Volume 3 – Arco 2
Capítulo 208: Pilha de Desgraças
— Ar-Argh! — Com a lança do Kaiser empalada em seu peito, era difícil para o parceiro da felina expressar o que doía mais, a perfuração ou a queimação. — Seu… merda… Você… Majin…!
— Lata mais, cachorro moribundo. — Sem dificuldades, o infame levantou mais a haste, forçando a vítima suspendida no ar a ter que segurar no aço quente, para que evitasse de escorregar para baixo.
O pobre coitado gritou de dor; cuspiu sangue com a intensidade da sua voz; a carne das suas palmas chiaram em contato com o metal aquecido; o cheiro forte de queimado subiu até as suas narinas.
— Para com isso! — A felina partiu para cima do seu autointitulado heroi; fosse quem fosse, seu parceiro corria perigo, e a Ressonância insistia em alertar isso.
— Ei, garota — rosnou o majin, com uma expressão fechada e envolvendo-se em Chamas Demoníacas, o que forçou a semi-humana a ter que desistir de avançar e a ter que se afastar da morte. — Isso é jeito de agradar quem salvou a tua vida?
Acuada e com o coração na mão, a felina deu um passo para trás. Como a situação pôde ter mudado de resgate para ameaça tão rápido? Maldito fosse o destino.
— Kaiser… Profenius. — Por que ela tinha que estar atordoada quando o maldito a pegou? Por que tinha que ter levado tanto tempo para reconhecer o majin?
— É, eu mesmo. — Sorridente, kaiser intensificou as chamas da sua lança, para que engolissem o corpo do humano por completo. — Hahaha! — Enquanto um ria, outro gritava e esperneava na escuridão dos globos oculares derretidos.
Os cabelos do humano, como fogo de palha, durou pouco, até que a cremação reduzisse a carne a cinzas, exceto pelos ossos; esses, Kaiser poupou, a fim focar a visão da felina em desespero.
— Ah… Ah… — Dando passos para trás, a semi-humana se virou para correr, batendo o rosto em uma muralha de cristal. — Huh?!
— Podemos ir para a nossa missão agora? — questionou Lilya, enquanto descia até o parceiro e a felina. — Ou a gente vai acabar tendo problemas.
— Já cansei dessa missão. — Desfeito do manto de fogo, o infame se aproximou da felina e tocou o rosto dela, que suava de frio; as costas recuadas no cristal. — Por mim, aquele monstro pode morrer.
O majin cuidou de cobrir a saída do portal de Thornfield com o Fogo do Inferno, um breve desviou de atenção, já que o que mais o interessava a ele estava bem diante dos seus olhos.
Ao contrário do que Kaiser esperava, a frequência cardíaca da felina estava baixa demais, e quem perdeu o foco da sua visão acabou sendo ela.
Pernas bambas, a garota caiu, sendo segurada pelo majin, que confirmou a respiração superficial, o pulso fraco e as mãos frias, mesmo no meio de tanto calor.
— Um desmaio por medo, hein? — O infeliz riu. — Que menina fofinha.
— Isso vai pegar muito mal pra você. — Lilya virou o rosto para Terraemnia e sondou o cenário geral; ela já tinha em mente o que o parceiro queria fazer. — Não que eu me importe, de qualquer jeito.
— Só vamos embora. — Kaiser se levantou, pondo a felina sobre os seus ombros. — Eu vou até desativar aquele círculo. — E de fato, o círculo de fogo que se espalhava por Thornfield sumiu. — Veja como sou atencioso no que faço.
Se aquele círculo explodisse ao fim do Sacrifício Sangrento, ele levaria a criatura do Arklev junto; pra completar, ainda selou a saída do portal, já tinha feito mais do que precisava, ao menos, na sua concepção.
Sem mais o que fazer, o majin desativou o Sacrifício Sangrento e tirou um dispositivo de teletransporte do seu anel de ressonância, ato imitado por Lilya.
— A responsabilidade disso vai ser toda sua, entendeu? — enfatizou a garota, antes de acionar o dispositivo, antes de perceber um raio acima da sua cabeça.
— Hah! — Com a mão que segurava o dispositivo de teletransporte para cima, Kaiser lançou um ataque que queimou o raio de Tília. — Dessa vez, não funcionou, né, belezinha? — falou para o nada. — Vocês decidiram voltar tarde demais aqui!
De qualquer forma, com a conquista de uma excelente semi-humana, ele estava até de bom humor; se estressar com aqueles dois seria um grande porre.
— Em troca dessa garota, vou dar uma diquinha pra vocês! — Jogou o dispositivo de teletransporte levemente para o ar. — Terraemnia nunca morre enquanto está em contato com a terra! — Ao que o objeto retornou para as suas mãos, ele sumiu dali, assim como Lilya e a felina.
— Por que disse aquilo? — indagou Lilya, no meio de um salão desocupado da Organização Perpetuum. — O Arklev vai querer o seu fígado. — A majin parou por um momento, então corrigiu. — Não. O Percatuum…
— Aqueles velhos que se fodam. — Dando as costas para a parceira, o infame caminhou para a porta da saída. — Tenho coisa melhor pra me preocupar agora.
Calada, Lilya deixou ele ir, aviso não faltou. Desde que o único que sofresse por aquele comportamento fosse o próprio Kaiser, e ela iria se certificar de garantir isso, não haveria problema nenhum.
— Maldição! — Eslly bateu em sua própria coxa, a que ainda era de carne e osso. Quem optou por aproveitar a oportunidade de recuar durante o ataque de Terraemnia foi ele. “Aquele… maldito…!”
Não eram os dois que deveriam assumir as rédeas do caos enquanto as Top 2 Rank S estivessem dentro do portal? Perderam um duo para Kaiser pela covardia dele. O que aconteceria dali pra frente, Eslly temia sequer pensar.
Pra fechar o pacote, a criatura colossal estremecia o cenário e derrubava as já arrasadas construções de Thornfield. Os duos consultaram os Top 3 Rank S. Tempo para se martirizar, lamentar, nem disso o arqueiro tinha direito.
“Então, o que fazemos?”, indagou alguém.
Pelo que Kaiser disse, eles realmente teriam que arrancar aquela criatura do chão para, só então, poder matá-la?
Loucura.
Bastava passar as vistas por cima de Terraemnia pra perceber que nem longe, tão pouco de perto, um monstro daquele porte seria leve; a própria criatura se movia com certa lentidão.
“Como tirar aquilo do chão, se até aquela coisa já sofre com o seu próprio peso?” Eslly mordeu os lábios e expirou pesadamente. “E ainda tem aquele fogo na saída do portal”. O que Kaiser pretendia com aquilo? — Huh?!
— Aconteceu algo? — questionou Tília.
— As meninas podem estar com problemas. — O rapaz se virou para o disco negro no céu. — Quando as duas quebrarem a Pirâmide de Hórus, como elas vão sair de lá? — Quantas mãos desgraças se empilhariam naquele dia?
— Só nos resta acreditar nelas. — Era duro ter que dizer tais palavras, ainda mais quando os dois nem tiveram como resgatar a menina que Kaiser levou embora. — Os outros estão esperando uma resposta.
O semi-humano pensou um segundo a mais. A informação que Kaiser passou poderia ser falsa ou até mesmo uma possível armadilha. Como Terraemnia reagiria caso tentassem tirá-la do chão?
— A todos aqueles que possuírem técnicas ofensivas poderosas — orientou pelo MIC — carreguem elas e soltem na cabeça da criatura ao mesmo tempo, sob o meu sinal.
Tília ouviu a sugestão do parceiro em silêncio. Então ele iria testar a veracidade do que Kaiser disse, mas por que usar as técnicas dos seus parceiros, em vez das dela? Tília poderia fazer aquilo sozinha.
— Tá com medo de me colocar em perigo? — brincou a menina. — Hehe! O que é?
— Eu só tô evitando o risco do monstro se adaptar ou algo assim. — Poderia ser uma suposição besta, mas Kaiser já podia imaginar a decisão que os duos tomariam. — Se eles falharem, aí sim vai com você.
Escondidos atrás das poucas paredes que restavam na área em que Terraemnia se encontrava, os duos, com os seus ataques preparados, aguardavam a ordem de tiro.
— Preparar! Apontar! — Então, Eslly gritou: — Fogo! — Uma enxurrada de ataques, de tipos variados, deixou a criatura atordoada, olhando de um lado para o outro, ao menos até que a sua visão foi obstruída pelo eco do dano na sua cabeça.
Explosões consecutivas e fumaça cinzenta ocultaram totalmente o crânio deformado de Terraemnia, que vacilou em seus passos e tombou de joelhos, enfim revelando o pescoço rochoso sem a cabeça, sem sangue, apenas pedra.
O chão tremeu sob os pés dos duos, e uma grande massa de poeira subiu ao alto quando o colossal caiu sobre a terra, um ruído que arrancou o silêncio das bocas dos espectadores homicidas.
— E então? — Eslly e Tília observavam o desenrolar, na expectativa de que fosse o fim; entretanto, a energia natural do solo se tornou visível, um belo e cativante verde, que fluiu para, ou melhor, foi sugado pelo corpo tombado da bizarrice ecológica.
Pouco a pouco, reconstruída em sua totalidade, a cabeça do monstro abriu a sua boca, ainda prosseguindo com o roubo da energia natural que ondulava no ar na forma de uma Aurora Boreal.
Com o rugido icônico de incêndio florestal, Terraemnia desprendeu toda a energia furtada em um feixe veloz de luz verde que ultrapassou a extensão da cidade.
— Por isso que tem que tirar ela do chão? — Boquiaberta junta a Eslly, Tília assistiu Terraemnia girar o seu pescoço de rocha enquanto traçava uma volta completa de 360° ao redor de toda a Thornfield.
Conforme tudo se perdia no ruído da destruição caótica e incendiária à sua volta, a criatura parou os movimentos dos seus membros por um instante, como se se recuperasse do esforço realizado.
— Eu vou levar ela pro céu. — Pronto para assumir a sua forma de águia gigante, Eslly fez sinal para que os duos se afastassem. — Você cuida do resto.
— Entendido — assentiu Tília, contudo, antes que o parceiro dela pudesse prosseguir com o seu plano, uma densa fumaça cinza-escuro encobriu Terraemnia e logo se espalhou na forma de uma explosão tóxica. — Mas o que…?
Tão rápidos quanto podiam, os duos correram para longe da fumaça, mas a existência daqueles que foram lentos em suas pernas ou reação foi inevitável e a inalação das toxinas os levaram a uma morte súbita, empilhando corpos pelo caminho; nem os companheiros monstros de Terraemnia foram poupados.
— Hã? — Tendo escapado para o território aéreo de Thornfield, Eslly se arrependeu de não ter seguido a informação do Kaiser logo de cara, uma vez que, mesmo após a fumaça tóxica abaixar, uma parcela continuava impregnada na criatura. — O que foi que eu fiz?
Levando uma mão ao rosto, o semi-humano sentiu sua garganta travar, ainda que, diferente do ar inalado pelas vítimas terrestres, o que estava ao redor dele ainda podia ser considerado puro.
— Eslly… — Tília segurou a mão que o rapaz havia posto no rosto, fazendo-o olhar diretamente para ela. — Tudo bem.
— Mas como…? — Ela ainda estava viva; perder a parceira de novo era o maior medo dele, mas e os duos que morreram, não eram também os seus parceiros? — A gente não pode nem mais… chegar perto.
— Claro que pode! — O rapaz arregalou as vistas frente ao tom elevado da voz da sua parceira; se estivesse em terra firme, ele teria dado um passo para trás. — Quem é que controla o vento aqui?! Jogue aquela fumaça pra longe! Eslly, você…!
— Sem querer interromper a briga do casal — intrometeu-se uma voz masculina, bem no interior da mente dos Top 3 Rank S — Mas vocês precisam de uma mão aí?
Incrédulos quanto à origem da voz, Eslly e Tília se viraram para trás, para contemplar o retorno à cena de dois loucos — ou múmias enfaixadas — que, com toda certeza, não deviam ter o menor amor às suas próprias vidas; mas que, apesar de tudo, transmitiram um certo alívio.
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