O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 2 – Arco 5

Capítulo 126: Erva Venenosa

Em meio ao Setor de Laboratórios da Academia de Batalha Leviatã, todos os técnicos trabalhavam fervorosamente em busca de um objetivo em comum; um objetivo que, caso fracassado, poderia custar a vida de todos ali.

Ahhh… — Abraçada em sua píton, uma garota baixinha, alguém que costumava fazer algumas visitas àquele lugar, suspirava. A cabeça pendia para o lado a ponto de quase desmaiar. — Quaaanto… trabaaalho…

Para quem era digna de ser nomeada como Patrona do Pecado da Preguiça, não havia tortura maior do que ser jogada em meio a um ambiente de trabalho sob pressão.

A pequena Trivia se via à beira de ter um treco; contudo, para a sua infelicidade, a participação dela era indispensável naquele projeto.

— Queeero… embooora…

A píton sibilou, expressando algum traço de compaixão pela sua dona. Quando tudo aquilo acabasse, Trivia tiraria uns bons anos de férias.

Invadir a Academia? Os outros que fizessem isso. Ela só queria dormir.

— Cuidado pra não cochilar por aqui, ok? — disse a voz melodiosa de uma moça, a qual chegou pelas costas da Patrona. — Se dormir, ninguém sabe quando você acorda, né?

— Mineeerva… — Encarou a moça que caminhou até o seu lado e, segurando uma prancheta próximo ao peito, observou o empenho frenético que ocorria do outro lado do vidro. — Queeero… caaasa…

Hehe! — Levou a prancheta até a boca para esconder uma risadinha descontraída, o que lhe proporcionou um certo charme intelectual, principalmente por causa do jaleco branco e do par de óculos. — Foi mal. Nem eu posso te libertar desse trabalho.

Ainda que detivesse em suas mãos o domínio sobre cada centímetro cúbico do Setor de Laboratórios de uma das grandes Academias de Batalha, nem mesmo Minerva era capaz de ir contra as ordens do diretor.

No território da Academia de Batalha Leviatã apenas Nabuco Donosor reinava absoluto; suas palavras eram lei, e ninguém, delas, poderia alterar um ponto ou uma vírgula.

— Socoooro… — soltou sua lamúria arrastada, deixando o corpo minúsculo ceder aos braços da gravidade. — Caiiindo…

Esperava ser segurada pelo corpo da píton, entretanto o que sentiu foi bem mais macio, confortável e cheiroso. Trivia relaxou; sem dúvidas, havia caído de cara em um travesseiro bem aconchegante.

Então, um par de braços esguios envolveu as costas dela e a manteve ali, com o cuidado de uma mãe, protegida em seu abraço.

— Eu disse pra você não dormir aqui. — Apesar da expressão de repreensão, Minerva falava de uma forma tão cheia de afeto e cuidado que chegava a ser difícil interpretar como algo ruim. — Esse chão não é lugar pra se tirar uma soneca.

A píton sibilou em afirmação.

Uhuuum… — Ainda sem tirar o rosto dos seios da moça, Trivia esboçou um minúsculo balançar de cabeça. — Cheiroooso…

A outra riu enquanto afagava os cabelos da Patrona da Preguiça que, naquela posição, nem chegava a parecer que possuía um dos venenos mais perigosos que o mundo já tinha visto.

Por outro lado, tão cheia de sono e cansaço, ela despertava um desejo natural de protegê-la e até de mimá-la; Minerva sempre sentia isso.

"Parece até um pet." Sem cerimônia, deu uma cheiradinha nos cabelos bagunçados da pequena garota. — Você também é cheirosa.

Foi então que a porta do laboratório se abriu em formato de "X", anunciando que o momento de descontração das duas já estava mais do que na hora de acabar.

Acompanhado por um rosto familiar, que Minerva tinha visto em algumas ocasiões e pelo qual nutria uma repulsa genuína, a autoridade máxima — Nabuco Donosor — caminhou em direção às moças; seus passos firmes maltratavam o chão.

Dado o olhar frio e a cara de poucos amigos, era fácil deduzir o que sairia daquela boca autoritária; entretanto, pondo-se a demonstrar respeito em vez de medo, Minerva cumprimentou seu superior e o acompanhou desprezível dele.

— É sempre uma honra recebê-lo em nosso laboratório, diretor — disse com voz solene, ainda assim, fazia o máximo para evitar contato visual. — Se nos prestigia com a sua presença, então…

— Os resultados… — curto e grosso, como sempre. — Como está o progresso da toxina?

Minerva silenciou-se por um momento.

Assim como o diretor e o visitante, ela passou a observar o trabalho dos seus colegas de laboratório. Corrigiu a postura e, de forma eloquente, pôs-se a realizar o relatório oral:

— Em posse das amostras de veneno produzidas pela Trivia e pela serpente… — A píton sibilou, evidenciando que possuía um nome. — Digo, pela Samael.

O suporte daquele pet junto à Habilidade Inata de Manipulação de Veneno e ao DNA de uma besta venenosa, que a Patrona do Pecado da Preguiça tinha misturado ao dela, havia permitido que o processo de criação da toxina estivesse sendo antecipado em anos.

— Logo o veneno que o senhor solicitou estará devidamente desenvolvi…

— Em quanto tempo?

Mesmo que sem ser observada diretamente, a moça podia sentir o corpo soltar espasmo de medo a cada questão levantada por aquele homem.

Com certo receio, respondeu:

— Uns três dias, senhor.

Nabuco Donosor estalou a língua.

Três dias estavam fora do prazo.

O ataque à Academia ocorreria dentro dos próximos dois dias; caso demorasse mais do que isso, o Santo Graal seria devolvido ao continente dos tenjins.

Não. Isso jamais poderia acontecer. O Cálice Sagrado estava bem debaixo do nariz dele, na própria Academia de Batalha Leviatã; uma chance de ouro.

Se não fosse necessário ter o registro ocular de no mínimo três dos quatro diretores das Academias de Batalha para liberar o acesso ao cálice, tudo já estaria acabado.

— Termine dentro de dois dias — decretou, dessa vez encarando a jovem moça no fundo dos olhos. — Nem um segundo a mais, nem um segundo a menos.

— Entendo, senhor. — Com o olhar baixo, viu apenas as pontas dos sapatos de couro do indivíduo, apontadas direto para ela. "Mesmo assim…"

O que ele estava pedindo era complexo demais para ser alcançado em tão pouco tempo: sem cor; sem odor; uma morte quase instantânea; que afetasse qualquer um, menos ele; e, acima de tudo, que não causasse irritação nos olhos das vítimas.

Eram especificações em demasia para um pedido que fora solicitado havia apenas poucos dias. Por mais que os profissionais do Setor de Laboratórios se esforçassem, por mais que dessem seu sangue, produzir aquela substância era simplesmente… impossível.

Haha! Parece que fiz bem em vir aqui! — Diante da situação crítica dos demais, o acompanhamento do diretor, que assim como Minerva também usava um jaleco branco, resolveu se vangloriar. — O que seria de vocês sem a minha mente brilhante, afinal?

Tsc! — Mesmo que incomodado, era inegável que, se não fosse pelo auxílio do louco do Arklev, tanto ele quanto os Patronos do Pecado já teriam sucumbido aos efeitos do tempo há eras. — Desde que concretize suas palavras, faça o que bem entender.

Sem desperdiçar mais saliva do que era necessário, Nabuco Donosor deu as costas a todos os que ali se encontravam presentes, deixando para trás o que poderia ser muito bem o cão em forma de gente.

— Não há com o que se preocupar, minha jovem. — Inclinando-se na direção das garotas, Arklev espreitou de forma minuciosa cada milímetro quadrado de Minerva. — Mesmo se falharmos na criação do veneno perfeito, você e a sua equipe ainda terão alguma serventia.

Minerva engoliu a saliva em seco, sentindo a garganta rasgar no processo e uma gota de suor escorrer pela lateral de seu rosto.

Era evidente o fim que estava reservado para aqueles que Nabuco Donosor julgava como incompetentes.

— Nós faremos… o possível…

Foi então que Minerva sentiu um forte aperto em seu braço; Trivia a abraçou simplesmente do nada e encarou o cientista louco, com feições sérias.

— Periiigo…

A serpente Samael também ficou do lado da garota, fazendo menção de que não deixaria Arklev aprontar algo para cima de Minerva.

— Olha só você fazendo algum esforço, pequena Preguiça — debochou o cientista.

Era inegável que ele gostaria de usar cada uma daquelas pessoas como cobaias em seus experimentos, assim como fez com Trivia e com cada um dos outros Patronos do Pecado; entretanto, no fim de tudo, o dever falava mais alto.

— Vamos dar o nosso melhor, tudo bem? — Vendo que a Patrona continuava com a guarda levantada, direcionou sua atenção para Minerva. — Ninguém aqui quer sofrer a ira daquele homem, certo?

— Sim — concordou, mesmo sabendo que o verdadeiro perigo estava bem na frente dela.

Ter sua carreira e a sua vida destruídas por Nabuco Donosor chegava a ser um ato de clemência perto do que seria virar um experimento nas mãos de Arklev.

Trivia sabia disso muito bem.

Ela ainda conseguia se lembrar com clareza dos gritos e do choro de cada uma das crianças que agonizaram até a morte, nas instalações subterrâneas da Organização Perpetuum.

Se havia algo que a impedia de se deitar e dormir calmamente por todo o sempre, esse seria os flashes traumáticos que insistiam em estragar seus sonhos e forçá-la a abrir os olhos de novo.

Nunca, em hipótese alguma, ela permitiria que Minerva passasse por algo do tipo, mesmo que tivesse que fazer algo que não gostava: trabalhar.

— Vamos… nos esforçaaar…

Haha! — Ouvir aquilo fez Minerva relaxar um pouco; por um momento chegou até a esquecer que estava com a corda no pescoço. — Vamos sim.

— Agora que alinhamos nossos propósitos — disse Arklev, mal vendo a hora de colocar as mãos na massa — me atualize sobre os detalhes do projeto, minha jovem.


Continua no Capítulo 127: Espectadores

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