Volume 3 – Arco 2
Capítulo 209: “Mãe” e “Filha”
Durante o desabrochar dos seus vinte e cinco anos, Minerva Starborn vivia o que poderia ser considerada a primavera da sua vida: casada há um ano com o homem que amava; Chefe de Laboratório uma das grandes Academias de Batalha, a Leviatã; e, como podia-se ver na barriga levemente protuberante, o sonho de se tornar mãe.
A mulher passou a mão em sua barriga, ansiava pelo dia em que poderia sentir a sua filha se movendo pela primeira vez; sim, segundo os médicos, seria uma fofa e saudável menininha.
— Acho que ainda vai um mês até ela começar a se mexer — explicou Rodolfo, marido da Minerva, enquanto a abraçava por trás da cadeira e cheirava a fragrância do seu pescoço. — Mãe coruja.
— Hehe! Me deixa aproveitar o período de mãe de primeira viagem. — Acariciou sua bochecha no braço do marido. — E nós contamos a gravidez em semanas.
— Nunca entendi isso bem. — O homem riu, discreto, e a mulher também; mas, no fim, o relógio não sabia esperar, e Rodolfo fez companhia ao café da manhã da sua esposa; os dois ainda tinham bastante trabalho pra dar conta naquele dia.
Recém-admitida no cargo de Chefe de Laboratório, após uma demissão problemática da sua antecessora, que vendia amostras restritas por baixo dos panos, Minerva havia pego o bonde, como diziam, andando.
— Hoje o meu trabalho deve acabar bem tarde. — Rodolfo partilhou a informação, um tanto descontente com as horas extras. — Sinto muito. Eu realmente queria poder te buscar todos os dias.
— Haha! Está tudo bem, querido. — Sorriu, apesar que adoraria a concretização do desejo do seu marido. — Eu vou estar te esperando com “algo especial” pra você, hoje à noite.
— Cof! Cof! — Engasgado com o café, o homem cobriu a boca com a mão, a fim de evitar manchas no terno e ter que trocá-lo de última hora. — O que seria esse “algo especial”?
Minerva desconversou com um sorriso ambíguo e uma olhadela tão misteriosa quanto.
Algo especial era algo especial, oras.
A noite chegou, e como Minerva esperava, Rodolfo estava sentado ao seu lado, ou ao lado do seu leito hospitalar. Mal havia aberto os olhos, e a cabeça já latejava.
— U-Uh… Ai! — Levando uma mão até a testa, a mulher fitou o teto branco do quarto de hospital, iluminado por uma pedra de luz branca. — Onde…?
Vasculhando o ambiente de canto a canto, Minerva repousou sua visão sobre o rosto do marido que ia falar algo, mas teve as palavras travadas em sua garganta.
— Querido… — Tentou se levantar, entretanto, a enxaqueca deu uma pontada no alto da sua cabeça, e a mulher teve que regressar ao travesseiro. — O que houve?
— Minerva, você perd… — Rodolfo parou os seus lábios e inspirou com calma, assim como o médico orientou: manter-se calmo como um pilar firme no qual sua esposa pudesse se apoiar. — Você sofreu um acidente enquanto voltava pra casa.
Pequenos flashes de horas atrás piscaram na mente da Chefe de Laboratório: a carruagem que ela havia pegado quando saiu do trabalho; uma colisão repentina com outra carruagem; água, o pequeno rio da cidade; batida de cabeça.
— Urgh… — Memórias conturbadas, que nem o chacoalhar da carruagem enquanto ela tombava no riozinho. — Minha filha…
Ainda grogue, Minerva tateou sua barriga por debaixo do lençol, sem discernimento suficiente para notar qualquer eventual diferença; só queria sentir os chutinhos da criança. Ah, sim, Rodolfo disse que ainda levaria um mês talvez… quatro semanas.
— Está tudo bem, querida. — O homem pôs sua mão sobre a dela, por cima do lençol branco. — Está… Está tudo bem. — Ela estava bem. — Agora pode dormir.
A contragosto, porém sem condições de se opor à exaustão, a mulher lentamente fechou as pálpebras devagar, e o sobe e desce do seu peito diminuiu, antes que conseguisse enxergar o semblante caído do seu marido, que soluçou baixinho.
— É sério isso? — indagou-se Vínia, na mira da cientista armada que havia ficado de fora do conflito, talvez por motivos óbvios. — É só um revólver comum.
“Feriu uma Top Ranking.” Grete corrigiu a parceira em segredo. “É mesmo ‘comum’?”
— Eu mandei vocês ficarem longe dela! — Inquiriu Minerva, fazendo a guarda da Patrona, mesmo que com as pernas tremendo de leve, como a arma em sua mão. — Deixem a Trívia em paz!
Involuntariamente, o duo fitou a criança que se encolhia no chão, com feições de terror e suando frio; poderia chorar a qualquer momento, mesmo inconsciente.
— Trívia é o nome dela? — perguntou Grete, em tom baixo. A Preguiça tinha um nome bonitinho, até lembrava o da Vínia.
— Quem tem que ficar longe dessa capeta, é você, senhora! — rebateu a dita Vínia. — Você sabe o que esse cão fofinho aí fez com a minha pessoa? — Apontou para a dorminhoca. — Ela é uma peste!
Minerva apertou o gatilho, e o eco rouco da arma foi quebrado pelo agudo do projétil sendo fatiado em vários pedacinhos pela lança da Vínia. Ela podia ter perdido a Habilidade Inata, mas ainda continuava sendo bem hábil em combate.
— Olha, senhora cientista. — A lanceira apontou a lâmina da arma para a sua própria testa. — Eu já tô com a paciência por aqui, ó. — Então apontou a lança para a mulher. — Experimenta só atirar em mim de novo.
— Ca-Calma, Vínia.
— Que “calma”, o quê? — Intimidou a Minerva com os seus olhos sanguinários, o que fez a Chefe de Laboratório tremer mais ainda.
Cientistas não foram feitos para o campo de batalha, onde as variáveis corriam à solta, diferente do ambiente controlado de um laboratório; mas a pequena Trívia estava ali, indefesa; se Minerva fugisse, a sua menininha… ela morreria.
— Haff! Haff! — Suando mais que a Patrona, a mulher estava para puxar o gatilho mais vez; ainda que fosse inútil, era tudo o que ela podia fazer para que a menina tivesse tempo de acordar.
— A Pirâmide de Hórus — interviu Grete. — Ela talvez possa dizer pra gente onde é que tá — sugeriu. — Er, senhora. — Dirigiu o seu rosto em direção a Minerva. — Se você contar, a gente deixa vocês vivas.
— É o quê?! — Vínia quase teve um treco; se estivesse fora da mira daquela arma, teria pego a parceira pelos ombros e chacoalhado ela até o cérebro voltar pro lugar certo. — Cê, pirou?!
— Eu conto — expressou-se Minerva. — Eu conto pra vocês. — Era um preço pequeno, além de que, se as duas garotas estavam procurando o dispositivo ali, todo aquele conflito era em vão. — Eu conto pra vocês onde a Pirâmide de Hórus está.
Se Grete abriu um sorriso de alegria, Vínia esbugalhou as vistas a ponto de seus globos oculares quase saltarem para fora das órbitas do seu rosto descrente.
— Mas eu quero uma garantia de que vão nos deixar vivas.
— É, tinha que ser. — A lanceira meneou a cabeça para o lado. — E como que a gente vai fazer isso?
— Vamos todas sair do portal, primeiro. — Minerva respirou fundo e manteve os olhos fixados nas adversárias. — Afinal, a Pirâmide está do lado de fora, não aqui dentro.
“Fora?”, refletiu Grete, levantando o rosto em direção à saída selada pelo veneno da Patrona. — Faz sentido mesmo.
Vínia, por outro lado, coçou a cabeça. Aquela mulher podia muito bem só querer dar um jeito de dar no pé assim colocasse as pernocas dela do lado de fora.
— E onde é que tá exatamente?
— Se eu dissesse, você poderia só cortar o meu pescoço com essa arma agora. — A assassina suspirou. Aquele tipo de negociação era um porre de lidar.
— Ah, tá bom, vai! – Desmaterializando a lança, Vínia apontou para a criança inconsciente. — Acorda a capetinha. — Cruzou os braços e caminhou até o lado da parceira. — Ela tem que liberar a saída pra gente.
Grete acenou positivamente com a cabeça e liberou apenas a Patrona e a Píton da técnica, mantendo as criaturas oriundas do portal em quarentena absoluta.
Trívia acordou de supetão, quase tendo um infarto, um colapso pulmonar e o que mais fosse possível; a visão embaçada pelo sono e pelas lágrimas.
Já a píton, vendo-se liberta, não tardou em se enrolar ao redor da Patrona e mostrar suas presas e língua para as inimigas.
— Está tudo bem, Samael — explicou Minerva, o que fez a píton se virar para ela. — Estamos resolvendo de forma amigável.
“Amigável, sei”, debochou Vínia. “Fala a mulher que me deu um tiro”.
Sem preocupação, e guardando a arma, a Chefe de Laboratório se aproximou da Patrona — a píton permitiu o acesso — e abraçou, com carinho, a menina que soluçava e tremia sem parar.
— Mineerva… — Trívia apertou a mulher, como se abraçasse a mãe que ela tinha perdido. — Medo… Tanto… medo.
— Passou, passou. — Fez um carinho no cabelo da menina, enquanto a píton fazia uma volta nelas. — Vai ficar tudo be…
Um “crack!” repentino, e todas as presentes arregalaram as vistas. Ruindo de cima a baixo, o interior do portal se despedaçava igual vidro frágil.
— Já destruíram a pirâmide? — indagou Vínia. — Com a gente aqui dentro?!
“Isso é ruim, muito ruim!” Minerva tomou ar com calma e pediu para a Patrona, buscando não gerar desespero: — Tire o veneno da saída. Vamos pra casa, tá?
— Uhum… — Mesmo com o rosto enfiado no peito da mulher, Trívia desativou sua técnica; entretanto, em vez de alívio, o desespero só aumentou: Chamas Demoníacas mantinham a saída selada.
— Kaiser… — Mordendo os lábios, para que um grito de raiva fosse contido em sua garganta, Minerva verbalizou em sua mente o que Vínia jogou para fora dos seus lábios:
— Filho de uma cadela!
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