Volume 2 – Arco 5
Capítulo 128: Entre o Luxo e a Lama
— Que pancadas são essas no coração, senhoras e senhores?! — Gritando a ponto de quase perder a voz, o narrador do campeonato continuava a queimar os ânimos do público, no mais puro êxtase. — Será a Academia de Batalha Ziz capaz de tirar o pé da cova?
Desfez o semblante caído em seu rosto e olhou para o alto, como se almejasse tocar o céu azul e límpido com as palmas das próprias mãos.
— Ou será a Academia de Batalha Absalon capaz de alcançar o trono do Sojourner?
Caso ganhassem mais 3 pontos na luta atual, Vínia e Grete totalizariam 5 pontos; assim abrindo certa vantagem contra os 3,5 pontos da Academia de Batalha Leviatã — a atual primeira colocada no ranking.
Entretanto, Trevor e Sophie estariam sepultando de vez toda e qualquer esperança que a sua Academia tinha de conseguir alcançar o título do campeonato.
— Tempo e espaço, medo e ilusão — disse tencionando, reverberando… rasgando sua voz. — Entre o Luxo e a Lama, quem irá prevalecer?!
Cara a cara com as adversárias, Trevor e Sophie materializaram suas armas; mas, estranhamente, as adversárias não fizeram menção de atacar num primeiro momento.
"Elas querem usar uma tática de contra-ataque?", pensou o rapaz. Mas se era o caso, por que deixar a intenção tão evidente? — Vocês ainda têm o quadro que eu pintei?
Fazia referência ao primeiro encontro que ambos tiveram no dia anterior, durante o evento de pintura do campeonato, o que fez Vínia — a mais excêntrica das duas — esboçar um certo ar de superioridade.
— Humpf! — Materializou sua lança e, fazendo um risco semicircular no chão, apontou-a em direção ao pescoço de Trevor. — Tá bem guardado lá no nosso quarto, só esperando o troféu do campeonato pra fazer companhia a ele.
O rapaz inclinou a cabeça para o lado, um tanto quanto confuso; então, com uma mão no queixo, resolveu fazer algo que ele não tinha o hábito: tirar onda.
— Mas o troféu do campeonato fica em posse da Academia campeã — disse com uma piscadinha para a parceira, uma forma de convidá-la para ajudá-lo na provocação. — Estou certo, Sophie?
— Sim, sim — concordou com um breve balançar de cabeça. — Ninguém pode levar o troféu pra casa, nem que seja pra colocar ao lado de um quadro.
"Ahhh!…. Esses dois!" Vermelha de raiva e de vergonha, Vínia sentiu a lança tremer em sua mão, algo que normalmente deveria acontecer com os inimigos dela. — O que deu em vocês?!
Por causa da cena patética, era praticamente certo que o público estava rindo da cara dela naquele momento, em uma transmissão para o continente inteiro.
Aqueles dois… Eles estavam agindo de um jeito estranho; contudo, Vínia não veio a entender o motivo de uma forma muito agradável.
Bastou o mínimo de distração para que Trevor aparecesse de forma instantânea nas costas dela; a espada reluzindo na mão dele.
"Teletransporte?!" Então era isso: receosos de que as adversárias estivessem tramando algo, encenaram um teatrinho para que ela se irritasse e baixasse a guarda. — Merda!
A espada de Trevor por trás, as flechas de Sophie pela frente; dos dois ferimentos inevitáveis, qual ela deveria escolher?
E a resposta era: nenhum!
Focando em se virar e bloquear o corte de Trevor, Vínia apenas escutou os estalos das flechas de energia de Sophie serem destruídas pelas adagas de sua parceira, Grete.
— De-Deixa ela comigo… Vínia — disse, apreensiva, enquanto encarava os olhos esmeraldinos de arqueira da oponente.
— Só vou acabar com esse cara. — Colocando força nos pés, girou o corpo de modo a empurrar o nefilim com a haste da lança para longe. — Já já eu te ajudo aí, tá?
Então, sem pestanejar, avançou com tudo; entretanto, quando estava prestes a alcançá-lo, aquilo que viria a ser o maior obstáculo aconteceu: o espaço ao redor ondulou, e o ataque foi desviado para o lado.
— Pra que essa vergonha toda? — caçoou a moça. — Deixa eu te dar só um abracinho, vai.
— Fico grato por oferecer tamanha receptividade, mas… — Com a mão que não segurava a espada, apontou dois dedos, em formato de pistola, em direção à barriga da garota. — Serei forçado a recusar.
Vínia sentiu um frio tomar conta de sua barriga, então — em um movimento reativo — usou a lança como alavanca e pulou para o alto pouco antes do espaço se contorcer em uma espiral, bem onde ela estava.
— Que habilidade chata! — Girou no ar e, cheia de determinação e força de vontade, desferiu um ataque giratório de cima para baixo, o qual foi desviado pelo próprio espaço mais uma vez. — Tsc!
Mesmo que já tivesse conhecimento sobre a Habilidade Inata de Trevor, aquela Distorção Espacial estava enchendo o saco mais do que ela esperava; ou, talvez, já devesse estar contando com isso.
Aquele cara não estava em uma situação onde poderia se arriscar demais. A fim de tirar a Academia dele do buraco, Trevor evitaria ao máximo tomar danos fúteis.
— Vai ficar só defendendo, é?! — Atacando de forma incessante, fitou o adversário, intimando-o a dar a cara à tapa; nenhum corte alcançando-o. — Se tá com medo de se machucar, volte pra casa!
— Não é essa a questão aqui — disse enquanto as pernas dele começavam a tremer como vara verde. O coração passou a bombear sangue com mais intensidade, e encarar a moça nos olhos estava ficando difícil. — Estou ciente da sua Habilidade Inata; então, se pudéssemos acabar com isso logo, eu agradeceria.
Quando Trevor ergueu a espada para, enfim, partir para ofensiva, Vínia sorriu. A Distorção Espacial poderia ser uma bela defesa, mas só enquanto o usuário não atacasse.
Como o espaço ficava todo bagunçado ao redor dele, nenhum dos cortes do espadachim poderiam alcançar a sua adversária também, o que o forçava a ter que desativar a técnica.
Quando ele atacasse, estaria acabado.
"Vem, garotão!" Entretanto, como se almejasse frustrar as expectativas dela, Trevor deu um pulo para trás, escapando do alcance da lança sanguinária. — Oi?
O que Vínia mal sabia era que o maior motivo de surpresa só viria a seguir: durante o corte do rapaz, a ponta da espada dele entrou dentro de uma fenda no espaço.
"Aonde vai aparecer?" Muito tarde para que pudesse reagir, uma fenda espacial surgiu próximo ao pulso dela. — Urgh!
O corte nos tendões foi limpo e cirúrgico. Incapaz de manter a lança na mão, a arma reverberou um som metálico ao cair no chão.
— Que droga. — Encarou o adversário, que desviou o olhar para o lado, enquanto o sangue quente e viscoso escorria por entre os dedos dela. — Você vai ver só…
Na busca pela vantagem de sua classe de batalha, Sophie buscava manter distância e encurralar a garota que, apesar de parecer nervosa e não parar de gaguejar, era bem ágil na hora de desviar.
"Nesse ritmo, é só questão de tempo até ela chegar aqui." Estreitou as vistas, então símbolos tribais se espalharam pelo seu rosto, aperfeiçoando todos os cinco sentidos. "Assim tá bem melhor".
Vendo a outra se mover de uma forma muito mais lenta, além de ter se tornado capaz de localizá-la pelo cheiro adocicado e suave do perfume, agora Sophie escutava cada um dos passos silenciosos da assassina.
"E a próxima peça a ser movida no tabuleiro é…"
Com o acesso a tantas informações e a experiência do xadrez, Sophie já não necessitava da Manipulação Temporal para deduzir quais seriam os próximos movimentos da adversária.
"Te peguei!"
Antecipando-se um breve instante, o suficiente para que Grete percebesse o ocorrido apenas quando já fosse impossível de evitá-lo, Sophie disparou uma flecha na perna dela.
— Urgh! — Com a dor repentina, a moça perdeu o equilíbrio, até mesmo caiu de mau jeito ao ter o osso da outra perna perfurado logo em seguida. — Ai!
— Rendição? — sugeriu a arqueira, mesmo que já soubesse a resposta: Grete poderia ter um treco de tanta vergonha, mas jamais daria o braço a torcer; a responsabilidade de vencer estava sobre as costas dela. — Agradeço pelo combate.
Contudo, ao disparar mais uma saraivada de flechas contra o peito da garota, Grete — sem qualquer explicação — desapareceu como fumaça.
Não apenas o corpo mas também os rastros da Energia Espiritual dela havia sumido por completo. Era como se ela nunca tivesse feito presença ali.
Sophie entrou em posição defensiva, com seus sentidos trabalhando à toda em busca de superar a Furtividade da assassina.
"É mais do que isso, né?" Nem mesmo a Furtividade da Classe Assassino era capaz de ocultar alguém completamente. — Então, onde…?
Gelou ao sentir o frio e afiado toque de uma adaga em seu pescoço. Sentindo que poderia perder a cabeça caso desse um passo em falso, Sophie ouviu a voz da adversária, atrás de si:
— Ren-Rendição? — Sabendo que a arqueira poderia muito bem enganá-la na base da lábia, assim como Vínia havia a alertado, Grete foi mais veloz do que a resposta da adversária. — Eu sinto muito…
Deixando apenas fracos feixes de luz para trás, as adagas percorreram todo o corpo de Sophie em um flash insanamente veloz.
Tendões, ligamentos e algumas artérias foram cortados em um instante, e a investida só falhou em ser mais efetiva porque a moça foi teletransportada para o outro lado da arena pelo seu parceiro.
— Obrigada… Trevor. — De joelhos, buscou manter Grete na mira de seu arco, ao menos até que a imagem dela se desfizesse em fumaça outra vez. — Heim?
O estado e o lugar onde a assassina voltou a aparecer deixou tanto Sophie quanto os espectadores intrigados.
Grete ainda estava terminando de curar os ferimentos em suas pernas. Ela permanecia no lugar em que tinha sido ferida pelas flechas da arqueira.
Só então a ficha caiu: a Grete que havia atacado e ferido Sophie não passava de um fruto da Manipulação de Ilusões.
— Lidar com isso é pior do que eu imaginava — disse enquanto reajustava a mira para o alvo verdadeiro.
Os ferimentos ardiam e latejavam; o sangue escorria deles e se espalhava sobre a pele, indicando que os danos causados pela Grete ilusória eram bem reais.
Continua no Capítulo 129: Automutilação
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