Volume 1
Capítulo 14: Histórias de Pescador
Era um tempo agradável. A única coisa que se podia escutar era o som mágico da floresta. O encontro do vento com as folhas resultava em um som — quase que místico. Trazia essa sensação esquisita, mas agradável. A aragem fresca do lugar me deu essa impressão — estranha — como se o tempo tivesse parado, mesmo que por alguns instantes.
Segurar por tanto tempo a vara de pesca artesanal, fazia com minhas mãos ficassem formigando um pouco. Já se fazia algum tempo que estávamos ali e não acontecia qualquer coisa.
"Será que realmente tem peixes aqui?"
Esse pensamento continuava a martelar a minha cabeça. Não é como se eu não acreditasse no velhote, porém, já se passou algum tempo desde a última vez em que ele esteve aqui. Vai saber o que aconteceu nesse período...
Estávamos nós dois — sentados um do lado do outro. O velho píer rangia com o menor movimento. Ele parecia estar em bom estado, mas, não é bom ficar testando minha sorte. Por isso, tentava me manter em um estado quase que imóvel. Além disso, sempre que fazia o menor ruído, o velhote me lembrava que o som podia — afugentar — os peixes.
O único barulho que se podia escutar naquela imensidão de folhas e árvores, no entanto, não era de aves ou pássaros. Mas sim, de uma música o qual eu era já um tanto familiarizado. Quando me cansava de olhar para o lago, olhava de relance para minha direita; o velhote cantarolava e assobiava sem parar a sua música favorita. Para quem já estava morando com ele já algum tempo, sabia exatamente o que isso significava: ele estava com um humor excelente.
Dizem que o tempo passa mais rápido quando estamos nos divertindo, então, provavelmente, isso significava que pescar não era tão fascinante quanto achei que seria. Ter esse tipo de pensamento, no entanto, não me deixou muito contente. Parecia que não estava valorizando o presente do velhote.
Eu acho que só... ainda não tinha pegado o jeito da coisa...
Contudo, de repente, a canção que escutava chegou á um fim repentino. Tinha certeza que não era nessa melodia que terminava a música, então, logo estranhei aquilo tudo. Virei meu rosto, mais uma vez, para o meu lado direito e me surpreendi quando vi o velhote olhando fixamente para mim. Bom, pelo menos ele tentava já que seus olhos quase que meio fechados, eram obviamente forçados visto que ele não enxerga tão bem.
— O que foi, Iori? Não está gostando?
— Hã? Que pergunta é essa, velhote? — Tentava ao máximo esconder minha voz de tédio, enquanto respondia sua pergunta. — Só estou um pouco cansado...
— Ah, entendi! Hehehe! – Disse, Erich. Como se tivesse acabado de resolver um enigma. — Você só está entediado! Estou certo, garoto?
— Haha... bem, esconder as coisas de você, não faz nenhum sentido. Você sempre consegue me ler...
— Huhum! Isso é óbvio! Você é tão fácil de ler como um livro aberto, garoto!
— Mas, você não consegue enxergar, velhote.
— Esse não é o ponto!! — Exclamou, enquanto bufava.
— Pfff...
— Hehehe!
É impossível levar esse velho gagá a sério. Ele sempre consegue fazer com que o clima fique mais agradável.
— Huhum! Eu consigo te entender garoto! Mas, para fisgar o peixe é necessário uma paciência sem igual!
— Mas, já estamos aqui há mais de 5 horas!
— Hum... bem, talvez os peixes daqui não gostem muito de pão.
— Ou talvez, eles não gostem de acordar cedo. Hoje é sábado, até os peixes tem dias de descanso!
— Humm... acho que você tá é muito molenga... acho que vou aumentar sua carga de treino...
— EU TAVA BRINCANDO! EU JURO, EU JURO...
— Hehehe!
"Droga... velho maldito!! Vá se lascar!!"
— Você sabe o que é bom pra fazer o tempo passar mais rápido?
— Meu celular? — Disse, despretensioso.
— Celu- O quê?
— Deixa pra lá...
—...?
—...Contar uma história! Isso sempre faz o tempo correr como louco!
Pensando agora... faz sentido. Pescar enquanto alguém conta uma história ou alguma conversa deve ser uma das melhores maneiras de fazer o tempo passar mais rápido.
— Hum, mas qual história devo contar? — Erich suspirou enquanto pensava. — Hehehe! Tenho certeza que você está curioso sobre minhas aventuras como um herói!
O Velho Erich sempre foi um grande contador de histórias. Porém, ele não falava muito sobre sua época como um herói. Com certeza, ele tem muita coisa interessante para falar sobre isso... mas, lembro dele não ter terminado uma história ainda.
— Seria legal. Mas, não seria melhor você aproveitar para terminar a última história que você estava me contando?
— Hã?! E qual seria essa? — Indagou, Erich.
— Aquela sobre Holly. Você havia me dito que vocês tiveram um pequeno desentendimento em frente a casa da família dela, porém, não me disse o que fez ela perdoar você.
— Ah?! Eu te contei essa história? Nem me lembrava!
— Isso não é uma novidade. — Exclamei com uma voz provocante, enquanto sorria. — Seria uma supresa você lembrar... não vou mentir, estou curioso sobre o fim dessa história.
— Hehehe! Você tem uma língua muito grande garoto! — Respondeu, Erich, á minha provocação. — Ok! Está pronto? Vou começar...
— [...]
Ponto de Vista: Erich Lume.
O que a neve tem de tão especial assim?
Aquela garota estranha não saía de minha cabeça já fazia alguns dias. Eu não conseguia de deixar de refletir nas palavras que ela tinha me dito naquele dia.
Vivemos em uma região onde neva a todo momento. Por isso, quando não neva, é quando normalmente as pessoas de nossa cidade mais fazem festa. É o momento especial onde todos podem sair de suas casas e onde as crianças podem sair para se divertir com seus amigos e vizinhos. Entretanto, aquela garota ansiava pela neve que descia dos céus. Seus olhos se encontravam com os flocos e eles pareciam retribuir de volta. Era tão bonito...
Ela tinha me dito que a neve a fazia se sentir melhor — isso tornava de alguma maneira seus problemas mais fáceis de lidar. Ela como um Larue, com certeza, devia ter sido criada com uma educação muito rígida, por isso é difícil de entender a sua tese. Se ela simplesmente quer uma vida mais fácil, ela apenas deveria seguir o seu destino, dessa maneira, ela poderia arrumar um bom casamento arranjado e viver uma vida tranquila e estável como uma nobre.
Contudo, ela parecia querer lutar contra isso. Ela prefere lutar contra seu destino, como que, nadando contra uma forte correnteza. Porém, ela deveria saber que existem — correntezas — que não podem ser vencidas á braçadas. Seu destino é imutável. Ela deveria saber disso, mas que qualquer um. Infelizmente pra ela, suas palavras bonitas não podem ajudá-la nisso.
Na minha opinião, ela apenas deveria seguir o seu destino, por mais doloroso que fosse naquele momento. Mesmo agora, ela luta bravamente contra seu próprio destino — ela é uma garota forte, ela pode fazer isso. Se ela continuar agindo dessa maneira, ela vai acabar machucando alguém ou até mesmo ela, quando isso acontecer aí vai ser tarde demais.
Tomei a decisão de falar com Holly mais uma vez. Sim, ela parece ter ficado um pouco chateada comigo, talvez eu tenha sido um tanto ríspido. Mas, tenho certeza que ela vai entender. No futuro, sei que Holly vai me agradecer por isso!
Já passava das 11:00 da manhã. Aproveitei que a neve, enfim, havia cessado um pouco, e saí em direção a casa dos Larue. Não era tão longe então não seria um grande problema.
O ar frio era insuportável. Eu odeio sentir frio, mas acho que grande partes dos moradores de minha cidade sentem a mesma coisa. Tenho a certeza que as pessoas que moram em lugares muito quentes e lugares onde não neva, devem odiar o calor e sentir inveja de mim. É algo normal do ser humano reclamar do que é lhe dado. Por isso, acho Holly tão intrigante, já que ela parece sentir afeição pela neve.
Ela parece ser uma garota arruaceira. Ela gosta de fugir de suas obrigações e brincar com as crianças da rua, mesmo sendo mais velha que eles. A neve deveria ser a única coisa que deveria atrapalhá-la, visto que a impediria de sair de casa e de fugir das garras de sua família. Então... porquê? Não consigo entender...
Não demorou muito pra chegar na frente da casa dos Larue. Sempre andei com a minha cabeça baixa, mas percebi onde estava quando escutei o barulho das crianças arruaceiras. Elas já estavam correndo de um lado para o outro. Contentes visto que a neve enfim havia cessado. Toda aquela algazarra me irritou um pouco, então, apenas me coloquei em frente ao grande portão da casa Larue; esperava encontrar algum servo da mansão ali.
Talvez eles estranhassem um Lume ali, mas, se eu me apresentasse como — amigo — de Holly, eles provavelmente apenas esqueceriam disso em um piscar de olhos. Isso, porque, eles veriam como uma oportunidade para estreitar laços.
Já estava pronto para falar com alguém, quando, escutei um dos garotos falando comigo.
— Moço, Moço!!
Ele parecia ser um dos garotos que estavam da última vez que estava aqui. Acho que lembro de ter visto ele... eu acho. Fiquei um pouco ansioso, mas decidi ver o que ele queria comigo, antes de qualquer coisa.
— O que foi?
— Você é o namorado de Holly, não é?! Ela não está em casa!
— Namo–
Fui pego de surpresa pela fala repentina do garoto. Mas, depois de refletir um pouco, creio que seja normal para um garoto dessa idade pensar dessa maneira. Contudo, me surpreendi em saber que Holly não estava presente no momento. A neve tinha acabado de cessar um pouco. Isso significava que seria pouco provável que ela estivesse fora antes disso. Então, ela teria que ter saído bem rápido de casa; sendo mais preciso: assim que a neve cessou.
Ainda sim, não queria voltar pra casa de mãos abanando, por isso, decidi que seria melhor fazer uma pergunta primeiro.
— De-Deixando isso de lado... você sabe onde ela está?
O garoto me olhou de cima a baixo, como se tentasse descobrir minhas intenções, ou talvez, eu apenas estivesse um pouco nervoso.
— Ela foi pra ali! — Apontou com o dedo indicador da mão direita para fora da cidade, ao leste, onde um bosque é situado. Se me lembro bem, é nesse lugar que tem um lago que vive congelado, devido ao clima local. — Ela costuma ir pra lá de vez em quando.
— Ah, obrigado garoto.
Satisfeito com a informação que recebi, já estava me movendo em direção ao lugar, quando uma pequena mão segurou com força a minha roupa. Era o pirralho.
— O que deseja? Tem algum problema?
— [...]
Com muita força ele puxava a minha roupa, mas não falava nada. Como se estivesse procurando as palavras certas do fundo de sua garganta.
— V-...
— V...?
— V-Você é, ou não é, o namorado da senhorita Holly? Por favor, seja sincero! — Disse, o garoto com o rosto virado para o chão.
A nossa conversa estava chamando a atenção das crianças e pessoas que passavam pela rua. Eu realmente nunca gostei de chamar atenção, por isso, estava achando tudo aquilo indesejado. Porém, a pequena e franzina mão do garoto, apesar de segurar forte, tremia como se não suportasse alguma coisa. Algo estava o angustiando e ele apenas parecia não saber medir suas palavras.
Eu nunca tive muito tato. Por conviver a maior parte do tempo com meu pai, talvez tenha adquirido sua rispidez e sua forma rude agir com as pessoas. Talvez por causa disso, tanto ele como eu, somos pessoas tão solitárias e fechadas. Não há ninguém que queira se aproximar de um espinheiro. Porém, minha mãe era diferente. Ela era um doce e um amor com as pessoas, e por isso, era amada e cercada de pessoas. Sei disso porque o dia de seu enterro foi um dia de lamúria e luto. Entretanto, mesmo na morte, ela estava cercada de pessoas que a amavam verdadeiramente. Já meu pai, duvido que alguém lamentaria sua morte, nem sua própria família.
— Não sou. Por quê?
— B-Bem... eu vi vocês conversando... e ela parecia bastante feliz...
Estranhei a fala do garoto. Pelo que sabia Holly era uma garota verdadeiramente feliz. Tanto que ela me lembrava muito a forma como minha mãe brilhava junto das pessoas. Por isso, escutar essas palavras me fizeram ficar um tanto perdido.
— Ué, mas ela não é alguém feliz?
— Não! Quer dizer... sim, mas não!
— ?
O garoto soltou a minha roupa e começou a coçar a cabeça, como se buscasse as palavras de lá. Mas, ele parecia muito nervoso, principalmente com a minha presença.
Se eu sou um — espinheiro — então, minha mãe se aventurou entre ele em busca de alguma coisa presa no meio dele. Seria uma rosa? Não sei. Mas, talvez aquele fosse o momento ideal, para eu começar a parar de agir como o meu pai.
Então, me coloquei de joelho na neve molhada. Era frio e nojento. O garoto pareceu surpreso quando coloquei minha mão direita em sua cabeça e ternamente comecei a esfregar seus cabelos. Era difícil fazer contato visual como minha mãe fazia, mas tentei fazer o melhor que podia.
— Tudo bem, garoto. Pode falar.
Notas do Autor: Todas as Ilustrações dessa novel são feitas por IA. Comentem e façam teorias, leio e respondo todos os comentários