Volume 2 – Arco 7
Capítulo 173: Quebrador de Leis
Na colisão subaquática de punhos, o Oceano Índigo foi separado, gerando um vazio descomunal nas profundezas até então inexploradas.
Espécies submarinas jamais conhecidas pelo homem continuariam com o mesmo status; pulverizadas, assim como os ossos do punho de Raizel, foram dizimadas.
“Porcaria!” O nefilim cerrou os dentes ao ter seu braço empurrado para trás, com uma força duas vezes maior do que a aplicada no ataque, além da força imposta pelo demônio.
Pela lei de ação e reação, os ataques de Raizel deveriam gerar uma reação de igual força, com o mesmo módulo e a mesma direção, porém com o sentido oposto.
A infeliz lei da física, alterada por Belzebu, lançava sobre o nefilim tanto o efeito da ação quanto o da reação, deixando um isento de dano e o outro com o dano total.
Um maldito quebrador de leis.
— Faz um esforço aí, moleque! — Belzebu girou seu corpo numa velocidade que o Bastão Demoníaco se curvou antes estourar o crânio do rapaz, que não teve velocidade de reação suficiente para escapar. — Hahaha!
Quando as águas do Oceano, enfim, conseguiram fechar o vácuo criado pelos combatentes, Raizel desferiu um Legato com a Espada do Princípio, tão rápido quanto a regeneração da cabeça dele.
A espiral afiada de energia subiu limpa aos céus, uma vez que o Príncipe Infernal se antecipou a ela e apenas observou-a se extinguir, com êxtase no olhar.
De costas para o adversário, se antecipou a cada corte subsequente, que rasgaram as águas e o espaço; sempre um passo à frente, nada o ameaçava.
Mesmo quando Raizel surgiu logo atrás, Belzebu defendeu o ataque com o bastão, o que apenas apenas mandou toda a ação e reação contra a Espada do Princípio, que foi empurrada e se encheu de rachaduras.
— Se continuar usando esse brinquedo, você não vai passar nem do aquecimento — aconselhou, rindo, enquanto surgia de costas para Raizel e lá ficou sem qualquer preocupação. — Ou já aceitou a derrota?
— Você já sabe a resposta. — Apertou o cabo da espada; o coração palpitante.
Diferente de Dreison Asimorph, que se achava o topo do mundo, Raizel tinha pleno conhecimento de seu no lugar na Criação: de quem ele estava acima e de quem estava abaixo.
Desde o princípio, sempre soube que suas chances de vencer Belzebu eram nulas; mesmo assim, não podia se render.
Em condições anteriores, até aceitaria a morte de bom grado, mas, naquela hora…
— Foi por causa da menina, estou certo? — O demônio abriu um sorriso largo.
O medo que Raizel sentiu, quando a mão dele tremeu no começo do confronto, nunca foi por ser mais fraco, mas sim por causa da ideia de não conseguir voltar vivo para a garota que o esperava.
“Ah, que bom!” Aquela era a chave para dar o melhor sabor à alma do moleque. — Que patético, né? Mesmo que você viva, a menina do Absalon vai matar ela!
— Tinha que ter dedo seu.
— Me agradeça por ser tão benevolente. — Abriu os braços, eufórico, com aquela merda de voz que já causava, no nefilim, uma forte ânsia de vômito. — Eu vou te poupar de assistir a sua namoradinha morrendo de novo.
— “De novo?” — Por um mísero instante, a mente de Raizel fugiu da luta e quase caiu no que só poderia ser uma mentira do demônio. — Conta outra.
Teria que ser uma brincadeira do destino para que Petra possuísse a alma da Karen, e uma de muito mau gosto.
A reencarnação por si só já era uma irregularidade na Criação, uma vez que a primeira vida da pessoa era jogada nas Águas do Esquecimento, e ela seria julgada pela sua segunda vida.
Raro e só acontecia uma vez, não era como um ciclo infinito; então, para que Petra fosse a nova vida da Karen, Azreal teria que ter segurado a reencarnação daquela alma por um período de tempo muito longo, algo sem sentido nenhum.
— Huh?! — Belzebu moveu um músculo de seu corpo, e Raizel reagiu o mais rápido que pôde; independente de ser um movimento qualquer, todo cuidado era pouco.
E a precaução rendeu bons resultados: com a perda de apenas um braço, o nefilim escapou de ser dividido ao meio pelo bastão que rasgou o espaço com violência.
— Olha só, você consegue desviar quando quer. — Deliciou-se com as feições de confusão e dor estampadas na cara do prato do dia. — E eu não estava mentindo.
Mesmo que Raizel se negasse a acreditar, a letal semente da dúvida já havia sido plantada e em breve renderia frutos.
— Vai se foder. — Regenerou o braço perdido e sem tirar os olhos de cima do demônio por um segundo, girou a Espada do Princípio e a apontou para baixo.
Da lâmina escura, uma fluida energia vermelha escorreu e deu forma a um poço espiral medonho que começou a sugar tudo o que havia por perto.
— Quinto Ato. — Em uma dança circular, o som da energia, em vez de gerar ruídos sem propósito algum, dava forma a última harmonia que seu alvo ouviria antes de mergulhar na morte. — Acorde Final.
Com uma força de atração capaz de puxar céus e terra, tudo o que caía em seus domínios encontrava a dilaceração inevitável de cada um de seus átomos.
— Que artístico! — Exclamou o ser das trevas, de peito aberto, enquanto caminhava confortável e ileso, sem medo da morte. — O senhor Lúcifer deve está adorando assistir isso!
De fato, uma bela visão de nuvens rodopiantes, atraídas junto às massas de água em direção à luminescência do intenso clarão escarlate, renderia um belo quadro para enfeitar a parede do governante supremo do Reino Infernal.
— Isso! — Balançou o Bastão Demoníaco, e, do Acorde Final, restaram apenas memórias dissipadas como fumaça. — Já curti o suficiente!
Belzebu ançou um ataque em linha reta, do qual Raizel tentou desviar ao usar suas asas e um Círculo de Propulsão, para se impulsionar para cima, entretanto…
O Bastão Demoníaco se curvou no ar, como o seu material rígido fosse flexível. Raizel manobrou seu corpo e rebateu a arma do inimigo, em meio à perseguição aérea.
Faíscas e mais faíscas voaram a cada movimento que deixava o nefilim com menos rotas de fuga disponíveis.
Uma vez que o céu se encontrou dominado pelas extensões do Bastão Demoníaco, Raizel usou a espada para conter o avanço certeiro, que driblou a lâmina dele e o atingiu no peito.
— Argh! — Duas ramificações brotaram da haste negra e, cravadas em carne e ossos do nefilim, empurraram-no para além das águas do Oceano Índigo.
Com a noção do espaço sendo deformado à sua volta, tudo não passava de rabiscos e borrões. O impacto de estruturas sólidas foi contínuo nas asas de suas costas.
Para as pessoas dos quatro continentes de Calisto, a passagem de Raizel foi marcada por um flash veloz, gritos de inocentes e o som de muita, muita carnificina.
Sem fazer diferenciação entre as vítimas: se casas, árvores ou pontes; humanos, majins, semi-humanos ou tenjins, quem estava naquela linha reta foi inserido no acidente.
Quantas voltas haviam sido dadas ao redor do planeta, Raizel já não sabia dizer. A única certeza que ele tinha era do calor e da poeira do deserto no qual foi lançado.
Arrastado pelas areias escaldantes, colidiu contra uma pirâmide antiga, arruinando a herança histórica. Parou apenas quando o Bastão Demoníaco travou seu movimento do nada e o amassou de cara no chão.
Tardou a se levantar. O corpo estava sujo pelo sangue das vítimas que tiveram o azar de estar em seu trajeto até ali; doía, apesar de curado.
— Ah… Ah! — Mal conseguiu levantar a cabeça, que não parava de latejar, e se deparou com o par de botas de couro preto de Belzebu.
Em uma tentativa de obter uma abertura, aproveitou-se da proximidade e guarda baixa do demônio; explodiu o chão, com a energia de suas mãos e gerou uma cortina de areia, o que, mais uma vez, de nada adiantou.
Belzebu continuou a se antecipar a cada um dos Prestos que dilaceravam o espaço, até que já farto de lidar com aquela arma de brinquedo, escreveu um novo passado.
Nas mãos de Raizel, sua espada se quebrou em vários pedacinhos brilhantes, ou melhor, ela já estava naquele estado desde um bom tempo atrás.
— Use logo de uma vez. — Dois pares de asas demoníacas eclodiram das costas do demônio, semelhantes às do morcego mais medonho do mundo. Nas membranas pretas, veias pulsavam; nas pontas, espinhos de ossos afiados. — Use a espada do Miguel!
Bateu as quatro asas, lançando Raizel para o alto juntamente a toneladas de areia, que rodopiaram na forma de um vórtice violento, com ventos cortantes que superavam qualquer estatística registrada.
A única forma de bater de frente com um Príncipe Infernal seria recorrer aos poderes da arma de um Arcanjo, coisa que Raizel tinha à disposição.
Entretanto, uma coisa era certa: o nefilim não era privilegiado a ponto de ser o único a possuir uma arma daquele nível.
Belzebu também possuía a sua própria e estava só esperando para manifestá-la ali.
E pela experiência que teve no embate contra o Guardião dos Céus, mais cedo, Raizel ssbia as consequências de colidir tais armas nos domínios do Plano Físico.
— Hah! — Belzebu deu um tapa no ar, para baixo, o que levou o corpo dilacerado do nefilim a ser esmagado contra o solo.
Fincou o Bastão Demoníaco no chão e pisou nas costas do adversário caído, o qual soltou um grunhido de dor, que foi abafado na areia escaldante quando o outro pé de Belzebu foi posto em sua nuca.
— Que fique claro, moleque! — Segurou as asas divinas de Raizel. — Eu vejo o seu futuro! — Puxou com força, fazendo os ossos estralarem. — Cada possível infinito futuro!
— Uhhh! — Urrou de dor, com a boca cheia da areia do deserto. Com a pele das costas esticada, ossos foram quebrados e a consequência foi inevitável: do lugar das asas arrancadas, rios de sangue escorreram, e Raizel já não mais reagia.
— Sabe o que é mais engraçado nisso tudo? — Desintegrou os membros alados do garoto, ainda em suas mãos, e continuou com a investida psicológica. — Em todos os futuros, você… sempre… perde!
Foi então que uma enorme sombra roxa brotou debaixo dos dois, da qual a cabeça de um colossal dragão morto-vivo eclodiu.
— Hahaha! — Dentro da boca do dragão, Belzebu foi carregado, em um instante, para além das nuvens. — Que humilhação pra você, heim, filho de Azriel?!
O Dragão rugiu Nether com a temperatura do núcleo de uma estrela hipergigante azul, gerando um caminho de luz roxa visto de qualquer planeta daquele sistema solar; caminho que Belzebu foi levado a seguir.
Em terra, novamente de pé, porém de cabeça baixa e cabelos roxos, Raizel encarava o grimório que flutuava na altura de sua cintura, aberto na página 50: O Dragão da Destruição.
Continua no Capítulo 174: Penetras
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