O Nefilim Primordial Brasileira

Autor(a): Ghoustter


Volume 2 – Arco 4

Capítulo 94: Um Bom Mau Exemplo

Brincando com tudo e todos sem levar nenhuma das suas obrigações a sério, apenas deixando a vida a levar, Sirin Strauss estava longe de ser o que qualquer um chamaria de exemplo de tenjin.

— Tenjin isso, tenjin aquilo. — Caminhando ao lado daquele que, no futuro, se tornaria seu parceiro de duo como Top 3 Rank S da Academia de Batalha Behemoth, a pequena fazia expressões faciais estranhas, como se tivesse chupado um limão. — Ergh!

— Você deveria levar a opinião dos outros mais a sério. — O rapaz caminhava olhando fixamente para a frente. Era assim que ele vivia: focado e disciplinado. — Isso é porque eles se preocupam com você.

Embora fosse tão jovem quanto a pequena garota ao seu lado, Nathan Martin já possuía um objetivo bem claro: se tornar o maior arqueiro que aquele mundo já viu.

Muito se orgulhava dos seus olhos afiados — característica da sua Classe de Batalha. Na época, ele ainda não usava a habitual venda que os cobria, pela qual seria muito conhecido na Academia de Batalha Behemoth.

Err… — Sirin o encarou como quem via um bicho não muito divertido. — Tão certinho.

Tudo o que a moça sentia ao ver um garoto como o seu amigo era que ter um sonho e lutar por ele — além de ser muito chato — era trabalhoso e cansativo.

Talvez esse fosse o preço para se alcançar grandes objetivos. Mas as pessoas realmente precisavam derramar tanto suor e perder incontáveis noites de sono?

Desde que tivesse o suficiente para levar uma vida tranquila e preguiçosa, sem ter que dar satisfação aos outros — fossem pais, amigos ou professores — ela já se sentia mais do que satisfeita.

Por falar em professores, os dois estavam caminhando em direção à escola. Por causa do desleixo daquela garota inconsequente, eles estavam a ponto de se atrasarem.

Ainda assim, Nathan se esforçava para se manter calmo e sereno. Até considerava a presença da amiga como um exercício para isso.

"Os melhores arqueiros são aqueles que permanecem calmos em qualquer situação, independente do quão desesperadora seja, e as suas mãos jamais tremem" era o que ele costumava dizer.

— Que brega! — Ignorando a companhia do amigo, e o fato de que estavam correndo contra o relógio da escola, a garotinha aproveitou que eles se aproximavam de uma pequena ponte e correu em disparada rumo à beirada.

Como se não temesse o perigo, ou fosse apenas irresponsável, usou o impulso da corrida para pular e subir em uma das muretas que ficavam nas laterais da ponte.

De pé e com os braços abertos, erguidos ao alto, sentiu o agradável frescor da brisa matinal perfumada pelo cheiro das águas abaixo.

— Tem que viver a vida da forma mais relaxante e agradável possível!

— E-Ei… — Ofegante, o rapaz demorou para acompanhá-la. Mesmo com aquele estilo de vida sedentário, sua amiga ainda era da Classe Assassino. — Isso é perigoso, Sirin.

Se ela não tivesse gritado naquela hora, talvez ele nem tivesse percebido que a presença da garota havia se distanciado. A Furtividade daquela Classe de Batalha era algo assustador.

— A aula já vai começar. — Respirou fundo, pegou um pouco de ar e reestruturou sua postura. "Que menina rápida".

— Tá! Tá! Eu já enten… — Ao dar um leve giro para ficar de frente para o seu amigo e descer dali, por uma fatalidade, seus pés se desequilibraram. — A-Ahh!

Sirin podia sentir o corpo ser tomado pela imparcialidade da gravidade, ao passo que a beleza do céu azul se manifestava logo acima.

Que bela vista para se apreciar antes de sucumbir ao frio abraço da morte. Ao menos, não teria mais que se preocupar com coisas triviais como estudar e trabalhar.

"O caralho!" Por instinto, cada célula do seu corpo buscou, em meio ao desespero, um amparo pela vida.

Suas mãos se moveram da forma que podiam para se segurar na mureta da ponte, todavia o máximo que conseguiu foi sentir as pontas dos dedos escorregarem pela lateral.

Estava tudo perdido. Apenas fechou os olhos e esperou seu corpo colidir contra o paredão de concreto em forma de rio logo abaixo.

Foi quando algo agarrou uma de suas mãos erguidas, e ela pôde sentir seu corpo ficar suspenso, de forma abrupta, no ar graças àquele que a segurava com todas as forças.

— Nathan? — Era perceptível como o garoto estava se esforçando: dentes cerrados, rosto vermelho, veias inchadas…

— Eu vou te puxar agora — falou com certa dificuldade. — Tenta pegar apoio em alguma coisa.

E assim ela o fez. Conforme era puxada, sua mão livre e pés conseguiram alcançar as extremidades da mureta e diminuir um pouco a pressão imposta sobre seu amigo.

Por sorte, ou quem sabe pela percepção afiada dos olhos do garoto, Sirin conseguiu escapar daquela com vida.

Agora, sentados e encostados na pequena estrutura da qual a moça quase despencou, ambos suspiravam aliviados e esgotados.

— Como alguém… pode dar tão pouco valor… à vida? — Deixou os membros relaxarem. Depois daquilo, o garoto já havia esquecido da aula.

— Escuta, Nathan. — Um pouco mais reflexiva que o normal, sua amiga indagou: — Como é se esforçar por alguma coisa?

Para alguém que quase acabara de sofrer um acidente que poderia muito bem, no mínimo, quebrar alguns de seus ossos ou ainda levá-la dessa para melhor, aquela era uma pergunta um tanto quanto inesperada.

— Cansa e dá muito trabalho, mesmo assim — disse, enquanto observava sua mão vazia, como se segurasse algo invisível e intangível — a sensação de conquistar algo é simplesmente… incrível.

Ah, é… — Replicando o movimento do companheiro, disse: — Espero que você esteja certo mesmo.

Acompanhados por uma Alícia mais pensativa que o normal, Sirin e Nathan percorriam os largos corredores da Academia de Batalha Leviatã em direção à arena de combate.

Após esperar até que a barreira da mesma fosse reparada, os dois poderiam, enfim, dar início à sua participação no evento.

Uma vez que o duo da Academia rival foi vitorioso na partida anterior, Sirin e Nathan viam-se quase obrigados a conquistar a vitória contra o duo de semi-humanos da Academia Absalon.

Mas isso nem de longe parecia algo simples. Saber quem seriam os seus adversários fez Nathan se manter calado durante a maior parte do percurso.

Ele levou uma mão até a venda em seu rosto e soltou um suspiro pesado, o que despertou a atenção de Alícia.

— Você está preocupado com o outro arqueiro? — indagou a moça de olhos roxos, tão profundos quanto a sua própria aura. Acompanhava seus amigos, pois queria desejar-lhes sorte na luta a seguir. — Você consegue lidar com ele.

— Claro que consegue! — A parceira do rapaz logo se intrometeu no assunto. — Nós vamos vencer aqueles dois, e a nossa vitória vai ser algo simplesmente incrível!

Vendo Sirin tão determinada, era até difícil acreditar quando Nathan dizia que aquela garota já foi alguém que não se esforçava por nada na vida.

Talvez o tempo realmente fosse um fator poderoso na hora de mudar as pessoas. Pelo menos, era isso o que Alícia esperava, principalmente, em relação a um certo alguém.

Caso Raizel continuasse tão fechado e frio quanto era naquela época, interagir com aquele cara seria mais difícil do que ela esperava.

Talvez ele até a odiasse.

— Tenho certeza de que serei o melhor suporte — disse Nathan, enquanto se abaixava para pegar uma latinha que alguém deixou cair por ali e a arremessou com precisão cirúrgica em uma lata de lixo — Sirin.

— Eu já sei disso. — Cruzou os braços e virou o rosto corado para o lado. — Não precisa ficar repetindo essas coisas embaraçosas.

Se Sirin fingia não ter gostado de ouvir aquilo, Alícia, por sua vez, olhava admirada para a lata de lixo que o parceiro da garota havia acertado. Às vezes até esquecia que o rapaz usava uma venda.

Chegando na entrada da arena de combate, a moça viu que ali era fim de linha para si. Até que chegasse o dia da sua própria luta, não poderia passar por aquele portão.

— Eu e o pessoal estaremos torcendo por vocês. — Deu um abraço em Sirin, o qual foi correspondido com uma certa força. — Se cuidem, tá bom?

— Claro, pode deixar com a gente. — Soltando-se do abraço, apontou um dedo repreensor para a amiga. — Agora corre de volta para a nossa sala, senão vai perder a transmissão da luta.

Hehe! Tá bom. — Acatando a ordem da outra, Alícia se pôs a caminhar a passos largos, até esqueceu de se despedir do outro companheiro.

Dando uns tapinhas de leve em suas bochechas, Sirin encarou a entrada e disse com determinação: — Vamos arrebentar a cara deles.

O que Alícia não esperava era que, ao caminhar de volta para a sala dos membros de sua Academia, acabaria por esbarrar com o dito cujo, o qual fazia a mesma coisa que ela.

Caminhando de forma reflexiva, o rapaz parecia não ter notado a presença dela, ainda que ambos estivessem quase de frente um para o outro.

De qualquer forma, era uma boa oportunidade para se redimir pela confusão causada quando se encontraram da outra vez.

Que os seus amigos a perdoassem; ela perderia um pouco da transmissão da luta deles, mas seria por um bem maior — ou talvez apenas por causa do seu próprio egoísmo.

— Olá! — O som de sua voz logo fez Raizel abrir bem os olhos e sair do transe no qual estava submerso.

Foi aí que, em meio aquele corredor solitário, a imagem um do outro foi refletida no encontro dos olhos vermelhos e roxos.


Continua no Capítulo 95: Contra a Parede

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