O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 2 – Arco 6

Capítulo 147: O Dragão Ganancioso

Um único pisão da pata abissal, e o interior de todo o templo de mármore tremeu. As colunas que sustentavam a estrutura — altas o suficiente para alcançar os céus – davam sinais de que cairiam a qualquer instante.

Junto ao grunhido amedrontador da monstruosidade, sua garra afiada arranhou o piso lustroso do lugar, causando uma agonia irritante aos ouvidos dos intrusos, que se escondiam atrás de duas das colunas.

"Isso só pode ser brincadeira." Com as mãos tapando seus ouvidos, Carelli lamentava o tamanho de seu azar dentro daquele portal. "Tinha que ser logo um boss mitológico?"

Ela e Baltazar mal tinham acabado de alcançar sua posição como Ranking S, e já tinham sido jogados para enfrentar justo o Dragão Ganancioso, o terrível Fafnir?

Lidar com as hordas quase infindáveis de dragões no exterior do templo já tinha dado uma canseira danada; todos de Rank S Classes Destruição ou Catástrofe, e agora era a desgraça de um Boss Classe Apocalypsis?

"Vamos recuar", disse por telepatia para o parceiro, que estava na coluna ao lado da sua. "Só tem o boss agora. Quando o portal de saída abrir, os outros duos…"

"Não viaja, Carelli." O maluco do Baltazar parecia ser o único a não ter a menor noção do risco que corria. — "Eu tenho um plano".

"Eh?!" — Um frio desconcertante tomou conta de sua barriga.

Desde que aceitou a recomendação da Academia de Batalha para que fizesse o Pacto de Ressonância com aquele louco, Carelli soube que Baltazar poderia ser definido em duas palavras: vergonha alheia e irresponsabilidade.

Até àqueles dias ela não tinha certeza de como os dois conseguiram firmar o pacto, uma vez que ambos deveriam compartilhar algo em comum — ter algo que o outro admirasse, esse era o mínimo exigido.

"Vai, conta." De qualquer forma, era melhor ouvir do que só ficar esperando aquela aberração cuspidora de fogo encontrar eles e os transformar em carvão.

Carelli até poderia escutar o "plano pelfeito" do seu parceiro com atenção e espanto, ainda assim com paciência, mas o mesmo jamais poderia ser dito do seu algoz.

Soltando fogo ardente e fumaça enegrecida pelas narinas, Fafnir grunhiu. A raiva evidente em seus olhos vermelhos também se revelava em suas presas sanguinárias.

Dada a sua conexão com os outros dragões, e a capacidade de controlá-los em um alcance planetário, o boss tinha pleno conhecimento de que os dois invasores haviam exterminado cada um dos seus servos; apenas ele restava de pé.

Inaceitável.

Simplesmente inaceitável.

— Vermes insignificantes que profanam meus domínios! — Carelli e Baltazar ficaram pasmos ao ouvir a voz gutural da criatura ecoar pelo salão. — Sucumbam nas cinzas!

Um rugido enfurecido se alastrou desde o templo até alcançar os limites da dimensão interna do portal. Tudo tremeu, como se tivesse ocorrido um terremoto violento.

Ensurdecedora, a voz de Fafnir se sobrepôs à voz mental de suas presas; no entanto, mal imaginavam elas que o pior se formava dentro da garganta flamejante da criatura.

Só então os invasores se deram conta de que a fala sobre "sucumbir nas cinzas" não era figurativa, mas literal. Mirando no chão, o Rugido de Fogo se espalhou descontrolado por tudo quanto era lado.

— Droga! — Mais por reflexo do que por consciência, Carelli criou um Escudo Telecinético, que envolveu ela e Baltazar. — Eu disse que era pra gente ter fugido!

E ao notar que tudo ao redor do seu escudo era um infinito mar de fogo, a garota teve certeza de que bater de frente com aquele monstro seria suicídio.

Se o seu Escudo Telecinético não barrasse a propagação do calor para o interior da proteção, os dois já teriam morrido antes mesmo de sequer serem atingidos pelas chamas.

— É só fazer o que eu digo, Carelli — anunciou como se ignorasse as rachaduras que se formavam na defesa da parceira. — Relaxa que vai dar bo… Opa!

Uma segunda camada se formou dentro do Escudo Telecinético, comprimindo-se e puxando o rapaz para mais perto da parceira, que suava enquanto fazia força para criar uma proteção mais resistente.

Crack!

A camada maior desmoronou, engolida pelo mar flamejante. Carelli se esforçava, com o suor descendo pela lateral de seu rosto; não pelo calor, mas pelo desespero advindo do desejo de sobreviver.

Desespero que aumentou ao ver a segunda camada do escudo rachar, igualmente ocorreu a outra, o que levou a moça a comprimir uma terceira camada, tão minúscula que espremeu ela e Baltazar lá dentro.

"Acaba, por favor!" Maldito dragão que não parava de cuspir aquele fogo dos infernos.

— Ei, relaxa. — A voz do parceiro veio calma e confiante, praticamente rente ao seu ouvido, já que ambos estavam coladinhos um no outro. — Eu sei que parece doideira, mas vai dar certo.

— Se você morrer, eu te mato, Baltazar. — Com a queda da segunda camada e o estalo arrepiante da terceira, o fogo de Fafnir começou a reduzir, trazendo alívio aos corações de suas presas. — Cumpra o que prometeu.

Ao desfazer o escudo, Carelli pôde enfim ter noção do calor que assolava o ambiente. Chegava a ser incrível que o mármore do templo ainda continuava intacto. Não era à toa que aquele lugar servia de lar para um Classe Apocalypsis.

Haha! — Eufórico, Baltazar materializou seu machado astral e avançou contra a criatura raivosa. — Chega de se esconder!

— Inseto maldito! — Sem tempo para conversa, cuspiu as chamas no draconiano, que arremessou sua arma contra o seu maxilar, forçando-o a fechar a boca.

Foi aí que o dragão sentiu uma força invisível selar sua mandíbula, impedindo-o de abri-la outra vez. Irado, lançou um olhar mortal para a garota ao fundo, a usuária da Telecinese.

No entanto, dedicou seus esforços para golpear o adversário mais próximo com sua cauda cheia de espinhos, o que falhou quando Baltazar se agarrou a ela e aproveitou para correr até em cima de suas costas.

— Opa! — O garoto quase caiu quando a aberração começou a se debater e, levantando as patas dianteiras, desferiu uma porrada contra o solo. — Oi?!

O draconiano preocupou-se ao notar que o chão se transformou em ouro puro; aquele ataque não tinha sido para ele, era para acertar a garota que ainda estava em contato com o piso do templo.

— Care…! — Por sorte a garota foi ágil em fugir para o ar e escapar dos efeitos da Ourificação, a qual transformou toda a matéria presente no espaço interior do portal de Rank S em ouro puro.

Ainda era cedo demais para ficar aliviado. Caso aquele monstro conseguisse sair para o lado de fora, bastaria um simples toque de suas garras para transformar o planeta inteiro em uma gigantesca bola de ouro — uma joia para os tesouros de Fafnir.

— Agora! — Carelli bradou no instante em que o dragão conseguiu se soltar da Telecinese e abriu sua boca, o que foi uma brecha perfeita para que a garota controlasse a arma caída do parceiro e a travasse entre os dentes do monstro.

Pego de surpresa, Fafnir estranhou o lance dos invasores, principalmente quando Baltazar aproveitou que sua boca ainda estava aberta e pulou para dentro dela pouco antes do machado dele se quebrar entre os dentes do dragão.

Ha! Ha! Hahaha! — Era um moleque idiota. Pôde escapar de ser dilacerado pelos seus dentes, mas derreteria assim que fosse pego pelos sucos gástricos do seu estômago. — Agora só falta um.

A passos lentos, caminhou em direção à garota que segurava um machado astral em posição de combate. Apesar da apreensão, ela ainda mantinha determinação para lutar.

— Tenha o mesmo destino que o moleque. — Abaixou sua cabeça e encarou a garota. Ela era pequena demais para saciar sua fome, mas era tudo o que tinha sobrado no momento. — Parada!

"Heim?" Carelli se viu forçada a obedecer a ordem imposta, de modo que nem mesmo seus lábios conseguiam se mover. "A Língua do Dragão Soberano?"

O poder que só o topo da raça dos dragões possuía, a capacidade de ditar ordens a outros seres, algo a que Carelli deveria ter alguma resistência por causa da ressonância com um draconiano.

Ainda assim, ela foi pega sem a menor chance de reagir. Seus olhos, arregalados, contemplavam a mandíbula gigantesca se abrir lentamente para devorá-la. O bafo fétido de enxofre feriu seu olfato. Por um instante, Carelli pensou que seu nariz iria cair.

Diferente do garoto, Fafnir não a engoliria sem antes mastigar cada pedaço da carne dela, sentir o gosto vívido do sangue escorrer pelo seu paladar e quebrar cada mínimo osso entre seus dentes.

Ur-Urgh! — Estranhamente, o dragão caminhou para trás. Algo estava causando um rebuliço estranho em seu estômago. Uma má digestão? O pirralho que ele engoliu estava podre? — Mal… dito…

Sua barriga inflou como um balão, enquanto que em agonia Fafnir se debatia e arranhava o piso do templo. Urrou de dor, o que serviu apenas para que uma rajada de fogo, ou melhor dizendo, plasma saísse de sua garganta.

Dado os movimentos loucos de seu corpo, espalhou o plasma quente por todos os lados, quase acertando a garota no processo, a qual conseguiu desviar assim que o efeito da Língua do Dragão Soberano diminuiu.

— Valeu, Baltazar — agradeceu, mesmo sabendo que o parceiro não a escutaria. — Agora sai daí. — Passar muito tempo dentro da barriga daquela coisa era perigoso demais.

Fafnir, ao notar que o plasma acertaria uma grande porta adornada ao fundo, ergueu sua cabeça em direção ao teto do templo. Seus olhos se reviraram em agonia antes de se fecharem para sempre e seu corpo volumoso e denso sucumbir inerte no chão.

Com o coração na mão, Carelli esperou o corpo do boss se desfazer, dando lugar apenas ao núcleo vermelho-alaranjado dele e ao seu parceiro que sorria mostrando um sinal de joinha com a mão direita.

Carelli se aproximou e ofereceu apoio para o rapaz todo queimado conseguir se manter em pé. Então, puxou o núcleo do boss para dentro do seu anel de ressonância.

— Nunca mais sugira essas ideias loucas de novo. — Servindo de muleta para Baltazar, guiou o rapaz até a porta adornada que Fafnir evitou destruir enquanto morria. — Você vai acabar me deixando sem parceiro algum dia assim.

— Relaxa, eu sou resistente. — Foi então que o draconiano prestou mais atenção à porta logo à frente, a única coisa que não tinha sido afetada pelo plasma. — O que você quer ver ali?

Carelli não respondeu, já que era apenas uma suposição. Se ela estivesse certa, existia apenas uma coisa que o Dragão Ganancioso jamais ousaria danificar… o seu tesouro.

Abrindo a porta com Telecinese, a moça confirmou o que tinha pensado: havia joias, armas, utensílios e os mais diversos tipos de pedras preciosas espalhadas pelo vasto salão.

No entanto, o que mais lhe chamou a atenção foi um grande machado com símbolos de conexões neurais que estava exposto em um suporte de prata.

— Isso aqui deve valer bem mais do que o núcleo de um Classe Apocalypsis, né, não? — A parceira acenou com a cabeça, sem tirar os olhos da arma que parecia chamar por ela. — Aquele dali também é daora.

Um cabo rústico que levava até uma lâmina semelhante aos dentes do próprio Fafnir. O segundo machado era mais macabro do que o primeiro, mas fazia o tipo do draconiano.

— Até que valeu a pena quase morrer hoje.


Continua no Capítulo 148: Marionete de Sangue

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