O Pior Herói Brasileira

Autor(a): Nunu


Volume 1

Capítulo 16: Erich Lume (4)

Flocos de neve. Sim, flocos de neve embeleciam tudo á nossa volta. Nada parecia mais importante que aquele momento agora. Era como se, todo o resto do mundo tivesse desaparecido, como se fôssemos os últimos humanos do mundo. O resto era irrelevante, até mesmo risório.

A silhueta da garota preenchia a minha retina, não conseguia sequer pensar direito. Sua suave voz — tão doce — fez meu coração bater desesperadamente. Com certeza estava frio, visto que, neve descia dos céus. Mas, então por que estava me sentindo tão... quente? Será que estava ficando doente? Era estranho...

A garota de cabelos castanhos não se movia, apenas permanecia olhando para mim. Seu sorriso habitual permanecia. Sim, este era a verdadeira Holly, sem dúvidas. Eu gostaria de continuar observando aquele quadro, entretanto, Holly acabou dando o primeiro passo.

— O que faz aqui, nobrezinho? — Indagou, Holly. — Por acaso, acabou se perdendo do seu palácio de cristal?

Holly amava me provocar, este era o seu jeito usual. Mas, por alguma razão, senti algo diferente em suas palavras desta vez. Parecia diferente de suas brincadeiras habituais. Por alguma razão, ela aparentava estar com algo em seu coração, algo que não poderia dizer a ninguém. Não havia muito tempo que a conhecia, sequer seria capaz de chamá-la de — amiga — talvez, no máximo, conhecida. Contudo, aquele garoto parecia ter a certeza que ela se abriria para mim. Ele era seu amigo e confiou á mim, um completo desconhecido a tarefa de ajudá-la; como se eu fosse algum tipo de herói.

Mas, eu não era um herói. Muito pelo contrário. Pelo que sabia, as ações da minha família estavam bem longes do que um herói faria. E um dia seria eu, o responsável por comandá-la. Porém, por algum motivo, não conseguia deixar de sentir essa sensação esquisita: de que eu estava no lugar, onde deveria estar.

Sem demora, respondi a questão da garota.

— Acho que você também, pelo jeito. O que você, senhorita, faz no meio de toda essa neve?

— Hehehe! Você está ficando cada vez mais afiado, nobrezinho! Que orgulho! — Exclamou a garota, com um sorriso que, por alguma razão, esbanjava confiança.

— Hehehe! Eu não sei do que você está falando...

Por reflexo acabei rindo da mesma maneira que Holly na frente dela. Fiquei com muita vergonha assim que percebi que a mesma havia notado. A garota que se mostrou surpresa num primeiro momento, transbordou felicidade. Seu riso provocante me fez sentir uma pequena sensação de derrota. Porém, diferente do que houvera pensado, Holly não me provocou mais. Ela apenas se voltou mais uma vez ao céu.

Ficar parado ali, não me ofertaria nada. Então, me movi em sua direção ficando a cerca de uns 2 metros dela. A neve ainda pairava sobre nós. Por mais que estivesse tão perto de Holly, seu coração aparentava não estar ali. Como se encontrasse encoberto no meio de toda aquela neve. Apenas observá-la não me traria qualquer resposta, então, teria que — escavar um pouco.

— O que... você tanto observa?

Hã?! — Exclamou, Holly. Virando seu rosto mais uma vez para minha direção.

— Holly, por que você tanto olha para a neve?

Holly pareceu confusa. Talvez, até um tanto desapontada com minha indagação. Porém, ela nunca foi do tipo de pessoa que diz as coisas diretamente, apesar, de seus sentimentos transparecerem em seu rosto. Depois de soltar um ar de desaprovação, ela pareceu ter conseguido manter a calma para me responder.

He... eu não já havia te respondido, nobrezinho? Eu a acho bonita, apenas isso. — Afirmou, Holly. Porém, como se tivesse se lembrado de algo, ela voltou a falar. — Ah, se você se pergunta sobre aquilo não se preocupe, não é nada demais. É bom observar a neve, para limpar um pouco a mente. As responsabilidades de uma nobre são desgastantes... Hehehe...

— [...]

"Por que... você parece tão triste, Holly?"

— O que eu quero dizer é...

— [...]

Pelo que você tanto espera, Holly?

O sorriso de Holly que se mantinha em seu rosto — imóvel — como em uma boneca, se desestabilizou. Seus lábios que permaneciam intocáveis, agora, pareciam ceder ao mais leve toque — o tremor era visível. O brilho que havia em seus olhos, naquele momento, sumira totalmente.

A garota que estava na minha frente, naquele instante, não mais tinha nenhuma característica da Holly que eu conhecia. Havia um grande vazio em seu olhar, e sua expressão corporal era, no mínimo esquisita. Agora, seu semblante era sério e intocável. Entretanto, por mais que estranhasse sua mudança repentina de personalidade; não podia afirmar que essa garota não fosse Holly. Ao contrário, essa feição parecia mais honesta do que a costumeira.

— Por que diz isso, nobrezinho? — Questionou, Holly? — Creio que não esteja esperando por nada específico. Ou você tem uma ideia diferente?

— Não importa quantas vezes eu olhe para você, para mim, você sempre parece esperar por algo.

— Sério?! E pelo que estou esperando então?! — Indagou com uma voz severa. Diferente do seu habitual.

—...Por um milagre.

Holly pareceu confusa. Não compreendendo minhas palavras. Como se não quisesse acreditar no que tinha acabado de ouvir.

— Desculpa... o quê?

— Eu disse que você espera... por um milagre.

Pffff... Hehehe!!

A fisionomia da garota mudou mais uma vez. Como se eu tivesse contado uma anedota, a jovem nobre gargalhou como se não houvesse amanhã. Ria tanto, que ela mal parecia conseguir se manter de pé enquanto gargalhava.

— Estou errado?

—...Hehehe... Des-desculpe nobrezinho... é que foi muito engraçado...

Sua mudança de postura não era mais surpresa alguma para mim. Holly, como uma verdadeira e recatada dama, voltou mais uma vez ao seu costumeiro. Cada vez mais neve descia dos céus. Nosso tempo estava acabando, como em uma ampulheta. Não conseguia deixar de ficar nervoso sobre isso, mas eu não poderia me acovardar ali.

— Não...

Hã?!

—...Você não está mentindo. Sim, realmente... acho que estou esperando por um milagre.

Não, eu estava errado. Ela estava sim, diferente. Aquela era uma Holly que eu não conhecia. Ela mantinha esse — ar — esquisito, como se tivesse aceitado a derrota em um jogo de cartas. Era irritante por algum motivo, essa definitivamente não era a garota que eu conhecia.

— Porém, nem eu tenho certeza, de que tipo de milagre seria esse...

Eu mal conhecia essa garota. Meu tempo estava acabando e Holly provavelmente teria que ir embora para casa. Se me manteasse calado, a situação se manteria no meu agrado: Holly provavelmente teria que se casar com algum nobre. Em minha mente, naquele momento, pensava que esse seria o melhor para ela. Isso evitaria que ela se metesse em mais problemas e com o devido tempo, ela se acostumaria. Contudo, eu não conseguia deixar de pensar em minha mãe. Sim, ela por alguma razão não saía de minha cabeça.

"Milagres..."

A mulher a qual eu chamava de mãe, não deixou de acreditar em milagres. Ela até o fim de sua vida, se manteve acreditando em um futuro onde eu conseguisse ser livre — longe das garras de meu pai. Mesmo nos seus últimos suspiros, ela ainda mantinha seus olhos em mim; Anna lutou contra o destino até o fim, para me proteger. Naquele momento, outra mulher muito forte lutava contra o seu futuro e assim como a primeira não tinha muitas esperanças. Ainda sim, ela lutava. Mesmo sem resultados ela continuava lutando, todos os dias.

E eu? O que podia falar de um homem que desde pequeno aceitou tudo, e apenas amaldiçoou sua terrível sorte?! Um covarde. Sim, era isso que eu era. Ao meu lado, duas mulheres fortes e corajosas continuavam a batalhar por um porvir diferente, pelo que elas tanto queriam. Por isso, eu não poderia esperar mais nenhum segundo sequer.

— Holly, o que você deseja?

Hã?! O que você quer... dizer com isso...?

— Qual o seu sonho?

— Sonho...

Isso, provavelmente, era uma fala cômica para Holly. Sonhos? Objetivos pessoais? Isso era irrelevante no mundo nobre. Toda sua vida era decidida desde o dia que você nasceu. Se você nasceu como um homem, você já poderia se considerar sortudo o suficiente. Para uma mulher que luta diariamente contra o seu destino, essas palavras vindas de um homem poderiam causar até repulsa em Holly. Mas, eu realmente precisava escutar sua resposta.

— Sonhos?! O que é isso? Desde pequena, não me lembro ser permitida de sonhar. — Exclamou, Holly. Suas sobrancelhas abaixaram e seu olhar se tornou afiado como uma espada. Ela estava visivelmente irritada com minha pergunta. — Você realmente é um nobre? Ou dispõe desse título como uma mera piada?! Você entende como tudo funciona, estou errada?!

— Não. Você está certa.

— E então?!

— Ainda sim, eu gostaria de escutar o seu sonho. Por favor, me diga.

— Você escorregou e bateu a cabeça?!

Ela permanecia firme. Inabalável. Mas, eu já esperava isso. Seria estranho se não fosse assim. Lembro claramente, na última conversa que tivemos em frente a sua casa, de Holly dizer que tinha um sonho. Foi em um momento de fragilidade, eu sei. Mas, tenho certeza de que havia algo real naquelas palavras. Decidi acreditar nelas.

— Eu não consigo te entender...

— Mesmo que não entenda... por favor... — Abaixei minha cabeça, implorando por sua resposta. Isso era uma reação, totalmente inaceitável para um nobre. Principalmente, vindo de um homem.

— Idiota! P-Pare de agir assim...

— Então, por favor, me diga.

— [...]

A neve se amontoava em minha cabeça. O vazio que presenciava naquele momento fazia meus ossos gelarem. Minha coluna doía devido a inclinação do meu corpo. Ainda sim, não levantaria até escutar sua resposta. E ela veio.

— Desde pequena...

— Hã?! — Exclamei levantando minha cabeça ao encontro do rosto de Holly. Naquele instante, em sua feição, ela deixava escapar um singelo sorriso.

—...Eu tenho o sonho de ser uma médica.

— Uma... médica...?

— Sim. Porém, não uma médica comum. Mas, sim, uma médica heroína.

Surpreso com a resposta de Holly, demorou alguns segundos para que eu raciocinasse sobre o assunto.

"Uma médica..."

Hunf! Você também acha que eu não consigo?! — Indagou, Holly. Fazendo beicinho. — Eu sou bem corajosa sabia?!

— N-Não... E-Eu... só fiquei surpreso. Só isso...

Hehehe! Eu sei, estava só brincando...

Notei que a Holly que estava em minha frente, parecia mais — autêntica — que qualquer uma. Doce e gentil, mas também, uma garota de personalidade forte. Ver esse lado dela, me fez ficar um pouco feliz, admito.

— Você sabia que minha vó também era uma médica?

— Não tinha ideia.

Hehehe! Sabia! -1000 pontos pra você, nobrezinho!

— O quê?! Como eu ia adivinhar?!

"E o que diabos são esses pontos..."

Holly, então, mais uma vez virou-se para o céu. Parecia querer dar uma última olhada, como que se despedindo. Contudo, me surpreendi quando notei que ela parecia ter mais a dizer.

— Minha vó... faleceu a algum tempo...

— [...]

— Meus pêsames...

— Não precisa fazer essa cara. — Disse, Holly. Com uma voz doce. — Isso já faz alguns anos. Já está tudo bem.

Por mais que fosse comprometido em me tornar um nobre. Nunca me apeteceu pesquisar sobre as outras famílias e pessoas importantes da região. Na verdade, isso sempre foi um saco pra mim. Isso explica, porque fazia apenas algum tempo que conheci Holly.

— Ela era uma médica incrível! Segundo suas histórias, ela até mesmo fez parte do império real! Minha vovó era incrível! Hehehe!!

Aquelas palavras pareciam fantásticas demais para mim. Não duvido da vó de Holly, mas, ela poderia ter exagerado um pouco sobre os fatos. Porém, isso era irrelevante. Porquê? Porque Holly sorria como eu nunca tinha visto antes. Mesmo debaixo de toda aquela neve, ela brilhava como o próprio sol. Sim, Holly quando sorria sempre brilhou demais aos meus olhos. Nesses momentos, não conseguia deixar de olhar para ela.

— Minha vó... — Percebi mais uma vez, lágrimas. Sim, pequenas e singelas lágrimas que desciam do seu rosto. Eu já tinha visto aquela cena, entretanto, o choque foi o mesmo. — ...Ué...? H-Hehe... Por que estou chorando?! Eu ainda sou muito infantil, não é?!

Por mais que esfregasse seus olhos, as lágrimas não paravam. Como tentar manter uma grande quantia de água nas mãos por muito tempo — era inútil.

Nghh... Sniff...

— [...]

— S-Se eu fosse uma grande médica. Eu poderia s-salvar muitas vidas. — Murmurou, Holly. Ainda chorando muito. — Se eu fosse uma médica como minha vó foi, colocaria sorrisos nos rosto das pessoas...

—...Holly...

— S-Se eu... f...oss...e uma b-boa mé-médica... talvez eu pudesse ter salvo a minha v-vózinha...

Eu finalmente a tinha entendido. Eu achava que não, mas, compreendia esse sentimento: ver alguém importante morrer, mas não poder fazer nada. O sentimento de inutilidade e uma culpa inabalável. Eu a entendia.

— Holly.

H-Hã?! S-Sim? — Indagou, Holly. Tentando desesperadamente enxugar seu rosto.

— Sua avó parece incrível! Eu gostaria de saber mais sobre ela!

— S-Sério?

— Sim. Ela parece tão corajosa e incrível! — Exclamei, com um grande sorriso e uma voz tão animada que até me surpreendeu. — Ela, com certeza, foi uma heroína!

Parecendo se recompor, Holly respirou fundo. Ela até mesmo fechou os olhos, juntando forças para se acalmar.

— Por que diz... isso?

— Como assim?

— Você... realmente a acha incrível? Por quê?

— Ora, isso não é óbvio, Holly?

— ?

— Apenas alguém tão corajosa e destemida poderia ter criado você! Sim! Você realmente puxou ela!

Holly pareceu surpresa com minha afirmação. Talvez, ela não esperasse isso de mim. Isso não seria incomum, visto a minha personalidade habitual. Mas, eu precisava ser honesto com ela.

— Você está falando sério?

— Seríssimo.

É verdade, Holly ainda estava bem confusa. Entretanto, ela realmente pareceu feliz com meu elogio. Seu rosto estava ficando um pouco vermelho e seu olhar tinha alguma inconsistência. Sinto que naquele momento, minhas palavras a alcançaram.

— Holly... eu preciso te dizer uma coisa...

Dei alguns passos rápidos na direção de Holly. Ela pareceu muito confusa e isso aumentou quando eu peguei em suas mãos. Holly praticamente quase deu um pulo de susto.

— S-Sim? — O rosto dela estava tão vermelho quanto um tomate nesse momento. Sua fala também saiu meio estranha.

— Seu sonho... é tão bonito. Por favor, não desista dele. Lute até o fim para alcançá-lo.

Holly pareceu ficar sem palavras. Ainda sim, era isso que eu queria dizer pra ela.

— Vo-Você sabe que não é tão simples...

— Eu sei. Mas, por favor, não desista dele. Se estiver com algum problema, sem dúvidas, eu te ajudarei. Eu prometo!

— Por-Por que você está agindo assim, nobrezinho?

Holly não entendia meu comportamento. Mas, isso era algo que nem eu entendia direito. Há pouco tempo atrás, entendia que ela se casar e viver como uma nobre seria o melhor para ela. Porém, isso mudou quando escutei o seu desejo. Ele é tão nobre e bonito... eu gostaria de ter tido um sonho como esse. Mas, se eu não tinha nem um objetivo como esse ainda, então — assim como a minha mãe fez — eu me esforçaria para que ela fosse feliz.

— Isso, infelizmente, é impossível, nobrezinho. — disse, Holly. Sua expressão se tornou sombria e triste mais uma vez. — Minha família já está se mexendo para arrumar um casamento arranjado para mim. Não dá pra ir mais longe que isso.

— Desde pequena, eu fui criada com esse objetivo. Isso também acontecerá com minha irmã — suspirou, Holly. – e com você também, Erich. Isso é ser um nobre. Você tem muitas responsabilidades e deveres. Ser mais do que isso, é ser egoísta.

— Você me perguntou sobre a neve... quando eu era pequena, minha vó e eu, sempre assistíamos a neve, da janela de nossa casa. Ela me dizia que: quando, enfim, a neve cessasse. Isso significava que coisas boas chegariam: o sol, brincar com amigos, o fim de uma estação...

"Será que algo tão simplório, como a neve, pode acalmar o coração de alguém...?"

—...Por isso, sempre gostei de esperar a — neve — cair... isso sempre me acalmou meus sentimentos. Isso sempre me deu esperanças de algo bom surgiria, de que sempre haveria uma esperança... mas, eu já estou virando uma adulta, uma mulher. Contudo, a neve não parou de cair...

As palavras saíam de sua boca. Mas, era evidente que não era isso que ela queria dizer. Sim, esse rosto... era cheio de amargor e tristeza. Essa, definitivamente, não era a Holly que eu conhecia.

— Não. Isso não é a verdade.

— Hã?!

— Viver pelos sonhos dos outros. Isso é ser egoísta...

— Isso...

— Foi você que me disse isso... Holly...

— [...]

— Holly, eu vivo pelos sonhos de outros. Sou apenas um egoísta covarde. Mas, você... sempre lutou desde pequena contra seu destino... você é uma garota forte, Holly...

— Não... isso não é verdade...

— Sim. Você é uma garota muito forte. — Nesse momento, eu a abracei. Eu apenas senti vontade de fazer isso, porque, tenho certeza que é isso que a vó de Holly faria por ela. — Eu tenho certeza que sua vó diria a mesma coisa. Eu sei que onde quer que ela esteja... ela te observa e tem muito orgulho de você, Holly.

A garota em meus braços era muito forte. No entanto, mesmo sendo forte, ela chorou. Isso não a tornou mais fraca, ao contrário, isso foi apenas uma resposta de sua alma. Uma forma de Holly se expressar. O choro de Holly, não podia ser escutado por ninguém, além de nós mesmos. Suas lágrimas me fizeram chorar também, porque sabia que ela segurava essas lágrimas há muito tempo.

Holly era tratada por todos como um garoto. Mas, ela era mais feminina que qualquer garota. Só que chorar, apenas não era permitido para ela. Mas, ela poderia fazer aquilo agora. Ninguém poderia escutá-la. Era apenas, Holly e eu. Algo incomum, foi a neve. Que por alguma razão, não caía mais dos céus.

                           Fim do Ponto de vista de Erich Lume

— E foi assim que a história termina, Iori... ou quase isso. — revelou, o velhote.

— Como assim?

— Com o tempo, Holly e eu, nos aproximamos cada vez mais. Agora era ela que vivia me chamando na porta da minha casa, Hehehe!

— Não houve algum problema com sua família por causa disso? Holly tinha uma má fama, não?

— Isso não aconteceu, devido a doença do meu pai. Ele ficou de cama e por causa disso, eu tive que assumir a família Lume, no seu lugar. Era uma doença terrível que havia o afligido.

— Hum, entendi!

— Eu só tive que mover uns pauzinho aqui, outro ali e pronto! O idiota pensou que eu estava namorando com a irmã de Holly. Quando ele foi descobrir, já era tarde demais! Hehehe!

— E quem fez o pedido de namoro, você ou Holly?

Hehehe...

— ?

—...Holly é realmente paciente...

"Você é uma vergonha, velhote..."

— Você, então, decidiu se tornar um herói, por causa do sonho de Holly?

— Mais ou menos. — Explicou, Erich. — Holly, por algum tempo, disse que se sentia feliz o suficiente apenas em se casar comigo. Contudo, nossos planos mudaram, devido a aquilo...

— Aquilo? O que aconteceu?

— [...]

O semblante de Erich mudou. Ele parecia incomodado com algo. Como se tivesse se lembrado de um pesadelo terrível...

— Eu... realmente não quero falar sobre isso...

Ah... tudo bem. Não precisa me dizer.

Eu realmente fiquei curioso sobre isso. Mas, existem assuntos que eu sei que dói falar sobre. Por isso, estava decidido a não pressionar o velhote sobre esse tema mais.

— Não... eu preciso te dizer...

Hã?!

— Sim, Iori. Escute com atenção, por favor...

— [...]

                                      Ponto de Vista: Erich Lume

Isso foi algum tempo depois do casamento. Holly e eu, estávamos vivendo felizes, já planejando a nossa lua de mel.

No entanto, recebi uma mensagem de meu pai ( vinda de um dos nossos servos ) para que eu fosse visitá-lo em seus aposentos. Já era noite e nevava muito.

Odiava meu pai, mas, não ao ponto de não poder visitá-lo. Além disso, isso poderia soar estranho na Casa Lume, mesmo que eu fosse o líder no momento. Já passava das 20:00, quando me dirigi ao seu quarto. Estava acostumado a vir aqui sempre, já que algumas decisões só podiam ser tomadas com sua supervisão.

Dei 3 batidas na porta. Fiz isso para que ele escutasse, já que ele realmente estava sendo moído pela doença. Ele dormia a maior parte do tempo, provavelmente, para que as horas passassem mais rápido.

— Entre. — a resposta não demorou a chegar.

— Com licença...

Lá estava o homem que eu chamava de pai. Ele estava acabado. Os ossos de seus cotovelos podiam ser claramente vistos, mesmo na escuridão do quarto. A sua imponência que era conhecida por todos já não existia naquele homem. Talvez, por isso, ele não deixava que qualquer um entrasse no seu quarto.

O homem o qual era meu pai, ligou a lamparina que ficava em cima de sua escrivaninha. Com isso, tínhamos um pouco de luz no quarto.

— Eu não consigo te ver direito... mas, acho que você está bem.

— Sim, estou muito bem.

— Como estão as coisas na família?

— Está tudo muito bem. Todo o preparo que tive desde pequeno, veio a calhar agora.

— Entendo. Isso é bom...

Por mais que odiasse esse homem. Não sentia qualquer prazer pela situação em que ele se encontrava agora. Apenas sentia... pena. Era estranho. Tudo o que via na minha frente, era um homem fraco, covarde, doente e sozinho. Quando ele morresse ninguém sentiria qualquer falta dele. Um homem que sequer confia em alguém para estar ao seu lado, mesmo nessa situação. Era de dar dó...

Seu dinheiro, status e tudo que conquistou era irrelavantes agora. Nem meus seus médicos pessoais conseguiam fazer qualquer coisa por ele. Ele estava acabado.

Aquilo parecia mais uma reunião entediante. Talvez, a última visto a situação dele. Então, apenas decidi escutar tudo logo e ir embora. Não queria perder meu tempo com ele.

— Mas, mudando de assunto...

— Hã? O que foi?

O tom de voz fraco e deprimente mudou completamente. A voz fria, ríspidas e sem piedade do seu auge, voltaram a tona. Quando escutei suas palavras, meu estômago pareceu revirar e um grande calafrio se estendeu pelos meus ossos.

— Eu quero que você se separe da garota Larue.

— O q-quê?!

— Foi o que eu disse. Se separe dela, imediatamente.

Somado ao seu tom severo. Seu rosto era sério e me fazia lembrar do líder maldoso que comandou a família Lume por tanto tempo. Ainda sim, o que ele falava era pura loucura. Nossas famílias já tinham se unido, uma separação nessa altura seria um dos maiores escândalos já vistos. A unica resposta que vinha em minha mente, era que a doença já tinha afetado seu cérebro.

— Você está maluco? Uma separação nesse momento?! Eu não vou me separar de Holly! — Exclamei com raiva e desprezo. Em toda minha vida nunca havia falado assim com ele — Você sequer tem um bom motivo pra falar uma besteira dessas?!!

— [...]

— Você sabia que ela é infértil?

— O-qu...

Aquelas foram poucas palavras, mas, foram suficientes para me deixar em choque. Minha cabeça estava vazia e não conseguia expressar qualquer reação.

Isso era algo que eu havia descoberto com Holly a pouco tempo. Levei ela no médico visto que ela sentia os sintomas de uma gravidez. Estávamos muito felizes com isso, seria nosso primeiro filho. Contudo, descobrimos que se tratava de uma — gravidez psicológica — ou seja, ela apenas queria e acreditava muito que estava grávida. Além disso, tivemos a infeliz notícia de que Holly era infértil, então, uma gravidez seria impossível.

"Merda! Provavelmente, o médico que atendeu Holly tem ligações com a família Lume..."

— Hunf! Infértil... que azar, em garoto... Ghehehe!

— [...]

A risada daquele homem me enojava. Dava vontade de vomitar. Como era asqueroso.

— Bem, não posso dizer muita coisa...

— Hã?!

— Sua mãe sabe... Anna também era uma imunda!

Eu não conseguia acreditar no que estava escutando. Aquele verme estava desprezando a minha mãe na minha frente.

— Aquela mulher me foi dada em casamento. Ghehehe! Inútil! Foi por isso que morreu!

— [...]

— Além de ficar colocando coisas na sua cabeça, a idiota ainda teve a audácia de me desafiar! — Exclamou. — Você acredita que a vadia engravidou de uma garota? Nem pra me dar filhos aquela cadela servia...

— [...]

— Descobri isso quando fomos no médico pela última vez. Era uma garota. Ele usou uma habilidade com o Nill para ver a barriga dela. Assim, que descobri, ordenei aos médicos que matassem a criança assim que Anna realizasse o parto. No entanto, a idiota descobriu e tentou fugir com o bebê e você.

— [...]

— Quando soube disso, eu mesmo dei um jeito nela...

— [...]

— Estava com tanta raiva que quase sobrou pra você também. Mas, isso já faz muito tempo. Você nem deve se lembrar...

— [...]

— Deu muito trabalho, abafar o caso... mas, no fim deu tudo certo. Se você trabalhar direito, creio que ninguém vai notar garoto...

— [...]

— Apenas invente uma traição falsa! Ou...acuse ela de mexer no tesouro da família... alguma coisa do tipo. Caso nenhuma dessas coisas funcione... deixe para seu pai. Eu sei como resolver isso...

Meu pai estava deitado numa grande cama. Eu estava em frente a ele. De junto de sua cama, havia um grande pedaço de madeira, o qual, ele usava para se movimentar. Esse era o mesmo bastão o qual ele me espancou naquele dia, sim, dá pra ver pelo quão o bastão está desgastado.

Me lembro que, antes do bastão chegar em meu corpo, ele já parecia bastante usado. Um líquido vermelho já estava presente na madeira. Mais tarde, descobriria que era o sangue de minha mãe. Naquele dia, perdi minha mãe e minha irmãzinha.

Nevava muito lá fora. Entretanto, isso era irrelevante.

*PAFFFFFFFFFFF

Tudo era irrelevante.

Eu sequer podia notar alguma coisa.

*TCHOWWWWK

Quando percebi, o homem pelo qual tanto desprezei em minha vida já estava morto. Ainda sim, continuei batendo.

*PLOFTTTTTTTTT

O cheiro de sangue era muito forte e o vermelho impregnou por toda cama. Seu rosto, sequer podia ser identificado agora, já que tinha esmagado sua cabeça a pauladas.

A única coisa que lembrava é que ele gritava a todo momento. Gritava para que eu tivesse piedade. Mas, ele não teve piedade de minha mãe. Ela também provavelmente gritou também, chorou também. E ele não parou, não até que ela parasse de responder.

Quando enfim, parei. Fraquejei e chorei. Me senti sujo, pois havia feito o mesmo que meu pai. Até o fim, agi como ele. E não fui diferente dele. Talvez, se tivesse olhado para a neve, teria parado. Não teria me movido. Deixaria aquele homem morrer como ele merecia, sozinho. Mas, não escutei a minha mãe. Apenas agi como sempre fiz, como meu pai.

Quando acabei de me lamentar, virei-me para a janela. A nevasca estava muito forte, talvez, a mais forte que já tenha visto. Já estava acabado, não tinha como voltar atrás. Mas, não conseguia deixar de pensar...

"Será que algo tão simplório, como a neve, pode acalmar o coração de alguém?"

Infelizmente, não achei minha resposta a tempo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Notas do Autor: Todas as Ilustrações dessa novel são feitas por IA. Comentem e façam teorias, leio e respondo todos os comentários

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



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