O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 2 – Arco 7

Capítulo 177: Alto Custo

Acompanhado das Personificações do Espaço e do Tempo, Raizel contemplou o labirinto infinito se desfazer, ou o que restou após o colapso da Matéria e Antimatéria.

— Hã?! — As páginas das Invocações Número 93 e 94 se desintegraram bem diante dos olhos de Nether do nefilim. — Aquele merda…!

Mesmo sacrificando dois conceitos naquela investida suicida, ainda seria possível invocá-los quantas vezes fosse necessário, desde que o Necronomicon, o catalisador abençoado por Azrael, continuasse intacto.

Vítimas da lâmina amarela — a Fome — o poder de devorar a existência das coisas, as Personificações da Matéria e da Antimatéria jamais voltariam a ver a luz do dia.

— Você pode imperar sobre conceitos — declarou Belzebu, agora diante dos olhos de Raizel, e sem a presença de qualquer ferimento sofrido anteriormente — mas eu transcendo essas coisas.

O nefilim apertou o cabo da Espada do Fim dos Tempos, que tremeu em sua mão.

o desgraçado do Belzebu substituiu o passado real por um fictício que ele escreveu a seu bel prazer: um passado onde o colapso dos conceitos não o afetou; por outro lado, Matéria e Antimatéria foram tragadas pela fome insaciável da lâmina amarela.

Com a existência daquelas invocações comidas, mesmo uma arma divina projetada pelo Arcanjo da Morte falharia em manifestá-las de novo; pior que isso, o dano nas invocações também afetava o grimório, danificando o Necronomicon de forma permanente.

“Merda…” Raizel desviou sua atenção por um breve segundo, involuntariamente, para a Personificação do Tempo; se perdesse aquele conceito, estaria a um passo do fim.

Fosse pela capacidade de se antecipar aos incontáveis futuros ou por aumentar sua velocidade, graças ao fluxo acelerado do tempo, aquela invocação era a única razão pela qual o nefilim ainda conseguia ter alguma mínima reação frente aos ataques de Belzebu.

— Tsc! — No impulso, mesmo diante dos incomensuráveis futuros desastrosos, Raizel fechou o punho na direção do adversário. — Comprima!

Obediente, a Personificação do Espaço moveu seus braços, fechando-os na forma de uma espiral que começou a comprimir toda a extensão daquele plano dimensional sem fim.

— Ainda continua disposto a lutar! Que louvável! — Com a sua voz abafada pela compressão constante que pressionava as quatro asas contra em suas costas, Belzebu ficou com o restante da fala para si mesmo. “Mas não passa de puro desespero, hahaha!”

Raizel cerrou os dentes.

O coração batia acelerado.

— Mais rápido!

Se vacilasse por mais um instante sequer, o futuro em que a arma de Belzebu devorava todo o espaço, e mais um conceito ia pra vala, se concretizaria.

Mas o espaço criado era infinito; para comprimi-lo por completo, seria necessário um período de tempo igualmente sem fim.

A Personificação do Tempo entrou em ação, fornecendo o que era necessário para concluir a compressão em um piscar de olhos.

— Primeiro Ato: — Tornando nula a distância espacial entre a lâmina e o alvo, que ainda tinha que lidar com todo o espaço que o apertava, Raizel partiu para uma investida dupla. — Megido!

Ou melhor, uma investida tripla.

Os ponteiros giraram no rosto da Personificação do Tempo, e assim como Belzebu fez questão de mostrar, um novo passado começou a ser escrito.

Ainda que naquele tempo presente, o Senhor das Moscas conseguisse lidar com as Chamas de Megido, um passado onde ele fosse atingido seria concretizado.

Foi então que a dimensão criada por Raizel rachou de cima a baixo, afundada na aniquilação total, e todos foram mandados de volta para o vácuo do universo de origem deles.

As duas Personificações, Espaço e Tempo, começaram a ser desintegradas, assim como toda a extensão espacial, foram engolidas pela Lâmina da Fome.

Apesar de devorar a existência das Invocações 91 e 92, Belzebu ainda foi atingido no peito, pelas Chamas de Megido, e o corte quente se recusava a se fechar, mesmo que o tempo fosse alterado, reescrito ou substituído.

— Haha! Moleque maldito!

O Príncipe Infernal sorriu torto, não por Raizel ter aproveitado até o último segundo da Personificação do Espaço para acertar o ataque de distância zero, mas pela fenda roxa que estava logo atrás do nefilim.

“Necronomicon, Invocação Número 100.”

Argolas de Aço Divino se formaram e apertaram os pulsos, os tornozelos e o pescoço de Raizel. Das argolas, pequenos pedaços de correntes balançavam no vácuo do espaço.

Da fenda atrás de Raizel, dedos enormes surgiram e forçaram a ruptura dela, dando passagem ao som gutural de uma criatura medonha.

Dentre todos os usuários de Necronomicon, ninguém além de São Azrael Arcanjo, deveria ser capaz de manifestar aquela coisa no mundo.

Uma mentira? De certo modo.

Gotas de suor escorreram pelo rosto de Raizel. Ele era, de fato, capaz de personificar aquele conceito; mas mantê-lo sob controle por muito tempo, já era outra história.

— Personificação da Inexistência.

Como um grande vulto roxo-escuro e sem forma, a invocação possuía as mesmas argolas ferrenhas que estavam no corpo de seu invocador ofegante.

“Alguns segundos…” O nefilim não obteve o intervalo que queria para concluir a invocação. “Só mais alguns…”

— Mas que peninha. — De frente para um Raizel estático, Belzebu tocava a lâmina verde da Amálgama Antagônica no grimório do rapaz. — Isso ia ser bem perigoso.

Sem o auxílio da Personificação do Tempo, o nefilim perdeu a capacidade de reagir com eficiência às investidas inimigas; ainda assim, ele precisava daquele sacrifício, precisava de um obstáculo capaz de distrair o avatar de um Príncipe Infernal, nem que só um pouco.

— Eu disse que você perderia, moleque.

O Necronomicon teve seu fim em contato com a lâmina verde — a Podridão do Senhor das Moscas — decompondo-se da realidade, até a última folha miserável.

A Personificação da Inexistência sumiu junto às argolas no corpo de Raizel.

— Eu disse que negar as suas origens teria um custo. — E um custo alto. — Se você tivesse refinado o Nether desde que nasceu, hoje, você seria capaz de realizar essa invocação de forma instantânea e controlá-la livremente. Que pena.

Mesmo que sem domínio completo daquele conceito, ligando-se a ele por meio das argolas e correntes, Raizel ainda conseguiria usá-lo por alguns segundos, tempo suficiente para reduzir o avatar de Belzebu a um estado de inexistência.

— Você perdeu, e a culpa é toda sua. — Devagar, o Príncipe Infernal deslizou a Lâmina da Fome pelo peito do garoto, devorando o tecido da camisa e a carne do corpo dele. — Tudo o que conseguiu foi adiar o inevitável.

“Reaja.” Diante dos olhos sem esperança de Raizel, a Lâmina da Fome; em seu peito, uma ferida sem cura. “Se seu espírito se quebrar, tudo acaba”.

Petra também estava lutando, para chegar ao encontro dele, contra outra Chave da Goétia, uma adversária realmente perigosa; tudo para que ele vivesse.

Ele tinha que vencer o Senhor das Moscas, independente do que acontecesse; mas…

A visão de todos aqueles futuros…

Ele sempre perdia.

E eram tantos.

— Espaço… — Os lábios de Raizel se moveram, vacilantes, em busca do pouco que ainda restava em sua manga. — Dimensional.

Dentro do Reino das Espadas, cada arma vibrou apenas pela hostilidade que emanava de Belzebu: o perigo iminente, a morte certa.

Imbuídas em Nether, as espadas estavam preparadas para rasgar até mesmo a resistência física de um Príncipe Infernal.

— Isso que é capricho. — O inimigo avançou contra Raizel apenas para testar a velocidade de reação das armas ali presente, e para seu êxtase, era instantânea. — Urrul!

O braço de Belzebu voou, decepado por uma rápida linha roxa, que marcou o trajeto da arma. Ele poderia apenas inverter o seu papel com o de Raizel e passar o dano para o garoto de novo.

Desnecessário.

O moleque já estava desesperado demais; ignorou a lei do seu Espaço Dimensional e lançou todas as armas para cima do adversário, mesmo que ele não tenha esboçado nenhuma intenção de ataque.

O Reino das Espadas deveria ser um lugar onde apenas seu criador poderia atacar sem ser fatiado; mas Raizel sabia que aquilo poderia mudar a qualquer hora.

— Aha! — Um movimento da Lâmina da Fome, e várias espadas sumiram; A Podridão, e muitas conheceram a degradação. — Pode mandar mais!

Qual ramificação do futuro seria a melhor para terminar de quebrar o espírito do nefilim? Destruir cada arma refinada durante tanto tempo? Virar a lei do Espaço Dimensional contra ele mesmo?

Eram tantas possibilidades.

— Prenda-o desde as profundezas — sussurrou Raizel, distante — Abaddon.

Integradas ao Reino das Espadas, as correntes divinas — munidas das Gravuras de Atlas — cercaram Belzebu e prenderam os braços e as pernas dele, sem sucesso.

— Humph! — Forçou seus membros e as Cadeias de Abaddon quebraram. — Pífio.

Sem dar descanso para o inimigo, Raizel arremessou a Espada do Fim dos Tempos, e o tinido do encontro dela com a Amálgama Antagônica marcou uma rachadura espacial que se alastrou pelo Reino das Espadas que Raizel zelou ao longo de tantos anos.

Belzebu sorriu.

Pouco a pouco, o garoto perdia cada um de seus preciosos bens.

— Mesmo se sobreviver, o que vai te restar? Nada?! — Belzebu rebateu a Espada do Fim dos Tempos para longe e se deparou com um novo adorno no cenário. — Nada mesmo.

Junto às espadas do Espaço Dimensional, o adorno, que num primeiro momento parecia ser o brilho de estrelas minúsculas, se mostrou como sendo, na verdade, um emaranhado de incontáveis galáxias.

— Ah… — Ofegante, o nefilim suava horrores. Suas mãos trêmulas não conseguiriam segurar mais nenhuma de suas preciosas armas.

Em contraste aos olhos caídos de Raizel, os de Belzebu brilhavam com a luz que emanava da cadeia dos superaglomerados de galáxias. Ainda que em menor escala, mantinham seu poder destrutivo original.

Mesmo depois de ter personificado cinco conceitos do Necronomicon, o que nem de longe gastava pouco poder — ainda que fosse só um — o moleque conseguiu dar forma àquilo: uma estrutura colossal que se estenderia por centenas de milhões de anos-luz no espaço.

— Tudo o que eu tenho. — Um braço débil se esforçava para se manter erguido. O colapso daquela estrutura cósmica marcaria também o fim e o adeus de Raizel ao Reino das Espadas. — Até a última gota de energia.

O nefilim fechou os punhos com uma força que ele já nem tinha mais, enquanto todo o lugar mergulhava na devastação causada pela magnífica Grande Muralha Hércules Corona Borealis.


Continua no Capítulo 178: Riel

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