Volume 2 – Arco 4
Capítulo 97: Compartilhamento
— Isso é ruim pra eles. — Na sala dos duos da Academia de Batalha Ziz, Sophie observava a poeira de toda aquela destruição começar a baixar. — Já não bastava a Tília aperfeiçoar a própria velocidade com a Manipulação de Eletricidade, agora ela tem esses olhos também?
Naturalmente, em troca de uma grande resistência e uma força física de causar inveja às outras Classes de Batalha, os integrantes da Classe Guerreiro possuíam os atributos de velocidade e agilidade inferiores aos demais: o machado pesado era o símbolo disso.
Tília, por outro lado, conseguia burlar essa desvantagem até certo ponto, graças aos efeitos da sua Habilidade Inata.
Quando os Olhos de Águia entravam na equação, a percepção dela aumentava de modo a se tornar um problema até mesmo para os ágeis movimentos de alguém da Classe Assassino.
— Uma verdadeira sinuca de bico pra Sirin — ressaltou Trevor enquanto cogitava uma certa possibilidade: — A Academia de Batalha Absalon fez isso de forma proposital?
— Huh? — Petra, por ter passado muito tempo longe da Academia, foi a única a não entender bem o que o rapaz quis dizer. — "Proposital"?
— Ah, sim. — Com um punho fechado em frente à boca, o rapaz limpou a garganta e se pôs a explicar: — Historicamente, a Academia de Batalha Absalon é a que mais usufrui das regalias do Pacto de Ressonância.
Diferente das demais Academias, que tinham como foco principal a boa interação entre os integrantes dos duos, a Absalon detinha seus olhos sobre o Compartilhamento de Habilidades do Pacto de Ressonância.
Quase todos os duos daquela Academia eram formados por pessoas de raças diferentes. Só não existiam pares de tenjins com majins, uma vez que estes eram naturalmente incompatíveis.
— Entendo. — Como havia encontrado muitos duos formados por pessoas da mesma raça, Petra deixou esse detalhe passar. — É tipo as runas e a Veste Divina que eu posso usar por causa do meu pacto com o Rai.
— E a imortalidade, não pode esquecer. — Com um dedinho erguido ao teto, Sophie tratou de chamar-lhe a atenção. — Ah, é mesmo! Você já se habilitou à ideia de que só vai envelhecer até os vinte anos?
Com uma mão atrás da nuca e um sorrisinho sem jeito, Petra imaginou como essa experiência tinha sido para Sophie e Eirin.
— Bem, desde que eu passe esse tempo ao lado do Rai, acho que eu vou me acostumar.
— Hmmm… — Com um sorrisinho sugestivo, Sophie se inclinou na direção da amiga e disse o que a deixaria um tanto quanto envergonhada: — "Ao lado do Rai", né?
— Digo… Er… — Ao desviar o olhar para qualquer direção, em busca de uma resposta, Petra não chegou a perceber as feições pálidas de uma certa pessoa.
"Ela não vai envelhecer." Como se tivesse acabado de encarar um fantasma, Valentina, que estava mais ao canto, se encontrava a ponto de desmaiar. "Mas… Mas… eu vou".
A amiga que tanto prezava, a qual vai como irmã mais nova. Uma das suas pessoas mais importantes. Alguém que ela viu crescer ao seu lado. De uma garotinha indefesa, Petra chegou até mesmo a superá-la em termos de força.
Tudo isso a fez se sentir muito feliz. Nada a alegrava mais do que o sucesso da sua amiga. Mas agora, por alguma razão, seu peito doía.
— Valentina? — Andrew pôs uma mão sobre o ombro dela, chamando-lhe a atenção.
Foi quando, por meio de um movimento brusco, a porta da sala em que o grupo se encontrava foi aberta com tanta força que o ar que estava dentro quase foi sugado para o lado de fora.
— Ah, céus é você! — Com a mão no coração, Sophie quase deu um pulinho na poltrona que compartilhava com Trevor. — Quase me fez enfartar.
— Desde quando seu coração enfarta por algo tão simples? — disse Raizel, enquanto fechava a porta e se dirigia para o assento ao lado de Petra. — Mal começou e já está a ponto de acabar?
Prestando atenção na situação desesperadora do duo da Academia de Batalha Behemoth, o nefilim ignorou as feições confusas de Sophie.
Raizel nunca foi de dar uma resposta tão seca para ela por causa de uma brincadeira daquelas.
Talvez só estivesse chateado por causa da derrota dos seus companheiros e da forma que eles foram tratados durante a luta.
Ainda assim, Raizel nunca foi o tipo de pessoa que despejava sua frustração em cima dos próprios amigos.
Contudo, diferente dos demais, que apenas optaram por ignorar o ocorrido, alguém segurou a mão dele de fininho e entrelaçou os seus dedos nos dele.
— Eu sei que você acabou de chegar, mas… — disse Petra com uma voz suave, enquanto repousava seu rosto sobre o ombro de Raizel, deixando-o levemente surpreso. — Quem você acha que vai vencer essa luta?
Agora que ela estava tão próxima do seu rosto, era possível sentir o cheiro doce e suave que sua parceira carregava. Sem que percebesse, Raizel esboçou um sorriso discreto e sentiu o corpo relaxar.
— Vejamos… — Com um tom de voz mais ameno, observou a luta com atenção antes de responder a pergunta da sua parceira. — Se houvessem fichas para apostar, eu jogaria todas no duo da…
— A-Argh… — Sua carne ainda ardia e tremia por causa da eletricidade residual em seu corpo. Mesmo assim, Sirin se esforçava para se levantar com as pernas cambaleantes. — Se lascar…
Enquanto sentia a viscosidade do sangue escorrer pelo braço esquerdo, que pendia sem forças para baixo, encarou os olhos sagazes de sua adversária mais uma vez.
— Ter que se esforçar cansa… mesmo.
Atenta a cada mínimo movimento da tenjin debilitada, Tília confirmou que a assassina já não poderia mais usar uma de suas adagas.
A mordida do Dragão de Raio foi eficaz em destruir boa parte do ombro de Sirin. Levaria um bom tempo até que ela conseguisse se recuperar daquilo por completo.
A vitória se encontrava a um passo de estar em suas mãos, mas, para isso, era necessário acabar com aquilo enquanto o cenário se encontrasse favorável.
— Você se esforçou bem — disse, ao passo que diversas faíscas de eletricidade começaram a crepitar do que havia restado do piso da arena, provocando contínuos estalos por todos os lados. — Foi um prazer te ter como oponente, Sirin.
Ao ouvir aquilo, Nathan logo mirou um disparo na garota, mas parou assim que escutou o som do vento se intensificar na direção em que Eslly se encontrava.
Mordendo os lábios, percebeu que qualquer flecha que ele disparasse seria facilmente interceptada pelo seu rival arqueiro.
— Tsc!
Fixando a base de seus pés com força no chão, a ponto de fazê-lo rachar, a guerreira girou seu corpo enquanto carregava o pesado machado consigo e arremessou-o com tudo.
Girando tão rápido, como se tivesse se tornado uma espécie de disco, a arma avançou absorvendo todos os raios que estavam espalhados pelo chão.
Todavia, em vez de ir direto até o seu alvo, o machado desviou para o lado e, em uma velocidade insana, circundou as extremidades da arena, absorvendo mais e mais eletricidade, tornando-se cada vez mais rápido e poderoso.
"Isso é mau!" Fosse por causa dos estalos elétricos ou apenas por pressentir a catástrofe que a aguardava, Sirin tremeu da cabeça até os pés. — Eu tenho que…!
Mesmo que buscasse distância, devido aos ferimentos sofridos, Sirin não conseguiu ser tão rápida quanto esperava para escapar das garras da oponente, a qual logo se pôs na frente dela.
— Tarde demais. — Brilhando como o Sol e crepitando mais do que inúmeras fogueiras, a arma de Tília retornou para as mãos dela e, como um raio que caía para castigar a terra, estava para finalizar a assassina. — Juízo Trovejante!
Porém, por alguma razão, a voz do seu parceiro soou atrás dela, dizendo: — Pare, Tília!
— Heim?
Por que ele pediu para que ela interrompesse o ataque que nitidamente os faria vencedores? Depois de nocautear aquela garota, bastaria imobilizar o arqueiro.
"Pera, o arqueiro…?" Num ínfimo intervalo de tempo, Tília usou sua visão periférica para observar que quem havia falado com ela não tinha sido o seu parceiro. "Emulação de Voz?!"
Modelando o som das suas cordas vocais de modo a se assemelhar à voz de Eslly, Nathan conseguiu uma um mísera, mas suficiente brecha para que Sirin retirasse uma Gema Espectral do seu anel de ressonância e fundisse à adaga.
Agora, um pouco mais comprida, a arma foi capaz de alcançar, de forma superficial, a pele do peito de Tília. Ao menos, até que uma Flecha de Vento passasse perto da lâmina, e a inevitável explosão do machado elétrico ocorresse.
Por ambas estarem com a guarda desestruturada no momento do choque, tanto Sirin quanto Tília foram brutalmente jogadas para longe junto a raios, poeira e detritos.
Quem também recebeu dano daquela devastadora explosão, porém de forma indireta, foi Nathan que, rangendo os dentes, tapou os ouvidos.
Mas aquilo em nada se comparava ao estado em que sua parceira se encontrava. Enquanto Tília se levantava, Sirin continuava caída, em meio a contínuos espasmos musculares.
"Dro… ga…!"
Devido aos fortes efeitos da eletricidade, os pulmões e o coração de Sirin estavam apresentando falhas em seu funcionamento.
— Quê? — A guerreira não podia acreditar no que via. Para a sua surpresa, a imagem da garota caída estava se dividindo em três. — Veneno…
Enquanto a pele de seu peito ardia, uma leve fumaça esverdeada subia do ferimento ainda aberto.
No fim, aquela Gema Espectral não servia apenas para aumentar o tamanho da adaga, era para acelerar o efeito do veneno também.
— Hehe! Suas pernas perderam as forças, e ela se viu vulnerável, de joelhos. — Que tenjin ardilosa.
Até mesmo o som da sua própria voz já parecia distorcido, assim como o da voz do seu parceiro. De qualquer forma, ela nem precisava ouvir. Com pesar, já imaginava o que saía da boca dele.
— Eu… errei… — Como também foi pego de surpresa pela alteração na voz de Nathan, Eslly não conseguiu desviar a lâmina da assassina com a sua Flecha de Vento, e quem sofreu com isso foi a sua própria parceira — de novo… eu…
Continua no Capítulo 98: Uma Única Vez
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