me... ajudando?

— Sim, agora vamos.

— Eu não entendo... por que está fazendo i...

— Faça perguntas depois, tome. — Ao dizer, isso o homem jogou um manto bem parecido com o dele para Luna.

Ela hesitou por um momento, pois toda esta situação era completamente inesperada, mas no fim decidiu acompanhá-lo mesmo que não soubesse nada sobre ele ou quais eram seus objetivos. Ainda estava surpresa demais para desconfiar dele, então ela simplesmente vestiu o manto — escondendo seu rosto — e seguiu o estranho.

Ambos se esgueiraram pelas ruas da capital de Fordurn. O homem sabia se mover rápida e discretamente, e conhecia bem as ruas abandonadas que eram evitadas pelas pessoas. Graças a habilidade dele, ambos foram capazes de se afastar rapidamente do palácio e sem que ninguém os visse.


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